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quinta-feira, 11 de maio de 2023

Demetrio Magnoli sobre equivocos de gregos e goianos (FSP)

 O Livres, em lugar de defender as liberdades em abstrato, deveria refletir a partir de alguns argumentos de Demetrio Magnoli.

 Folha de S. Paulo, 11/05/2023

Plataformas temem a corresponsabilização por discursos que publicam

Sempre que leio os argumentos dos que se opõem ao PL das Fake News, torço pela sua aprovação. Quando, porém, leio os argumentos dos defensores do PL, torço pela sua rejeição.

Se escrevo um texto criminoso neste espaço, a Folha partilha o ônus jurídico; se uma rede social difunde o mesmo texto, sofro sozinho as potenciais consequências, enquanto a plataforma contabiliza os lucros. As plataformas de internet temem, acima de tudo, o núcleo correto do PL: a corresponsabilização por discursos criminosos que publicam. O modelo de negócio delas organiza-se em torno do impulsionamento da palavra que acirra emoções primitivas –ou seja, no mais das vezes, o discurso extremista. Por isso, rejeitam as leis de responsabilidade que regulam a imprensa.

Os oponentes do PL alargam o conceito de liberdade de expressão até fazê-lo abranger o crime. O Facebook foi o veículo principal da campanha de limpeza étnica conduzida pelos militares de Mianmar contra os muçulmanos Rohingya. Foi, igualmente, o megafone da campanha de ódio do governo nacionalista hindu de Narendra Modi contra os muçulmanos indianos.

Discursos exterministas circulam nas redes, mirando judeus, cristãos, negros e uma infinidade de outros grupos. No Brasil, as plataformas serviram à campanha antivacinal de Bolsonaro e à articulação dos atos golpistas do 8/1. O que é crime fora das redes, é crime nas redes. Os inimigos do PL almejam perpetuar a "liberdade" de disseminar discursos criminosos.

Mas queremos criminalizar o crime ou a mentira? No seu texto, acertadamente, o PL limita-se ao primeiro. Já seus defensores mais entusiasmados clamam pela eliminação da "mentira", da "desinformação". As freiras imaculadas esqueceram que a inverdade é parte do discurso político desde (pelo menos) os debates no Senado Romano no século anterior à Era Cristã?

O episódio Google evidenciou a extensão da ira santa. O Google violou a confiança de seus usuários ao transformar a página neutra de busca em suporte de um link editorial. Foi um gesto antiético de uma empresa na sua relação privada com os consumidores. Ela plantou a semente da desconfiança sobre seu bem mais precioso, que é o mecanismo de busca, mas não cometeu um crime contra a ordem pública.

Segundo a lógica do PL, o Google deve ser tratado como veículo de imprensa. Nesse caso, o que ele produziu foi, apenas, um editorial. As freiras reagiram enrolando-se no sagrado pendão auriverde e invocando nada menos que a Pátria e a Soberania (maiúsculas, aí). Juízes sem freios entraram no jogo, anunciando sanções preventivas e exigindo uma "imparcialidade" que não figura em nenhuma lei. Por algumas horas, o Brasil vestiu-se com as fantasias da China, da Rússia, do Irã ou da Arábia Saudita...

Banir a "desinformação"? Prenderemos o bolsonarista que qualificar o AI-5 como um instrumento da "guerra ao comunismo"? Encarceraremos o arauto brasileiro de Putin que justifica a invasão da Ucrânia pelo "combate ao nazismo"? Também sentenciaremos Lula por classificar um impeachment fiscalizado pelo STF como golpe de Estado?

As freiras histéricas não escondem sua utopia mais perigosa: entronizar a Verdade (com maiúscula). Entretanto, como se sabe, o Reino da Verdade é, invariavelmente, o outro nome do totalitarismo. A democracia recusa a verdade oficial. Nela, o que existe são verdades, no plural –e, justamente por esse motivo, admite-se a liberdade partidária e exigem-se eleições competitivas.

O PL tem defeitos óbvios, como a cláusula vergonhosa que permite à casta parlamentar a produção de discursos vedados aos demais e as ambiguidades sobre a fonte e natureza de um indefinido órgão regulador. Seus inimigos, contudo, encontraram um ponto mais frágil, que se situa fora dele: o discurso de seus defensores. É que, de fato, muitos deles sonham com a Censura do Bem.”



quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Demetrio Magnoli desmonta a hipocrisia dos poderosos (O Globo)

Tábuas da aliança

Demetrio Magnoli

O Globo, 26 de dezembro de 2022

 

Gilmar Mendes, operando monocrática e politicamente, torpedeou a chantagem de Arthur Lira, retirando o Bolsa Família do teto de gastos. Lula não precisava mais do Centrão para cumprir suas promessas centrais de campanha. Mas a PEC, explicaram os próceres do PT, era ''o Plano A, o B e o C''. Já não se tratava de colocar comida na mesa dos pobres. O plano obsessivo era - e é - cooptar uma ampla facção do bolsonarismo para o governo.

Foi por pouco, seis a cinco, e na última hora. A maioria do STF operou juridicamente, resistindo à tentação da politicagem, ao declarar a inconstitucionalidade do ''orçamento secreto''. Os negociadores de Lula usaram a decisão para concluir o pacto de aliança com Lira, repartindo ao meio o fruto envenenado.

''Genocida!'', ''pedófilo!'', ''canibal!'' - ninguém, exceto militantes fanáticos, tem o direito de continuar a levar a sério o rugido santo do lulismo. O agora camarada Lira funcionou como esteio indispensável de Jair Bolsonaro. As duas tábuas da aliança votadas no Congresso - a PEC da Transição e a divisão das verbas do extinto ''orçamento secreto'' - evidenciam que, se depender de Lula, o comandante parlamentar das forças bolsonaristas se tomará um baluarte do novo governo.

A imprensa afogou-se em eufemismos. Crédito extraordinário? Não: a PEC oferece segurança jurídica mais robusta. Pacto com o bolsonarismo? Sim: disso depende a sacrossanta ''governabilidade''. Tudo que era sólido desmancha-se no ar: o escandaloso converte-se em natural, necessário, quase sábio.

Só que é mentira.

A nova Câmara, embora bastante conservadora, propicia a construção de maioria sem o bolsonarismo. Uma base constituída pelos partidos que apoiaram Lula no turno final mais MDB, PSD, PSDB e Cidadania somaria 241 deputados, contra 194 dos cinco partidos bolsonaristas (PL, PP, Republicanos, PTB e PSC). Os 16 faltantes para a maioria absoluta encontram-se em facções dos demais partidos, especialmente no União Brasil. A paisagem não é diferente no Senado. Uma base constituída em linhas similares teria 41 cadeiras, contra 24 dos partidos bolsonaristas. Faltaria, para a maioria, apenas um voto entre os 16 senadores restantes.

Lula tinha, portanto, a oportunidade de governar sem Lira e sem o bolsonarismo, aprovando leis e medidas provisórias. Só faltariam votos para passar PECs - mas, num país normal, emendas constitucionais não devem ser vistas como ferramentas de governo. Dessa constatação, nasce a indagação: por que o presidente eleito escolhe, voluntariamente, a aliança com a direita bolsonarista?

Uma pista para a resposta encontra-se na aprovação da PEC do Calote, em dezembro de 2021, que adiou o pagamento de precatórios, e da PEC Kamikaze, em julho, que inventou uma ''emergência'' para ampliar o valor do Auxílio Brasil. No primeiro episódio, cinco dos seis senadores petistas votaram com o bolsonarismo. No segundo, as bancadas petistas no Congresso votaram em massa com o governo.

A aliança Lula/Lira assenta-se sobre uma plataforma comum: a captura dos recursos públicos por grupos de interesse privilegiados. Lula declarou, há pouco, que ''acabaram as privatizações''. De fato, porém, a privatização principal, a do Estado, continua a todo vapor.

É coisa antiga. O manejo das políticas fiscal e parafiscal e as concessões de subsídios abertos e ocultos para atender a interesses privados, assim como a proteção dos altos salários da elite do funcionalismo, inscrevem-se na tradição política brasileira. A novidade das últimas décadas é que os mecanismos de apropriação privada dos recursos públicos passaram a ser mascarados por programas de transferência de renda aos pobres.

O Estado-Financiador - eis o conceito central que configura o acordo entre Lula e Lira. Dele emana a necessidade de maiorias parlamentares excepcionais, capazes de promover frequentes mudanças constitucionais. Os arcabouços legais da responsabilidade fiscal, concebidos a partir do Plano Real, começaram a cair sob o fogo de Bolsonaro/Lira. A aliança Lula/Lira promete derrubar o pouco que resta.

 

 

Demétrio Magnoli

 

 

 

 

segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

Nova política externa de Lula é velha - Demetrio Magnoli (Globo)

Nova política externa de Lula é velha


Mensagem central do petista na campanha foi voltar à idade de ouro

Demétrio Magnoli
O Globo, 12/12/2022

Restauração — o retorno à “idade de ouro”. Na campanha eleitoral, foi essa a mensagem central de Lula. O Brasil embarcaria numa máquina do tempo, voltando à era supostamente gloriosa dos mandatos lulistas anteriores. A nomeação de Mauro Vieira para o Itamaraty indica que o discurso era para valer.

O martelo, porém, só foi batido após uma disputa subterrânea no círculo mais próximo do presidente eleito. Vieira, último ministro de Relações Exteriores de Dilma Rousseff, pertence à facção liderada por Celso Amorim, o chanceler de Lula 1 e Lula 2. Amorim preferia voltar à cadeira que ocupou entre 2003 e 2010 ou, ao menos, entregá-la à embaixadora Maria Laura Rocha, sua subordinada direta entre 2008 e 2010. Mas a escolha de Lula, um insucesso tático, evitou-lhe uma derrota estratégica.

A verdadeira alternativa à facção de Amorim era Jaques Wagner. O ex-governador da Bahia e ex-ministro da Casa Civil de Rousseff representava uma contestação dos paradigmas ideológicos que, no passado, orientaram a política externa lulista. No fim, apesar de tudo, prevaleceu o impulso de restauração.

As linhas gerais da nova/velha política externa de Lula 3 já estão escritas no muro. São quatro sinais, que formam um desenho.

1. Sabotagem da candidatura de Ilan Goldfajn ao BID
A operação fracassada foi conduzida publicamente pelo ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, mas derivou de articulação oculta de Amorim. Goldfajn, um economista que preza os fundamentos e despreza a inflação, não fará do BID uma plataforma econômica para a ideia terceiro-mundista da unidade latino-americana.

2. Adiamento da visita de Lula a Washington
Nesse caso, ao contrário da sabotagem a Goldfajn, a facção de Amorim aparentemente prevaleceu. Jake Sullivan, conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, veio ao Brasil com a missão de promover um encontro entre Lula e Joe Biden ainda em dezembro, antes da posse.

A meta era oferecer um inequívoco respaldo americano ao desenlace eleitoral, ajudando a secar os delírios golpistas que circulam num setor minoritário das Forças Armadas. Ao mesmo tempo, tratava-se de reativar a cooperação EUA-Brasil, assentando-a na política climática. O adiamento da visita presidencial veicula uma mensagem: o governo Lula não está interessado numa parceria estratégica com os Estados Unidos. Prefere, no lugar dela, o caminho que conduz ao “Sul Global” — na prática, o fórum do Brics, com destaque para China e Rússia.

3.Reforma do Conselho de Segurança da ONU
O Conselho da ONU, com seus cinco integrantes permanentes e direito a veto, nasceu da Segunda Guerra Mundial. A ideia de reforma entrou na agenda internacional na década de 1990, mas nunca decolou, devido à ausência de algum consenso mínimo: não se cede poder à toa.

Hoje, sob as nuvens de chumbo da rivalidade EUA-China e da guerra na Ucrânia, inexiste espaço para a retomada do debate. Mesmo assim, Amorim apressou-se em recolocar o tema no centro da agenda da política externa brasileira. A insistência obsessiva não se destina a descortinar novos horizontes, mas a fabricar um discurso “anti-imperialista” de denúncia das potências (ocidentais) e da ordem internacional.

4. Guerra e paz na Ucrânia
Na campanha, Lula colocou um sinal de equivalência entre Putin e Zelensky —entre a potência agressora e a nação agredida. Circula a ideia de que o novo presidente almeja desempenhar um papel de protagonista numa iniciativa internacional para encerrar a guerra na Ucrânia. Fala-se, no entorno lulista, em “negociações” e “paz”, mas nunca na integridade territorial ucraniana.

Paz sem desocupação: a fórmula coincide, exatamente, com os objetivos imediatos de Putin, que pretende congelar temporariamente o conflito, interrompendo a contraofensiva da Ucrânia e ganhando tempo para reorganizar as forças invasoras assediadas. Nesse ponto, Lula segue os passos de Bolsonaro, adotando uma espécie de “neutralidade pró-Rússia” que viola os princípios explícitos inscritos em nosso texto constitucional.

Restauração: “O tempo passou na janela e só Carolina não viu”.

https://oglobo.globo.com/opiniao/demetrio-magnoli/coluna/2022/12/nova-politica-externa-de-lula-e-velha.ghtml 

segunda-feira, 22 de agosto de 2022

Como a esquerda pode apoiar o fascista do Putin? O antiamericanismo é maior que o antifascismo? - Demetrio Magnoli

 Creio que a esquerda tem, sim, um antiamericanismo tão anacrônico, míope e torpe, que o seu anti-imperialismo se esgota no antiamericanismo, e aceita qualquer coisa que tenha tido sabor de antiamericanismo, mesmo se é o fascismo de esquerda, de uma Venezuela chavista, de uma Nicarágua orteguista, de uma Rússia putinesca.


Stalingrado, versões de uma batalha!

Demétrio Magnoli, sociólogo, doutor em geografia humana pela USP

Folha de S.Paulo, 19/08/2022

 

No 23 de agosto de 1942, 80 anos atrás, começou a Batalha de Stalingrado, ponto de inflexão da guerra mundial no teatro europeu. Desde 2013, Volgogrado reverte a seu antigo nome nos aniversários da batalha crucial. O culto a Stalingrado descortina a evolução do nacionalismo russo, de Stálin a Putin.

 

A primeira versão sobre a batalha fixou-se em 1943, na Conferência de Teerã, quando Churchill passou às mãos de Stálin a Espada de Stalingrado, oferenda do rei George 6º à cidade heroica. Originalmente, a URSS traduziu a vitória como marco da unidade das potências aliadas contra o nazifascismo.

 

Durou pouco. Desde 1947, Stálin ergueu uma segunda versão, adaptada à nova rivalidade da Guerra Fria. Os antigos aliados foram reinterpretados como herdeiros do nazifascismo e a batalha transformou-se na certidão de batismo da Grande Rússia soviética. Duas décadas depois, numa cidade já renomeada, Kruschev inaugurou A Pátria Convoca, a estátua de 85 metros de altura, no estilo do realismo socialista, de uma mulher guerreira empunhando uma espada.

 

Putin, que qualificou a implosão da URSS como "a maior catástrofe geopolítica do século 20", conserva a versão grão-russa sobre a batalha, mas a recobre com uma tintura especial. A sua Grande Rússia substitui as referências comunistas por uma pasta ideológica inspirada no fascismo. No salto, ocupa lugar destacado o filósofo político cristão Ivan Illyn (1883-1954).

 

Illyn foi expulso da Rússia soviética em 1922. No exílio, em Berlim e depois na Suíça, conectou-se aos emigrados russos contrarrevolucionários e abraçou o pensamento fascista. Em 1950, escreveu um ensaio que viria a ser repetidamente citado por Putin. Nele, identificava um "experimento hostil", urdido pelas potências ocidentais, de fragmentação da Rússia num "gigantesco Bálcãs", que seria "enganosamente exibido como supremo triunfo da ‘liberdade’ e da ‘democracia’...".

 

"A propaganda alemã investe dinheiro e esforço singulares no separatismo ucraniano", alertava Illyn. Em 2005, ano do primeiro levante popular ucraniano contra um governo pró-russo, Putin obteve a transferência dos restos mortais do pensador fascista para a Rússia e, quatro anos mais tarde, depositou flores em sua tumba, no monastério Donskoy. Em 2013, o Kremlin indicou o livro "Nossas Tarefas", no qual encontra-se o ensaio, como leitura fundamental para os altos funcionários russos.

 

Segundo Illyn, Hitler cometera o equívoco fatal do ateísmo. As impurezas da modernidade –isto é, o pluralismo e o advento da sociedade civil– teriam exilado Deus e precisariam ser purgadas pela restauração do mundo antigo. A missão redentora caberia a uma nação justa (a Rússia) disposta a seguir um líder descomunal engajado na criação de uma nova totalidade política. Putin tem bons motivos para recomendar a seus cortesãos o estudo da obra de Illyn.

 

Otan? O pretexto inicial para a invasão da Ucrânia sobrevive apenas no discurso do "anti-imperialismo" ocidental. As vozes ligadas ao Kremlin empregam a linguagem exterminista típica do fascismo. Margarita Simonyan, chefe da rede estatal RT, explica que "a Ucrânia não pode continuar a existir. O ex-presidente Dmitri Medvedev refere-se aos ucranianos como "bastardos e degenerados". Vladimir Soloviov, âncora de TV premiado por Putin, prefere a palavra "vermes": "Quando um veterinário desparasita um gato, para ele é uma operação especial, para os vermes é uma guerra e para o gato é uma limpeza".

 

A versão antiocidental da Batalha de Stalingrado contada por Stálin celebrava uma Grande Rússia destinada pela história a ser a URSS. A retificação emanada de Putin glorifica uma Grande Rússia eterna: a espada purificadora que Deus cravará num mundo pecaminoso. A adoração devotada pela extrema direita a Putin é normal. Já a simpatia da esquerda solicita investigação.


quinta-feira, 14 de julho de 2022

No Chile, a Constituição da nova esquerda (vai destruir o governo atual e os seguintes) - Demetrio Magnoli (FSP)

No Chile, a Constituição da nova esquerda 

Demétrio Magnoli

Folha de S. Paulo sábado, 9 de julho de 2022

Se aprovada em plebiscito, proposta destruirá o governo de Gabriel Boric


            "O Chile é um Estado social e democrático de Direito. É plurinacional, intercultural, regional e ecológico." A Constituição emanada da Constituinte chilena é um retrato em 3 por 4 da nova esquerda: a coleção completa de suas utopias, doutrinas e dogmas. Se for aprovada em plebiscito, destruirá o governo de esquerda de Gabriel Boric – e qualquer governo que o suceder.

            Nos seus infindáveis 388 artigos, não se contenta em listar os direitos dos humanos, determinando até que o Estado promova uma "educação baseada na empatia e respeito pelos animais" (art. 131). Segundo o artigo 18, a "Natureza" torna-se um sujeito de direitos, ao lado dos cidadãos e das nações indígenas –mas, claro, o texto não define quem fala por ela.

            A Constituinte nasceu da onda de protestos sociais de 2019 e 2020. Sob o impulso das ruas, formou-se uma maioria de ativistas de movimentos sociais e partidos de esquerda que não reflete a balança de forças real da sociedade chilena. Nas eleições do ano passado, Boric conseguiu apenas 26% dos votos no turno inicial, e a esquerda obteve 27% dos assentos na Câmara, contra 48% dos partidos de centro-direita e direita. O texto constitucional, porém, reflete um país imaginário, habitado exclusivamente pela esquerda pós-moderna.

            A política identitária esparrama-se por todas as esferas. A palavra "gênero" é mencionada 39 vezes. Garante-se a "paridade de gênero" em todos os órgãos da administração estatal, na direção das empresas públicas e, inclusive, nas organizações políticas não estatais (artigos 2 e 163). A "paridade de gênero" aplica-se, ainda, a todos os órgãos eleitos de representação popular, o que viola o direito dos cidadãos de escolher livremente seus representantes.

            De acordo com o artigo 312, os tribunais "devem resolver com enfoque de gênero", uma regra subjetiva que ergue o espectro da potencial inconstitucionalidade sobre qualquer decisão judicial. O mesmo indefinido "enfoque" aplica-se ao "exercício das funções públicas", o que possibilita judicializar os mais corriqueiros atos administrativos.

            O Estado de Direito, consagrado no artigo inicial, é relativizado pela proclamação da plurinacionalidade. Os povos indígenas são declarados "nações" e ganham direito à "autonomia" e ao "autogoverno", o que inclui "instituições jurisdicionais tradicionais" (art. 34). Daí decorre que a proteção geral dos direitos individuais, civis e políticos não se estende aos indígenas.

            A nova Constituição ampara-se na crença implícita de que o Chile é um espaço edênico de abundância ilimitada, de cujo céu jorra leite e mel. A seguridade social pública deve proteger integralmente as pessoas do nascimento à morte, inclusive nos casos de "redução dos meios de subsistência" (art. 45). Estabelece-se um direito universal ao trabalho "de livre escolha" e proíbe-se "todas as formas de precarização no emprego" (art. 46). O seu elenco de direitos abrange "moradia digna" em "localização apropriada", assegurada por ações estatais (art. 51).

            Nem todos os direitos são acolhidos pelo texto constitucional. Fica "proibida toda forma de lucro" nas instituições de educação básica, média ou superior (artigos 36 e 37). O artigo 51 veta a especulação imobiliária "que ocorra em detrimento do interesse público", um critério aberto às mais bizarras interpretações das maiorias políticas de turno.

            Uma nuvem de incerteza paira sobre o plebiscito da nova Constituição. Sondagem recente registrou reprovação de 51%, contra aprovação de 34%, Na hipótese de rejeição, o país ficará com a Constituição herdada da ditadura de Pinochet. Na hipótese oposta, o Chile rumará à ingovernabilidade e se inviabilizará o mandato de Boric, um presidente de esquerda que recusa tanto o autoritarismo quanto o populismo. De um modo ou do outro, a nova esquerda cumprirá sua missão reacionária.

 

Primeiro comentário de um leitor:

Anônimo disse...

            O preconceituoso colunista exagerou como nunca. Gosto de lê-lo, pois às vezes ele tem análises corretas e interessantes, mesmo contrárias à Esquerda e ideologicamente comprometidas. Algumas preocupações levantadas neste texto são até verdadeiras, mas a quantidade de bobagens que ele incluiu é surpreendente. Ele deve estar mesmo bem revoltado com os rumos da progressista constituição chilena!

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Ruínas da ponte chinesa: 50 anos de Nixon na China (já deu até ópera) - Demetrio Magnoli (FSP)

 Opinião 

Demétrio Magnoli

Demétrio Magnoli

Sociólogo e doutor em geografia humana


Ruínas da ponte chinesa

Por Demétrio Magnoli

Folha de S. Paulo, 21/02/2022 • 00:00 


‘Esta foi a semana que mudou o mundo’, disse Richard Nixon em Xangai, em fevereiro de 1972, numa referência direta ao livro-reportagem “Dez dias que abalaram o mundo”, de John Reed, sobre a Revolução Russa de 1917. Nas declarações, logo após a assinatura do Comunicado conjunto, o presidente dos EUA anunciou a construção de uma ponte imaginária “através de 16 mil milhas e 22 anos de hostilidades”. A ponte ajudou a encerrar a Guerra Fria e abriu caminho à integração da China ao mundo, mas não ficou em pé para celebrar seu aniversário de 50 anos.

Sem o encontro histórico de Nixon com Mao Tsé-tung, não é fácil enxergar a transição chinesa do fracassado modelo estatista à “economia socialista de mercado” que começou em 1979, sob Deng Xiaoping. Sem o Comunicado de Xangai, base da aproximação geopolítica entre China e EUA, quem sabe quanto tempo ainda viveria a URSS?

A reviravolta de 1972, fruto da iminente derrota no Vietnã e do gênio intelectual de Henry Kissinger, realmente “mudou o mundo”. Ironicamente, as duas potências engajam-se, atualmente, numa espécie de Guerra Fria 2.0, e a China alardeia uma parceria estratégica, política e militar com a Rússia.

“Não importa a cor do gato, desde que ele cace os ratos”, explicou Deng, anunciando o advento da liberdade para as mercadorias e os capitais. A China pós-maoista, porém, nunca aceitou a extensão da liberdade a seus próprios cidadãos, como foi comprovado pelo esmagamento dos protestos na Praça da Paz Celestial, em 1989, e pelas reformas regressivas de Xi Jinping, um quarto de século depois.

A China da Olimpíada de 2008 não é a dos Jogos de Inverno de 2022. Na primeira, delineava-se a marcha rumo a um sistema autoritário moderado, capaz de tolerar espaços restritos de liberdades públicas e individuais. A segunda aboliu os direitos de Hong Kong, ameaça invadir a república democrática de Taiwan e arrasa a sociedade e a cultura dos uigures em Xinjiang. Contudo a implosão da ponte com os EUA não deve ser atribuída à brutal reafirmação do sistema totalitário.

O giro estratégico de Washington começou com Obama, acentuou-se com Trump e ossificou-se com Biden. Hoje, o paradigma de uma rivalidade estrutural com a China tornou-se consenso bipartidário. Mas a China de Xi Jinping não é pior, politicamente, que a miserável nação maoista de meio século atrás. A Guerra Fria 2.0 decorre, essencialmente, da percepção americana de uma ameaça fundamental à hegemonia alcançada no final da Guerra Fria original.

O elemento estratégico-militar da resposta de Washington à ascensão chinesa tem as cores da política de contenção aplicada contra a antiga URSS: a criação do Aukus, aliança trilateral com Reino Unido e Austrália, e a parceria privilegiada com a Índia. O elemento econômico deriva de uma concepção oposta: no lugar do estímulo ao internacionalismo (Plano Marshall, União Europeia), o recuo às trincheiras do nacionalismo.

De Trump a Biden, os EUA engajaram-se na formulação de políticas industriais protecionistas e numa guerra de atrito contra os avanços tecnológicos chineses (5G, inteligência artificial). É um caso típico da “armadilha de Tucídides”, descrita pelo historiador da Guerra do Peloponeso. A potência tradicional enxerga sua posição desafiada por uma potência emergente e tenta restringi-la. Como resultado, adota uma atitude defensiva, calcificando o sistema internacional em torno de seus interesses nacionais.

Na Guerra Fria original, a estratégia dos EUA baseava-se na noção de que a URSS era uma potência assentada em alicerces de barro. Na Guerra Fria 2.0, os EUA operam sob a ilusão da irresistível ascensão chinesa. O diagnóstico desfoca a paisagem, ocultando as fragilidades do competidor: uma crise demográfica de longo curso, as hemorragias internas no sistema financeiro, a desaceleração econômica, as tensões sociais que se acumulam, as fissuras crônicas no sistema de poder político.

Ninguém celebrará o aniversário da visita de Nixon. Da ponte que serviu aos interesses dos EUA, da China e do mundo, resta apenas um monte de ruínas.

Por Demétrio Magnoli

 

segunda-feira, 31 de maio de 2021

A casta patrimonialista e extratora do funcionalismo federal contra a nação - Demetrio Magnoli

 A casta


Por Demétrio Magnoli
31/05/2021 • 01:00

São “parasitas” que estão matando o “hospedeiro”? A sentença emitida por Paulo Guedes, como quase tudo que fala o já não tão poderoso ministro, é uma generalização estúpida. Nas suas desigualdades internas, o funcionalismo público é quase um microcosmo do conjunto da sociedade brasileira. Mas sua elite forma, de fato, uma casta aristocrática que extrai recursos vitais dos brasileiros comuns, amplificando a concentração de renda.

A casta está incrustada no funcionalismo federal: segundo o Ipea, em 2017, os servidores municipais tinham salário médio de R$ 2,9 mil, contra R$ 5 mil dos estaduais e R$ 9,2 mil dos federais. O Congresso e, especialmente, o Poder Judiciário formam os ecossistemas da casta: no Executivo, o holerite médio era de R$ 3,9 mil, contra R$ 6 mil dos funcionários do Legislativo e R$ 12 mil dos servidores do Judiciário.

Raymundo Faoro iluminou, nos idos de 1958, a relação intrínseca entre o poder estatal e o estamento dos servidores públicos. A conversão patrimonial do bem nominalmente público em propriedade privada — a prática sistemática de “tosquiar” a sociedade — expressa-se, entre tantas formas, na remuneração da casta. Os funcionários federais ganhavam, em média, 96% mais que os trabalhadores de empresas privadas, sempre em 2017. No Judiciário, 4,2% dos funcionários recebiam salários superiores a R$ 30 mil.

Getúlio Vargas esculpiu a transição para a economia urbano-industrial criando a moderna burocracia estatal e lançando as sementes da casta. Os filhos dos fazendeiros tornaram-se bacharéis. O PT, partido apoiado nos sindicatos de servidores, completou a obra varguista. Nos governos Lula e Dilma, o gasto com pessoal saltou de cerca de R$ 200 bilhões para mais de R$ 300 bilhões, já descontada a inflação.

O país existe para servir os servidores? Em 2019, o Brasil gastou 12,9% do PIB com o funcionalismo, um dos maiores dispêndios do planeta, superior ao do Canadá (12,1%) ou da França (11,8%), para não mencionar Reino Unido (9%), EUA (8,7%), Alemanha (7,6%) ou Chile (7,1%). Só o Judiciário — e sem contar o MP — consumiu 1,5% do PIB, um assalto à arca pública que fica evidente no cotejo com Itália (0,18%), França (0,15%) ou EUA (0,14%). Por aqui, terra de fidalgos togados, o vale-refeição dos juízes supera o salário mínimo em 24 das 27 unidades da Federação.

O lulismo impulsionou a casta a um novo patamar — e seus arautos nem sequer admitem a discussão de uma reforma administrativa capaz de limitar as rendas públicas destinadas a sustentar seus privilégios. O sociólogo Jessé Souza, o mais autêntico formulador da visão lulista sobre o Estado e a sociedade no Brasil, sintetizou a alegação da casta na seguinte sentença: “Os bancos querem enxugar os gastos do Estado, para que o Estado possa ter seu orçamento dirigido aos bancos”. Ficamos sabendo, então, que, segundo Jessé, propor uma reforma administrativa implica defender os interesses dos bancos.

A técnica de acusar o interlocutor de nutrir maléficas motivações ocultas, típica de espíritos autoritários, destina-se a circundar a argumentação histórica e factual, substituindo o debate informado por um torneio de insultos. Na maioria das nações democráticas, governos de diversos matizes políticos evitaram que a alta burocracia de Estado abocanhasse parcela da riqueza nacional similar à que alimenta a “nossa” casta. Seriam todos esses governos meros agentes do capital financeiro?

Na base do funcionalismo, especialmente nos níveis estadual e municipal, encontra-se a parcela dos servidores públicos de maior valor social. São, em grande parte, funcionários mal-remunerados da saúde e da educação que atendem à população de baixa renda. É a casta, não os malvados banqueiros, que desvia para si mesma os recursos necessários para a qualificação e modernização dos serviços públicos universais.

Uma reforma administrativa equilibrada — que, obviamente, não é a de Paulo Guedes — interessa à maioria dos brasileiros. Pena que, 90 anos depois de Vargas, os representantes políticos da casta ainda consigam se fantasiar como amigos do povo.

https://blogs.oglobo.globo.com/opiniao/post/casta.html

terça-feira, 13 de abril de 2021

Eu acuso, de Demetrio Magnoli, sobre o anacronismo dos historiadores do politicamente correto

Um tema sempre atual, o do racismo reverso, embora guiado pelo politicamente correto, essa outra ditadura americana que se espalha igualmente pelas universidades brasileiras e do resto do mundo. Um artigo do Demetrio Magnoli que me havia passado despercebido.

Paulo Roberto de Almeida

Eu acuso

Primeiro dever do historiador é fugir da armadilha do anacronismo

Demetrio Magnoli

FSP, 19.fev.2021 às 23h15

 

Na Califórnia, o Conselho de Educação de São Francisco mudou os nomes de 44 escolas, varrendo figuras racistas do passado e, de passagem, também Abraham Lincoln. Na Folha (19/1), Marcelo Coelho reativou a campanha pelo cancelamento de Monteiro Lobato, rotulando-o como um “racista delirante”. Ezra Klein tem razão ao concluir que, por essas vias, transforma-se a política mais em estética que em programa (Folha, 12/2).

Cada geração tende a reinventar a história à sua imagem, atribuindo aos personagens do passado as virtudes ou pecados que tocam nas sensibilidades do presente. O Lincoln oficial é Grande Emancipador; o dos dirigentes escolares de São Francisco é o político que se opunha tenazmente ao exercício do sufrágio pelos negros. Depois de cancelar os líderes da Confederação, a esquerda identitária americana precisa seguir adiante, condenando ao opróbrio todos os que não abraçam seus valores. O primeiro dever do historiador é fugir da armadilha do anacronismo, inscrevendo os personagens que estuda na moldura de sua própria época.

Mas o anacronismo constitui a ferramenta imprescindível dos emissários da atual política simbólica. Lincoln simplesmente compartilhava as ideias predominantes no seu tempo. Lobato debatia-se com as encruzilhadas reais ou imaginárias da metade inicial do século 20. O método de pinçar frases racistas em suas obras ou cartas pessoais serve, exclusivamente, para obter aplausos da plateia cúmplice que milita no

identitarismo acadêmico.

Que tal democratizar o anacronismo? Eu acuso W.E.B. Du Bois, “pai fundador” do movimento negro americano, de nutrir certas simpatias pelo nazismo. Acuso Abdias do Nascimento, prócer do moderno movimento negro brasileiro, de propagar as ideias fascistas da Ação Integralista Brasileira. E acuso milhares de negros do Brasil do século 19 de terem sido proprietários de escravos. Minhas cápsulas de verdades fora de contexto, artimanhas no palco do ilusionismo, esclarecem tanto quanto a sentença inquisitorial lançada contra Lobato.

As musas da Sorbonne costumavam soprar nos ouvidos dos intelectuais brasileiros. Não mais. Hoje, os cavaleiros andantes da política identitária seguem gurus americanos –e querem que o Brasil seja os EUA. O problema é que, quando se trata de nação e raças, a América Latina tomou rumo diferente. Enquanto os EUA praticavam a segregação racial oficial, o mexicano José Vasconcelos (1882-1959) e o brasileiro Gilberto Freyre (1900-1987) enalteciam a miscigenação. Lobato não adotou nenhum dos dois polos, ensaiando um raciocínio inclinado à conciliação de raças. Os três, porém, pisavam um chão ladrilhado por conceitos raciais que só seriam superados na metade final do século 20. A acusação a Lobato nada diz sobre o escritor, mas pinta um retrato preciso de seus acusadores. 

A crítica literária Ana Lúcia Brandão recolocou o debate sobre Lobato no seu devido lugar (Folha, 15/2), descortinando amplos horizontes para divergências civilizadas. Vã esperança: Coelho retrucou comparando-a aos terraplanistas. Se não rezam pela cartilha de Bolsonaro, são comunistas; se contestam o manual de cancelamento da política identitária, serão terraplanistas. Vamos mal.

A política estetizada ignora os dilemas que interessam às pessoas comuns. As escolas de São Francisco permanecem fechadas –mas seus nomes foram devidamente sanitizados. O Pisa revela que o ensino público brasileiro continua a sonegar o direito à educação aos filhos de famílias de baixa renda de todas as cores – mas temos cotas raciais nas universidades e cercaremos com bandeiras de alerta as frases suspeitas de

Lobato. São Paulo empurra seus pobres a periferias cada cada vez mais distantes – mas logo removerá a Estátua do Empurra da entrada do Ibirapuera.

A estética nos consome: lancetamos símbolos. Sorte da direita populista.

 

sábado, 5 de setembro de 2020

Políticas racialistas são políticas racistas, ponto! - Demétrio Magnoli, Paulo Roberto de Almeida

Sempre me insurgi contra políticas racialistas, e isto desde FHC, ou seja, antes de Lula, e antes do STF. Concordo apenas em parte em que é preciso promover algumas chances de vida e a autoestima dos negros brasileiros, dando a eles as chances que não tiveram pela persistência do racismo, da desigualdade no acesso à escola, pela má qualidade da educação de que sempre sofreram ao longo de décadas.
Mas sempre julguei que isso deveria ser limitado, temporário, e de preferência ampliado a todos os carentes de chances, como os pobres em geral, com o que se atenderia a um número proporcionalmente maior de negros e pardos. 
Eu sempre clamei contra a criação de um novo Apartheid, que essas políticas racialistas poderiam criar, que é a reação de brancos (que se tornam mais racistas, por se acharem prejudicados) e pela criação de uma cultura negra, artificial, separada da cultura mainstream, que deve ser a de um Brasil único em suas qualidades e deformações, mas sem separação racial.
Paulo Roberto de Almeida

Avanço da doutrina racialista para a representação política golpeia a soberania popular

Benedita da Silva e Luís Roberto Barroso tratam o acesso a cargos parlamentares como uma carreira

"Estaremos do lado dos que querem escrever a história do Brasil com tintas de todas as cores." O ministro Luís Roberto Barroso anunciou, por essa frase capciosa, a pretensão dos altos tribunais de tutelar os partidos políticos e os eleitores, determinando uma distribuição racial dos fundos públicos eleitorais.
O inevitável avanço da doutrina racialista para a esfera da representação política golpeia o conceito de soberania popular, pilar da democracia.
Mas, como é de seu feitio, prontificou-se a legislar de outro jeito, no mesmo rumo racialista, gerenciando o caixa dos partidos com vistas a um "equilíbrio racial".
As leis de cotas raciais para ingresso nas universidades apoiam-se na justificativa da promoção social de grupos excluídos. As cotas raciais dividem os estudantes de escolas públicas segundo a cor da pele, alavancando ressentimentos que nutrem o racismo. O consenso partidário formado em torno delas destina-se a mascarar a ruína do ensino público, raiz da desigualdade de oportunidades no umbral das universidades. Quando a raça chega ao terreno do voto, o racialismo retira sua máscara, exibindo a face que precisava ocultar.
Benedita e Barroso tratam o acesso a cargos parlamentares como o ingresso na universidade —ou seja, como uma carreira. A política é definida, aí, como profissão: meio de ganhar a vida e produzir patrimônio.
"Escrever a história do Brasil com tintas de todas as cores" significa, para eles, alçar "negros" a empregos bem remunerados. O problema do raciocínio é que, no fim, a seleção desses "profissionais" depende dos eleitores. Que tal, então, dirigir a mão que digita o voto para o lugar "certo"?
Os programas pioneiros de cotas raciais nas universidades foram introduzidos em 2003. Seus defensores alegavam, à época, que o expediente seria provisório, esgotando-se no horizonte de dez ou, no máximo 20 anos. Hoje, quase duas décadas depois, não só esqueceram-se do prazo limítrofe como engajaram-se na introdução de cotas raciais na pós-graduação e na administração pública.
A fraude da vontade popular na esfera eleitoral também caminhará por etapas. A primeira, em curso, define a distribuição de fundos de campanha. Numa segunda, cotas "raciais" dentro dos partidos. A conclusiva, pelo estabelecimento de cotas raciais nos próprios órgãos legislativos. No Líbano, a representação parlamentar é repartida segundo linhas sectárias, com a divisão de cadeiras entre cristãos, sunitas e xiitas. No Brasil, a lógica racialista aponta para uma divisão entre as "raças oficiais" —isto é, basicamente, entre "brancos" e "negros", pois os autodeclarados "pardos" já foram administrativamente suprimidos do universo legal.
A "voz dos negros" deve ser ouvida —eis a tradução conceitual da frase de Barroso. Os "negros", porém, participam de diferentes partidos, exprimindo ideologias diversas. Quem é a "voz dos negros"? Benedita, que é uma "voz de Lula", ou Sérgio Camargo, uma "voz de Bolsonaro"
A racialização dos órgãos legislativos nada tem a ver com a "voz dos negros". Expressa a voz das elites brasileiras que recobrem, com uma mão de tinta fresca, o racismo institucional praticado pelas polícias e a exclusão social de pobres de todas as cores.
A política é o campo dos valores, das visões de mundo —não das raças. A "voz dos negros" exigiria a constituição de um Partido Negro. Os arautos do racialismo não vão criá-lo, pois sabem que seriam rejeitados inclusive pelo eleitorado não branco. A estratégia deles é tutelar o voto por meio de leis restritivas da soberania popular.

sábado, 21 de setembro de 2019

Demetrio Magnoli: um novo julgamento para Lula (FSP)

Lula livre
DEMÉTRIO MAGNOLI
Folha de S. Paulo, 21/09/2019

O STF examinará, logo mais, as condenações impostas a Lula. Hoje sabemos, graças à Vaza Jato, que os processos tinham cartas marcadas. O conluio entre Estado-julgador e Estado-acusador violou as leis que regulam o funcionamento do sistema de Justiça. A corte suprema tem o dever de preservar o Estado de Direito, declarando a nulidade dos julgamentos e colocando o ex-presidente em liberdade. Lula livre. Evito adicionar o clássico ponto de exclamação porque, sob a minha ótica, Lula é politicamente responsável pela orgia de corrupção que se desenrolou na Petrobras.
A corrupção lulopetista nasce de uma tese política elaborada, em versões paralelas, por José Dirceu e Luiz Gushiken. O PT, no poder, deveria modernizar o capitalismo brasileiro, encampando o programa que uma “burguesia nacional” submissa ao “imperialismo” recusava-se a conduzir. Lula converteu a tese em estratégia, articulando a aliança entre empresas estatais, fundos de pensão e setores do alto empresariado privado que reativaria nosso capitalismo de Estado. Numa segunda volta do parafuso, parte da renda gerada pelo mecanismo financiaria o projeto de poder, assegurando ao lulopetismo uma maioria parlamentar estável e a hegemonia perene na arena eleitoral. O mecanismo corrupto provocou uma erosão nos alicerces da democracia. Lula e o PT devem ser julgados por isso, mas no tribunal certo, que é o das urnas. Não creio em bruxas. Do Planalto, Lula avalizou pessoalmente a colonização de diretorias da Petrobras por agentes do PT, do PMDB e do PP que aplicaram as regras do jogo da corrupção, distribuindo contratos ao cartel de empreiteiras e cobrando propinas destinadas tanto a seus amos políticos quanto a formar patrimônios próprios.
A promiscuidade entre o presidente e as empreiteiras estendeu-se para além das fronteiras nacionais, gerando contratos corruptos, financiados pelo BNDES, com governantes amigos na América Latina e na África. Lula beneficiou-se diretamente do mecanismo, por meio de palestras no exterior patrocinadas pelas empreiteiras. Nelas, um ex-presidente que detinha a palavra final no governo da sucessora traficava influência, trocando seus bons ofícios por remunerações milionárias. Segundo minha convicção, o tribunal dos eleitores não cobre toda a responsabilidade de Lula. Acho que ele deve responder perante a lei por uma cadeia de atos de corrupção que lhe propiciaram benefícios políticos e materiais. Mas, felizmente, na esfera jurídica, o que eu penso —e o que você, leitor, pensa— não tem valor nenhum. No Estado de Direito democrático, juízes independentes ignoram o “clamor popular”, escrevendo sentenças embasadas na lei e informadas por um processo delimitado por formalidades que protegem os direitos do réu. Fora disso, ingressamos no mundo da Justiça politizada, que é o de Putin, Erdogan e Maduro.
​​Sergio Moro agiu como juiz de instrução italiano, uma espécie de coordenador dos procuradores —mas no Brasil, onde inexiste essa figura, não na Itália, onde um juiz diferente profere a sentença. 


Batman e Robin
Moro e Dallagnol, comparsas, esculpiram juntos cada passo do processo, nos tabuleiros judicial e midiático. No Partido dos Procuradores, milita também a juíza Gabriela Hardt, que copiou a sentença de Moro para fabricar a do sítio —e que, num trecho original de sua peça plagiária, trata José Aldemário Pinheiro e Leo Pinheiro, nome e apelido da testemunha-chave, como pessoas distintas. Batman, Robin e cia merecem sentar no banco dos réus sob a acusação de fraudar o sistema de Justiça. Lula livre, não por ele ou pelo PT, mas em defesa de um precioso bem público, de todos nós, ao qual tantos brasileiros pobres precisam ter acesso: o Estado de Direito. Que o ex-presidente seja processado novamente, segundo os ritos legais, e julgado por magistrados sem partido.

segunda-feira, 22 de julho de 2019

Um embaixador profissional e um de mentirinha (pior: submisso) - Demetrio Magnoli


A nomeação de Eduardo Bolsonaro equivaleria a transferir as chaves da embaixada brasileira ao próprio Trump

Escrevi, para o Itamaraty, décadas atrás, um manual de Relações Internacionais destinado ao exame de ingresso na carreira diplomática.

O primeiro capítulo aborda as origens da diplomacia e as funções do diplomata. Se fosse reescrevê-lo, hoje, missão para a qual certamente não serei convidado, eu organizaria o texto em torno de Kim Darroch e Eduardo Bolsonaro.

O contraste entre as duas figuras esclarece a cisão conceitual que inaugurou a diplomacia contemporânea. Já a queda do primeiro e a ascensão do segundo iluminam o impacto do populismo sobre os corpos diplomáticos.

“O Estado sou eu” —nas antigas monarquias absolutas, o diplomata era um representante pessoal do soberano. Nessa condição, sua única qualificação indispensável era a fidelidade ao soberano. O círculo familiar do rei e a corte funcionavam como instâncias privilegiadas de recrutamento. O enviado era uma ponte entre duas cortes. Por isso, para sua escolha, pesavam positivamente eventuais relações de amizade estabelecidas por ele com os cortesãos estrangeiros.

A indicação de Eduardo obedece ao figurino do Antigo Regime. Candidamente, seu pai e ele mesmo explicaram que, na desolada planície de seu currículo, mais que o hambúrguer, destaca-se a amizade recente travada com o clã familiar de Donald Trump.

Darroch simboliza o oposto disso: representa uma nação, não um soberano. O embaixador britânico nos EUA, diplomata profissional culto e experiente, serviu a governos trabalhistas e conservadores, ocupando inúmeros cargos de alta responsabilidade. Paradoxalmente, na fonte do escândalo que provocou sua renúncia encontram-se os sinais distintivos da diplomacia do Estado-Nação.

Darroch foi atingido por três raios sucessivos. Um: o vazamento de mensagens sigilosas que enviou ao seu governo com avaliações negativas sobre a Casa Branca de Trump e a política externa americana.

Dois: a reação furiosa de Trump, vetando contatos de seu governo com o embaixador. Três: o desamparo a que foi relegado por Boris Johnson, candidato favorito à chefia do governo britânico.

As mensagens vazadas classificam o governo Trump como “singularmente disfuncional” e a política dos EUA para o Irã como “incoerente e caótica”.

Uma das funções do diplomata é conduzir atividades de inteligência, oferecendo a seu governo diagnósticos sobre o país estrangeiro. Darroch apenas cumpria o dever de transmitir a Londres suas apreciações políticas, certas ou erradas. Foi, porém, colhido pelo vendaval do populismo.

Trump extrapolou os limites diplomáticos normais das relações entre aliados, aproveitando-se do vazamento para humilhar os britânicos e ganhar aplausos de sua base eleitoral. Johnson, por sua vez, preferiu lambuzar-se em elogios a Trump, colocando suas convicções ideológicas acima da obrigação de proteger a diplomacia de seu país. Darroch foi traído pelos poderosos de uma nação à deriva, ferida pelo plebiscito do brexit, que já não sabe separar o interesse nacional das conveniências da ala reacionária do Partido Conservador.

A tragédia brasileira é, sob esse aspecto, um tanto parecida com a britânica. Uma prova disso emerge na indicação de Eduardo para a embaixada em Washington, posto estratégico ocupado originalmente por Joaquim Nabuco.

O filho 03 jamais enviaria avaliações críticas como fez Darroch, pois não é capaz de distinguir o interesse nacional brasileiro dos interesses dos EUA —e nem os interesses legítimos americanos das conveniências ideológicas de Trump ou de Steve Bannon.

A sua nomeação, mais que um novo ultraje ao pobre Itamaraty, equivaleria a transferir as chaves da embaixada brasileira ao próprio Trump.

A palavra final cabe ao Senado. Otimista, acalento a esperança de que os senadores decidam declarar o Brasil um Estado-Nação, não uma monarquia absoluta.

Demétrio Magnoli
Sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP

sábado, 11 de maio de 2019

Demetrio Magnoli e nossos militares "gregos" - como Lenin, eles perguntam "O que fazer?"

Demetrio Magnoli parece acreditar que os militares que se encontram atualmente no governo possuem algum acordo consensuado entre eles sobre o que fazer com essa administração maluca na qual se meteram, um pouco por preocupação real com a coisa pública no Brasil – desde muitos anos dominada por uma corja de corruptos oportunistas –, outro tanto por terem entendido, com base em conversas de um período recente, que poderiam convencer (ou até obrigar) o personagem que hoje ocupa a presidência a se comportar de maneira conveniente, de maneira a retirar o Brasil da trajetória desastrosa na qual se meteu (ou na que foi metido) tanto antes, no regime mafioso do lulopetismo, quanto no regime de transição do vice-presidente e, atualmente, no regime confusionista que reina no governo e em torno dele.
Considero que Demetrio Magnoli está equivocadamente otimista quanto à capacidade dos militares graduados em postos chave do governo de entender adequadamente o que se passa, realmente, nas entranhas e nas mentes desse governo dirigido por aloprados fundamentalistas, e de formular estratégias e táticas ajustadas às necessidades do momento e da conjuntura histórica de transformação.
Sempre é interessante, para o público leitor, ler histórias cativantes sobre grandes feitos militares e políticos do passado, como essa "teoria" da "retirada tática" (supostamente para aplicar a "estratégia correta" de ocupação de terreno e de manobra bem-sucedida, permitindo aos "homens bons" alcançar a vitória nessa atmosfera contaminada como parece ser o governo bolsonarista-olavista. Mas, permito-me discordar. Essas analogias não servem para muita coisa; aliás, nenhuma analogia histórica serviu para qualquer coisa, a não ser para encher folhas de papel e depois publicações apreciadas pelo distinto público leitor, feito de acadêmicos com algum sentido e conhecimento da história.
Os militares tinham sim um acordo com o personagem em questão, mas os filhos do capitão não entraram nesse pacto informal, e continuam escapando ao controle dos adultos da sala.
Por outro lado, os militares sabiam o que não queriam – a continuidade do caos anterior, com seu festival de bandalheiras e de corrupção, de estagnação e desprestígio do Brasil, aqui dentro e no exterior – mas não tinham ainda um planejamento adequado sobre o que queriam exatamente, ou não tinham ainda formulado o seu plano de governo pós-vitória eleitoral. Agora fica difícil obrigar todos os personagens a se encaixarem nos seus cenários mais ou menos racionais.
Enquanto não tiverem claro o que desejam, vai ser difícil corrigir o caos do atual governo, supondo que consigam ver claro e que tenham os métodos adequados para enquadrar os guris que estão perturbando o ambiente.
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 11/05/2019 


Retirada tática
Demétrio Magnoli
Folha de S. Paulo, 11/05/2019

É provável que a 'revolução' bolsonaro-olavista provoque a implosão do governo.

A vitória de Temístocles em Salamina (480 a.C) preservou o mundo grego ameaçado pela Pérsia. O triunfo do macedônio Filipe 2º em Queroneia (338 a.C) unificou as cidades gregas e assentou as bases para a difusão cultural do helenismo. A invasão normanda foi concluída por William, o Conquistador na batalha de Hastings (1066), fonte mítica da moderna Britannia. Segundo uma interpretação exagerada, a civilização ocidental deve sua existência a esse trio de batalhas icônicas. Os generais do alto escalão do governo Bolsonaro certamente as estudaram —e, com elas, aprenderam o valor militar da retirada tática. É hora de aplicar a manobra à política.
O pacto dos generais com o capitão reformado nasceu de um equívoco fatal: os primeiros não entenderam a natureza do segundo. Bolsonaro jamais deixou de ser o fanfarrão estéril, turbulento e indisciplinável, afastado da corporação em 1988. A novidade é que, na curva final rumo ao Planalto, acercou-se de correntes populistas de extrema direita fundamentalmente hostis às mediações institucionais da democracia. Os generais pretendiam participar de um governo "normal", enquadrado na moldura do Estado de Direito. De fato, participam de um governo cujo núcleo almeja subverter o Estado de Direito.
Na rua ao lado, uma faixa da vovó Jurema promete trazer seu amor de volta. A "filosofia política" do Bruxo da Virgínia vale tanto quanto os búzios da vovó —e sua pregação era, até há pouco, um mero golpe de charlatanismo, com implicações exclusivas para seus seguidores ignorantes. Desde a ascensão de Bolsonaro, converteu-se em programa de governo. Os generais começam a entender que o conflito não é com o espalhafatoso bobo da corte, mas com o presidente e seu clã familiar. Falta-lhes, ainda, entender que a conciliação é impossível.
O bolsonaro-olavismo deplorou o "impeachment parlamentar" de Dilma Rousseff. Naquela hora, eles clamavam por uma "intervenção militar" definida não como golpe de Estado clássico mas como uma "marcha sobre Brasília" do povo e dos militares. Hoje, sonham transformar o governo Bolsonaro no ato inaugural de um Estado-movimento: um poder estatal não submetido ao limite das leis e consagrado à luta política permanente. Nessa ordem tresloucada de ideias, a barragem de artilharia virtual sobre o STF, a imprensa e os generais destina-se a preparar a "marcha sobre Brasília" —isto é, a ruptura do Estado de Direito.
Os populismos certamente são capazes de matar as democracias por dentro (Turquia, Hungria, Venezuela). No Brasil, porém, mais provável é que a "revolução" bolsonaro-olavista provoque a implosão do próprio governo Bolsonaro. Se os generais não querem aparecer como cúmplices do desastre, resta-lhes apelar à retirada tática.
Salamina foi uma simulação de retirada, que atraiu os barcos persas ao estreito da armadilha. Em Queroneia, uma breve ofensiva seguida por retirada da ala direita das forças macedônias abriu a cunha fatal entre as falanges gregas. Hastings tem algo de Queroneia, mas é difícil saber se a decisiva retirada temporária das forças normandas foi uma manobra planejada ou o resultado de um insucesso na ofensiva inicial. De qualquer modo, para os generais brasileiros, a solução não requer excessiva inventividade.
O governo Bolsonaro sustenta-se sobre o tripé formado pela equipe econômica, o superministério de Moro e a chamada "ala militar". A remoção do terceiro pilar, pela entrega coletiva dos cargos, destruiria a estabilidade do edifício. A queda encerraria o levante dos extremistas, que confundem os ecos de seus tuítes com a voz do povo. Depois dela, ainda sobraria Mourão --e, portanto, a chance de construção de uma vereda política para o futuro.
Generais, mirem-se em Temístocles, o ateniense, Filipe 2º, o macedônio, e William, o normando. Retirem-se, antes que seja tarde.
*Demétrio Magnoli, sociólogo, autor de “Uma Gota de Sangue: História do Pensamento Racial”. É doutor em geografia humana pela USP.