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quinta-feira, 2 de novembro de 2023

As más escolhas que nos tiram do caminho do progresso e da inclusão social - Paulo Roberto de Almeida

As más escolhas que nos tiram do caminho do progresso e da inclusão social

  

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Nota sobre o recuo do governo brasileiro na decisão de ingressar na OCDE.

  

Existe um pequeno livro de Antonio Paim, Momentos Decisivos da História, que trata de três escolhas erradas que o Brasil fez no passado e que comprometeram o seu futuro. Algumas vieram de longe, outras são mais recentes.

A mesma indecisão quanto a qual caminho adotar no presente compromete nossa trajetória desde mais de três décadas: a correta dosagem das políticas macroeconômicas e setoriais, assim como sua orientação qualitativa e prioridades.

A interação Brasil-OCDE, iniciada na última década do século XX, fortaleceria a solidez das políticas econômicas e sociais. Ela foi interrompida pouco depois e ficou parada, esperando nova oportunidade, que veio de uma maneira muito hesitante. 

Afastar esse objetivo, como ocorre no atual governo, tornará mais difícil o caminho do desenvolvimento econômico e social. A via do avestruz, que insiste na introversão e no protecionismo, nos leva a um atraso persistente, mas parece que vamos patinar na mesma má escolha novamente…

Estou tentado a agregar um quarto equívoco ao livrinho de Antonio Paim, confirmando nosso velho hábito de insistir nas escolhas erradas: foi assim no tráfico e na escravidão, foi assim na ausência de reforma agrária, foi assim na não educação de massa de qualidade, foi assim na introversão de nossa industrialização: continuamos na postura do avestruz, uma escolha que não é uma política; é apenas indecisão. 

Minha reflexão não tem nenhum poder de mudar a realidade presente, a despeito de estar fundamentada numa análise do passado. Mas cabe registrá-la formalmente, para que não se diga que descurei do nosso futuro. 

Estamos atrasados desde várias décadas: ficaremos no mesmo lugar por uma ou duas gerações a mais. Uma pena para nossos filhos e netos: alguns, ou muitos, escolherão o caminho do exílio (muitos já o fizeram). 

Por certo perdeste o senso, escreveu um poeta cem anos atrás…

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4502, 2 novembro 2023, 1 p.


segunda-feira, 3 de abril de 2023

Antonio Paim: de militante comunista na União Soviética a guru do liberalismo brasileiro - Felipe Vidal Benvenuto, Alberto Tomás Paixão Borges (Diálogos Internacionais)

Antonio Paim não era só um guru do liberalismo brasileiro, e muito menos na era Bolsonaro. Era um grande intelectual, pensador tout court, e não só do liberalismo, mas do conhecimento universal. (PRA)

Notas biográficas de Antonio Paim: de militante comunista na União Soviética a guru do liberalismo brasileiro na era Bolsonaro

Volume 10 | Número 97 | Mar. 2023

Imagem de Andrew Martin por Pixabay

Por Felipe Vidal Benvenuto Alberto
Tomás Paixão Borges

RESUMO

Na busca por recriar os caminhos trilhados por uma figura bastante singular do Pensamento Político Brasileiro, este trabalho perpassa aspectos pessoais e inusitados da vida de Antonio Paim, que militou como comunista na União Soviética e terminou sua vida como referência para figuras significativamente distanciadas desses ideais. Em paralelo aos aspectos essencialmente biográficos, é esboçada também uma análise acerca da ideologia política defendida e propagada por Paim, ainda que tenha se mostrado tão caleidoscópica ao longo de sua vida. Como um expoente intelectual brasileiro, a despeito de seu posicionamento político, esse aspecto não poderia ser ignorado.

Palavras-chave: Marxismo; Liberalismo; Pensamento Político Brasileiro; Extrema-Direita.

INTRODUÇÃO E ORIGENS

Antonio Ferreira Paim nasceu na cidade de Jacobina, na Bahia, em 1927, sendo criado pela sua avó juntamente com seus irmãos. Filho de um homem envolvido com o meio musical, em determinado momento Paim chegou a acumular, entre os seus muitos afazeres para uma criança, a prática de trompetista, algo que não passou de uma imposição familiar em sua vida. Apesar de seu marcante afastamento das memórias de infância, motivado principalmente pelo tardio interesse no levantamento de sua biografia, com o protagonista já em idade avançada, ainda é possível encontrar características que posteriormente viriam aflorar nas seus pensamentos e atividades desenvolvidas. O mais evidente destes casos é certamente a sua aberta inspiração no irmão mais velho, Isaias Paim, que viria a se tornar um médico psiquiatra dedicado à organização do conteúdo teórico existente sobre a área na sua época (JUVENTUDE, 2018).

Seguindo o padrão do período, Paim frequentou simultaneamente o ginásio escolar — atualmente chamado de segundo grau — e o Tiro de Guerra, instituição vinculada ao Exército Brasileiro voltada a ser formação de entrada de estudantes secundaristas no serviço militar. Contudo, o caráter desimportante desta formação complementar precisou ser revogado em 1943, quando a integração do Brasil na Segunda Guerra Mundial leva à incorporação de reservistas como o futuro pensador político. Recém-chegado ao Rio de Janeiro e decidido a seguir seus estudos pela área das ciências exatas, Paim é surpreendido pelas novidades e passa por alguns anos de intensas mudanças forçadas pelos seus serviços militares vinculados a Exército e Aeronáutica.

MILITÂNCIA NO PCB E PERÍODO MARXISTA

Na segunda metade da década de 40, a convulsão do pós-guerra colabora fortemente para a ampla disseminação dos ideais comunistas principalmente entre os jovens do país. Assim, segundo palavras do próprio autor, “influenciado pelos amigos” que ingressaram o Partido Comunista Brasileiro (PCB), Paim também o fez, sendo, inclusive, convocado para trabalhar na Tribuna Popular, um diário carioca diretamente ligado a essa vertente ideológica. Segundo seus relatos em entrevistas recentes, chegou a ser preso em 1948 por reagir com tiros a uma tentativa da polícia de fechar seu local de trabalho da época e, depois da prisão, considerou-se um “verdadeiro líder comunista” (BRUNO, 2016), pois passou a organizar e promover manifestações e greves na região Nordeste. Nesse momento, o autor afirma que estava sendo formado para ser um “bolchevique”, que na definição de seus correligionários era alguém “sem alma”, que não poderia ter amigos ou família. Em suas palavras, passou por um processo de desumanização, até que foi convidado a estudar o marxismo em Moscou.

Na Rússia, Paim inicia seus estudos na Universidade de Lomonosov e ali se apaixona por uma tradutora nativa, sofrendo duras críticas dos integrantes do partido — devido à definição do que deveria ser um bolchevique — porém ignorou-as e decidiu por casar-se com a russa (PAIM, [s.d]). Após muito tempo de estudo aprofundado, o autor alega ter encontrado incoerências no pensamento marxista, mas somente quando foi divulgado o Relatório Khrushchev, que acusava Stalin “pelo uso indiscriminado de violência, execuções, processos fraudulentos contra adversários políticos, violando todas as normas de legalidade revolucionária” (DISCURSO, [s.d.], p. 11), que decidiu abandonar o PCB, pois, em suas palavras, o partido foi criado para ser “imagem e semelhança” do que ocorria na Rússia.

Regressando ao Brasil, mais especificamente ao Rio de Janeiro, onde anos atrás havia tentado sem sucesso se estabelecer, o autor deixou suas “aventuras mais revolucionárias” para trás e retornou às atividades acadêmicas convencionais, iniciando o curso de Filosofia, na Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Apesar de haver deixado o Partido Comunista, Paim ainda se considerava marxista, muito por só ter estudado esta corrente durante toda a sua juventude. Na atualidade, o autor afirma que naquele período conhecia a crítica marxista a todos os principais autores filosóficos, porém não estudava suas ideias em si. Por desejar conhecer a filosofia que considera lhe ter sido privada pelo foco marxista, inscreveu-se na cadeira de Kant da Faculdade de Filosofia e começou a estudar com afinco as ideias kantianas, às quais se dedicou por mais de 15 anos.

GUINADA LIBERAL E CRÍTICA AO MARXISMO

Como a situação política do Brasil nos anos 60 não permitiu que Paim realizasse sua tese sobre marxismo à época, é somente muitos anos mais tarde, que ele publica seu livro Marxismo e Descendência (2009). Nele, o autor descreve o marxismo como um sistema filosófico que, com base em uma visão econômica da realidade, discorre sobre o Estado, a sociedade e o pensamento. Na obra, Paim critica as incoerências desse sistema ao desconsiderar os sistemas com líderes democráticos que prosperavam e pender para um sistema político sem pluralidade democrática.

A saída de Paim do movimento marxista se deu pela influência da vertente do culturalismo da filosofia kantiana, através dos filósofos da Escola de Baden. Com base nessa vertente, na primeira parte de sua obra, o autor analisa a doutrina marxista do Estado. Para ele, há uma afinidade entre a doutrina de Marx e o patrimonialismo. Esta, segundo Weber, representa um tipo de dominação carismática e racional, definida por forte concentração de poder nas mãos do soberano, não permitindo a clara separação entre patrimônio público e riqueza privada. Além disso, a população fica à mercê do arbítrio do soberano, que não tem limitações de poder, e da ausência de instituições sólidas de representação, como partidos políticos. Assim, com o patrimonialismo, o Estado é mais forte que a sociedade.

O autor, então, afirma que Marx pende para a violência política para destruir o Estado burguês e substituí-lo por uma ditadura do proletariado, que construiria uma sociedade comunista sem classes. Isso se apoiaria e entraria em consonância com a tradição do patrimonialismo russo, tal como postulado por Lênin e, em seguida, Stálin. Ou seja, para Paim, Marx se identificava com métodos de tomada de poder pela força. No entanto, ele ignorava que métodos parecidos já haviam fracassado. Por exemplo, os de Louis Auguste Blanqui, com o movimento dos operários de Paris, cuja queda deu origem à Segunda República, e a tentativa de Napoleão III de reinstaurar o império, que fracassou com a Guerra Franco-Prussiana e o esmagamento da Comuna de Paris, dando origem à Terceira República (RODRÍGUEZ, [s.d.]).

Assim, Marx ignorava os movimentos que mais deram frutos, principalmente na Europa Ocidental. Eles consistiam na resolução das questões sociais através da incorporação progressiva das massas trabalhadoras nas organizações políticas que as representavam no jogo eleitoral. Foi, para Paim, uma evolução histórica muito diferente daquela postulada com base no patrimonialismo.

Esse processo se iniciou na Inglaterra no final do século XVII, após a Revolução Gloriosa, que resultou no surgimento de um governo monárquico limitado pelo Parlamento e que se consolidaria depois como regime parlamentarista. Foi um freio inicial ao absolutismo, através de um sistema representativo, e que, naquele então, refletia os interesses dos beneficiários da revolução, ou seja, a nobreza rural. Outro fator importante, para o autor, foi a Reforma Protestante. Sendo a religião um berço da moral, cujos valores servem de referência na construção do mundo social do indivíduo, ela desempenha importante papel nos processos históricos. Logo, o surgimento de interpretações rivais criou a necessidade de que grupos com pensamentos diferentes convivessem. Daí em diante novos atores políticos foram sendo incorporados ao processo evolutivo, como a burguesia industrial, a pequena classe média e, por fim, a classe não proprietária.

A possibilidade de participação política através do voto se expandiu e se universalizou com o fim do voto censitário. Essa mudança se espalhou pelo Ocidente da Europa, pautada por um sistema de partidos políticos permanentes e não blocos parlamentares. Esse processo de evolução seria, para Paim, a democratização da ideia liberal, que ocorre pela exigência liberal de que o Estado tenha seu poder sobre o indivíduo limitado e pela busca democrática por decisões tomadas pela maioria. Foi essa visão liberal que criou, nos Estados Unidos, a primeira república presidencialista.

ANÁLISE DO PENSAMENTO POLÍTICO BRASILEIRO E INFLUÊNCIA KANTIANA

Por sua vez, no terreno das histórias das ideias políticas, Antonio Paim teve uma contribuição ímpar para uma nova visão do processo político brasileiro. Em seu livro A Querela do Estatismo, apoiado nas conceituações teóricas weberianas das dimensões básicas da vida social e da legitimação do poder, constrói a ideia de um “Estado Patrimonialista Brasileiro”, caracterizado pela faceta “clientelista e cartorialista” (PAIM, 1994, p. 23) de sua esfera econômica e por fonte tendência modernizadora em determinadas épocas.

Na visão do teórico, a única forma de compreender amplamente o processo de formação deste Estado reside no entendimento que o “Estado é uma realidade per se” (Idem, p. 16). Ao superar uma visão tradicionalista que centra toda a análise na sociedade civil e apenas situa o Estado como sua expressão máxima, rejeita qualquer tipo de análise que atribua as decisões tomadas à nível governamental apenas ao interesse de classes no Brasil. Esta inovadora abordagem recentraliza o papel da tradição cultural na formação da realidade político-estrutural brasileira.

Na perspectiva de Paim, a origem deste Estado reside nas históricas tradições dos sistemas políticos lusitanos, altamente patrimonialista. Apoiado pelos escritos de Raymundo Faoro, aponta que o Estado Português manteve no bojo de suas estruturas políticas práticas culturais que, além de misturar a propriedade estatal com os domínios das antigas realezas, impediu a florescência de um capitalismo industrial. O autor reforça também a importância do período pombalino na formação de uma elite política que via com gosto a hegemonia da modernização do país pelo Estado.

A partir desta tendência lusitana, urgiu uma outra grave questão na estrutura política do Brasil: a falta de uma real representação política. Do modo como se estrutura a República no país, um sistema com real consciência política e poder de transformação por parte da população é substituído por uma democracia ilusória, onde a “eleição, mesmo formalmente livre, lhe recusa a escolha entre as opções que não formulou” (FAORO, 1975, p. 748). Para o filósofo, a única experiência verdadeiramente representativa do sistema político brasileiro ocorreu durante o Segundo Império, graças a prática parlamentarista, de inspiração liberal.

Desta forma, a transformação da atual situação patrimonialista do Estado brasileiro não se esgotaria em reformas dentro do sistema que incentivassem a pluralização política, maior participação política da população e estímulo a eleições verdadeiramente livres. Pelo contrário, se faz necessária uma reconstrução dos moldes em que foi formado, promovendo uma abertura plena ao sistema capitalista e renovando a perspectiva ideológica que ainda suporta o pensamento cartelista dos estadistas. Reforçando essa ideia, Ricardo Vélez Rodríguez, antigo aluno de Paim e então Ministro da Educação, ao analisar a obra de seu mestre aponta que “é imprescindível desenvolver, no interior da cultura brasileira, o interesse pelas ideias liberais, hoje abandonadas pela grande maioria dos políticos e intelectuais” (PAIM, 1997).

No livro O Patrimonialismo Brasileiro em Foco (PAIM et al., 2015), o autor destaca as mazelas que esse modelo vem causando no país, além de mostrar que a população já tem consciência do quanto ele a prejudica, referenciando-se ao repúdio popular ao caso do “mensalão” quando o crime de apropriação indevida de recursos públicos foi devidamente punido.

Como anteriormente comentado, Paim possui uma forte influência daquele para o qual dedicou muitos anos de seus estudos, o filósofo Immanuel Kant. Sua crítica ao modelo político brasileiro muito se assemelha ao artigo 2º da primeira seção da obra A Paz Perpétua, o qual afirma que o Estado não é patrimônio de uma pessoa ou grupo. Como o próprio filósofo prussiano diz, “o Estado adquire, pois, um governante, não é o governante como tal que adquire o Estado” (KANT, 2008, p. 5). Apesar da obra direcionar-se para a aquisição literal de Estados, a situação do patrimonialismo de Weber se apresenta como análoga à criada por Kant, visto que o governante agiria como proprietário do Estado, utilizando dos bens públicos para fins pessoais.

Outra semelhança está na defesa de uma constituição republicana. Apesar do Brasil possuir o título de República Federativa, a análise de Antonio Paim quanto ao patrimonialismo existente no país mostra-o como contrário ao conceito de república estabelecido pelo filósofo. Isso ocorre porque quando o chefe do Estado não é um membro do Estado, mas seu proprietário, os súditos não são mais cidadãos dotados de liberdades individuais plenas. Assim, o Estado fica ainda mais propenso a guerras de acordo com o pensamento kantiano, pois as guerras ocorreriam segundo os interesses pessoais dos governantes e não os prejudicaria diretamente devido às suas regalias aos custos da população; ao contrário de uma situação de república, na qual a população que é cidadã consegue decidir se deve ou não haver guerra, pois ela seria a sua principal financiadora e a principal afetada por seus efeitos.

O autor também produziu outras diversas obras que exploravam às questões relativas ao pensamento político brasileiro. Destacam-se entre elas O Liberalismo Contemporâneo (1995) e o Pensamento Político Brasileiro (1994). Além disso, buscando maior divulgação das ideias do liberalismo no Brasil e a formação de uma elite intelectual liberal, publicou o curso de Introdução Histórica ao Liberalismo (1996).

INFLUÊNCIAS ATUAIS E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Vivendo até 2021 em uma casa de repouso para idosos, na cidade de São Paulo, o pensador ainda é tido como uma das principais referências para o ideário liberal brasileiro, fator acentuado pelo alinhamento ideológico adotado pelo ex-Presidente da República Jair Bolsonaro. Com a opção por nomear uma série de ministros indicados pelos gurus intelectuais da vertente liberal do pensamento político nacional, Antonio Paim voltou ao protagonismo de outrora, apesar de sua idade já avançada à época. A mais evidente influência de suas falas se mostra na nomeação de Ricardo Vélez Rodríguez, seu ex-aluno e posterior companheiro de estudos, para o cargo de Ministro da Educação. Ainda que o colombiano Vélez tenha durado apenas quatro meses no cargo, sua exoneração em nada passou por um distanciamento ideológico com o presidente em exercício, mas sim pelas sucessivas inconstâncias que marcaram o governo de Bolsonaro.

Paim seguiu uma vida pacata em seus últimos anos de vida, nos quais um dos principais hobbies passou a ser o de receber estudantes em sua habitação, a fim de tecer conversas informais e passar parte do seu vasto conhecimento político e filosófico. Obviamente esse público possuía uma prévia simpatia ao que Paim tinha a propagar ideologicamente (JUVENTUDE, 2018). Ainda que mantivesse uma interação regular, principalmente por meios digitais, com outros de seus correligionários da mesma época, como o pretenso filósofo Olavo de Carvalho, ficou evidente a sua predileção pelos bastidores em detrimento dos holofotes. Ao contrário do espalhafatoso Olavo de Carvalho, falecido em 2022 e deixando uma horda de órfãos daquilo que opinava diariamente através de redes sociais, Antonio Paim faleceu no ostracismo em 2021, aos 94 anos, de causa não divulgada (FILÓSOFO, 2021).

REFERÊNCIAS

BRUNO Garschagen entrevista Antonio PaimMises Brasil, 15 jan. 2016. Podcast 201 (60 min.). Disponível em: https://www.mises.org.br/FileUp.aspx?id=413. Acesso em: 10 jan. 2023.

DISCURSO Secreto de Khrushchev no XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética, O. Rio de Janeiro: Ed. Ipanema, [s.d.].

FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder. 2.ª ed., Porto Alegre: Globo/USP, 2v, 1975.

FILÓSOFO Antonio Paim morre aos 94 anos. G1, São Paulo, 1 mai. 2021. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2021/05/01/filosofo-antonio-paim-morre-aos-94-anos.ghtml. Acesso em: 10 jan. 2023.

KANT, Immanuel. A Paz Perpétua, Um Projeto Filosófico. Covilhã: Universidade da Beira Interior, 2008.

JUVENTUDE Comunista de Antonio Paim. Revista Insight Inteligência, ano XXI, nº 81, (abril/maio/junho 2018): 52-62. Disponível em: . Acesso em: 10 jan. 2023.

PAIM, Antonio Ferreira. Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro: Sócios Honorários Brasileiros, [s.d.], Disponível em: https://ihgb.org.br/perfil/userprofile/AFPaim.html. Acesso em: 10 jan. 2023.

_______. Historiador das Ideias. Revista Brasileira de Filosofia, São Paulo, vol. 44, nº 186 (abril/maio/junho 1997): 203-212.

_______. A Querela do Estatismo. Brasília: Senado Federal, 1998.

_______. Marxismo e Descendência. São Paulo, Vide Editorial, 2009.

_______.; BATISTA, Antonio Roberto; KRAMER, Paulo; RODRÍGUEZ, Ricardo Vélez. O Patrimonialismo Brasileiro em Foco. São Paulo: Vide Editorial, 2015.

RODRÍGUEZ, Ricardo Vélez. Antonio Paim: Vida, Obra, Pensamento. Proyecto Ensayo Hispánico. [s.d.]. Disponível em: https://www.ensayistas.org/filosofos/brasil/paim/paim.htm. Acesso em: 10 jan. 2023.

Felipe Vidal Benvenuto Alberto é mestrando no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais (PPGRI) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) como bolsista CAPES. Bacharel em Línguas Estrangeiras Aplicadas pelo CEFET/RJ, com período sanduíche na Faculté des Sciences Juridiques, Politiques et Sociales da Université de Lille. Pesquisador do Núcleo de Estudos Atores e Agendas de Política Externa (NEAAPE) do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP/UERJ). Sócio Estudante da Associação Brasileira de Relações Internacionais (ABRI).

Tomás Paixão Borges é mestrando em Ciência Política no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ (IESP/UERJ). Bacharel em Línguas Estrangeiras Aplicadas às Negociações Internacionais pelo CEFET/RJ, com período sanduíche no Institut d’Études Politiques da Université de Strasbourg (Sciences Po Strasbourg). Pesquisador do Grupo de Estudos e de Pesquisa em Teoria Política e Pensamento Político Brasileiro (BEEMOTE) e do Núcleo de Estudos, Atores e Agendas de Política Externa (NEAAPE) do IESP/UERJ.

Como citar:
ALBERTO, Felipe Vidal Benvenuto; BORGES, Tomás Paixão. Notas biográficas de Antonio Paim: de militante comunista na União Soviética a guru do liberalismo brasileiro no governo Bolsonaro. Diálogos Internacionais, vol. 10, n. 97, Mar. 2023. Disponível em: https://dialogosinternacionais.com.br/?p=2895

A Diálogos Internacionais (ISSN 2596-2353), B1 pelo Qualis 2017-2020, é uma revista online, mensal de Relações Internacionais,

terça-feira, 3 de maio de 2022

A homenagem de Ricardo Vélez-Rodríguez ao grande mestre Antonio Paim

 Blog de Ricardo Vélez-Rodríguez em: 02/05/2022

ANTÔNIO PAIM: UM ANO DE SAUDADE

Alex Catharino convidou-me para fazer, na noite de 30 de abril, uma live em memória do querido Mestre Antônio Paim (1927-2021), falecido há um ano. Vou pinçar alguns momentos que vivi perto do Mestre, ao longo dos 49 anos durante os quais tive o privilégio de privar da sua amizade e orientação intelectual. 

Lembro-me da manhã da segunda-feira após a semana de Carnaval de 1973, quando o conheci na PUC do Rio. Tinha vindo da Colômbia com uma bolsa da OEA, para fazer o mestrado em Pensamento Brasileiro. O Mestre, que reconhecia um esquerdista à quilômetros, me perguntou acerca do meu interesse pelo Curso. Frisei que me interessava em geral pelo pensamento latino-americano. Ele me respondeu, com certa rispidez, que o Curso da PUC não era de pensamento latino-americano, mas brasileiro. Mas, enfim, queria fazer o mestrado e não discuti com ele. 

Na hora de definir o tema da minha pesquisa, falei que me interessava estudar as origens do autoritarismo brasileiro. Ele me informou, então, que precisaria ler muitos jornais do início do período republicano, pois o autor a ser estudado, Júlio de Castilhos (1860-1903), tinha sido redator de A Federação, o jornal dos ativistas gaúchos alcunhados de Castilhistas, frisando que o pensamento do mencionado autor encontrava-se disperso nos editoriais desse jornal, ao longo das décadas de 80 e 90 do século XIX. 

Topei fazer a pesquisa, para o qual tive de me deslocar por algum tempo para o Rio Grande do Sul, além de consultar as fontes que se achavam no Rio, na Biblioteca Nacional, na Biblioteca do Museu da Marinha. no Real Gabinete Português de Leitura e na Sociedade Sul-riograndense de Cultura. Peguei uma alergia danada por conta dos ácaros presentes nos velhos jornais.

Paralelamente, claro, tive de ler toda a bibliografia existente sobre o Positivismo Gaúcho e as Guerras Civis que ensanguentaram a terra rio-grandense entre 1893 e o final do século XIX (guerra dos Pica-paus e Maragatos) e entre 1922 e 1923 (guerra dos Assissistas contra o eterno presidente do Rio Grande, Borges de Medeiros). E, como se tratava de identificar o pensamento dos Castilhistas em toda a sua extensão, inclusive do ângulo das críticas endereçadas pelos liberais sul-riograndenses contra o positivismo, teria de me familiarizar com os clássicos do Liberalismo: Locke, Montesquieu, Kant, os Pais Americanos (Washington, Madison, Jefferson, Jay, etc.) e com os críticos doutrinários do autoritarismo francês (Guizot, Constant, Tocqueville, Villemain, Cousin, Aron, etc.), além, é claro, de estudar as teses básicas do liberais gaúchos críticos do Castilhismo (notadamente Gaspar da Silveira Martins e Joaquim Francisco de Assis Brasil), assim como o pensamento de Rui Barbosa e Sílvio Romero, no que se refere à crítica à ditadura “científica”.

Defino jocosamente esse período como um autêntico estupro epistemológico. Em pouco mais de um ano tive de dar conta, em rigorosos informes semanais apresentados ao meu orientador (o Mestre Paim, coordenador do Mestrado, tinha definido que ele me orientaria). Apresentei a defesa da minha dissertação em dezembro de 1974, sob o título de: “A filosofia política de inspiração positivista no Brasil: o Castilhismo”. Daí sairia o meu livro intitulado: Castilhismo, uma filosofia da República, já na terceira edição. 

Um efeito colateral importante da minha dissertação: ao ler a ampla bibliografia liberal, notadamente as obras de Tocqueville, pude confessar o que Gilles Lipovetski falou acerca da sua conversão ao liberalismo: “Deixei Marx e adotei Tocqueville”. Pois bem: abandonei o marxismo e virei liberal. Não posso, em virtude disso, não acreditar na validade de uma conversão cultural! 

Continuei estudando o Liberalismo e fiz um Pós-Doutorado no Centre de Recherches Politiques Raymond Aron de Paris (entre 1994 e 1996), sobre o pensamento de Tocqueville, tendo contado com a eficaz e dedicada orientação do meu Mestre Paim e com a ajuda do amigo e saudoso embaixador José Osvaldo de Meira Penna (1917-2017), que me apresentou aos pesquisadores franceses. Foi possível, assim, para mim, receber orientação da grande estudiosa de Tocqueville na França, madame Françoise Mélonio (1951-), autora do clássico Tocqueville et les Français [Paris: Aubier, 1993]. Sob sua orientação publiquei, ulteriormente, pela Editora da Universidade de Toronto, o meu ensaio intitulado: Tocqueville au Brésil [Toronto University Press, The Tocqueville Review, Vol. XX, nº 1 – 1999: 147-176]. A restante parte da minha pesquisa sobre o liberalismo tocquevilliano foi publicada em duas obras: A democracia liberal segundo Alexis de Tocqueville [São Paulo: Mandarim,1998] e O liberalismo francês: a tradição doutrinária e a sua influência no Brasil [Juiz de Fora: Centro de Estudos Estratégicos Paulino Soares de Sousa, 2002] - Edição digital: https://static.poder360.com.br/2018/11/rodriguez_o_liberalismo_frances_trad_doutrinaria.pdf 

Tendo regressado à Colômbia no início de 1975, militei no Partido Liberal chefiado pelo ex-presidente Carlos Lleras Restrepo (1908-1994). Em decorrência das minhas atividades na extrema esquerda anteriores a 1973, não consegui voltar à Universidade Externado de Colômbia, de Bogotá, onde trabalhei antes de viajar ao Brasil para fazer o mestrado. Fui convidado pelo Reitor da Universidade de Medellín, o saudoso amigo Orión Alvarez, para ser pró-reitor de Pós-Graduação e Pesquisa dessa Universidade. De outro lado, lecionei “História das ideias políticas na América Latina” na Universidade de Antioquia, em Medellín, bem como a cadeira “Humanismo de la Técnica” na Universidade EAFIT. Com o pesado clima de violência que se instalou na Colômbia, ao longo do final dos anos 70 e durante a década seguinte, decidi, em 1979, fazer o doutorado em pensamento luso-brasileiro que era oferecido pela Universidade Gama Filho. Pedi licença sem vencimentos nas Universidades às quais estava vinculado em Medellín e fui fazer o doutorado em Pensamento Luso-Brasileiro, na Universidade Gama Filho do Rio de Janeiro. 

Mestre Paim, docente e fundador do Curso, foi o meu orientador. O tema da minha tese foi o pensamento sociológico de Oliveira Vianna (1883-1951), que tinha desenvolvido a categoria de “autoritarismo instrumental” para definir a forma em que o Brasil se modernizou, tentando superar a herança castilhista. O título da minha tese foi: Oliveira Vianna e o papel modernizador do Estado Brasileiro, publicada em 1997. Paim me orientou na identificação do Patrimonialismo brasileiro, estudando as fontes weberianas da tipologia Feudalismo / Patrimonialismo em Max Weber e Karl Wittfogel e mergulhando no estudo da obra de Oliveira Vianna (1883-1951).

Para Paim, seria possível superar o Patrimonialismo. Essa possibilidade radicaria em dois pontos: que a sociedade brasileira recuperasse a valorização da livre iniciativa (que tinha se dado pioneiramente no ciclo do açúcar no Nordeste, no século XVII) e, em segundo lugar, que houvesse um amplo processo de privatizações a fim de diminuir o tamanho do Estado, para consolidar uma representação de interesses no Congresso a partir da qual se pudesse organizar um Estado a serviço da Sociedade, não sobranceiro a ela. As obras de Paim intituladas: A querela do estatismo [3ª edição de 2018], Marxismo e descendência [2ª edição de 2009] e Momentos decisivos da História do Brasil[2ª edição de 2014] encarregaram-se de traçar o plano de voo de desmonte do Estado Patrimonial e de sua progressiva substituição por um Estado concebido a partir do ideal liberal da representação de interesses e de valorização da livre iniciativa. 

No entanto, a conclusão a que o Mestre chegou não é alvissareira: o Estado Patrimonial foi reforçado, infelizmente, com a adoção do esquema cultural do cientificismo, aliado à força estatizante vinculada à burocracia e à classe política, que terminou rejeitando os esforços em prol do aperfeiçoamento da representação, com o paralelo e agressivo surgimento da vulgata marxista que instalou essa ideologia no terreno educacional com a obra de Paulo Freire (1921-1997). Paim chama a atenção, em Momentos decisivos da História do Brasil, para a conclusão a que chega o antropólogo Alberto Carlos Almeida, na sua obra intitulada: A cabeça do brasileiro [Rio: Record, 2007]. Segundo o mencionado antropólogo, a elite brasileira encabeçada pela classe política e a magistratura, endossou claramente a escala de valores do Patrimonialismo, em torno à crença de que de que é lícito se enriquecer com o dinheiro público. Hoje, com o agressivo desmonte da Operação Lava Jato e com a instauração de uma minoria monocrática na cúspide do poder judiciário, definidamente autoritária nos moldes do espírito pombalino, fica claro que será difícil, nas próximas décadas, vencer de vez o Patrimonialismo.

Lembrando o paradoxal título da obra de Barbara Tuchman (1912-1989) intitulada:  A marcha da insensatez [Tuchman, 2012], que destacava a desgraça conjuntural, nos Estados Unidos, da presença de opositores ao progresso liberal simbolizados no Cavalo de Tróia, frisa o Mestre Paim: “No caso brasileiro, as opções também se configuraram, quase sempre tão claras como no confronto entre separatismo e unidade nacional, ou entre sistema representativo e autoritarismo. (...). Ao contrário de corresponder àquela expectativa [do progresso liberal], seria justamente o PT que empreenderia um passo que bem pode estar destinado a fechar-nos de vez à realização daquele que seria o nosso autêntico projeto nacional. Trata-se de que haja conseguido enterrar de vez projeto de constituição da ALCA. Ao invés de estarmos integrados ao que seria o provável desfecho do atual ciclo de globalização - a criação de mercado constituído pela junção dos Estados Unidos com a União Européia - , ingressaremos num período de marginalização cujas dimensões e consequências serão certamente funestas (...)” [Paim, Momentos decisivos da História do Brasil, 2014: 13-15].

Como sairmos do buraco patrimonialista nestes confusos tempos de populismos que se contrapõem? Mestre Paim dá a sua resposta: como o erro da elite brasileira consistiu, justamente, em se esquecer dos rumos da história, substituindo os fatos, no contexto do cientificismo marxista, pelas narrativas, o caminho da regeneração virá pela volta ao estudo dos fatos históricos, como ponto de partida para identificarmos a nossa identidade. Trata-se, portanto, de voltarmos às fontes históricas com o objetivo de “difundir o essencial do patrimonio da historiografia nacional” [Paim, Brasiliana Breve, 2019: 14], no contexto arejado da filosofia culturalista da história. 

Para Paim, “a experiência humana não autoriza inferir como seriam as coisas em si mesmas, isto é, na ausência do próprio homem com seus pontos de vista interessados (referidos a valores). Ao mesmo tempo, radicalizamos o seu posicionamento ao afirmar que toda mudança social pressupõe uma prévia mudança de valoração. (...). Se não desvendarmos as razões do declínio (da mudança), jamais estaremos em condições de compreender por que, nos três séculos subsequentes, terminam sempre em fracasso as tentativas de nos colocar entre as nações capitalistas do Ocidente. Precisamente a essa circunstância denomino de primeiro momento decisivo de nossa história, e neste livro, espero ter capacidade para desvendá-lo” [Paim, Momentos decisivos da história do Brasil,2007: 31].

BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, Alberto Carlos [2007]. A cabeça do brasileiro. Rio de Janeiro: Record.

MÉLONIO, Françoise [1993]. Tocqueville et les Français. Paris: Aubier. 

PAIM, Antônio [2009]. Marxismo e descendência. 2ª edição. Campinas: Vide Editorial.

PAIM, Antônio [2014]. Momentos decisivos da História do Brasil. 2ª edição, São Paulo: Vide Editorial.

PAIM, Antônio [2018]. A querela do estatismo. 3ª edição, Campinas: Távola Editorial / CEDET. 

PAIM, Antônio [2019]. Brasiliana Breve. Uma coleção para difundir a historiografia nacional. Brasília: Edições do Senado Federal, vol. 258. 

TOCQUEVILLE, Alexis de [1977]. A Democracia na América. 2ª edição. (Tradução, prefácio e notas de Neil Ribeiro da Silva). Belo Horizonte: Itatiaia / São Paulo: EDUSP.

TUCHMAN, Barbara [2012].  A marcha da insensatez: De Troia ao Vietnã. (Tradução de Carlos de Oliveira Gomes). Rio de Janeiro: Best Seller / Record. 

VÉLEZ Rodríguez, Ricardo [1980]. Castilhismo: uma filosofia da República. 1ª edição. Porto Alegre: EST / Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul. 2ª edição corrigida e aumentada. (Apresentação de Antônio Paim). Brasília: Senado Federal, 2000. 3ª edição corrigida e aumentada. (Apresentação de Antônio Paim), Brasília: Senado Federal, 2010.

VÉLEZ Rodríguez, Ricardo [1997]. Oliveira Vianna e o papel modernizador do Estado brasileiro. (Apresentação de Antônio Paim). Londrina: Editora da UEL.

VÉLEZ Rodríguez, Ricardo [1998]. A democracia liberal segundo Alexis de Tocqueville. São Paulo: Mandarim.

VÉLEZ Rodríguez, Ricardo [1999]. Tocqueville au Brésil. Toronto University Press, The Tocqueville Review, Vol. XX, nº 1 – 1999: 147-176. 

VÉLEZ Rodríguez, Ricardo [2002]. O liberalismo francês: a tradição doutrinária e a sua influência no Brasil. Juiz de Fora: UFJF - Centro de Estudos Estratégicos Paulino Soares de Sousa, da Universidade Federal de Juiz de Fora - Edição digital: https://static.poder360.com.br/2018/11/rodriguez_o_liberalismo_frances_trad_doutrinaria.pdf 


terça-feira, 29 de junho de 2021

O melhor da Brasiliana ao alcance das novas gerações - Paulo Kramer (Congresso em Foco)

 Uma matéria do início de 2019, mas da qual tomei conhecimento apenas agora, e que transcrevo com o prazer que me dá toda reportagem falando de livros, de conhecimento, de história.

Paulo Roberto de Almeida

O melhor da Brasiliana ao alcance das novas gerações

"A crise da República Velha foi caracterizada por agitações político-militares. Tamanha fermentação de ideias ensejou o surgimento daquela que até hoje é a mais importante iniciativa editorial na área de estudos brasileiros, a coleção Brasiliana-Bibliotheca Pedagógica Brasileira"

A crise da república oligárquica – 1889/1930, período conhecido como República Velha – caracterizou-se por agitações político-militares, cujo maior exemplo foi o Tenentismo, até desembocar na Revolução de outubro/novembro daquele último ano. A intelectualidade de então não passaria incólume por essa conjuntura, com a multiplicação de obras literárias, artísticas (Semana de Arte Moderna, 1922), históricas etc, cada uma traduzindo ao seu modo verdadeira sede de redescoberta do Brasil, em busca das raízes do nosso atraso e dos caminhos para a sua superação.

Tamanha fermentação de ideias ensejou o surgimento daquela que até hoje é a mais importante iniciativa editorial na área dos estudos brasileiros: a coleção Brasiliana-Bibliotheca Pedagógica Brasileira, da Companhia Editora Nacional (São Paulo), significativamente iniciada naquele mesmo ano de 1930. A editora tinha sido fundada em 1925 pelo escritor e homem público Monteiro Lobato (1882/1948), para quem um "país se faz com homens e livros", e por seu sócio e continuador no empreendimento, Octalles Marcondes Ferreira (1901/1973). Como editores, a coleção teve dois homens de saber – primeiramente, o sociólogo e educafor Fernando de Azevedo (1894/1974), seguido, a partir de 1956, pelo historiador Américo Jacobina Lacombe (1909/1993). Foram, ao todo, 387 volumes, mais 26 da série Brasiliana-Grande Formato, reunindo relatos de viajantes, naturalistas e etnólogos estrangeiros que percorreram o Brasil dos séculos 16 a 19;  biografias; tratados de geografia física e humana, economia, monografias regionais, obras sobre os Brasis-Colônia, Império e República. (Na senda aberta por essa Brasiliana, viriam depois outras duas preciosas coleções: Documentos Brasileiros, da editora carioca José Olympio, e Reconquista do Brasil, da mineira Itatiaia.)

Pois bem, agora na virada de 2018 para 2019, as edições do Senado Federal (CEDIT@senado.leg.br, ou http://www.senado.leg.br/publicacoes/conselho), sob o comando desse incansável amigo dos bons livros que é Joaquim Campelo Marques, nos brindam com dois grandes lançamentos. O primeiro deles é a coleção Brasiliana Breve, com 20 volumes, a qual  coloca ao alcance dos leitores de hoje   títulos consagrados  da original, tais como como o Tratado descritivo do Brasil, de Gabriel Soares de Sousa, escrito em 1587, pioneiro estudo sistemático da terra e das gentes; a História geral do Brasil, de Francisco Adolfo de Varnhagen (1816/1878), o visconde Porto Seguro, diplomata e fundador do estudo 'científico' da nossa história; Formação da sociedade brasileira/Populações meridionais do Brasil, do sociólogo e jurista fluminense Oliveira Viana (1883/1951); Descobrimento do Brasil e povoamento -- mais uma 'seleta' --, do cearense Capistrano de Abreu (1853/1927), outro eminente precursor da historiografia nacional; História das bandeiras paulistas, de Afonso d'Escragnolle Taunay (1876/1958);  e Através da Bahia, excertos da Viagem ao Brasil, 1817/1820, dos naturalistas bávaros Carl Friedrich Philipp von Martius  (botánico e antropólogo, 1794/1868) e Johann Baptist von Spix (zoólogo, 1781/1826), membros da missão científica e artística austro-alemã que acompanhou a arquiduquesa d'Áustria, dona Maria Leopoldina (1797/1826), futura imperatriz-consorte do Brasil, para onde viera a fim de se casar com o princípe-herdeiro, depois imperador dom Pedro I (1798/1834). Incorpora, também, estudos recentes,  que não constam da relação original, mas ajudam a iluminar, sistematizar e compreender episódios e figuras marcantes do multissecular painel histórico traçado pela Brasiliana, prolongando-se até a atualidade; são eles: Atuação da Inquisição no Brasil, organizado pelo historiador e filósofo Antonio Paim; Nossa primeira experiência de governo representativo. idem; Personalidades políticas (Independência e Império, verbetes), idem; Castilhismo: uma filosofia da República, do historiador das ideias políticas Ricardo Vélez Rodríguez, atual ministro da Educação; Primórdios da questão social no Brasil e A Frente Liberal e a democracia no Brasil, ambos do advogado e educador Arsênio Eduardo Correia; O estoque brasileiro de capital segundo sua origem, do jornalista e economista Gilberto Paim (1919/2013); e Síntese da trajetória institucional da República brasileira, de Antonio Paim, Ricardo Vélez Rodríguez e Leonardo Prota (1930/2016) – este último, sacerdote católico, estudioso das filosofias nacionais em perspectiva comparada e antigo professor da Universidade Estadual de Londrina (UEL).

Antonio Paim, pensador liberal baiano admiravelmente produtivo nos seus 92 anos de idade, não apenas coordenou a presente seleção da Brasiliana como produziu o segundo “presente” da editora do Senado aos amantes da cultura brasileira: o guia de leitura Brasiliana Breve: uma coleção para difundir a historiografia nacional. Em pouco mias de 100 páginas, ao inacreditável preço de R$ 8,00, ele mobiliza a sua notável erudição, aliada ao talento jornalístico para se comunicar com leitores de qualquer grau de instrução, para esclarecer resumidamente o sentido da nova coleção e os  principais aspectos das 20 obras selecionadas. Achei extremamente úteis, por exemplo, sua explanação de como Varnhagen se valeu de relatos de viajantes e outras fontes coloniais para o seu modelo pioneiro da historiografia brasileira (capítulos II e III); e também o primor de síntese que é o capítulo IV, breve roteiro da evolução política e cultural dopaís desde a Colônia até hoje.

É claro que selecionar sempre implica excluir. Assim, as escolhas, seus critérios e resultados seriam, certamente, tão numerosos e variados quantos porventura fossem os estudiosos encarregados de desenvolver, em separado, diferentes versões da Brasiliana Breve ( ** ). Decerto, todo fá da coleção original tem seus volumes prediletos, e, no meu caso, nenhum deles foi contemplado, a saber: o volume 243, de José Antonio Soares de Sousa, A vida do visconde do Uruguai, 1807/1866, biografia de Paulino José Soares de Sousa, diplomata, membro do Conselho de Estado, senador do Império, autor de seminal Ensaio sobre o Direito Administrativo, a quem Paim considera um dos estruturadores do sistema representativo brasileiro do século 19, cuja evolução gradual no sentido de um lento aperfeiçoamento e uma progressiva ampliação do eleitorado, no marco da monarquia constitucional, viria a ser interrompida com o advento da República. Ou então o volume 340, do historiador mineiro João Camillo de Oliveira Torres (1915/1973), Os construtores do Império: ideais e lutas do Partido Conservador brasileiro. Ou ainda o volume 136, biografia do político e escritor alagoano Aureliano Cândido Tavares Bastos (Tavares Bastos, 1839/1875), adversário liberal do conservador Paulino, escrita pelo seu conterrâneo Carlos Pontes. Da série Grande Formato, sou particularmente afeiçoado aos volumes 6 -- Tomas Ender, pintor austríaco na corte de d. João VI no Rio de Janeiro: um episódio da formação da classe dirigente brasileira, 1817/1818, de J. F. de Almeida Prado -- e 11, de José Honório Rodrigues (1913/1987), brilhante herdeiro de Varnhagen, Teoria da história do Brasil (5ª edição, 1978).

Mas, o importante, mesmo, é que os 20 tomos da Brasiliana Breve, acompanhados do precioso trabalho introdutório de Antonio Paim, possibilitarão que novas gerações de leitores tomem posse desse monumento à nossa memória histórica e cultural, instigando a sua curiosidade para conhecer os demais itens da coleção, hoje felizmente digitalizados e, portanto, ao alcance dos internautas, graças à  iniciativa da Fundação Biblioteca Nacional, no sítio eletrônico www.brasiliana.com.br/brasiliana/colecao.

Este artigo também será publicado na revista Boa Vontade, da LBV, onde Paulo Kramer mantém a coluna Congresso em Pauta


quinta-feira, 3 de junho de 2021

A reflexão de Antonio Paim sobre o liberalismo brasileiro - Mano Ferreira entrevista Paulo Roberto de Almeida

A reflexão de Antonio Paim sobre o liberalismo brasileiro: Mano Ferreira entrevista Paulo Roberto de Almeida no canal do Livres no YouTube


A trajetória intelectual de Antonio Ferreira Paim, nascido na Bahia em 1927 e falecido em 30 de abril de 2021, é ímpar na cultura e na história das ideias políticas e filosóficas no Brasil. Após ter uma formação marxista, com curso de filosofia na Universidade do Brasil e depois na Universidade de Moscou, Paim realizou uma guinada política e filosófica que o levou ao liberalismo.
Neste #LivresEntrevista com o embaixador Paulo Roberto de Almeida, conselheiro acadêmico do Livres, analisamos aspectos centrais da obra de Antonio Paim: sua visão a respeito do patrimonialismo, os momentos decisivos da história brasileira e as condições sociais para a consolidação no país de modelos de Estado e sociedade compatíveis com o liberalismo, seja no campo econômico, com o capitalismo, ou no campo político, com a democracia liberal.
## Quem é o entrevistado? ##
Paulo Roberto de Almeida é diplomata de carreira desde 1977, autor de diversos livros, doutor em Ciências Sociais, ex-diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais e conselheiro acadêmico do Livres. Autor de diversos livros, entre eles o e-book
## Quem é o entrevistador? ##
Mano Ferreira é jornalista e especialista em comunicação política, cofundador e diretor de comunicação do Livres. Alumni da International Academy for Leadership da Fundação Friedrich Naumann Pela Liberdade, da Alemanha. Também é cofundador do Students For Liberty no Brasil.
## Sobre o quadro ##
O #LivresEntrevista é o quadro em que recebemos importantes especialistas para aprofundar a conversa a respeito das ideias liberais e dos principais temas em debate no Brasil e no mundo. Vídeos novos são publicados toda quarta-feira e em segundas-feiras alternadas.
## Sobre o Livres ##

O Livres é uma associação civil sem fins lucrativos que atua como um movimento político suprapartidário em defesa do liberalismo. Promovemos engajamento cívico e desenvolvimento de lideranças, projetos de impacto social e curadoria de políticas públicas para aumentar a liberdade individual no Brasil. 


quinta-feira, 6 de maio de 2021

Antonio Paim: um mestre aos 87 anos - Ricardo Velez-Rodriguez (2014)

 Um antigo texto de um de seus apreciados discípulos

domingo, 13 de abril de 2014

Antonio Paim: um mestre aos 87 anos - Ricardo Velez-Rodriguez

Uma singela homenagem a um dos maiores pensadores brasileiros.
Site Rocinante, em 10/04/2014
http://pensadordelamancha.blogspot.com/2014/04/o-aniversario-do-mestre-antonio-paim.html

O ANIVERSÁRIO DO MESTRE ANTÔNIO PAIM

Da esq. para dir.: Maria, Arsênio, Leonardo, Anna Maria, Ricardo, Rosa, o mestre Antônio Paim, Augusta e Antônio Roberto



No passado 7 de Abril, um grupo de familiares, amigos e discípulos de Antônio Paim,  comemoramos em São Paulo os 87 anos do mestre. O evento aconteceu na Tasca do Zé e da Maria, em Pinheiros. A filha Augusta (que mora em S. Paulo) e a amiga Rosa Mendonça de Brito (residente em Manaus), planejaram tudo. Foi uma festa surpresa para o querido mestre. As organizadoras teriam gostado que mais amigos e discípulos do Antônio Paim estivessem presentes. Mas com o corre-corre foi difícil entrar em contato com mais pessoas. 

Estiveram presentes: Maria e Arsênio Corrêa (S. Paulo), Leonardo Prota (Londrina), Anna Maria Moog (Petrópolis), Ricardo Vélez Rodríguez (Londrina), Rosa Mendonça de Brito (Manaus), Augusta Fonseca Paim (S. Paulo) e Antônio Roberto Batista (S. Paulo).

Antônio Paim é um desses educadores que conseguem manter nexos de amizade com as várias gerações de discípulos que passaram pelas suas aulas. Coloco, a seguir, os depoimentos de três discípulos do mestre: Anna Maria Moog, Rosa Mendonça de Brito e Arsênio Corrêa. 

Eis o depoimento da Anna Maria Moog: "Ao receber o e-mail de Rosa (Mendonça de Brito)  propondo que eu fosse, dali a dois dias, participar de um jantar comemorativo do aniversário de mestre Antonio Paim, pensei que não conseguiria me desvencilhar dos compromissos prévios.  Mas logo decidi colocar tudo de lado e viajar para S. Paulo .  Valeu a pena. Foi uma enorme alegria estar com amigos de longa data, unidos justamente pela amizade, respeito e admiração que nutrimos pela figura de Paim. Ao longo dos anos, Antonio Paim tem sido nosso norte, a referência inelutável para seus amigos, ex-alunos e admiradores de sua obra, sobre todos os temas relativos à cultura, à filosofia, à moral e à política.  Acima de ser referência intelectual, reconhecemos nele o homem de bem, de postura discreta mas capaz de iluminar com suas palestras inteligentes e, por vezes, espirituosas, nossas reuniões.  O homem que nunca faltou  com seu apoio aos que a ele recorreram e jamais, jamais deixou um amigo 'na mão'.Inúmeros depoimentos sobre sua pessoa já o declamaram de sobejo. Por esse, e muitos mais motivos, o jantar dos 87 anos do jovem Antonio Paim foi festejado  com alegria, mormente porque proporcionou aos amigos a oportunidade de lhe demonstrar mais uma vez o carinho que lhe temos e a alegria de o abraçarmos".

A seguir, o depoimento de Rosa Mendonça de Brito: "O encontro com Paim, Augusta, Anna Moog, Leonardo Prota e Ricardo Vélez,   encontro de mestre e discípulos, colegas e amigos, em São Paulo, na Tasca do Zé e da Maria me fez retroceder no tempo e chegar a 1975, 39 anos atrás, quando da seleção para o Mestrado em Filosofia da PUC/RJ. Vencidas as duas etapas da seleção, a avaliação do projeto de dissertação e prova de língua estrangeira, tinha que encarar uma entrevista com três professores do Programa. Lembro-me que tive de passar pelo crivo de Celina Junqueira e de Antonio Paim, não me recordo do nome do outro professor. Naquele momento, quando da entrevista, uma pergunta de Paim me marcou profundamente. O mestre perguntou: 'EU GOSTARIA QUE VOCÊ ME EXPLICASSE POR QUE O HUME DESPERTOU O KANT DO SONO DOGMÁTICO?' Minha resposta foi: 'não sei, faço tal afirmação porque ela sempre esteve presente nos livros que estudei e nas aulas dos meus professores, mas nunca li ou ouvi qualquer explicação sobre a afirmação'. A resposta para o desconhecimento foi uma bela aula que nunca mais esqueci. Aceita, após aprovação na seleção, para compor a turma de Mestrandos de 1976, voltei a encontrar Antonio Paim em sala de aula. Minha intenção era fazer o Mestrado em Filosofia da Ciência, mas suas aulas me levaram a optar pela área de Filosofia Brasileira e procurá-lo para pedir - e confesso que bastante temerosa -, para que ele me orientasse. Para minha satisfação, ele aceitou. Naquela jornada, a fim de suprir a minha deficiência de conhecimentos - me sentia uma formiga diante de elefantes - e não decepcioná-lo, estudava pelo menos 18 horas por dia. Entrava na PUC às sete da manhã e saía às dez da noite, quando a Biblioteca fechava. Em casa, estudava pelo menos até 2 da madrugada, mas valeu a pena! Paim se colocava a disposição e, além disso, disponibilizava livros, orientava na busca de documentos e obras que deveria estudar. Defendida a Dissertação, em 1979, voltei para Manaus, mas não perdi o contato com o Mestre, que já considerava amigo. Com a criação do Doutorado em Filosofia Luso-Brasilera, na Gama Filho, submeti para a seleção de 1982 o meu Projeto de Tese com tema sugerido por Paim, feito da seguinte forma: 'Você topa realizar um estudo sobre a Filosofia de Kant no Brasil? É um estudo denso, mas é muito importante para o pensamento brasileiro'. Eu lhe perguntei: 'O senhor acha que eu tenho competência para realizar este trabalho?'  A resposta foi: 'sim, tenho certeza que você fará um bom trabalho'. Era um estudo que ele pretendia realizar 5 anos mais tarde, mas que, acreditando na minha capacidade, o delegou a mim. Diante da demonstração de confiança,  senti-me lisonjeada e, apesar de apavorada com a dimensão e profundidade do estudo, resolvi aceitar o desafio. Enfrentei algumas dificuldades: doença, fechamento do setor de obras raras da Biblioteca Nacional, 2 filhos pequenos (Márcio com 1 ano e meio e Gisele com dois anos e oito meses), falta de empregada de confiança. Apesar disso, consegui com a orientação segura e indispensável de Paim, concluir o doutorado em três anos, tendo a honra de ter como membros da banca de defesa, além de Antonio Paim, Anna Maria Moog, Creuza Capalbo, Ricardo Vélez e Aquiles Guimarães, amigos queridos a partir de então.Naquele momento, além da dimensão de educador, descobri em Paim uma dimensão humana fantástica. Nunca passou a mão na minha cabeça, ao contrário, exigia o máximo de mim, cobrava o tempo todo, mas ajudava sempre através de discussões, de indicação de onde encontrar com pessoas ou instituições o material para o desenvolvimento do trabalho que envolvia pesquisa em obras raras. Evaristo de Moraes Filho, por intermédio de Paim, me disponibilizou a sua biblioteca particular, em sua casa, para que ali realizasse estudos em obras não encontradas em outro lugar. Paim fez muito mais! Levando em consideração que eu tinha duas crianças pequenas, fazia a minha orientação em seu apartamento no Leme, com isso, tornei-me amiga de Rita, sua mulher, e suas filhas Juliana e Augusta. Toda semana, quando ia para o encontro de orientação e não tinha com quem deixar os meus filhos, eu os levava. Juliana e Augusta ficavam com eles enquanto me era dado o privilegio de receber magníficas aulas. Paim foi fundamental para o meu desenvolvimento intelectual. Ser-lhe-ei eternamente grata. Ele será sempre o meu guru e mestre favorito!"

A seguir, transcrevo o depoimento de Arsênio Corrêa: 

"Antonio Paim sempre disseminando conhecimento, conhecimento é vida, vida é alegria e a alegria é a razão de viver do ser humano. Antonio Paim é um mestre na mais pura acepção, porque a busca do saber é incessante, vibrante, contagia a todos que com ele convivem. Aprendi com ele que a pesquisa deve ser constante, sem ela nós somos ultrapassados, o tempo deve ser aproveitado, ao ser humano cabe construir e manter o conjunto do saber da humanidade, isso ele nos faz ver em todos os encontros.Aprendi com o mestre o valor da cultura".

Quem é Antonio Paim, o filósofo baiano - Guilherme Evelin (Revista Época, 2019)

Quem é Antonio Paim, o filósofo baiano que fez a cabeça do ministro da Educação

Paim é visto como um mestre pelos liberais-conservadores que passaram a orbitar em torno da Esplanada dos Ministérios
https://epoca.globo.com/quem-antonio-paim-filosofo-baiano-que-fez-cabeca-do-ministro-da-educacao-23361323
O professor Antonio Paim, guru do ministro da Educação, Ricardo Veléz Rodríguez Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
O professor Antonio Paim, guru do ministro da Educação, Ricardo Veléz Rodríguez Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

Em seu discurso de posse no dia 2 de janeiro, em meio a críticas ao globalismo, ao pensamento gramsciano, ao marxismo cultural e à ideologia de gênero — o quarteto eleito como alvo preferencial dos ataques da ala ideológica do governo Jair Bolsonaro —, o ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, explicou que a “inspiração liberal-conservadora” de suas propostas educacionais, que pregam a recuperação dos valores culturais tradicionais e religiosos, vinha de “dois grandes educadores”: Antonio Paim e Olavo de Carvalho.

A ascendência do “guru da Virginia” — como Olavo de Carvalho passou a ser chamado pelos bolsonaristas — sobre o novo governo instalado em Brasília se tornou bem conhecida. Além de opinar a favor da escolha de Vélez Rodríguez para o Ministério da Educação, Carvalho também atuou pela nomeação do embaixador Ernesto Araújo para o Itamaraty. Menos alardeada, a influência das ideias de Paim é igualmente importante em setores do novo governo, e a figura do filósofo baiano é tão ou mais reverenciada que a de Carvalho.

Autor de obras como "Histórias das ideias filosóficas no Brasil" e "Evolução histórica do liberalismo", Paim é também tratado como um mestre pelos liberais-conservadores que passaram a orbitar em torno da Esplanada dos Ministérios. “Paim mostrou que a luta pelo sistema democrático-representativo e pluralista produz resultados humanamente mais aceitáveis que os sistemas cooptativos do antigo Leste Europeu, de Cuba, da Venezuela bolivariana e da China comunista”, disse o cientista político Paulo Kramer, que fez parte da equipe de transição do governo Bolsonaro e foi coautor de um livro com Paim e Vélez Rodríguez sobre o “novo patrimonialismo brasileiro”, publicado em 2015.

Para o cientista político Christian Lynch, professor da Fundação Getulio Vargas no Rio de Janeiro, “Paim é autor de uma obra ciclópica e muito respeitável sobre a história das ideias filosóficas no Brasil, que é um clássico da área”. “A preocupação central em seus textos sobre o pensamento político brasileiro tem sido compreender as raízes do iliberalismo no Brasil, que ele acredita radicar numa incompreensão da questão da representação política”, acrescentou Lynch. “Nos últimos 20 anos, o prestígio do socialismo ou da social-democracia foi relegando alguns intelectuais a um lugar marginal na academia e na mídia, como se fossem dinossauros em extinção. Com o retorno do conservadorismo, depois de 30 anos, esses autores voltaram à voga.”

Prestes a completar 92 anos, Paim, nascido em Jacobina, no interior da Bahia, vive hoje numa casa de repouso particular para idosos, repleta de jardins e com um lago, no Jardim Bonfiglioli, bairro de São Paulo, às margens da Rodovia Raposo Tavares. ÉPOCA o encontrou lá em dois domingos, dia que ele reserva para ouvir música clássica, num quarto em que mantém uma TV, um computador e uma estante com seus livros e fotos de suas duas filhas. Paim precisa recorrer a um andador para se locomover, mas, em meio a alguns resmungos contra a velhice (uma m..., resume), ele se mantém bem-humorado, com uma conversa afiada e atualizado sobre tudo que ocorre com o governo Bolsonaro. 

O ministro da Educação Ricardo Vélez Rodriguez, na posse de seu cargo, cumprimenta seu antecessor Rossieli Soares Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil
O ministro da Educação Ricardo Vélez Rodriguez, na posse de seu cargo, cumprimenta seu antecessor Rossieli Soares Foto: Marcello Casal Jr / Agência Brasil

Sua ligação mais direta com o novo governo é, claro, com Vélez Rodríguez, com quem falou, por telefone, para desejar sucesso no governo. O ministro da Educação foi seu aluno quando chegou ao Brasil na década de 70, com uma bolsa da Organização dos Estados Americanos (OEA) para estudar pensamento brasileiro num curso ministrado por Paim na Pontifícia Universidade Católica (PUC) no Rio de Janeiro. Paim rememora, com prazer, como conheceu Vélez Rodríguez, colombiano de nascimento, depois naturalizado brasileiro. “No primeiro dia de aula, ele falou em América Latina. Eu disse a ele: Você ganhou uma bolsa para estudar pensamento brasileiro. Não me venha com conversa de América Latina, que isso não existe aqui’. Ele, ainda um garoto, não respondeu nada e ficou em pânico”, contou Paim, aos risos.

O mestre disse que depois o “discípulo” se mostrou de grande valor e fez uma pesquisa primorosa sobre o caudilho gaúcho Júlio Prates de Castilhos (1860-1903), prócer do começo da República brasileira. Castilhos ajudou na difusão do positivismo, doutrina filosófica importada da França com grande penetração entre os militares brasileiros e inspiração do lema “Ordem e Progresso”, inscrito na bandeira nacional. A pesquisa redundou depois no livro Castilhismo, uma filosofia da República, de Vélez Rodríguez. A obra bebe no pensamento de Paim. Para o filósofo, “o positivismo era um troço primitivo”, a República foi instalada no Brasil por meio de “um golpe de Estado” articulado por uma minoria e a derrubada da monarquia em 1889 foi “um retrocesso brutal que abortou a construção no país de instituições representativas democráticas” no modelo liberal inglês — para Paim, o ápice da civilização política.

Paim e Vélez Rodriguez também comungam a mesma ojeriza às ideias socialistas e ao que eles chamam de doutrinação marxista nas universidades brasileiras. Para o filósofo baiano, o “Brasil é o único país do mundo, além da França, onde o comunismo parece que não acabou”. Ele diz ainda que “um marxismo vagabundo” prolifera nos campi nacionais. “A USP é hostil ao pensamento brasileiro. A Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, órgão do Ministério da Educação responsável pela supervisão dos cursos de pós-graduação) está na mão dos comunas, dos marxistas. O MEC só dá passagem e bolsa para quem está na chave gramsciana. Se você não estudar Gramsci, você perde o emprego. É exatamente isso”, afirmou Paim, que considera Gramsci um “totalitário”. Ele manifesta a esperança de que o novo ministro “vai liquidar isso”. “Não tem cabimento dar ao Estado o poder de dar pontuação às instituições culturais”, afirmou Paim, referindo-se ao método usado pela Capes para avaliar a pós-graduação.

Mestre e discípulo têm uma velha pinimba com a Capes. Em 2009, Vélez Rodríguez publicou um artigo na imprensa em que acusou os “burocratas da Capes no setor de filosofia” de agir de forma persecutória, entre 1979 e 1999, para extinguir os cursos de graduação e pós-graduação em filosofia brasileira, um nicho de atuação de filósofos conservadores, considerados minoritários na academia brasileira.

Segundo Vélez Rodríguez, “uma guilhotina ideológica” ceifou esses cursos por eles serem considerados de direita. A ação teria sido comandada por antigos ativistas marxista-leninistas, seguidores do filósofo e padre jesuíta Henrique Claudio de Lima Vaz. Vaz era mentor, na década de 60, da Juventude Universitária Católica (JUC) e da Ação Popular (AP), uma corrente política de esquerda em que militaram, no passado, José Serra e Herbert de Souza, o Betinho, entre outros. Quase uma década depois de sua publicação, o artigo de Vélez Rodríguez continua a reverberar no mundinho acadêmico. Após sua nomeação para o Ministério da Educação, circulou um manifesto de professores de filosofia, assinado inclusive por Marilena Chauí, que rebate “as insídias” contra o padre Vaz.

A rixa de Paim e Vélez Rodríguez com os seguidores do padre Vaz dura décadas. Paim diz que foi “boicotado” por antigos militantes da AP, quando eles assumiram o Departamento de Filosofia da PUC do Rio de Janeiro no final da década de 70. Uma reforma foi feita na pós-graduação, e o curso de filosofia brasileira, de Paim, foi retirado do currículo. Quando textos do jurista e filósofo Miguel Reale — mestre de Paim e pai do ex-ministro da Justiça Miguel Reale Jr., um dos autores do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff — foram retirados de uma antologia distribuída aos alunos, Paim publicou uma “denúncia” em forma de artigo no Jornal do Brasil.

A polêmica gerou meses de controvérsia na imprensa nacional e depois virou o livro "Liberdade acadêmica e opção totalitária". “Excluíram o Miguel Reale porque ele tinha sido integralista, o que é um absurdo. Eu tinha arrumado bolsas para os marxistas, em pleno governo militar, porque achava um absurdo a discriminação a eles, mas a convivência é difícil. Você não deve dar cargo de poder a eles, porque eles vão liquidar os outros. É da alma deles”, disse Paim.

Raul Landim, ex-diretor do Departamento de Filosofia da PUC, tem uma versão diferente. Disse que a exclusão do curso de filosofia brasileira estava relacionada a uma modernização do departamento para adequá-lo à realidade de outros cursos de filosofia no mundo. Da mesma forma, a antologia de textos distribuída aos alunos passou a incluir apenas filósofos considerados clássicos.

“Fui da AP, mas não sou marxista, como também não era o padre Vaz. Estávamos preocupados em melhorar a competência dos alunos, mas o Paim transformou tudo em questão ideológica”, disse a ÉPOCA Landim, hoje professor aposentado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na última terça-feira 8. A querela não terminou bem para ele. Seis meses depois, Landim e outros professores perderam seu emprego na PUC. Ele acha que a polêmica teve um efeito indireto em sua saída.

Apesar desse passado, Paim avalia que Vélez Rodríguez deve agir com prudência em sua faxina ideológica no Ministério da Educação. “Não pode generalizar. O Ministério da Educação tem muito funcionário decente. Não pode achar que tudo é marxista, tudo não presta, como os procuradores fizeram com a classe política. Não é bem assim”, afirmou. Perguntado sobre o Escola sem Partido, Paim disse que os professores devem adotar a mesma postura que ele tinha na sala de aula.

“Em meu tempo de professor, eu dava um curso sobre Kant (Immanuel Kant, filósofo alemão do final do século XVIII, considerado um dos pilares da filosofia moderna). Eu transmitia a eles como ler "A crítica da razão pura", mas não fazia doutrinação. Se eu fizesse isso, dizia a eles que podiam me criticar e me botar para fora”, afirmou. Paim disse que o curso de filosofia serve para ter conhecimento de todos os principais pensadores, inclusive Marx. Mas ressalva que Marx deve ser lido à luz da “complexidade do idealismo alemão”. Fora desse contexto, alertou, “marxismo vira bestialógico”.

Antes de virar um conservador e um anticomunista ferrenho, como ele próprio admite, Paim fez um caminho sinuoso. Foi ele próprio um comunista de carteirinha. Na juventude dos seus 20 e poucos anos, estudante no Rio de Janeiro, entrou no Partido Comunista do Brasil, o Partidão, entusiasmado com a União Soviética depois da Segunda Guerra Mundial. Achava que os soviéticos encarnavam a liberdade, que não existia na ditadura de Getulio Vargas.

Virou secretário de redação da Tribuna Popular, o jornal do partido, em que militava, entre outros, o poeta Carlos Drummond de Andrade. Durante o governo de Gaspar Dutra (1946-1951), num enfrentamento de jornalistas e gráficos que resistiram a bala a uma ação da polícia para fechar o jornal, levou um tiro que o deixou com um buraco na cabeça e foi condenado a sete anos de prisão. Foi enviado para uma casa de detenção, onde, segundo Paim, o diretor queria matá-lo. Paim contou que numa ocasião em que o diretor tentou pegá-lo com as mãos pelas grades da cadeia, reagiu e quase quebrou o braço do agente. Como punição, foi mandado para um cubículo numa solitária, onde ficou em condições degradantes. “O anticomunismo brasileiro era de um primarismo brutal. Uma pessoa com um mínimo de caráter ou enfrenta aquele negócio, ou se avacalha. Aí, eu virei comuna mesmo”, afirmou.

Depois de uma inspeção feita por uma Comissão da Câmara dos Deputados, Paim foi reconhecido como preso político e enviado para uma penitenciária onde, em condições melhores, cumpriu pena de dois anos e dois meses de prisão. Solto, virou dirigente do Partido Comunista. Em 1953, foi enviado para a União Soviética para estudar teoria leninista, na Universidade Lomonosov, em Moscou. Aprendeu a ler O capital, de Marx, em russo para traduzi-lo para o português. Paim disse que transformou-se em um “bolchevique sem alma, sem amigo, sem família, sem p... nenhuma, integrante de uma casta devotada à causa”.

Na Universidade Lomonosov, Paim, porém, apaixonou-se pela russa Margarita Anatolia Rodanov — que fazia a tradução simultânea para os brasileiros. Seus colegas comunistas não gostaram daquele namoro, porque achavam que atrapalhava as relações do Partido Comunista brasileiro com o soviético. Terminado o curso, Paim voltou para o Brasil, mas ficou poucos meses aqui antes de resolver voltar para a União Soviética para casar com Margarita.

“O amor foi um processo de humanização para mim”, declarou numa ocasião Paim, que disse ter sido salvo do comunismo pela paixão. Ele foi gradualmente afrouxando os laços com o partido. A ruptura final veio com a divulgação dos crimes de Stálin com o relatório Kruschev, de 1956, quando Paim ainda morava na União Soviética. “Fui eu que lutei para distribuir o relatório para o Partido Comunista brasileiro. Não dava para ficar no partido depois daquilo. Da minha geração, ninguém ficou”, contou Paim. O processo de desencanto daquela geração com o stalinismo é contado no livro "O retrato", de outro ex-comunista baiano, Osvaldo Peralva, que foi jornalista da Folha de S. Paulo. A reedição de 2015 de "O retrato" tem prefácio assinado por Paim. “A leitura de 'O retrato' pode contribuir para que pessoas de bom senso revejam esse tipo de opção”, escreveu o filósofo na apresentação. 

Depois de conseguir a autorização do regime soviético para que Margarita saísse da Rússia, Paim voltou para o Brasil com a mulher. Instalaram-se em Copacabana, no Rio de Janeiro, tiveram uma filha. Mas o casamento com Margarita, que traduziu Machado de Assis e fez um dicionário russo-português, durou pouco. Por volta de 1962, quando o Brasil já vivia o acirramento dos ânimos anticomunistas que culminaria no golpe militar contra o governo João Goulart em 1964, a russa resolveu voltar, com a filha, para a União Soviética, onde a mãe era uma dignitária do regime. Paim confessou ter ficado “desarvorado”. “Eu era muito agarrado a minha filha. Era um potocozinho”, disse Paim, que nunca mais a viu. Não é o único momento que usa da suavidade baiana para se referir a suas ligações com antigos camaradas e a Rússia soviética. “O povo russo é uma gente muito simpática, bonita, alegre. Sinto saudades deles, do período em vivi lá”, contou. Recentemente, disse ter descoberto a existência de duas netas na Rússia. Uma delas, volta e meia, lhe escreve e-mails em português — e torna a desaparecer.

O processo de saída do marxismo, disse Paim, foi igualmente penoso. “Uma coisa é sair do Partido Comunista, outra é sair do marxismo”, explicou. Ele fez a opção deliberada de “passar anos estudando para aprender” e conseguir o rompimento com a antiga ideologia. “O Fernando Henrique não fez isso e continuou se arrastando”, disse. Passou a estudar Kant com um engenheiro alemão, especialista na obra do filósofo. Com ele, disse Paim, fez “terapia kantiana” para se libertar do marxismo. A transição para o liberalismo conservador, brincou, foi igualmente “gradual, lenta e segura”. Por um tempo, flertou com a social-democracia. Contou que só virou liberal mesmo em meados da década de 70, depois de ter estudado como o liberalismo inglês se reformou, ao longo do século XIX, para tornar suas instituições políticas mais representativas.

Paim se disse animado com a perspectiva de dar maior consistência programática às várias propostas liberais que ganharam força nos últimos anos no Brasil. Disse ter o lido o programa do PSL, o partido de Bolsonaro, e o achou “muito bom”. Considera que o novo presidente “tem uma proposta liberal, sem dúvidas”, e que ele pode liquidar o PT, outro porta-voz do que ele chama de “marxismo vagabundo”. Mas mantém um certo ceticismo em relação aos resultados que podem ser alcançados pelo novo governo. “O Brasil elegeu um governo militar-liberal. Tem mais milico lá do que no tempo do Castello Branco. É um arranjo complicado. Você não pode dizer isso a priori, mas pode não dar certo. Depende muito da relação com o Congresso”, disse.

Em relação ao Brasil, Paim disse ter menos ilusões ainda. “Se não houver um cataclismo que mude sua base social, o Brasil jamais será um país desenvolvido”, afirmou. Adepto de uma filosofia que faz uma leitura culturalista das sociedades, ele acha que o obstáculo está relacionado a valores morais desenvolvidos nos tempos do período colonial, quando a Inquisição impediu que o país acompanhasse a Revolução Industrial. “No Nordeste, havia um dito: ‘Não herdou, não roubou, emerdou’. Isso mostra que o ódio ao lucro e à riqueza é um troço arraigado, profundo, no Brasil. A moral social é muito ruim. O grande obstáculo que impede a sociedade liberal no Brasil é a Igreja Católica. A Igreja Católica é hoje uma espécie de Partido Comunista”, disse Paim. Segundo ele, o máximo que o Brasil poderá aspirar em termos de participação da riqueza mundial será como país agroexportador, graças ao sucesso do agronegócio. “E PT Saudações”, completa ele, peremptório.