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domingo, 13 de maio de 2012

O "futuro" do Mercosul em debate (7) - comentarios Paulo Roberto de Almeida

Vamos aguentar mais um pouco, estamos na reta final (mas ela é longa...):



Ampliação geográfica do Mercosul  (SPG)

PRA: Não mais “small is beautiful”; agora a palavra de ordem é: “crescei e aparecei”. Sabemos que para enfrentar velhos e novos imperialistas – ninguém ainda falou dos chineses, não é mesmo? – cabe ser grande e forte, capaz de enfrentar o jogo duro do poder internacional, já que sabemos que o mundo se caracteriza por uma extraordinária concentração de poder econômico, político, tecnológico, militar e, mais importante, ideológico. Por isso o Mercosul deve crescer, a todo custo e sob quaisquer circunstâncias, mesmo em detrimento de sua institucionalidade básica e de suas normas e dispositivos internos relativos à união aduaneira e ao projeto de mercado comum.

SPG: Em um cenário internacional caracterizado pela ampliação de grandes blocos de países fortalecidos, a despeito da crise do euro, a capacidade do Mercosul de defender e de promover os interesses de seus Estados depende de seu fortalecimento econômico e político.

PRA: Creio que é uma opinião, que SPG pretende vender como um fato.

SPG: Do ponto de vista econômico e social, o fortalecimento do Mercosul  resultará do desenvolvimento produtivo de cada uma das quatro economias nacionais, de sua  integração física e comercial, da redução significativa das disparidades em cada uma das sociedades, de seu dinamismo tecnológico, da redução das vulnerabilidades externas de cada um de seus membros.

PRA: Eu tenderia a concordar com essa opinião, não fosse pelo fato de que seu proponente pretende que esse processo se dê pela ação corretiva dos Estados e governos, antes que pela dinâmica dos mercados. Acredito que burocratas governamentais são pouco suscetíveis de reduzirem assimetrias estruturais – o que está implícito no conceito de “disparidades” – e dispõem de pouco poder – a não ser o dos orçamentos – para dirigirem (é o que gostaria SPG) as iniciativas e investimentos dos investidores privados, que são, em todo e qualquer processo de integração econômica e de liberalização comercial, os principais agentes da globalização produtiva, o processo que vem, de fato, reduzindo assimetrias ao redor do mundo. Será que todas as multinacionais ocidentais que foram para a China, e que participam de seu intenso esforço exportador, obedeceram a algum plano quinquenal de Beijing? Ou decidiram elas mesmas investir no gigante asiático em função das vantagens ricardianas – vale dizer, das assimetrias estruturais, de emprego, infraestrutura, energia – que possuía aquele país, o que lhes garante, se supõe, alta taxa de retorno para seus investimentos? Qual das duas interpretações vale mais?

SPG: Do ponto de vista político, o fortalecimento do Mercosul como bloco depende de um lado de uma coordenação cada vez mais estreita de seus membros e, de outro lado, do número de Estados soberanos que o integram, Estados que, por esta razão, tem interesse em coordenar suas ações, como membros de um bloco, nas negociações e foros internacionais e diante de crises e iniciativas de terceiros Estados, em especial daqueles mais poderosos.

PRA: Perfeito como opinião. Cabe então uma explicação de por que, dois Estados soberanos, que defendem, desde 2003, políticas econômicas não neoliberais, como Brasil e Argentina, não conseguiram, ainda, coordenar suas políticas macroeconômicas, não coordenaram suas ações em foros multilaterais e continuam a manter conversas – a cada três meses praticamente – para reduzir barreiras comerciais criadas pelos hermanos en el bloco? Seria pela ação nefasta das multinacionais, pelo poder remanescente da ideologia neoliberal, por alguma pressão do FMI? Impossível! Já nos libertamos soberanamente de todos esses inimigos da integração há muito tempo. A única coisa nova no cenário regional é, justamente, a presença da China, em princípio aliada de nossos esforços e plenamente convencida da necessidade de medidas não ortodoxas de políticas, e de menos preocupação com inflação e equilíbrio fiscal. Qual seria a interpretação de SPG para esse mistério insolúvel da integração mercosuliana?

SPG: A ampliação geográfica do Mercosul significa a adesão de novos membros. Por causa de decisões que tomaram no passado, não podem, no momento atual, fazer parte do Mercosul Estados que assinaram acordos de livre comércio com outros Estados ou blocos, tais  como a União Europeia, e que, por esta razão, aplicam tarifa zero às importações provenientes daqueles Estados ou blocos e que, assim, não poderiam adotar e aplicar a Tarifa Externa Comum do Mercosul.

PRA: Ah, esses imperialistas europeus!: fazem de tudo para obstar a integração sul-americana! Curioso que a UE insiste para negociar com o bloco Mercosul, não com cada país individualmente, como, aliás, é lógico e necessário. Imaginem se uma união aduaneira em aperfeiçoamento, como o Mercosul, poderia permitir que seus membros saiam por aí negociando individualmente? Justo quando a TEC deve cobrir – quanto mesmo? – algo como 30% do comércio extrarregional e quando a coesão do bloco se aproxima do ideal, com todos esses programas anti-assimétricos financiados pelo Brasil. Mas, a interpretação de SPG é equivocada e não corresponde aos fatos, pois o que os vizinhos sul-americanos assinaram com os EUA e a UE foram meros acordos de livre comércio (com aspas e sem aspas), o que não obsta, absolutamente, a que eles assinem acordos preferenciais ou outros acordos de livre comércio (com aspas ou sem) com o bloco do Mercosul. Acordos de livre comércio não são excludentes, embora os de união aduaneira possam sê-lo. Se é verdade o que SPG opina, o Mercosul teria de convencer então os vizinhos sul-americanos que um acordo de união aduaneira com o Mercosul apresenta, para eles, maiores vantagens do que os meros acordos de livre comércio (com ou sem aspas) que eles mantêm ou pretendem ter com aqueles velhos imperialistas. Mas, suspeito – embora isso seja apenas uma opinião minha – que SPG está mesmo pensando em “flexibilizar” o ingresso dos vizinhos no Mercosul, ou seja, descartando as obrigações de uma união aduaneira. Não haveria, assim, nenhuma incompatibilidade no exercício.

SPG: A ampliação geográfica do Mercosul teve início com o processo de adesão da Venezuela. A participação integral da Venezuela no Mercosul é da maior importância política e econômica, dada a riqueza de recursos minerais e energéticos do país e de sua decisão de desenvolver industrialmente sua economia. Depende ela agora somente de decisão do Senado Paraguaio, já tendo sido aprovada pela Argentina, Brasil, Uruguai e Venezuela.

PRA: Não! SPG está equivocado, em várias frentes. O processo de ampliação geográfica do Mercosul teve início pelos acordos de associação de 1996 com o Chile e a Bolívia, embora este último país ainda pertencesse – e formalmente ainda pertença – à Comunidade Andina de Nações (mas não há nada que possa impedir, pelo menos no papel, que Dona Flor tenha dois maridos, se quisermos usar uma figura literária). Essa expansão prosseguiu pela associação do Peru, em 2003, e, teoricamente pelo menos, pela dos demais países da CAN no ano seguinte (embora se possa duvidar da eficácia e poder real de criação de comércio dos tênues acordos então firmados pelos dois blocos, sob os auspícios da Aladi, esse cartório de registros de atos notariais preferenciais). SPG também está equivocado quanto ao único requisito que falta à Venezuela para que o país andino – certamente rico em energia e outros recursos – ingresse no Mercosul, que em sua opinião depende apenas do parlamento paraguaio. Uma adesão plena da Venezuela ao Mercosul também dependeria – pelo menos se nos basearmos numa leitura correta do TA – de que esse país adote a TEC do Mercosul e incorpore todas as demais normas e regulamentos de política comercial do bloco, o que ela ainda não fez (e, aparentemente, não pretende fazer antes de alguma decisão paraguaia, quando ocorrer). Será que SPG é da opinião que a Venezuela deve entrar no Mercosul mesmo violando suas regras de base e sua arquitetura institucional? Nesse caso, minha interpretação, que se baseia em alguns fatos simples, seria a de que o Mercosul ficaria ainda mais fragilizado como bloco econômico, convertendo-se num mero foro político para exercícios da retórica de seus dirigentes (algo, digamos, que ele não está longe de ser).

SPG: Além da Venezuela, poderiam, em princípio, ingressar no Mercosul a Bolívia, o Equador, o Suriname e a Guiana. A possibilidade de Estados extra-regionais, isto é, situados fora da América do Sul,  ingressarem no Mercosul é reduzida.

PRA: Escusado dizer que SPG se escusa de dizer que ele não pretende obrigar todos esses Estados a aderirem à TEC do Mercosul e às suas demais regras comerciais. Interpreto, então, que SPG pretende, de fato, transformar o Mercosul em uma mera zona de livre comércio, o que contraria o TA e todos os demais compromissos firmados sob a égide do sistema multilateral de comércio. Seria, em consequência, necessário refazer todo o processo de apresentação do Mercosul à OMC, não sem antes reformar o TA, para retrocedê-lo ao status de zona de livre comércio (com aspas ou sem?) ou até de área preferencial, como é mais suscetível de ocorrer. Seria essa a proposta ou a opinião de SPG? Cabe, portanto, esclarecer essa questão relevante para o futuro do bloco, algo de que trata seu artigo, mas que ele se exime de examinar em toda transparência.

SPG: É de todo o interesse dos Estados do Mercosul criar as condições as mais favoráveis possíveis ao ingresso da Bolívia, do Equador, do Suriname e da Guiana como membros plenos no Mercosul e de fortalecer as relações com todos os demais países da América do Sul que, aliás, já são Estados associados, para que, no futuro, caso desejem ingressar no Mercosul, este ingresso seja mais fácil e eficaz, política e economicamente.

PRA: Interpreto essa proposta de SPG como um convite a que o Mercosul abandone seus requisitos de união aduaneira – seria ela neoliberal? – e decida incorporar novos membros ao arrepio das regras que valem para os quatro membros plenos atuais. Isso seria uma contravenção, de fato, aos princípios basilares do TA, ou seja, algo similar a normas constitucionais. Sabemos que a legalidade é algo muito relativo no Brasil e nos países da América Latina, de modo geral, mas conviria não violar tão claramente as regras sob as quais o Mercosul foi apresentado aos demais parceiros do Gatt-OMC. Ou seja, SPG pretende que o Mercosul interprete generosamente suas regras atuais para acomodar suas pretensões, de SPG, a ter todos sob o mesmo guarda-chuva (que seria, então, um instrumento extraordinariamente esfarrapado, mais do que já é, de fato, hoje). 

[CONTINUA...]

2 comentários:

Anônimo disse...

É uma vergonha como meia dúzia de políticos da extrema direita radical do Paraguai tenta impedir a integração do nosso continente sul americano. Interesses menores desses políticos do Congresso Paraguai está afetando toda a população venezuelana. Os venezuelanos elegeram Chaves e não podem pagar pelo regime implantado na Venezuela, o da reeleição. Se Chaves fosse um ditador seria expulso da OEA, da ONU e de organizações democráticas internacionais. Argentina, Brasil e Uruguai já aprovaram em seus Congressos, e o Paraguai faz chantagem para aprovar a Venezuela. O povo venezuelano é quem está sendo penalizado. Como sempre o Paraguai é a ovelha negra, o que tem a oferecer ao Mercosul, nada, nem saída para o mar eles tem.Na última cúpula das Américas, em Cartagena, Obama e Hillary Clinton, não fizeram nenhuma objeção quanto a participação da Venezuela nesta reunião, apenas barraram Cuba. Portanto a Venezuela é reconhecida pelos Estados Unidos como um país de eleições democráticas. É o que fez Lula indicando sua sua sucesso e o povo elegeu Dilma. Já o Paraguai que tem telhado de vidro quer dar uma de politicamente correto. Se não querem a Venezuela, pois que deixem o Mercosul, teremos muito mais a ganhar com a Venezuela com seus barris de petróleo e um dos mais ricos países da América Latina. O Mercosul sairá fortalecido com a Venezuela.

Paulo Roberto de Almeida disse...

O comentário desse Anônimo (que por respeito ao Paraguai nem deveria ser publicado), vai aqui postado como um pequeno exemplo do grau de imaturidade, deseducação (grosseria, para ser mais exato), mediocridade na argumentação, enfim, um retrato perfeito da deterioração da universidade brasileira, assim como da mediocridade do "debate" político neste país.
Considero cada uma das frases do Anônimo acima lamentável, de mau gosto, de falta de lógica e de falta de conhecimento, enfim, o contrário de tudo o que eu espero receber aqui.
Fica o aviso: foi postado desta vez, como anti-exemplo, mas não postarei mais grosserias desse tipo.
Paulo Roberto de Almeida