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sábado, 30 de janeiro de 2010

1885) Um debate sobre comércio, câmbio e a China...

Um leitor, E. Baldi, deste meu blog fez, a propósito de um post anterior,

1878) O debate sobre a "primarizacao" da economia ...:

este comentário-pergunta:
"PRA,
Caso possa responder, com base no texto apresentado, quais as limitações de um país vinculado ao atual esquema institucional do comércio mundial para mexer em seu câmbio? Pode-se desvalorizar à vontade, como faz a China? A pressão é unicamente política? Não há nada de direito internacional sobre isso?
Grato.
Ah, e tudo se resumiria ao câmbio? Não haveriam outras medidas tão ou mais importantes?"

Não disponho, sinceramente, de tempo para elaborar a respeito, mas diria simplesmente o seguinte"
1) Não existe NENHUMA vinculação "institucional" de qualquer país pertencence ao sistema multilateral de comércio com qualquer tipo de perfil exportador ou importador. Cada um faz o que quer ou o que pode, com base na sua dotação de recursos, suas competências intrínsecas, seu dinamismo competitivo e o tino produtivo de seus empresários, de acordo com algumas regras simples desse sistema de comércio -- cláusulas de nação-mais-favorecida, reciprocidade, tratamento nacional, não-discriminação, etc. -- e com a teoria e a prática do comércio internacional, cujas bases foram lançadas duas décadas atrás por Adam Smith e David Ricardo.
2) Todo e qualquer país pode fazer o que desejar com o seu câmbio, pois nem o FMI, nem a OMC tem mandato para determinar o valor da moeda ou o regime cambial desse país, que lhe cabe decidir soberanamente.
3) O GATT-OMC pode apenas exigir respeito às suas regras COMERCIAIS, que não alcançam o câmbio, todavia. Pode haver alguma acusação de "dumping" por razões cambiais, mas isso não se sustenta numa análise stricto sensu das disposições em vigor, pois o dumping é sempre uma prática microeconômica, ao passo que câmbio é uma disposição soberana de caráter macroeconômico.
4) Não existe nenhuma "maldição" em exportar produtos primários, pois EUA, Austrália, Canadá e outros países desenvolvidos também o fazem, mas o ideal, obviamente, é acrescentar valor aos produtos, e sempre introduzir tecnologia, via pesquisa de sementes, processos de extração mais elaborados e competitivos, etc. Ser dependente de um único produto primário -- como certos países com o petróleo -- representa, de todo modo, um perigo a ser evitado, sobretudo no caso do rentismo improdutivo que tende a se estabelecer nesses casos. Não por acaso vários desses países são petro-ditaduras, totalmente corruptas e ineficientes, mas o Brasil não corre mais esse risco com o pré-sal. O único risco é o uso político dos benefícios da exploração.
5) Sobre o caso da China, remeto ao post abaixo da correspondente do Estadão em Beijing, Cláudia Trevisan, que mantém um excelente blog no site do jornal.

A China e o câmbio
por Cláudia Trevisan
Seção: Economia, 09.11.09 - 07:51:31.

Por mais que o ministro Guido Mantega queira, a adoção do câmbio flutuante não faz parte dos planos de médio prazo da China, o que na noção de tempo do antigo Império do Meio pode significar muitos anos. O país é pressionado desde o início desta década por norte-americanos e europeus a valorizar sua moeda e adotar uma política cambial mais flexível e resiste bravamente.

A estabilidade do yuan e seu baixo valor em relação ao dólar são um dos principais ingredientes da receita de sucesso do modelo de desenvolvimento da China, que em 30 anos conseguiu sair de uma posição irrelevante no comércio internacional para o posto de segundo maior exportador do mundo _a liderança deverá ser obtida até 2010.

Como disse o Nobel de Economia Michel Spence em entrevista concedida a Fernando Dantas e publicada hoje no Estadão, “todos os países em desenvolvimento que tiveram alto crescimento, sustentado por um longo período, administraram suas moedas em alguma medida”. E nenhum deles seguiu a receita de maneira mais estrita que a China. Oficialmente, Pequim possui um câmbio “flutuante administrado”, mas na prática o modelo é muito mais “administrado” do que “flutuante” e está totalmente sujeito aos interesses econômicos do país.

Desde que a crise mundial começou a se insinuar, em meados do ano passado, a cotação da moeda chinesa se mantém inalterada em relação à norte-americana, na casa dos 6,80 yuans por US$ 1,00. Como o dólar se desvalorizou no mercado internacional, isso significa que o yuan também perdeu valor em termos reais em relação às demais moedas, incluindo o real brasileiro, o que ampliou ainda mais a competividade das exportações chinesas.

A maioria dos analistas acredita que o Banco do Povo da China deverá retomar a política de apreciação do yuan em algum momento do próximo ano, depois que as exportações se recuperarem um pouco em relação à profunda queda de 2009. Mas como tudo que diz respeito à moeda, o movimento será extremamente gradual e estará longe de qualquer coisa que lembre o câmbio flutuante. O banco UBS, por exemplo, prevê que no fim de 2010 a relação entre yuan/dólar está entre 6,50 e 6,40.

Depois de 11 anos de câmbio fixo, nos quais o yuan foi cotado em torno de 8,30 por US$ 1,00, a China anunciou no dia 21 de julho de 2005 a reforma de seu sistema cambial. A mudança previa a flutuação administrada do yuan em relação a uma cesta de moedas, dentro de uma banda fixada diariamente pelo Banco do Povo da China (o banco central local).

Desde o início, as autoridades de Pequim deixaram claro que o gradualismo daria o tom de sua reforma cambial. Em mais de quatro anos de reforma, o yuan ganhou cerca de 20% em relação ao dólar. Diante da persistente apreciação do real em relação ao dólar, o ministro Mantega defendeu que todos os países do G20 adotem o câmbio flutuante. Mas nada indica que os chineses tenham intenção de mudar sua estratégia agora.

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