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quinta-feira, 27 de agosto de 2009

1316) Ipea: Instituto de Producao de Equivocos Ampliados

Esse deveria ser o verdadeiro nome do IPEA, pelo menos sob a gestão atual.
Este post precisa ser lido em conjunção com dois outros, para ser plenamente entendido, os quais vou indicar abaixo.

A supreendente debilidade mental que acomete o IPEA na medição da produtividade do setor público.

Em todo caso, o tema se refere à fantástica fábrica de bullshits continuados sob a forma de comunicados da presidência, ou seja, sob a responsabilidade direta de seu atual ocupante desqualificado para o cargo.
Ele primeiro tentou vender a balela de que o Estado brasileira estava subocupado, gastava pouco com pessoal e poderia, deveria contratar mais funcionários públicos, para se alinhar com vibrantes economias, com muito mais funcionários públicos do que o Brasil.
Passons.
A última, porém, foi estupenda: ele nos provou, como 2 e 2 são menos 4, que o Estado brasileiro é uma fantástica máquina de eficiência produtiva, e que quanto mais se contrata gente mais aumenta o índice de produtividade do setor público, que supera o do setor privado por uma cabeça.
Mais espetacular ainda é o crescimento da produtividade em Roraima, que aumentou nada menos do que 136,6%, em contraste com o baixíssimo desempenho, ou o crescimento negativo, de estados que fizeram ajustes e reformas públicas e reduziram o dispêndio com pessoal.
Quando eu li esse anúncio, achei tão fantástica a conclusão, que fui buscar os indigitados estudos e publiquei um primeiro post interrogativo, tendo também o cuidado de consultar alguns economistas a respeito.
Vocês podem ler o estado preliminar do debate neste post em outro blog meu:

Sexta-feira, Agosto 21, 2009
492) O suposto aumento da produtividade do setor publico: anúncio do IPEA e avaliação de economistas...

Depois, sabedor de outras críticas publicadas na imprensa, elaborei este outro post, neste mesmo blog, mais abaixo:

Quinta-feira, 27 de Agosto de 2009
1311) IPEA: surrealismo econômico em alta (again, and helàs...)
A fantástica fábrica de chocolate econômico do presidente do IPEA

Agora, acabo de tomar conhecimento de uma nota preparada por dois economistas especialistas em finanças públicas e em contas nacionais, que ao contrário do presidente do IPEA, sabem do que estão falando.
Não preciso acrescentar mais nada, apenas transcrevo a nota, que é self-explaining.
Termino por acrescentar que, se o presidente do IPEA tivesse vergonha na cara pediria demissão por incompetência, o que ele obviamente não vai fazer.
Também acrescento que em qualquer país sério, o ministro supervisor demitiria na hora um economista tão incompetente quanto esse, o que infelizmente também não vai acontecer.
Finalmente acrescento que, em qualquer país dotado de um Legislativo digno desse nome, o incompetente em questão seria na mesma hora chamado numa comissão permanente do Congresso e devidamente triturado intelectualmente. Isso tampouco vai acontecer.
Afinal de contas, a gente vive no Brasil...

Análise Crítica da Nota do IPEA sobre Produtividade do Governo x Setor Privado
Gabinete do Senador Tasso Jereissati - Assessoria Econômica
Nota Técnica – 26/08/2009

O IPEA divulgou o Comunicado da Presidência no 27, sob o título Produtividade na Administração Pública Brasileira: Trajetória Recente, em 19/08/2009.
O trabalho, em resumo, calcula a produtividade da administração pública pelo conceito valor agregado (extraído das contas nacionais elaboradas pelo IBGE) divido pelo número de pessoas ocupadas no mesmo setor (pela PNAD).

De acordo com esses cálculos, o texto conclui que:
I. ao longo do período de estabilidade monetária considerado, a produtividade na administração pública manteve-se superior à do setor privado, em média, acima de 35%;
II. a produtividade da administração pública entre 1995 e 2004 foi puxada pelo crescimento de 39,8% no Nordeste e de 49,3% no Centro-Oeste (nas outras regiões, o crescimento foi negativo); e
III. os estados da federação que terminaram focando nas medidas de ajuste da administração pública (como os chamados choque de gestão ou administrativo) não foram aqueles, por exemplo, que terminaram registrando a aceleração nos ganhos de produtividade.

Apesar da boa vontade do instituto em contribuir para o debate, todas as conclusões acima estão viciadas (para não dizer, erradas grosseiramente) porque o conceito de valor agregado das administrações públicas pela contabilidade das contas nacionais não permite que se calcule a produtividade das administrações públicas.
Este problema não deveria ser novidade. O manual das contas nacionais do IBGE, que segue a metodologia do system of national account de 1993 da ONU, deixa claro o problema aqui abordado. (Para mais detalhes sobre tal cálculo no Brasil, ver a Nota Metodológica n.11, “Administração Pública”, editada pelo IBGE sobre o Sistema de Contas Nacionais – Referência 2000).
O calculo do valor adicionado na metodologia das contas nacionais resulta do cálculo do valor da produção menos o valor gasto com a compra de insumos. Outra forma de dizer o mesmo é que o valor adicionado corresponde à remuneração líquida dos fatores de produção (pagamento de salários, juros, aluguel, lucro, etc.). Acontece que a forma de cálculo do valor adicionado do setor privado e das administrações públicas é diferente.
* * *
No caso do setor privado, pode-se mensurar de fato o valor das transações com bens e serviços finais e, em seguida, retirar os valores gastos com as compra de insumos (consumo intermediário) para se chegar ao valor adicionado. Por exemplo, o IBGE sabe quanto as empresas compram de insumos, o valor final da produção a preços de mercado. Assim, o valor adicionado pode ser efetivamente calculado (apenas para tornar a análise mais simples, vamos desconsiderar impostos e subsídios):
Valor Adicionado (VA) = valor da produção final dos bens e serviços – consumo intermediário – consumo do capital fixo = salários + superávit operacional liquido (dividendos, aluguel, etc.).
Dito isso o que acontece se vários empresários decidirem contratar 10 mil trabalhadores para que esses trabalhadores fiquem em casa sem trabalhar? Nesse caso, como os trabalhadores não iriam trabalhar, a produção não aumentaria e logo a produtividade dos trabalhadores do setor privado, medida pelo valor adicionado dividido pelo numero de trabalhadores, iria diminuir. No caso do setor público, como explicaremos em seguida, esse mesmo exemplo leva a um resultado diferente.
Ao contrário do setor privado, como não é possível que seja medido o valor de mercado dos produtos da administração pública, como, por exemplo, os serviços de defesa ofertados pelo estado à nação, a produção de serviços não-mercantis das administrações públicas é calculada pelo somatório do consumo intermediário, remuneração dos empregados, outros impostos (líquidos de subsídios) sobre a produção e o consumo de capital fixo.
Em outras palavras, a produção do setor público é determinada pelos custos de produção:
consumo intermediário + consumo do capital fixo + pagamento de salários (ativos e inativos) -> valor da produção da administração pública ou de outra forma:
pagamento de salários (ativos e inativos) -> [valor da produção da administração púbica - consumo intermediário - consumo do capital fixo]
equivalente à:
pagamento de salários (ativos e inativos) -> valor adicionado

Sempre que a folha de salário aumenta no governo (e exatamente ao contrário do que ocorre nas empresas), o seu valor adicionado cresce independente de os trabalhadores estejam de fato trabalhando ou meramente dormindo, pois a produção do setor público e o valor adicionado são determinados pelos custos.
Para deixar mais claro esse ponto, imagine que o governo resolva aumentar os salários de todos os funcionários públicos e, no extremo, mande vários desses trabalhadores para casa para “dormir”. Por mais absurdo que pareça, pela metodologia de cálculo do valor adicionado das administrações públicas, a produtividade do setor público iria aumentar, pois o que importa é o valor da folha salarial e não se os trabalhadores estão trabalhando ou dormindo. Logo, é impossível e sem sentido medir a produtividade do setor público com base nos dados das contas nacionais como fez o Comunicado da
Presidência no 27 do IPEA.

Outros aspectos metodológicos acentuam ainda mais a crítica.
O caso mais pitoresco envolve os inativos da administração pública.
Pela metodologia das contas nacionais, o mesmo tratamento dispensado a folha salarial dos servidores ativos é dado ao gasto com inativos não cobertos por contribuição (denominado de “contribuições sociais imputadas” naquela contabilidade). Ou seja, quanto maior o déficit do regime próprio de previdência dos servidores, maior é o valor adicionado pelas administrações públicas e, assim, maior seria sua produtividade.
Fernando Montero comentou ainda a desatenção às muudanças no sistema de contas nacionais realizadas pelo IBGE há poucos anos:
“A nova metodologia das contas públicas no PIB implicou trocar uma hipótese de um consumo constante per capita do bem público por uma hipótese de produtividade constante por trabalho na oferta do bem público. É uma deficiência –produtividade constante- que se aceita nas contas nacionais para o tratamento de bens públicos que carecem de um deflator (i.e. carecem de um preço) e que não possuem um indicador
quantitativo próprio como educação (matrículas) e saúde públicas (internações).
No texto em questão, o IPEA compara o valor agregado do setor público no PIB com o emprego público extraído do PNAD. As variações mediriam mudanças de produtividade. Ora, se o VAPB medido pelo IBGE baseia-se no emprego público, qualquer alteração de valor agregado/PNAD refletirá uma discrepância na medição de emprego público (entre o IBGE e o IPEA) mais que variações de produtividade.”
* * *
Existem outros estudos que investigam a eficiência do setor público. É forçoso reconhecer que utilizam metodologia muito diversa, mas nenhum utiliza a mesma lógica do citado comunicado do IPEA e o Brasil também não aparece bem na foto. Vamos citar apenas três fontes.
Uma análise internacional recente é a de Antonio Afonso, Ludger Schuknecht e Vito Tanzi, sob título Public Sector Efficiency – Evidence for New EU Member Status and Emerging Markets, publicado pelo European Central Bank, como Working Paper Series n.581, de janeiro de 2006. Mesmo sem contar os países ricos, o Brasil aparece entre os mais mal avaliados.
Por exemplo, no caso do indicador de eficiência do setor público, entre 2001/2003 (ver Tabela 3, na página 31), o Brasil alcançou 0,69, ficou em penúltimo lugar num ranking de 24 países (superou apenas os 0,63 da Turquia) e muito distante da média de 1,09.
Dentre as avaliações nacionais, chama-se a atenção que o próprio IPEA já editou, dentre outros, um documento recente, dedicado a avaliar a eficiência do setor público e que atendia seu reconhecido padrão de qualidade técnica – caso do Boletim de Desenvolvimento Fiscal, n. 03, de dezembro de 2006, com cinco artigos sobre o tema, inclusive com abordagens e focos diferenciados.
Já sobre a comparação no desempenho dos governos estaduais, uma boa alternativa é o estudo apresentado no XII Prêmio do Tesouro Nacional de 2007, por Júlio Brunet, Ana Bertê e Clayton Borges, sob título “Estudo Comparativo das Despesas Públicas dos Estados Brasileiros: um índice de Qualidade do Gasto Público”. Aliás, qualidade do gasto é uma das áreas temáticas dessa iniciativa da STN e também podem ser encontrados outros trabalhos com o devido rigor técnico.
* * *
Em resumo, é impossível e sem sentido calcular produtividade das administrações públicas pelo dado do valor agregado das contas nacionais, pois esse valor é determinado pelos custos da administração pública, inclusive salários. O mesmo vale para questionar o ajuste fiscal de governos regionais, ainda mais quando chegam ao ponto de reduzir o valor real da folha ou até mesmo demitir funcionários – caso em que foram automaticamente tachados de menos produtivos e ineficientes porque diminuíram o valor que adicionam.
Nem é preciso estudar ou lecionar economia para concluir que esse raciocínio não faz o menor sentido. Não se trata de uma divergência de opinião, nem de leituras diferentes de uma evidência estatística, o que seria natural numa democracia e diante das diferentes visões da economia. Aqui, se trata de ignorar o mínimo significado de uma variável e tentar inferir dela algo que ela não informa. O que as contas nacionais brasileiras demonstram é o encarecimento relativo do bem público uma vez que, a preços correntes, o valor agregado da administração pública cresceu mais que o PIB.

Resta a questão de saber o que move dirigentes de instituição tão séria e respeitada, inclusive internacionalmente, a cometer equívocos tão grosseiros. Será que a intenção seria tentar justificar que se pode gastar cada vez, sem se preocupar com a receita, com as conseqüências para o futuro, desde que seja possível eleger sucessores e se perenizar no poder?
O Comunicado da Presidência no 27 do IPEA não observa o mínimo critério econômico, nem o bom senso mais elementar e trabalhos como esse podem prejudicar a reputação dessa instituição construída ao longo de mais de quatro décadas de atuação em pesquisas e análises econômicas.

Nota final PRA:
Como disse ao final de minha introdução, infelizmente não vai acontecer absolutamente nada. Creio que o incompetente presidente do IPEA vai enfiar a viola no saco e ficar calado. Mais fantástico ainda seria se ele tentasse justificar o injustificável.
A seguir...

2 comentários:

Glaucia disse...

É, esse aí não tem jeito, mesmo. Me pergunto que grupo de poder o mantém ali...

Paulo Roberto de Almeida disse...

Vejamos, que força humana -- no caso, sobrehumana -- seria capaz de manter na direção de órgão tão importante para o país -- ou pelo menos para o planejamento governamental -- uma pessoa tão néscia, tão despreparada, tao desonesta intelectualmente?
Mistério...
Só podem ser forças poderosas...
Eu apostaria num pequeno bando de trotsquistas, conhecidos por suas táticas entristas, ou então o todo poderoso PCdoB, um partideco surrealista que domina há décadas o movimento estudantil e abocanhou, sem que saibamos, nacos consideráveis do aparato estatal, que eles ainda chamam de burguês (mas que não pensam mais em destruir, do contrário não sobreviveriam...).
Ou então as "forças ocultas" que por ocultas nunca saberemos quais são...
Insondáveis são os caminhos da natureza e os desígnios dessas forças...