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domingo, 26 de julho de 2015

Celso Furtado: uma critica ao seu pensamento, 2 - Marcos HenriqueMartins Campos

A partir de um documentário encomiástico, este engenheiro desmonta os imensos equívocos conceituais daquele que ainda é considerado um dos grandes economistas do Brasil.
Vale por três aulas de economia. 
Paulo Roberto de Almeida

Para ver o documentário, "Pensando com Celso Furtado", que é criticado aqui, clique neste link: https://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=oAC7MT3nKgU

Crítica ao documentário “Pensando com Celso Furtado” (II)

Por Instituto LiberalEm 
celso-furtado3(para conferir a primeira parte, clique aqui)
por MARCOS HENRIQUE  MARTINS CAMPOS*
Trecho 2 – “A pobreza tem origem no controle do excedente social, por elites aculturadas, que sempre quiseramimitar o modelo de vida das economias centrais. Ou seja, para Furtado a pobreza é fruto da má distribuição da riqueza, e enfrentá-la seria, portanto, combater os privilégios que fazem com que aconcentração de renda seja uma condição estrutural do padrão deacumulação das elites.”
Comentário – A categorização das “elites” como “aculturadas”, não passa, a meu ver, da exteriorização mal disfarçada de uma sórdida intenção de depreciar a reputação deste grupo de pessoas, estratégia a qual ele leva a cabo se utilizando da rotulação pejorativa, difamatória, desdenhosa e desnecessariamente  insultuosa de toda uma classe de indivíduos.
Ademais, qual “cultura” em específico ele acusa a “elite” de malfadadamente copiar? Seria a cultura da busca constante por melhores condições de vida? E qual “modelo de vida” ele acusa a “elite” brasileira de imitar? Um “modelo de vida” mais próspero que o brasileiro? E por qual motivo a busca constante pela elevação das condições do “modelo de vida”, atualmente em vigência no Brasil, não seria legítima, louvável, e não deveria ser até mesmo estimulada? A meu ver, a busca pela melhoria das condições de vida é uma necessidade básica, intrínseca à própria natureza humana, e jamais um homem deveria ser criticado por sua ambição neste sentido. Quem nega sua legitimidade e a sua relevância, como impulso para a evolução e a prosperidade do Homem como espécie, nega sua própria natureza humana, e não é nem mesmo digno de desfrutar de todas as conquistas da humanidade.
Furtado embasa suas teses em um discurso genuinamente marxista. Em nenhum momento o termo “capitalismo” é citado, mas esta é a estratégia mesma que garante a aceitação, e o sucesso do discurso. Esta estratégia visa à conquista do consenso unânime, já que os “letrados” marxistas reconhecerão automaticamente sua fala, e lhe acenarão consentimento e apoio, e a fração das pessoas que não (re)conhece a estratégia é convencida por adesão automática às suas falas revisionistas, “politicamente corretas”, e auto-declaradas como excepcionalmente virtuosas, acreditando estar diante da mais pura demonstração de boas intenções. Este discurso adota como tese essencial (e mais uma vez, como pressuposto universalmente aceito) o argumento de que o único resultado possível, uma vez instituído um sistema capitalista, é a desproporcional concentração de capital nas mãos dos “capitalistas exploradores”.
Bem, é óbvio que a pobreza é resultado da má distribuição da riqueza. Mas Furtado atribui uma pobreza que é histórica e inextricável a um único suposto “culpado”, e falsifica os resultados das atividades das tais “elites”. As elites (a qual eu compreendo que ele esteja se referindo ao empresariado/burguesia) têm por objetivo primordial a obtenção de lucros, neste ponto ele tem total razão. Entretanto, ele despreza e omite propositadamente o fato de que a atividade empresarial, seja ela comercial, industrial, ou qualquer outra, não tem como resultado exclusivo a geração de lucro para a “elite”: a atividade empresarial gera “efeitos colaterais”, em forma de tributos pagos ao governo (capital que entra na economia); gera renda, em forma de salários, para todos os funcionários da cadeia produtiva, tanto dos empregados diretos no negócio, quanto dos seus fornecedores (renda esta que entra na economia); e omite ainda que mesmo o lucro gerado para o dono do negócio entra na economia, seja em forma de capital reinvestido para ampliação do próprio negócio (que vai gerar mais renda na forma de mais salários e mais impostos), seja investido em quaisquer outros negócios ou setores – imobiliário, financeiro, títulos do governo, etc. Assim sendo, esta “concentração” ou “acumulação” não é uma acumulação real, já que o capital gerado não fica parado nas mãos da “elite”. Os empresários do mundo real não são como o Tio Patinhas, que guarda todo o seu dinheiro em um cofre, descapitalizando dia após dia. Pode-se notar que as atividades da “elite” criam, ou desenvolvem o capital, a partir da alocação de recursos financiados com capital previamente adquirido, e este novo capital gerado entra na economia, de uma forma ou de outra, e acaba beneficiando toda a sociedade.


Furtado adota a visão da economia como sendo um jogo de “soma zero”, no qual se compreende que, para que algumas pessoas acumulem riqueza, outras necessariamente precisam perder riqueza (ou deixar de ganhá-la) na mesma proporção. Esta ideia é completamente incorreta! A atividade industrial, assim como a de serviços, agrega valor aos recursos previamente alocados – a indústria agrega valor às matérias primas, no momento em que estas são beneficiadas, nos insumos utilizados, e à mão de obra empregada; assim como tudo o que se recebe por um serviço, além dos custos dos recursos gastos pelo prestador, é capital desenvolvido. Se a economia fosse um jogo de soma zero, não haveria crescimento econômico mundial, haveria estagnação, com os países alternando, a cada ciclo, apenas a parcela do mercado – ou do capital pré-existente – que cada um deteria.
O funcionamento do mercado sem intervenções estatais parasitárias é de vital importância, pois apenas um mercado livre e saudável é capaz de gerar riquezas e distribuí-las adequadamente por todas as camadas da pirâmide social. A mera distribuição de renda, por meio de assistencialismo, apenas “tapa o sol com a peneira”, e só é sustentável no curto prazo. O excesso de tributação, indispensável para a implantação e manutenção de programas assistencialistas, cria distorções no mercado, tais quais inflação (devido ao aumento dos custos de produção dos produtores), e redução da demanda (devido ao aumento do comprometimento da renda da população com tais tributos), e só prejudica a economia – e consequentemente às pessoas – no longo prazo.
Sobre os supostos privilégios alegados, quais privilégios são estes? Quem realmente concede privilégios é o estado, por meio de isenções de impostos, financiamentos “camaradas” para empresas “selecionadas”, por meio de bancos estatais, concessões de licitações fraudulentas, etc; além de ser o próprio estado uma entidade privilegiada, visto que é notória sua participação desleal no mercado, através das empresas estatais, que tem por hábito até operar no vermelho, à custa do dinheiro dos contribuintes, para manter as “aparências” fiscais. Estado este, que Furtado parece julgar ser possuidor de idoneidade moral de tal maneira elevada a ponto de ser o mais indicado, e legítimo mediador entre o “terrível mercado” e o “oprimido consumidor”.
Furtado, mais uma vez, parece desprezar fatos imprescindíveis. O mercado é um território onde ocorrem trocas em comum acordo entre as partes envolvidas, ou seja, entre os que oferecem produtos e/ou serviços, e o consumidor, que é soberano em suas escolhas. Os privilegiados neste território de livre oferta, e soberania de escolhas, é o ofertante que conquista mais consumidores. O mercado não concede “privilégios”, mas sim premia os que atendem às suas necessidades de forma mais satisfatória, em relação a diversos critérios, tais quais o preço, qualidade do produto/serviço ofertado, condições de pagamento, etc, critérios estes que são constantemente avaliados pelas pessoas. O consumidor é soberano em suas escolhas, e são as suas decisões que determinam quem se mantém e quem sai do mercado (toda esta tese também é valida para as relações de troca e negociações entre nações, e serve para complementar o meu comentário do primeiro trecho, sobre os outros países que supostamente se encontram na “periferia do capitalismo”).
Furtado sugere “combater privilégios”. Neste caso, ele sugere então combater a soberania do consumidor, despojando este da sua liberdade de escolhas, evitando desta forma que ele, por meio de sua ação livre e soberana, como integrante ativo do mercado que é, conceda tais “privilégios” alegadamente “imorais” aos que bem lhe atendam? O bom produto ou serviço ofertado aos consumidores não deve ser valorizado, e seu ofertador recompensado?
Trecho 3 – “A herança do pensamento de John Keynes e a experiência da guerra, mostraram para Furtado que o estado pode ser um ator decisivo na história.” e “A reconstrução dos países devastados pelo confronto bélico, e o keynesianismo, alimentaram nele a esperança de que o estado pode ser o propulsor de grandes transformações na sociedade, e pode monitorá-las ao longo do tempo.”.
Comentário – Neste ponto, é exaltada a influência de Keynes para a formação do pensamento de Furtado. Acontece que os marxistas, ao longo do último século, se apropriaram indevidamente das ideias de Keynes, por um motivo bastante óbvio: a atribuição de maiores responsabilidades das regulamentações econômicas ao estado, defendida por Keynes, serve como uma luva aos ideais progressistas e socialistas. Apesar de Keynes ter se declarado antimarxista, de ter rejeitado e se oposto obstinadamente à ideologia socialista, e ter (alegadamente) dirigido todos os seus esforços para o aperfeiçoamento do sistema capitalista, é quase praxe nos dias de hoje, entre os marxistas e demais progressistas, que se associe o keynesianismo ao socialismo (frequentemente camuflado como capitalismo de estado, ou social democracia), visto que a linha de pensamento de Keynes é muito mais “robusta” e “sustentável” (teórica, prática, retórica e dialeticamente) que qualquer linha econômica marxista clássica. O próprio Keynes percebeu tendências nesta direção, e previu a que ponto chegaria tal apropriação indevida, a ponto de afirmar “Meu nome é Keynes, mas não sou keynesiano”, em alusão ao modelo no qual forçosa e artificiosamente tentavam encaixar sua corrente de pensamento. Infelizmente este “encaixe” se deu por completo, e hoje o legado de Keynes está posto à serviço da esquerda mundial, e Furtado apenas encobre e mascara sua retórica puramente marxista com um cientificismo keynesiano falsificado e esvaziado do significado que o próprio Keynes dava à sua obra. Seu objetivo é usurpar o legado, e gozar do prestígio do keynesianismo, de modo a legitimar o empoderamento progressivo do estado, rumo ao “absolutismo democrático”, cenário este cuja antevisão do clímax é o que orienta e impulsiona as esquerdas.
A visão de Furtado, do estado como “ator decisivo na história”, ou como se convencionou dizer, “agente histórico”, é outra visão essencialmente marxista. Esta visão só pode ser aceita por quem comunga dos preceitos coletivistas da ideologia marxista. Um dos princípios fundamentais da ortodoxia marxista é a progressiva amputação das consciências individuais, até a sua derradeira absorção total pela “consciência coletiva” comunista.
Marx pregava que os integrantes do proletariado deveriam se tornar o agente histórico responsável pela condução da sociedade na qual estavam inseridos, de modo a atingirem seus objetivos de classe. Mas ele compreendia perfeitamente que uma “classe” (e muito menos os indivíduos independentes) não preenchia os pré-requisitos essenciais que habilitam uma entidade a conduzir um processo capaz de realizar tamanho feito. Para tal tarefa, ele estabeleceu a importância e a necessidade de se criar um estado forte. Mais tarde, os líderes comunistas perceberam que só seria possível criar um estado forte, e se manter no poder deste continuadamente, se obtivessem êxito em criar um partido forte. Na concepção marxista, o partido deve passar a “ser” o próprio estado. E porque a criação de um estado forte, com o poder dominado por integrantes de um partido hegemônico? Porque apenas uma entidade capaz de prosseguir com a execução de determinados planos – que visam objetivos futuros – para além da duração do prazo de vida dos seus agentes individuais é capaz de se tornar um agente histórico verdadeiramente relevante.
A conquista da hegemonia do pensamento é extremamente importante para o partido, pois o fortalece – e é neste ponto que se faz importante o “nivelamento” das consciências conforme um senso comum universalmente aceito, baseado na ideologia de classe. A hegemonia do domínio sobre as consciências consequentemente garante uma “produção” continuada de agentes individuais (políticos, militantes e eleitores) alinhados com o objetivo de longo prazo, e garante o poder continuado que é tão imprescindível à causa de, como diz Furtado, “ser um ator decisivo na história”. Assim sendo, o importante, segundo a ideologia marxista, não é o estado, mas o partido, ou uma mescla ininteligível e indivisível dos dois.
Note outro detalhe: é de importância primordial para as esquerdas a garantia da sua continuidade no comando da máquina do estado, uma vez que, alternado o grupo dominante, todo o “trabalho” em direção aos objetivos da classe se perde. E é por esse motivo que as esquerdas são tão inclinadas aos totalitarismos. Os progressistas acreditam piamente serem possuidores do dever, e mesmo da autoridade moral de, como diz Furtado, “transformar a  sociedade”. Compreendida a importância da necessidade da manutenção do domínio sobre o poder ao longo do tempo, já que apenas um estado comandado por um único grupo (ou por vários grupos ideologicamente alinhados), de maneira continuada, por longo período pode efetivamente ser um agente histórico relevante, transparece claramente na ideia de Furtado a sua inegável vocação marxista, quando ele afirma que o “estado deve ser o ator decisivo na história”, e o “propulsor de transformações”.
Conclusão:
O que todos os entrevistados do documentário disseram foram apenas compactuações para com o pensamento de Celso Furtado. A única conclusão a que posso chegar (e aà qual já cheguei há tempos, e recorrentemente fortaleço minha convicção) é a de que os intelectuais progressistas são sofistas ardilosamente treinados, experientes, e agem em um território que lhes é imensamente favorável. Tudo o que afirmam é automaticamente reconhecido como princípio básico, como senso comum. Por este motivo, todas as pessoas envolvidas de alguma maneira na defesa dos ideais liberais e conservadores, devem se dedicar a aprender a “ler nas entrelinhas” tudo o que estes intelectuais produzem, de forma a serem capazes de combatê-los ostensiva e eficazmente, trazendo à luz as suas contradições, assim como as perversas e covardes intenções ocultas em cada sentença aparentemente inofensiva.
A esquerda é um mutante, que mantém firmes seus objetivos revolucionários, sempre bem fixados além do horizonte visível, mas que frequentemente têm trocado, segundo definição do próprio Marx, o “vestido de ideias” da ideologia, que serve para encobrir seus reais interesses, seus reais desejos, e seus reais objetivos, os quais prudentemente todos os seus adeptos se dedicam a ocultar e dissimular sob pretextos alegadamente (e obviamente, falsificadamente) holísticos.
O pragmatismo é um traço típico e fundamental desta estratégia. O oponente intelectual de hoje, é o “mestre” reverenciado de amanhã (e esta alternância se repete indisciplinada e infinitamente). A mentira e a dissimulação cínica e histérica são fundamentais à estratégia: os progressistas alegadamente possuem a solução para todos os problemas, e todas as mazelas do mundo se devem ao fato de “outros”, e não eles próprios, estarem no poder (e mesmo quando eles dominam o poder, sempre são capazes de criar artifícios dialéticos, e culpar um “bode expiatório”). A conquista do poder, por quaisquer meios que sejam, é seu objetivo principal. Suas ações são inconsequentes, determinadas conforme as demandas do dia, na busca cega pelo poder, tendo como alvo fixo a distante e inalcançável utopia.
*Marcos Henrique Martins Campos é estudioso e defensor incansável do liberalismo econômico e do conservadorismo cultural, Acadêmico de engenharia, técnico químico e gerente de produção em uma grande indústria nacional.

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