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quinta-feira, 29 de maio de 2014

Xavier Sala-i-Martin resenha o livro de Piketty sobre o perverso capital


Xavier Sala-i-Martin sobre Piketty

Um dos meus economistas preferidos, Xavier Sala-i-Martin, escreveu uma crítica contundente e detalhada sobre o best-seller do momento, “O Capital no Século XXI”, do francês Thomas Piketty. Vale uma conferida, principalmente por aqueles que desconfiam das estatísticas, por saberem que a maneira mais eficiente e insidiosa de construir um sofisma é através da leitura enviesada e parcial dos dados. Segue abaixo uma tradução livre da conclusão do autor:
Piketty escreveu um livro muito interessante, de grande impacto, que deve ser felicitado. Os dados apresentados são importantes e devem ser analisados pelos analistas econômicos. A leitura destes dados, no entanto, é frequentemente parcial e incorreta. Como um resumo, deixe-me colocar uma lista dos erros de interpretação de Piketty:
Primeiro, que a taxa de retorno sobre o capital é maior que a taxa de crescimento da economia, o famoso ‘r>g’, não implica a existência de algumas dinastias de pessoas abastadas que apropriam uma parte cada vez mais importante da riqueza. Esta taxa de retorno é compatível com e sem heranças (e, portanto, sem dinastias), ou com heranças que desaparecem após uma ou duas gerações. A desigualdade ‘r> g’ é uma medida da eficiência dinâmica da economia e não tem nada a ver com a distribuição da riqueza de um país, desde que é compatível com desigualdades crescentes, decrescentes ou constantes.
Segundo, a maior parte do aumento do capital durante a segunda metade do século XX é devido ao aumento do valor das habitações e não tem nada a ver com o relato de capitalistas que apropriam os meios de produção e exploram os trabalhadores.
Embora Piketty tenha claro para onde vai o futuro, infelizmente isso é baseado mais na sua ideologia e sua opinião que nos dados fornecidos por ele mesmo
Em terceiro lugar, as desigualdades de riqueza e renda nos países analisados diminuíram ao longo do último século. Só a partir de 1970 elas tiveram uma tendência ascendente. Apesar disso, Piketty argumenta que a tendência natural é de aumento, porque o período de redução das desigualdades é uma exceção histórica. Mas Piketty nunca demonstra essa afirmação. Há razões para pensar que a exceção é, na realidade, o período pós 1970, com a incorporação do ‘baby boom’ e de 4 bilhões de cidadãos asiáticos e europeus das ex-ditaduras comunistas no mercado de trabalho global, um fenômeno que certamente não voltará a acontecer.
Em quarto lugar, o aumento das desigualdades de renda desde 1980 é perfeitamente compatível com a mudança tecnológica, que aumentou as receitas de toda uma série de inovadores super ricos (Bill Gates, Steve Jobs, Mark Zuckerberg, Larry Page e Sergei Brinn). Piketty diz que esta teoria é “tautológica e arbitrária”. Sua tese é que, ”a partir de 1980, a sociedade passou a aceitar a remuneração estratosférica dos CEOs de empresas”. Mas, sem uma teoria para essa “aceitação social”, tal interpretação também é tautológica e arbitrária.
Em quinto lugar, a análise da fração da riqueza total, possuída pelos super-ricos da lista da Forbes, tem uma grande falha conceitual: as dinastias a que pertencem os super-ricos não são as mesmas no início do século XX, em 1987 ou em 2013.
E, finalmente, depois de escrever um livro sobre a evolução da desigualdade, Piketty falha em explicar por que as desigualdades são importantes. Ele expõe uma vaga teoria que diz que desigualdade gera instabilidade social. Mas, ao não formular uma teoria precisa, não sabemos se as desigualdades que importam são as desigualdades dentro dos países (que tem aumentado desde 1980), ou as globais (incluindo as desigualdades entre países, que decaíram desde 1970, graças a grande convergência dos países emergentes). As desigualdades globais experimentaram um declínio entre 1970 e 2012.
Depois de ler o livro de Piketty, tem-se a impressão de que a economia capitalista é um desastre que gera aumentos de desigualdade infinitos, especialmente durante as últimas quatro décadas. Mas se considerarmos a evolução da economia mundial, especialmente durante as últimas quatro décadas, percebemos que as taxas de pobreza no mundo foram reduzidas como nunca antes, as desigualdades globais são cada vez menores e os indicadores de educação, mortalidade, expectativa de vida, saúde, liberdade e democracia são melhores em quase todos os cantos do planeta. É verdade que as desigualdades dentro dos países têm crescido, embora depois de ler o livro “Capital no século XXI”, não possamos saber ao certo se esta é uma tendência que irá perpetuar-se ao longo do tempo ou simplesmente desaparecer. Embora Piketty tenha claro para onde vai o futuro, infelizmente isso é baseado mais na sua ideologia e sua opinião que nos dados fornecidos por ele mesmo.
Graças ao sistema capitalista, Thomas Piketty vai ganhar muito dinheiro com as vendas do seu agora famoso livro. Uma parte importante irá para o governo francês, que ele ajudou a chegar ao poder no ano passado. O resto ele pode gastar como quiser: fazendo festas, comprando livros, guardando para sua aposentadoria… ou mesmo fazendo algo tão nojento como deixar em herança para seus filhos. Liberdade para escolher, Thomas, eis a beleza do capitalismo no século XXI!
Fonte: Instituto Liberal




SOBRE JOÃO LUIZ MAUAD


João Luiz Mauad

Administrador de empresas formado pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas (EBAP/FGV-RJ), João Luiz Mauad é articulista dos jornais “O Globo” e “Diário do Comércio”. Escreve regularmente para os sites “Midia@Mais” e “Ordem Livre”.

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