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quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

689) O terrorismo islâmico-fundamentalista: uma quarta guerra mundial?

Gostaria, nesta breve nota, de fazer minhas observações pessoais e de deixar constância acerca de uma terrível realidade contemporânea da qual talvez não tenhamos (mas deveríamos ter) a exata dimensão e a consciência exata do que ela significa na história da humanidade.
Está se constituindo uma modalidade de terrorismo político-religioso sem qualquer precedente na história da humanidade, que promete ficar conosco durante muito tempo ainda: o terrorismo islâmico-fundamentalista, uma nova espécie de barbárie, que precisa ser chamada pelo que ela é, efetivamente.
Essa modalidade de terrorismo está sendo identificado, por alguns analistas, como sendo a Quarta Guerra Mundial (a terceira sendo constituída pela Guerra Fria, que terminou com a implosão do comunismo, que não foi obviamente destruído pelo capitalismo, mas foi eliminado por sua própria incompetência econômica e tecnológica).
Esse novo terrorismo, de base inegavelmente e inquestionavelmente (é preciso que se o diga) islâmico-fundamentalista, visa simplesmente a causar o maior número de mortos, de forma indiscriminada (mesmo entre os próprios seguidores da religião islâmica), em nome de objetivos muito difusos, mas que todos tem a ver com a recusa da modenidade ocidental, com a rejeição das conquistas do iluminismo (que foi ocidental, mas é propriamente universal).
Esse terrorismo islâmico-fundamentalista é profundamente reacionário e obscurantitsta, e alguns observadores o acusaram de fascista, mas não creio que esse conceito apreenda suas características peculiares. O fascismo tem a ver com uma determinada noção de um regime político, com a conquista do Estado e a obtenção de objetivos políticos, econômicos e sociais. O terrorismo islâmico-fundamentalista é mais uma negação do existe do que a construção de uma nova sociedade.
Esse terrorismo se baseia num estoque infindável de pessoas-bomba, de todos os gêneros e idades. Não é incomum assistir-se na TV, reportagens que mostram alguma mãe de um pequeno candidato a menino-bomba (existem garotos de dez anos sendo treinados para isso) dizendo se sentir orgulhosa de ver seu filho sendo treinado para ser um combatente contra o inimigo sionista e americano. Pode ser patético, mas é revelador de um certo estado de espírito.
Qual é a sociedade que produz uma mãe que pede, literalmente, que o seu filho se exploda com o maior número possível de inimigos? Não creio que seja uma sociedade “normal”, mas esse tipo de predisposição para o martírio corresponde a um movimento determinado, o do fundamentalismo islâmico, que aparentemente conquistou muita gente. Existem, como se sabe, muitos “meninos-bomba” em preparação, da Palestina ao Paquistão, e talvez mais além.
Não nos enganemos: todos esses candidatos voluntários ao martírio pertence a um arco civilizatório específico: o do islamismo decadente e fracassado, não enquanto religião, mas enquanto enquanto sociedades “normais”. Por várias razões – entre elas a autocracia política e a falta de modernização econômica e social, pelo próprio fracasso dessas sociedades e desses Estados autoritários em prover meios de vida descentes a uma massa considerável de jovens desesperançados (e alimentados no ódio ao Ocidente como se ele fosse responsável pelos fracassos) –, o movimento do terrorismo fundamentalista-islâmico dispõe hoje de um estoque infinito de candidatos a pessoas-bomba.
O que o Hezbollah, o Jihad, o Hamas e outros movimento assemelhados fazem hoje, da Palestina à Índia, passando pelo Iraque e pelo Afeganistão, é exatamente isso: uma nova modalidade de terrorismo inaceitável na perspectiva de qualquer nação civilizada na face da terra.
Sim, existe uma diferença entre esses bárbaros e os antigos terroristas, da fase anarquista, quase romântica. Os antigos anarquistas, geralmente de extração operária, faziam atentados isolados, visando diretamente os soberanos (presidentes, reis, autoridades em geral), pois queriam combater o Estado, que viam como mal absoluto. Se expunham pessoalmente e conseguiam em alguns casos o seu intento. Era uma tática terrorista numa estratégia mais ampla de luta política, mas algo desorganizada, geralmente condenada pelos demais grupos de esquerda.
Os bárbaros da atualidade explodem tudo e a todos, matando inocentes sem contar, sem qualquer objetivo militar aparente, numa estratégia de terror pelo terror. Eles também se expõem pessoalmente – e como: na promessa mirífica do paraíso dado automaticamente aos mártires – mas seus objetivos são indiscriminados, atingindo inocentes e alguns “correligionários”.
Acho que a realidade terrível está exposta, claramente. A nova barbárie bateu à nossa porta e ela promete perdurar por longos anos à frente. As pessoas que se julgam conscientes e responsáveis deveriam tomar partido. A linha divisória está posta.
Eu fico assustando de ver como a esquerda brasileira, e talvez a esquerda mundial, ainda se permite aplaudir esse tipo de gesto, apenas porque ele se dirige, supostamente, contra o inimigo imperialista ou sionista. Não gostaria de constatar que a esquerda se colocou do lado dos bárbaros, absolutos, inaceitáveis a qualquer pretexto.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 1709: 18 janeiro 2007

6 comentários:

Anônimo disse...

Muito bem escrito, Paulo, concordo integralmente !
E lamento a politica externa brasileira neste aspecto. Fiquei chateado ao ver o Presidente ir no Oriente Médio e não visitar Israel, única democracia na região e potência econômica e militar, numa tentativa de angariar apoio dos árabes, me pareceu.

Carlos Wilson

Reginaldo Macêdo de Almeida disse...

Paulo,

O que tu escreveste é realmente uma boa síntese dessa realidade sombria.

Ainda não está claro pra mim se os americanos foram os causadores dessa efervescência, ou apenas os catalizadores.

O fato é que o mundo, tanto o ocidental como o oriental, caminha a passos largos para provar e comprovar o que escreveu Ortega y Gasset no seu livro "A Rebelião das Massas", há mais de 50 anos. O grande lance penso eu, é que o mundo árabe anda tão sem perspectiva que de repente entraram em um estado de catarse coletiva e viraram o perfeito homem massa. Como acreditam que nada tem a perder e que quando morrerem terão nao sei quantas virgens a disposiçao...

Não sei até que ponto a leniência dos EUA com a situação de Israel e a Palestina foi a semente de tudo isso. Penso que a incoerência em sua política externa, de tentar defenestrar os ditadores inimigos brandindo a bandeira da democracia e das as costas para outros ditadores não ajudou muito na sua causa, ou na causa mundial, que deveria ser a tolerancia e a paz.

Por outro lado, é realmente irracional a pauta diplomática brasileira, no que tange à ideologização da mesma. Para mim diplomacia tem que ser pragmática, e não ideológica. Independentemente de a diplomacia brasileira ter elegido aos EUA como inimigo, essa de que o inimigo do meu inimigo é meu amigo não cola. Onde estão os nossos valores absolutos? Isso mais parece aquele acordo espúrio de Stalin com Hitler...

Anônimo disse...

Perfeito, Paulo Roberto.
A esquerda, desde a escola de Frankfurt, adotou como objetivo nao apenas a implantacao do socialismo, mas tambem a destruicao da civilizacao ocidental. Agora encontraram parceiros `a altura.

Paulo Roberto de Almeida disse...

Sim, Felipe. Alguns intelectuais liberais costumam referir-se ao fundamentalismo islâmico como "islamo-fascismo", no que acredito eles tenham razão.
A esquerda sempre se engana de personagens, e até hoje considera que Stalin, por exemplo, foi um dirigente de "esquerda".
Hoje mesmo, apenas porque o Coronel Chávez deblatera contra o imperialismo americano e se coloca de amigo de Fidel Castro, ele é considerado de "esquerda", quando o seu DNA é o mesmo do Mussolini: ele é um tremendo fascista...
Incrível como as pessoas não eprcebem isso, e se deixam enganar por discursos e não vão à essência das coisas...

Anônimo disse...

Paulo Roberto,
Sinceramente, não tenho muita certeza se esquerda e fascismo sao ideologias antagônicas. O próprio Mussolini foi militante socialista. "Socialismo democratico", rótulo da moda depois da queda do Muro de Berlim, é propaganda enganosa. Chavez é fascista, mas não deixa de ser esquerdista.
A propósito: parabéns pelo seu trabalho. Sou estudante de relações internacionais nos EUA, e aqui, na Florida International University, tenho contado com vários de seus livros (disponíveis na biblioteca) para a realização de trabalhos sobre história da política externa brasileira e relações Brasil-EUA. Seus trabalhos são definitivamente os mais lúcidos que já se produziu no Brasil sobre esses temas. É um alívio não ter de depender dos Cervos e Vizentinis e aquela conversa toda de dependência, alinhamento automático... Será que algum desses conceitos têm realmente algo de substantivo? O Brasil algumas vez na sua história se alinhou AUTOMATICAMENTE aos EUA?
Enfim, obrigado por trazer luz sobre o estudo da história da política e relações internacionais do Brasil.
Um abraço

Paulo Roberto de Almeida disse...

Para alguns autores, fascismo e comunismo são as duas faces da mesma moeda, tanto nos métodos políticos -- o Estado total, o partido unico, a violencia como método de controle social, a falta de liberdade politica, a censura à imprensa, os campos de concentração, enfim, o totalitarismo -- como nos procedimentos econômicos -- mais uma vez, a propriedade estatal, a repressão da mão-de-obra, a quase escravatura, o coletivismo e o dirigismo estatal. Eles são profundamente antiliberais.
Meus trabalhos de relações internacionais e sobre história diplomática brasileira procuram dar uma visão honesta, o tanto quanto possível objetiva das realidades existentes, com base nos documentos, na observação da realidade, no conhecimento direto do funcionamento de uma chancelaria e seu processo decisório. Descarto totalmente essa visão acadêmica que busca encaixar os movimentos politico-diplomáticos em moldes conceituais pré-concebidos (dependências, alinhamentos e outras bobagens acadêmicas). Lamento que tantos estudantes sejam literalmente contaminados por essas visões desprovidas de fundamentos, que passam por história ou análise das relações internacionais e da política externa brasileira.
Grato pelos seus comentarios, Felipe. O abraço do
Paulo Roberto de Almeida