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quinta-feira, 28 de junho de 2007

750) Um retrato do atual ambiente universitário?

Provavelmente sim, hélas!
Vejam a crônica bem-humorada, mas nem por isso menos verdadeiro, de meu colega acadêmico de Santa Catarina sobre os ares do nosso tempo, um Zeitgeist elementar, quando não vulgar...

CAMPUS AVANÇADO DA IDEOLOGIA
por Orlando Tambosi

O Brasil virou mesmo um país de mentes pasteurizadas pela ideologia. Cinco anos de governo lulo-petista bastaram para que tudo fosse virado pelo avesso. Se você defende as liberdades e a democracia, é tachado de "direitista" ou "conservador" (quando as defendia durante a ditadura, era considerado de "esquerda"). Se você defende a ciência, é logo carimbado de "positivista", membro dessa tribo antiquada que acredita na existência de fatos objetivos e, ainda mais absurdo, que tais fatos sejam acessíveis e explicáveis por teorias independentes dos observadores. E se leva a lógica a sério, então, você é um "reacionário" consumado, vítima do raciocínio "burguês".

Isto não acontece no bar da esquina, claro, mas dentro das universidades, particularmente nas ciências humanas/sociais. Seus alunos já vêm ideologicamente embalados do segundo grau, mas ao invés de desenvolverem um pensamento crítico e racionalista, recebem nos campi nova tintura ideológica. Ali, professor "legal" é aquele que reforça as convicções do alunado, não aquele que o incomoda com reflexão. E há muitos mestres, nesse teatrinho, que jamais contrariam aquilo que a platéia espera.

Onde impera o relativismo, tanto no campo cognitivo quanto na esfera dos valores, o mundo passa a ser aquilo que a hermenêutica pós-moderna diz que é. A grama das praças, por exemplo, pode ser vermelha, dependendo apenas do ponto de vista do sujeito. As palavras já não se referem à realidade, mas são a própria realidade - e nada existe fora da linguagem!

Se há dissenso em relação à racionalidade e às ciências, há consenso em torno de algumas pautas, a começar pelo ecologismo, que é quase uma nova religião. Não ouse duvidar que o maldito "ser humano" seja o único responsável pelo "Aquecimento Global", esta entidade com que os novos apocalípticos ameaçam o planeta. Não ouse contestar que a "globalização" seja uma invenção do imperialismo para dominar e a "periferia". E nem ouse negar que "outro mundo é possível", bem além da "lógica capitalista" e das "leis do mercado". Sobretudo, veja no Estado dirigente e regulador o justiceiro das classes populares, o remédio eficaz para todos os males do "neoliberalismo". Defenda sempre mais Estado, nunca menos.

Por fim, considere calunioso aquilo que o escritor Mário Vargas Llosa, obviamente um liberal, definiu como "idiotice latino-americana". Essa idiotice "postiça, deliberada e de livre-escolha", diz ele, "é adotada conscientemente por preguiça intelectual, apatia ética e oportunismo civil. É ideológica e política, mas acima de tudo frívola, pois revela uma abdicação da faculdade de pensar por conta própria, de cotejar as palavras com os fatos que pretendem descrever, de questionar a retórica que faz as vezes de pensamento. Ela é a beatice da moda reinante, o deixar-se levar sempre pela corrente, a religião do estereótipo e do lugar-comum."

http://otambosi.blogspot.com
Publicado em 27/06/2007

3 comentários:

Paulo Roberto de Almeida disse...

(Comentário efetuado por Maria do Espirito Santo GOntijo Canedo):

De fato, o Brasil é um país de mentes pasteurizadas pela ideologia, mas os cinco anos de governo Lula só deram continuidade, talvez com um pouco mais de ênfase, a um processo que já vinha ocorrendo a todo vapor desde o golpe militar, ou mais exatamente desde 1968, se quisermos ser mais precisos, ano do Ato Institucional no 5, muito bem retratados, em termos jornalísticos, por Zuenir Ventura no seu livro 1968, O ano que não terminou. Foi nas cercanias dessa data fatídica que as mentes começaram o seu processo de pasteurização pela ideologia militar. Este é um país que vai pra frente, ououououououou. E que supostamente iria pra frente se ninguém pensasse, se ninguém questionasse, se simplesmente todos apenas acreditassem que o país iria pra frente empurado pelas mãos medicinais de Medici e outros poucos a quem era permitido pensar e agir. Era isto ou o risco de acabar que nem o filho da Zuzu Angel. Ora, se respirar os ares do pensamento crítico poderia derivar no risco de respirar monóxido de carbono, o melhor a fazer era respirar o mínimo possível, transformar-se rapidamente em tartarugas lentíssimas, pacíficas, dóceis.
Outra fala que causou-me espécie foi o autor afirmar que "se você defende a ciência, é logo carimbado de positivista". Olha, eu invejo os alunos de vocês, viu.. porque os alunos que transitam nas universidades destas Minas Gerais, podem apostar! crêem que positivistas sejam pessoas muito positivas... e reacionário, para quase todos eles, é sinônimo de revolucionário.
Quanto ao relativismo a que ele se reporta, nossa... esse é de doer! Quando eles afirmavam, como papagaios, "que não há verdade nenhuma" e eu retrucava que eles tinham acabado de enunciar uma verdade, eles me olhavam como seu eu estivesse louca. E se eu ousasse dizer que a verdade é o horizonte teleológico do ser, correria o risco de ser apedrejada.
Quanto ao não haver nada além da linguagem, isto é lacanagem demais pra mim. Aliás, não haver nada além do que quer que não seja da minha preferência ou do meu comodismo (só Jesus salva, só a economia salva, só o comércio exterior salva, só a filosofia salva, só a literatura salva, usw...) é a primeira estaca cravada no solo da imbecilidade para se armar a barraca da burrice.
Só repetir, repetir, repetir as velhas fórmulas receitadas pela docilidade do consenso - a ordem é reciclar, a ordem é não poluir, a ordem é caminhar, a ordem é não discutir, Macado disse, Macado disse, Macaco disse... - quase me dá vontade de causar uma fratura exposta numa velhinha aposentada e explorar sexualmente um bebê de 2 dias ao mesmo tempo. E ainda bem que você não é uma advogada que eu tive o desprazer de trocar meia dúzia de palavras e portanto eu não precisarei dizer que estou me valendo do mais preto humor negro.
Realmente, essa onda de defender mais Estado é ridícula mas, mais uma vez, seria uma felicidade se os alunos das universidades mineiras defendessem, pelo menos, estratégias errôneas no que concerne à questões político-econômicas. A maioria crê que Estado seja Minas, Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro... Não estou exagerando: por alguns anos lecionei na Puc-Minas, na Fumec e na Unipac de Barbacena, nas faculdades de letras e comunicação.
Olha, em termos de alunos, vocês ainda são privilegiados... já pensaram na extensão da tragédia?
De qualquer forma, gostei de ler o texto... só achei o autor muito otimista...
(Enviado por: mgontijocanedo@yahoo.com.br)

Orlando Tambosi disse...

Salve, Paulo,

obrigado - parece que o artiguete agradou muita gente boa. Ainda preciso pegar de jeito o "mateialismo dialético", ainda aceito por aí.

Quanto a Maria do Carmo, ela tem razão: a era Lula é apenas o desfecho de um longo processo (deveria ter deixado isto mais claro no texto). Mas, no governo passado, por exemplo, ninguém carimbava outro de direitista por defender a democracia. Isto é "originalidade" do atual governo.

Maria, quer dizer que a coisa é ainda pior do que eu pinto??? Como diz um amigo, sempre acabo dando alguma dignidade ao que não tem....

Abs.

Maria do Espírito Santo disse...

Orlando, caríssimo,
eu nao sou Do carmo (marinheira, só...) eu sou é Do Espírito Santo, embora nascida nas Minas Gerais.
De fato, você parece tender a dignificar elementos representativos da "banalidade do mal", mas isto é bom: o materialismo "epilético" tem lá a sua dignidade patológica por ser um surto incompreensível, similar à epilepsia, que na Grécia arcaica era considerada a doença dos deuses. Os sujeitos contemporâneos vitimados por tal síndrome começam a entrar em raciocínios convulsivos e espumantes, estão em outra freqüência de onda, convivendo intimamente com a verdade revelada.
Quanto a questão do novo epíteto novidadesco atribuído aos que defendem a democracia,"direitista", você tem razão: é novo e insuportável. Eu conheço uma figura que por nunca conseguir acompanhar meus raciocínios adorava me chamar, em público e aos berros, de Maria Louca. Passei, então a chamá-lo, também em público e aos berros, de Fulano de Tal Medíocre, e a questão apelidal foi definitivamente resolvida. Pena que esta solução particular não possa ser aplicada no âmbito geral.
No mais, parabéns pelas suas idéias (gente que pensa hoje em dia merece aplauso e comemoração...). Foi um prazer te conhecer.