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quinta-feira, 19 de abril de 2012

Acordos de Barra Comercio: Republica Solitaria do Brasil

Pois é, os companheiros se orgulhavam tanto, nos idos de 2003-2006, de terem implodido a Alca, e o presidente de então, uma sumidade em políticas comerciais, dizia que o Brasil não pretendia ficar "dependente" (sic três vezes) do comércio com os EUA, e que ele estava mesmo era afim de criar uma "nova geografia do comércio internacional" (uau!, que coisa hem?).
Seu ministro das relações exteriores também se rejubilava por ter implodido, conscientemente, a Alca, e quando veio a crise de 2008, que impactou fortemente o México afirmava com todo o contentamente dos muito inocentes que "ainda bem que o Brasil não tinha entrado na Alca" (sic, mais "n" vezes), pois imagina se  tivesse a "dependência que o México tinha do comércio bilateral americano" (sic, quantas vezes vocês quiserem), a crise nos impactaria muito mais fortemente.
Essa eu confesso que não entendi. Ou entendi: se trata mesmo de estupidez econômica ou de suprema desonestidade intelectual.
Bem, nunca achei que a Alca era uma maravilha, e certamente não seria: ela consolidaria o acesso brasileiro a alguns mercados dos EUA e dos DEMAIS 33 PAÍSES da região, para a maior parte dos nossos manufaturados, deixando de fora produtos agrícolas considerados sensíveis nos EUA. So what?
Ela seria, sobretudo para o Brasil, um acordo de atração de investimentos dos EUA em nosso parque produtivo industrial.
Mas os companheiros se apressaram em desmantelar essa possibilidade, para não ficarmos "dependentes" (vejam que coisa horrível) do comércio com os EUA. 
O presidente, e seu chanceler, e todos os demais conselheiros companheiros preferiam aumentar o comércio com a China, promovida a parceira estratégica, e a sumidade do presidente chegou até a propor acordo de livre comércio com a China (certamente era parte da "nova geografia"), e fazer comércio em "moedas locais" (por puro preconceito contra o dolar, claro...).
Pois, assim ficamos, e estamos muito bem com a não-dependência da China, como vocês sabem todos.
Fiquem pois com um artigo meio para o irônico...
Paulo Roberto de Almeida 



A falta que fazem os acordinhos
Carlos Alberto Sardenberg
O Globo, 19/04/2012

Logo no início do governo Lula, quando as negociações em torno da Associação de Livre Comércio das Américas, Alca, estavam enterradas, diversos governos da região começaram a se mover para negociar acordos bilaterais com os EUA. O Brasil não quis nem saber desses "acordinhos", como os qualificou o então chanceler Celso Amorim. Só nos interessava o entendimento global na Organização Mundial do Comércio (OMC).
Passados estes dez anos, o que temos? A rodada na OMC fracassou, como muitos desconfiavam. E proliferaram pelo mundo os acordos bilaterais. Aqui do nosso lado, dez países latino-americanos têm tratado de livre comércio com os EUA. O Brasil não tem nem o entendimento para evitar a bitributação - sendo um dos únicos países importantes que não fecharam esse arranjo com os Estados Unidos.
Será uma coincidência que o Brasil tenha perdido espaço nas vendas para o maior mercado consumidor do mundo?
Por ocasião do Fórum das Américas e da visita de Hillary Clinton ao Brasil, empresários brasileiros que participaram de reuniões paralelas queixaram-se justamente disso: o acesso mais fácil e pagando menos impostos obtidos pelas indústrias instaladas na América Central e do Sul. Fábricas brasileiras mudaram para o Caribe para de lá vender nos Estados Unidos.
Colômbia, Chile e Peru já têm acordos com os EUA. Integram também a Aliança do Pacífico, um bloco comercial diferente do Mercosul, este reunindo Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, pendente a entrada da Venezuela.
O Mercosul deveria ser como a União Europeia, uma área inteiramente aberta, de livre circulação de mercadorias e pessoas. Por isso, seus membros, como na Europa, não podem assinar acordos separadamente. Só o bloco pode.
Mas se lá funcionou, aqui é uma sucessão de fracassos. O governo argentino vem há tempos impondo restrições às importações brasileiras. Do principal sócio! Como esperar que tope negociar abertura comercial com os EUA ou Europa?
Quer dizer, até negocia, mas para nunca chegar a qualquer resultado. Por exemplo, o Mercosul é o bloco que há mais tempo conversa com a União Europeia. Países que começaram depois, como o Chile, já fecharam o negócio.
Muita gente por aqui diz que Chile, Colômbia e Peru têm parques industriais limitados e, por isso, mais facilidade para acertar acordos com países avançados. Estes teriam interesse especial na exportação de produtos industrializados, o que seria uma ameaça para as fábricas brasileiras, mais amplas do que nos vizinhos.
Mas a Coreia do Sul, que é mais industrializada, tem acordo com os EUA e com a União Europeia.
Na verdade, o governo Lula fez uma opção ideológica: sem conversa com os EUA e ponto final. Claro que certos acordos podem ser desfavoráveis - por isso a negociação precisa ser cuidadosa -, mas o ponto é outro: o governo brasileiro simplesmente não quis nem começar a conversa. Alca é tentativa de dominação dos EUA, e ponto final. Acordo com os EUA é entregar nosso mercado.
Vai daí, Lula saiu por aí tentando organizar os países do Sul, os pobres, contra o Norte. Muitos desses países manifestaram apoio a essa estratégia, até entraram em organizações como a Unasul, da turma da América do Sul.
Mas continuaram tocando sua vida. Considerem a Colômbia: tem 44 tratados de livre comércio, inclusive com o Mercosul! Idem para o Chile. Eles não são bobos, gostam de muitos "acordinhos".
O Brasil está com um Mercosul desmantelado e seus produtores enfrentando problemas mundo afora. No último dia 17, Delfim Netto, em artigo no jornal "Valor Econômico", mostrou um resultado específico e grave dessa diplomacia: dos 20 maiores produtores de café, o Brasil é o que paga as taxas mais altas de exportação. Na União Europeia, por exemplo, o café brasileiro paga 9%; Colômbia, México e Equador estão isentos.
No Japão, um dos principais destinos do café nacional, a taxa "brasileira" para o solúvel é de 8,8%. Dos concorrentes, de zero a 1,1%.
Hillary Clinton mencionou acordos de livre comércio, mas, como o governo Dilma segue na mesma linha de Lula, a secretária americana tratou do tema que mais a interessa no momento: levar brasileiros para gastar dinheiro nos EUA.
Quando os EUA apertaram as exigências de visto, para quase todo mundo, tinham dois objetivos: prevenir o terrorismo e impedir a entrada de trabalhadores ilegais. O Brasil caía nos dois quesitos. Os americanos suspeitavam de grupos islâmicos em Foz do Iguaçu, na tríplice fronteira, e milhares de brasileiros tentavam mesmo buscar emprego nos EUA.
O Brasil, mesmo não sofrendo qualquer ameaça desse tipo vinda dos EUA, apertou também a concessão de vistos para os americanos. Reciprocidade diplomática.
Agora, quando tem mais emprego aqui do que lá e quando a ameaça terrorista parece controlada, os EUA estão facilitando os vistos para brasileiros. E o governo brasileiro?

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