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sábado, 25 de setembro de 2021

“I Have Eliminated 'the West’ from My Vocabulary” - Christoph Heusgen, Merkel's Foreign Policy Advisor (Der Spiegel)


 
French President Emmanuel Macron, German Chancellor Merkel and foreign policy adviser Christoph Heusgen in 2017 during a flight from Triest to Paris.

Foto: Energistyrelsen / Bundesregierung / Guido Bergmann / action press

Interview with Merkel’s Former Foreign Policy Adviser “I Have Eliminated 'the West’ from My Vocabulary”

Christoph Heusgen served for 12 years as Angela Merkel’s top foreign policy adviser. In an interview, he speaks about the chancellor’s successes, mistakes, the amateurish nature of Donald Trump’s government and the right approach to an ascendant China.
Interview Conducted by Christiane Hoffmann und Christoph Schult


segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

O legado de uma estadista - Editorial do jornal O Estado de S. Paulo sobre Angela Merkel (01/02/2021)

 O LEGADO DE UMA ESTADISTA!

Editorial - O Estado de S. Paulo, 01/02/2021 

“Nada de experimentos.” Com este lema, Konrad Adenauer, o primeiro chanceler da Alemanha ocidental pós 2.ª Guerra e principal artífice de sua reconstrução, conseguiu sua vitória eleitoral mais robusta em 1957. Este anseio por estabilidade se fez sentir de novo agora, quando o seu partido, a União Democrata Cristã (CDU), que governou a Alemanha por 50 dos últimos 70 anos, elegeu como seu líder Armin Laschet, o candidato mais alinhado à chanceler Angela Merkel. A era Merkel está no fim, mas o espírito de sua administração segue forte como nunca.

Desde que assumiram o comando em 2005, Merkel e o CDU consolidaram a posição da Alemanha como a principal economia da Europa, com finanças públicas sólidas e baixas taxas de desemprego. Primeira chanceler mulher da Alemanha, ela é a líder mais longeva da União Europeia (UE), foi frequentemente descrita como a sua líder de facto e também como a mulher mais poderosa do mundo e, após a eleição de Donald Trump, a “líder do mundo livre”.

O prestígio não foi conquistado em águas calmas. Ela enfrentou o colapso financeiro de 2008, a crise dos refugiados, o Brexit e agora a pandemia, mas, em contraste com seus pares – pense-se, por exemplo, nos destinos de Gordon Brown, David Cameron e Theresa May, no Reino Unido, ou Nicolas Sarkozy, François Hollande e Emmanuel Macron, na França –, a cada provação ela emergiu mais forte.

Na política externa, ela enfatizou a necessidade de cooperação internacional, fortalecendo os laços com a UE e a Otan. Na crise da dívida europeia, arriscou o dinheiro alemão, mas manteve a estabilidade do euro. Merkel liderou a UE nas sanções à Rússia após a anexação da Ucrânia e na crise dos refugiados se posicionou firmemente, quase sozinha, em nome dos valores europeus, recebendo mais de 1 milhão de exilados.

Em um perfil de Merkel, a revista The Economist delineou três marcas de sua gestão: ética, não ideológica; reativa, não programática; e desapegada, não engajada. “Sua fé luterana (‘uma bússola interior’) se expressa em seu estilo discreto e seus instintos: a dívida é ruim; ajudar os necessitados é bom.” Como disse seu colega do CDU Jens Spahn, “ela trabalha como uma cientista: lê muito, pondera os fatos e não tem preconceitos”. Merkel sempre mantém as opções abertas e evita polarizar os debates. “Sou um pouco liberal, um pouco social-cristã, um pouco conservadora”, definiu-se ela. Para a revista Der Spiegel, ela é inescrutável como as “esfinges, divas e rainhas”.

Com essas qualidades pessoais, ela transformou a aliança da CDU com a União Social Cristã (CSU) numa máquina eleitoral, conduziu a coalizão com os social-democratas e, a um tempo, ganhou a confiança dos conservadores e promoveu políticas caras ao progressismo liberal, como a abolição do serviço militar compulsório, o fechamento das usinas nucleares, o casamento gay e a assistência aos desfavorecidos.

A vitória de Laschet sobre Friedrich Merz mostra que o CDU optou por manter a orientação ao centro ao invés de uma guinada incerta à direita. As pesquisas de opinião estão massivamente a seu favor. Mas ele terá de manter a unidade e a integridade de seu partido, após flertes temerários nas coalizões regionais tanto com a extrema direita quanto com a extrema esquerda, e possivelmente precisará costurar uma aliança com os verdes, em ascensão, enquanto seus aliados tradicionais na centro-esquerda, os social-democratas, sofrem contínuo desgaste. Laschet é mais simpático aos verdes do que Merz, mas, por causa das suas relações com a indústria do carvão, não está tão perto daquele partido para disputar as eleições de setembro.

Com a saída de Merkel, as democracias liberais perderão uma protagonista decisiva no teatro global. Em tempos de ascensão do populismo, sua trajetória à frente de seu partido e de seu país são um exemplo de estabilidade, pragmatismo e decência. Laschet herda esse rico legado. Mas ainda terá de se mostrar capaz de colher seus frutos.

sexta-feira, 4 de setembro de 2020

Merkel: a grande estadista europeia e mundial - Ishaan Tharoor, Ruby Mellen (WP)

The Washington Post
Today's WorldView

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

A morte silenciosa do acordo Mercosul- UE (Deutsche Welle)

A morte silenciosa do acordo UE-Mercosul



Merkel pôs em xeque o pacto comercial devido às queimadas na Amazônia. Ao ignorarem o alerta, governos sul-americanos deixam claro seu desinteresse na implementação do tratado. Também na Europa o silêncio predominou.

Faz exatamente um ano desde que o presidente francês, Emmanuel Macron, atacou o Brasil pela primeira vez por causa dos incêndios na Amazônia, durante a cúpula do G7 na França. A chanceler federal alemã, Angela Merkel, disse agora que tem dúvidassobre se o acordo comercial da União Europeia (UE) com o Mercosul ainda pode ser implementado. O motivo são as queimadas na região amazônica.
As "sérias dúvidas" de Merkel se encaixam na corrente de muitos outros críticos que há um ano vêm exigindo cada vez mais veementemente que o governo brasileiro tome medidas contra o desmatamento. Primeiro foram as organizações ambientais, depois os embaixadores da Noruega e da Alemanha e, finalmente, agora fundos, bancos e empresas que pediram ao governo de Jair Bolsonaro que tome uma atitude.
Mas as reações do governo até hoje são as mesmas: afirma que faz o suficiente para proteger a Amazônia; responde que a Europa e os Estados Unidos já desmataram tudo o que tinham; quer oferecer parques nacionais a empresas privadas estrangeiras, para que elas possam proteger o meio ambiente. Afinal, o que o mundo estaria disposto a pagar pela proteção da floresta tropical?
Os militares, segundo o governo, protegerão a floresta de maneira mais eficaz do que as autoridades responsáveis. É preciso poder garantir aos pobres, como os indígenas da Amazônia, uma vida digna, algo que só seria possível com empresas e através de atividades econômicas. Assim soam os argumentos dos ministros quando comentam o tema.

quinta-feira, 4 de julho de 2019

Controversias de cupula no meio ambiente: Bolsonaro rejeita interferencia de Merkel e Macron

Bolsonaro diz que Merkel e Macron não têm autoridade para discutir questão ambiental

Da IstoÉ, 4/07/2019
Marcos Corrêa/PR
O presidente Jair Bolsonaro voltou a criticar a pressão dos governos francês e alemão sobre a política ambiental brasileira na manhã desta quinta-feira, 4, durante café da manhã com deputados da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). “Em Osaka, no G-20, convidei Emmanuel Macron e Angela Merkel para sobrevoar a Amazônia. Se eles encontrarem um km² de desmatamento entre Boa Vista e Manaus concordaria com eles na questão ambiental. Sobrevoei a Europa, já por duas vezes, e não encontrei um km² de floresta. Diante disso, Merkel e Macron não têm autoridade para discutir questão ambiental com Brasil”, disse o presidente, sendo aplaudido pela bancada ruralista presente no encontro.
Ao falar sobre a ausência de autoridades dos países europeus na questão ambiental, o presidente citou que a Alemanha não vai cumprir o acordo de Paris no tocante à energia fóssil e garantiu que o Brasil tem “quase tudo para cumprir o Acordo”. “Faremos o que for possível”, prometeu.
Bolsonaro disse que a maneira do Brasil se portar durante o mundo mudou. “Durante décadas, com conivência de chefes de Estado, tivemos um péssimo conceito ambiental no exterior. Agora, isso não vai continuar”, defendeu, citando que os chefes de Estado da Alemanha e da França “achavam” que estavam tratando com governos anteriores em Osaka.
“Esses chefes de Estado, achavam que iam chegar no Brasil demarcando dezenas de áreas indígenas, quilombolas e de proteção após a reunião. Macron, por exemplo, queria que anunciasse junto com Raoni (Metuktire, líder indígena) decisões para questões ambiental. Dei um rotundo não ao Macron sobre reunião com Raoni”, relatou o presidente.

terça-feira, 24 de abril de 2018

Macron's rise, Merkel's decline - Der Spiegel

Este editorial da principal revista alemã, informativa e de opinião, é cruel com a sua chefe de governo. De fato, Macron parece caminhar sobre as águas, ao passo que Merkel estacionou no pântano da política doméstica.
Sic transit...
Paulo Roberto de Almeida

Sidelined: A Shrinking International Role for Angela Merkel and Germany

Emmanuel Macron's En Marche party doesn't yet have a single seat in the European Parliament, but when the French president appeared in the body's plenary hall in Strasbourg last Tuesday, it already seemed as though he was in control. Macron shook hands with Federica Mogherini, the European Union's chief diplomat, and Jean-Claude Juncker, the enthusiastic European Commission president while a number of parliamentarians gave him a standing ovation. Others, meanwhile, hid behind signs castigating the French president for participating in the missile attacks in Syria. Macron stepped up to the lectern, where his speech, laid there by an aide, was already waiting.
Macron seemed to breathe new life and courage into the Continent after Brexit and the string of strong right-wing populist election showings. And in his Tuesday speech, he left no doubt about what is at stake. "Fascination with illiberalism is growing by the day," he warned. "The answer must not be authoritarian democracy but the authority of democracy."
Macron's focus was astonishing in its breadth as he cited philosopher Alexis de Tocqueville, who wrote the grand narrative of American democracy. Meanwhile, at almost exactly the same moment, the German chancellor was having to seek approval for her vastly more modest policy proposals. 
Specifically, it was Ralph Brinkhaus and Katja Leikert, two deputy parliamentary group leaders, who were reciting their concerns on Tuesday with Macron's EU reform plans. Merkel did what she could to counter them, invoking in her comments to conservative parliamentarians gathered in Berlin everything from the 1555 Peace of Augsburg to the crises of the present, but she was unable to generate much in the way of enthusiasm. In the end, she was so accommodating to her party's parliamentary group that it appeared that it was not Merkel herself who is determining the guidelines of Germany's EU policies, but rather a handful of parliamentarians Macron has probably never heard of.
Has the 'Queen of Europe' Been Dethroned?
Not even five years have passed since the spate of essays and opinion pieces about Germany's hegemonic power over the Continent. The cold reality, the Economistwrote, is that "Germany is the power in Europe that counts the most. Top brass in Brussels, or Paris, can talk as much as they like. But until Ms. Merkel agrees, nothing happens." The danger, it added, is not that Germany will grow too strong, but that it could refuse to take on the leadership role.
And today? The world has become a dangerous place, with a leader in the Kremlin dreaming of former Soviet power and an American president who doesn't appear to be able to tell the difference between politics and a video game ("missiles, nice and smart"). The U.S. missile strike in Syria a week ago Saturday was not nearly as explosive as it could have been -- but that certainly was no thanks to Merkel, who stood on the sidelines as the major powers decided what course of action the West would take.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Obama-Merkel: amigos, amigos, negocios a parte, ou, muy amigos....

Bem, isso só garante mais dois anos e meio de contenção na bisbilhotice. Depois, não se sabe...
Parece que Obama tem poucos amigos... ou certos amigos não são muy amigos...
Paulo Roberto de Almeida


ALEMANHA EUA

Berlim, 18 jan (EFE).- O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, afirmou que enquanto ele continuar desempenhando seu cargo, Washington não voltará a espionar à chanceler alemã, Angela Merkel.

domingo, 22 de setembro de 2013

Austeridade: uma simples questão de bom senso, nao de capitalismo

Você aí leitor: quando não tem mais dinheiro sobrando, continua gastando sem contar, pois tem alguma tia rica para quem mandar a conta?
Pois é: contrariamente a Keynes, em Bretton Woods, os Estados Unidos se recusaram a ser a tia rica da Grã-Bretanha, no que fizeram muito bem, do contrário o capitalismo ocidental não teria conhecido as três décadas de prosperidade, dos anos 40 aos 70. O keynesianismo destruiu isso, razão da volta a políticas de austeridade, que os beócios chamam de neoliberalismo.
E contrariamente aos que recomendam mais facilidades, hoje, a Alemanha se recusa a ser a tia rica de Grécia, Portugal e outros, no que ela faz muito bem: do contrário, eles continuariam a viver acima de seus meios, como aconteceu durante muito tempo com os americanos.
O título da matéria, portanto, está errado, mas não o sentido, caro leitor, e não se trata de uma idéia perversa do capitalismo, e sim de simples bom-senso, aplicável a qualquer sistema econômico, em qualquer tempo e lugar, no setor público, ou privado, coletivamente ou individualmente.
Quem pode viver acima dos seus meios? Ninguém, nem Deus...
Paulo Roberto de Almeida

Cenário

Austeridade: a ideia poderosa que dá vida ao capitalismo

Veja, 21/09/2013

Às vésperas das eleições na Alemanha, modelo econômico defendido por Angela Merkel se mostra certeiro — apesar de doloroso; sua intensidade é colocada em xeque, mas não sua eficácia

Silhueta da chanceler alemã Angela Merkel durante uma declaração na Chancelaria em Berlim, em 2007
Angela Merkel: eleições devem consagrá-la pela terceira vez no comando do país (Hannibal Hanschke/AP/Pool)
Quando um indivíduo cheio de dívidas e inadimplente se vê forçado a reduzir seus gastos e vender bens para saldar débitos e ‘limpar o nome’, pode-se dizer que ele se torna austero – que passa a mostrar rigor e disciplina. Convertida em doutrina econômica, a austeridade talvez não tenha muito charme, mas é uma ideia poderosa. A adoção dessa doutrina é o que tem garantido que nações como Grécia e Irlanda consigam reduzir seu endividamento público para retomar, no futuro, uma trajetória de crescimento sustentável. A Alemanha é encarnação da austeridade. E a chanceler Angela Merkel, que deverá ser reconduzida ao poder neste domingo, é sua maior defensora. A provável vitória de Merkel – com o aplauso de outros países europeus – evidencia a consciência europeia de que ‘cortar na carne’, por vezes, é um mal necessário.
Apesar de se mostrar uma alternativa dolorosa, especialmente para os países guiados pelo modelo de bem-estar social, a austeridade se faz necessária para manter o mundo – onde as economias estão cada vez mais interligadas – em certo equilíbrio. Ela tem defensores e críticos eloquentes, sobretudo porque os países que implementaram os cortes para reduzir a dívida ainda não deram sinais de crescimento. O professor de Relações Internacionais da Universidade de Brown, nos Estados Unidos, Mark Blyth, em seu livro Austerity – The History of a Dangerous Idea(Austeridade – A História de uma Ideia Perigosa), cita o economista britânico John Maynard Keynes para embasar suas restrições ao modelo. “Keynes estava certo ao dizer que a austeridade é, sim, necessária. Porém, em períodos de crescimento acelerado da economia, e não quando há crise”, diz Blyth.
O surgimento - O professor de origem escocesa fez uma ampla pesquisa sobre as origens do modelo de austeridade e constatou que suas raízes estão fincadas na Grã-Bretanha do século XVII, nas mãos do filósofo John Locke, o pai do estado liberal. “Locke era um revolucionário econômico. Ele fundamentou no direito à propriedade privada toda a sua noção do que constitui uma regra legítima. Sem isso não haveria liberalismo econômico, separação entre mercado e estado e o capitalismo como o conhecemos hoje”, escreve o professor. Blyth explica que Locke foi o primeiro a atentar para o fato de que os gastos da realeza criavam uma dívida que era paga pelos impostos da população e que isso impedia os mercadores de prosperar, não importasse a ‘vontade de Deus’. “Ele era contra os ganhos do estado a todo custo e acreditava que era preciso diminuir a capacidade de o estado de extrair mais recursos da  população”, afirma o autor. A redução do papel do estado na economia é um dos principais pilares da doutrina que hoje é aplicada aos países europeus em crise.
Além de Locke, dois escoceses  tiveram papel primordial no desenho do que viria a ser a austeridade. Primeiro, o filósofo e economista David Hume, a quem o endividamento público causava repulsa. Hume era contra a emissão de dívida não só porque, para ele, se tratava de um artifício arriscado, mas também porque era politicamente hipócrita, já que permitia que governos se endividassem para agradar aos eleitores, quando, na verdade, a real necessidade era de aumento de impostos. O segundo, contemporâneo de Hume, foi Adam Smith — que não apenas criticou o endividamento público, como também encontrou uma solução para ele. “Para Smith, o dinheiro fácil conseguido por meio da rentabilidade de títulos da dívida subvertia a parcimônia, que, para ele, era o motor do crescimento e do progresso. É por isso que ele defendia que a dívida pública fosse combatida e que a austeridade, na forma de parcimônia, fosse adotada”, escreve o autor.
A prática - A doutrina só saiu do papel e foi, de fato, aplicada na década de 1930, durante a Grande Depressão que sucedeu a crise de 1929, nos Estados Unidos. Por uma década, a economia americana e se contraiu como resultado de intensos cortes de gastos e a taxa de desemprego chegou a 25%. Na segunda metade da década, o Congresso americano aprovou novos cortes, aumentou impostos e conseguiu eliminar um déficit de 5,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Como resultado, a economia recuou 11% entre 1937 e 1938. A retomada só aconteceu na década de 1940, período em que o keynesianismo ganhou força, tendo como oponente a escola austríaca, cujo principal nome foi Friedrich Hayek.
A Alemanha também foi uma das primeiras a colocar em prática a política de austeridade para tentar conter a hiperinflação e uma década de política anticíclica estimulada pelo governo. O então líder do partido de centro, Heinrich Bruning, escolhido como chanceler em 1930, implementou uma série de reformas e cortes de gastos que pegaram de surpresa uma população acostumada com o expansionismo econômico desde o final da Primeira Guerra. Para Blyth, foi essa austeridade abrupta e desmedida que permitiu a chegada ao poder do Partido Social Democrata de Adolf Hitler. “Eles eram os únicos que não defendiam a austeridade e tinham alguma chance de ganhar”, escreve o autor.
Após a Segunda Guerra, a Europa escondeu e enterrou qualquer vestígio de aperto fiscal. Parcimônia, como previa Adam Smith, foi um conceito esquecido até a chegada da crise financeira de 2008. Durante a segunda metade do século XX, países como França, Alemanha e Grã-Bretanha tiveram de ampliar o déficit fiscal para arcar com os benefícios previdenciários de uma população envelhecida. No caso da Grécia, houve outro tipo de agravante: maquiagem nas contas públicas e a entrada para a zona do euro, o que impedia o país de desvalorizar sua moeda para aumentar sua competitividade. Segundo o economista Otaviano Canuto, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do Banco Mundial, diante do cenário pós-crise de 2008, depois que todos os erros já haviam sido cometidos, a única saída para os países – sobretudo os periféricos – era cortar gastos, estivesse Keynes de acordo ou não. “Quando o crédito bancário secou, toda uma estrutura de financiamento do consumo que estava pautada no ingresso de dinheiro deixou de existir. Diante disso, não havia outra saída a não ser passar pela austeridade. O que cabe discutir é se o processo de ajuste poderia ser menos doloroso”, afirma.
A intensidade - As críticas sobre o quão intensos foram os cortes recaem, em especial, sobre a Alemanha de Merkel. Ela foi a responsável por orquestrar, junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI), as contrapartidas que os países resgatados seriam obrigados a cumprir para receber os aportes financeiros para sanar suas contas. Com o desemprego na Grécia atingindo 27%, e na Espanha 30%, além de uma previsão de contração de 0,6% para a zona do euro em 2013, muitos economistas que outrora levantavam a bandeira da austeridade acima de todas as outras, como o pesquisador de Harvard Kenneth Rogoff, começam a questionar não o modelo, mas sua intensidade. O ponto crucial é a crença de que a política de austeridade alemã foi implementada de maneira tão truculenta nos países periféricos para que a própria Alemanha receba deles o pagamento pelos títulos públicos que detêm. “A Alemanha precisa aceitar e desistir de receber pelos títulos. Ela nunca vai conseguir receber tudo. Se a situação fosse oposta e a Alemanha fosse o devedor, a filosofia em torno da austeridade seria outra”, afirma Rogoff.
No início de 2013, Rogoff foi alvo de um bombardeio no mundo econômico (ao lado da também economista Carmen Reinhart) justamente devido ao tema da austeridade. Em janeiro de 2010, Rogoff e Reinhart produziram um estudo intitulado Crescimento em Tempos de Dívida, que afirmava que um endividamento público superior a 90% do Produto Interno Bruto (PIB) era nocivo para as economias. O texto foi amplamente utilizado pelos governantes europeus e pelo partido Republicano nos Estados Unidos para justificar políticas de aperto fiscal num ano em que o mundo ainda sofria os efeitos recessivos da crise. Mas um novo artigo publicado no início deste ano pelo economista Thomas Herndon apontava erros no estudo da dupla Rogoff e Reinhart. Assim, muitos defensores de políticas de estímulo aproveitaram o novo texto para desqualificar não só a teoria da austeridade, como também os renomados economistas. “Foi um ataque sem fundamentos e usado politicamente, cheio de omissão seletiva de informações, má interpretação e declarações falsas”, disse Rogoff ao site de VEJA.
A questão envolvendo os economistas norte-americanos evidencia o entusiasmo que o tema evoca em tempos de economia cambaleante. Em Austerity, Mark Blyth escolhe claramente um lado da discussão: ao valer-se de argumentos técnicos e históricos, mostra, de maneira até mesmo passional, que a austeridade nem sempre é o melhor caminho em momentos de crise. Contudo, recai no clichê ao afirmar que a escolha pela austeridade sempre está nas mãos de governantes que dificilmente terão suas vidas modificadas pela piora dos serviços públicos decorrente de um aperto fiscal. Assim, Blyth reduz a discussão à retórica da luta de classes. Como alternativa, sugere que a austeridade seja substituída pelo aumento de impostos. Mas não explica como, sem cortes de gastos, é possível impedir que um país minúsculo como a Grécia dê o calote em sua dívida e arraste consigo um continente inteiro, numa espiral de pânico e derretimento da economia mundial.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Portugal: tentando resolver problemas criados por um Estado grande

Entrevista sensata, sensível, e de bom senso, do Primeiro-MInistro português, Pedro Passos.

07/09/2012
 às 12:00 \ Vasto Mundo

O primeiro-ministro de Portugal: “Nosso objetivo é tirar o Estado da economia, acabar com o Estado patrão, dono de empresas. Pretendemos atrair capital novo e deixar atuar a livre iniciativa”

pedro-passos-coelho
Pedro Passos Coelho, primeiro-ministro de Portugal: "As medidas de austeridade que estamos adotando não são a origem do problema. São parte da solução" (Foto: Mario Proença / Bloomberg / Getty Images)
O ESTADO NO SEU DEVIDO LUGAR
(Entrevista a Duda Teixeira, publicada na edição impressa de VEJA)
O primeiro-ministro de Portugal vê na crise a oportunidade para fazer reformas. Ele vai cortar os benefícios sociais de quem não precisa, privatizar estatais e abrir a economia
Para muitos economistas, Portugal está a caminho de se tornar, depois da Grécia, a próxima nação da zona do euro a afundar. A taxa de desemprego é de 15%, superior à média europeia, e o PIB deve encolher 3% em 2012.
O desafio de Pedro Passos Coelho, de 47 anos, primeiro-ministro português, no cargo desde junho de 2011, é reduzir a dívida e os gastos públicos e, ao mesmo tempo, tirar o país da recessão.
Antes de Coelho assumir, Portugal só se salvou da quebra por receber um pacote de ajuda externa no valor de 78 bilhões de euros, um terço do que foi obtido pela Grécia. Com voz de barítono, que usava para cantar fados em ocasiões privadas, Passos Coelho falou a VEJA na residência oficial do chefe de governo, o Palácio São Bento, em Lisboa.
O governo brasileiro quer encarecer e dificultar a importação de vinhos, incluindo os portugueses, para beneficiar os produtores da Serra Gaúcha. Qual sua opinião sobre isso?
O protecionismo, por mais que pareça dar oportunidades imediatas aos grupos nacionais, é pouco eficiente a médio e longo prazo. Quando se diminui a exposição do país à competição externa, os consumidores são obrigados a pagar um preço mais elevado por um determinado nível de consumo ou de realização de serviços.
Ora, se uma parte desse gasto for liberada para a compra de outro produto ou para investimentos, a economia no seu conjunto ganhará mais. Portanto, mais vale privilegiar a competição internacional do que proteger os nossos campeões internos.
O que o senhor diz aos portugueses que culpam a chanceler alemã Angela Merkel e o ex-presidente francês Nicolas Sarkozy pela crise europeia?
Esse é um clichê muito difundido na imprensa. O fato de Alemanha e França procurarem soluções para a crise resultou na ideia errônea de que eles eram de certa forma responsáveis ou até beneficiários dessa situação.
Nada mais exagerado.
Primeiro porque, apesar de serem os líderes de duas das principais economias europeias, as decisões finais sobre os rumos do bloco são tomadas por um comitê mais amplo de chefes de governo e de Estado. Segundo, a situação adversa que Portugal vive hoje não veio em consequência das decisões de Merkel ou de Sarkozy.
Os desequilíbrios existentes em Portugal são resultado de más decisões tomadas por nós mesmos. Usamos mal o dinheiro, selecionamos mal os projetos de obras públicas, aumentamos os impostos para gastar em serviços de pouco valor, não flexibilizamos suficientemente o mercado de trabalho, não abrimos a economia…
Os líderes europeus não agravaram nossos problemas. Ao contrário, eles nos ajudaram a encontrar uma saída para eles.
Sarkozy e Merkel se reúnem em Bruxelas para conversar sobre a crise na UE (Fabrizio Bensch/Reuters)
O ex-presidente francês Nicolas Sarkozy e a chanceler alemã Angela Merkel: "os líderes europeus não causaram nem agravaram os problemas de Portugal. Os responsáveis foram nós mesmo, os portugueses" (Foto: Fabrizio Bensch / Reuters)
A Grécia está imersa no caos social e ainda negocia para não pagar uma parte de sua dívida. Toda a ajuda em dinheiro vinda de fora parece não ser suficiente para equilibrar as contas e superar a recessão. Alguns analistas dizem que Portugal será a próxima Grécia. Qual o risco de isso ocorrer?
Nosso país tem adotado medidas que a comunidade internacional e a União Europeia consideram bem-sucedidas. Corrigimos algumas deficiências em tempo recorde. Internamente, fizemos um acerto duro nos gastos públicos.
Apesar de a crise econômica ter reduzido a nossa receita tributária e aumentado as nossas despesas com benefícios sociais para os desempregados, conseguimos cortar o déficit estrutural em 4 pontos porcentuais.
Externamente, reduzimos o déficit na balança de pagamentos. Nesse quesito, alcançamos em dezembro de 2011 uma meta que todos esperavam ser possível atingir apenas em dezembro de 2012. Essa conquista ocorreu não apenas por causa da nossa política de austeridade, mas sobretudo porque os setores exportadores, como o têxtil e o automotivo, tiveram um desempenho superior ao previsto.
O turismo, que representa 10% do PIB, também foi muito bem. Até 2013 vamos atingir o equilíbrio nas contas externas. Isso dá aos mercados uma sensação de estabilidade e de confiança em relação a nós.
Portugal vai precisar de mais um pacote de resgate europeu?
Creio que não. De qualquer modo, o Fundo Monetário Internacional e a União Europeia se comprometeram com uma nova ajuda em dinheiro se no futuro subsistir alguma dificuldade. Isso, claro, com a condição de que as medidas de estabilização financeira e macroeconômica sejam bem-sucedidas e que a agenda de reforma estrutural da economia portuguesa seja cumprida.
Como temos feito tudo corretamente, e antes do previsto, a garantia do FMI e da União Europeia nos ajudará a voltar a emitir títulos da dívida a juros baixos no prazo esperado: setembro de 2013.
Como compatibilizar o corte de gastos públicos com a injeção de mais dinheiro na economia para estimular o consumo como medida contra a recessão?
Não são ações excludentes. Primeiro porque, em Portugal, o Estado gastou muito sem que a economia melhorasse. Segundo porque, atualmente, não temos alternativa. Os recursos financeiros para estimular a economia simplesmente não existem.
As medidas de austeridade que estamos adotando não são a origem do problema. São parte da solução. Se Portugal tivesse a oportunidade de decidir de outra maneira, não teria pedido ajuda às instituições internacionais. Tivemos de fazê-lo porque os mercados se fecharam e ninguém mais queria financiar a economia portuguesa.
O senhor vai privatizar a companhia aérea TAP e outras empresas estatais?
Sim.
Nossa lista inclui empresas dos setores energético e de transporte, além dos aeroportos, dos correios, de um canal de televisão e das Águas de Portugal, em que haverá um misto de abertura ao capital privado e concessões públicas.
O objetivo é tirar o Estado da economia, acabar com o Estado patrão, dono de empresas. Pretendemos atrair capital novo para Portugal, recebendo empresas que podem ter relevância para internacionalizar a nossa economia e tornar nossas empresas mais competitivas.
Tap
A companhia aérea TAP: "não queremos o Estado patrão, o Estado dono de empresas. Vamos privatizar" (Foto: TAP)
Como a opinião pública tem reagido aos anúncios de privatização?
Não tem havido resistência. Os portugueses sentem que o Estado não foi um bom gestor de empresas. O custo delas para o país e para os contribuintes é muito elevado. Os cidadãos também sabem que precisamos atrair dinheiro externo para movimentar a nossa economia.
Tanto há um consenso sobre isso que as privatizações já estavam no programa do governo socialista de José Sócrates, meu antecessor.
Com o argumento de que os portugueses precisam trabalhar mais, o senhor acabou com quatro feriados nacionais, incluindo o de Corpus Christi. Funcionou?
Precisamos ser mais produtivos, mais eficientes e, portanto, mais competitivos. As privatizações são somente uma parte desse processo. A questão dos feriados também. Queremos que os empresários tenham menos receio de contratar novos funcionários, tornando mais flexível o número de horas de trabalho e resolvendo melhor os conflitos trabalhistas. A maioria da população está de acordo com essas mudanças, porque a crise a fez refletir sobre isso.
Por que os gastos públicos portugueses cresceram tanto?
Há duas razões para isso. A de natureza conjuntural é a mesma que afetou os outros países da Europa.
Depois da crise econômica de 2008, o nível de emprego caiu, as despesas sociais aumentaram e a arrecadação declinou.
Com o fim da crise, isso muda.
Há também um componente estrutural, que se refere a um alargamento insensato das responsabilidades do Estado na economia. O fato de Portugal ter entrado na zona do euro facilitou o financiamento de obras e tornou a seleção dos projetos frouxa e pouco exigente. Como resultado, Portugal ganhou uma rede de estradas muito além das nossas necessidades. Não há tráfego que justifique todos os investimentos feitos na malha viária.
Desperdiçamos muito dinheiro em projetos sem retorno financeiro. Sucessivos governos também aumentaram as despesas com gasto de pessoal e serviços sociais, como educação, aposentadorias e seguro-desemprego, que hoje equivalem a toda a receita tributária. O resto é déficit.
Se quisermos um país mais competitivo, o que só pode surgir do lado privado, teremos de reduzir o peso do setor público. Teremos de corrigir também a rede assistencialista de tal modo que aqueles que realmente precisam da ajuda social possam recebê-la, sem abusos.
Quando a economia voltar a crescer, os benefícios sociais vão retornar aos níveis anteriores?
Não.
Nos próximos três anos, de 2012 a 2014, não queremos somente superar os problemas conjunturais. Vamos reestruturar a economia. As grandes obras públicas encomendadas pelo Estado português nos últimos anos deslocaram quase todo o crédito disponível para o setor público, quando ele deveria estar sendo usado mais na iniciativa privada.
Temos de deixar a economia respirar, ser mais aberta ao capital externo, mais focada nos mercados globais. Desse ponto de vista, a atual crise econômica é uma oportunidade para corrigir, entre outros, os desvios existentes nos serviços sociais.
Na crise grega, cogitou-se que o país abandonasse o euro para poder adotar uma moeda própria, menos valorizada, de forma a ganhar competitividade nas exportações. Os portugueses também enxergam um futuro fora da zona do euro?
Não existe ninguém em Portugal com peso político advogando uma saída do euro. Há, ao contrário, uma crença de que o nosso futuro está conectado ao da Europa. Não nos vemos na periferia do bloco, mas como membro destacado da União Europeia. Temos uma tradição atlântica muito ligada à nossa política externa, ao nosso relacionamento com os Estados Unidos, com o Brasil e com os países que falam português na África. Essas relações interessam à Europa.
A presidente Dilma Rousseff disse a Angela Merkel que os pacotes de ajuda aos países europeus jogaram dinheiro demais no mercado, o que inunda os países, entre eles o Brasil, com capitais especulativos. O senhor concorda?
O problema dos capitais especulativos se resolve com regras financeiras globais. A fraca regulação foi uma das causas da crise iniciada em 2008. Os principais bancos centrais do mundo precisam reforçar a vigilância mútua e a troca de informações. O FMI deve ser reformado. Tudo isso é parte de uma agenda global que ainda não teve uma resposta satisfatória.
O senhor conhece bem o Brasil?
Quando fui ao Brasil pela primeira vez, há três anos, tive a impressão de ser uma nação em via de grandes transformações e crescimento, com muitas oportunidades. Há uma distribuição de riqueza melhor do que antes, um processo iniciado com o presidente Fernando Henrique Cardoso, e a criação de uma classe média que passou a funcionar como o motor do crescimento da economia interna. Espero conhecer melhor o Brasil nas próximas ocasiões.
Fernando Henrique Cardoso
No Brasil, "há uma distribuição de riqueza melhor do que antes, um processo iniciado com o presidente Fernando Henrique Cardoso" (Foto: Mark Wilson / Getty Images)
A melancolia do fado serve como metáfora do momento econômico vivido por Portugal?
O fado está sempre em evolução. Mesmo os novos nomes do fado fazem interpretações muito clássicas de temas recorrentes da música portuguesa, mas com propostas criativas e inovadoras. Versões tradicionalíssimas e outras modernas convivem harmoniosamente. O fado tem essa qualidade de se renovar continuamente e se reinventar com novos artistas. Não há um fado. Há muitas versões do fado. A atitude geral, porém, mantém-se em qualquer circunstância. Consiste em matar as nossas misérias, os nossos fatalismos. De certa maneira, ao cantar o fado, nós espantamos os nossos fantasmas. É o contrário do que parece quando ouvimos aquelas letras.
O senhor canta com que frequência?
Muito pouca.
Uma vez por mês, pelo menos?
Atualmente, nem isso.