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sábado, 16 de agosto de 2014

A destruicao da Petrobras pela companheira-chefe (uma historia de horror economico e politico) - Rogerio Werneck

POLÍTICA

A reeleição e a Petrobras

Rogério Furquim Werneck
O Estado de S. Paulo, 15/08/2014

Voltas que o mundo dá. A presidente Dilma agora acha que a Petrobras deve ser preservada da campanha eleitoral. “Se tem uma coisa que tem que se preservar, porque tem que ter sentido de Estado, sentido de nação e sentido de país, é não misturar eleição com a maior empresa de petróleo do país. Não é correto, não mostra qualquer maturidade."
Quem agora diz isso é a mesma candidata que, a partir de 2009, transformou a partidarização do papel da Petrobras no pré-sal em plataforma de lançamento de sua candidatura à Presidência. É difícil que alguém já tenha se esquecido da sua campanha eleitoral em 2010, saturada por cenas em que a candidata aparecia, em sondas, plataformas e navios, com mãos lambuzadas de petróleo, envergando indefectíveis capacetes e macacões da Petrobras.
O problema é que, desde então, a Petrobras converteu-se em inesgotável poço de temas espinhosos, que a presidente preferiria não ter de tratar na campanha da reeleição. O Planalto tem boas razões para estar preocupado. O potencial de desgaste político é, de fato, grande.
Para começar, é preciso ter em mente que, por impressionantes que sejam, as perdas decorrentes das trapalhadas de Pasadena são incomparavelmente menores que as envolvidas no faraônico projeto da Refinaria Abreu e Lima, imposto pelo Planalto à Petrobras. E, como já tive oportunidade de destacar em artigo publicado neste mesmo espaço, em 4 de julho, sob o título “Desperdício em grande escala”, Dilma Rousseff é a figura chave para esclarecer como essa imposição de fato se deu, pois ocupava posições centrais em cada um dos principais elos da cadeia de comando com que o Planalto controlava os investimentos da Petrobras. Era, ao mesmo tempo, ministra-chefe da Casa Civil da Presidência, coordenadora do PAC e presidente do Conselho de Administração da Petrobras.
Mas as dificuldades com as duas refinarias são apenas parte dos espinhosos problemas que vêm aflorando na empresa. O irresponsável represamento de preços de combustíveis vem não só impondo grande desgaste ao governo, como exigindo dotes de malabarista para tentar manter um discurso que faça sentido sobre a questão. A rápida deterioração das contas da Petrobras, na esteira da “queima de caixa” decorrente desse represamento, vem reforçando expectativas de que o governo não terá como deixar de aumentar preços de combustíveis logo após as eleições. Mas, empenhado em vender a ideia de que a inflação voltará a ficar abaixo do teto de tolerância da meta no fim do ano, o governo não quer dar alento a expectativas de um “tarifaço” pós-eleitoral. É o que explica as manifestações desencontradas sobre correção de preços dos combustíveis que vêm sendo feitas pelo governo e pela Petrobras.
Em entrevista ao “Valor” de 11 de agosto, Rui Falcão, presidente do PT, preocupado com a questão, apresenta a melhor racionalização que conseguiu articular para a política de represamento de preços de gasolina: “...Você tinha que fazer uma escolha entre remuneração de acionistas e o poder aquisitivo da população. E a Petrobras, além de ter acionistas, é um patrimônio do povo brasileiro.”
A racionalização revela visão confusa e deturpada do problema. O povo brasileiro, através do Tesouro, é o acionista controlador da Petrobras. Manter preços de gasolina irrealistas é uma política pervertida que subsidia proprietários de automóveis à custa do povo brasileiro. O governo só teve de apelar para esse represamento populista de preços porque não soube conduzir a política macroeconômica. Agora, só lhe resta tentar evitar na marra que a inflação fique ainda mais alta do que já está.

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Sobram razões para o Brasil lamentar o desaparecimento prematuro de Eduardo Campos, um dos políticos mais talentosos e promissores de que o País dispunha. Como bem mostrou sua entrevista ao “Jornal Nacional”, na véspera do acidente que lhe foi fatal, o candidato do PSB à presidência tinha visão extremamente lúcida da urgência de se dar encaminhamento mais consequente às grandes questões que hoje afligem o país.

sábado, 31 de agosto de 2013

Brasil: uma politica economica esquizofrenica - Rogerio Werneck, Rodrigo Constantino

Do blog do economista liberal Rodrigo Constantino:


30/08/2013
 às 15:27 \ EconomiaIntervencionismoLiberdade Econômica

O modelo equivocado tem mãe. Ou: O problema vem do andar de cima.

Muita gente torce para alguma indicação mais concreta de que o modelo econômico, visto por quase todos como equivocado, finalmente será alterado. Concessões mais amigáveis aos investidores, fim da contabilidade criativa e maior rigor no combate a inflação. Compram sonhos.
Não só nenhum dos principais nomes envolvidos na concepção do modelo foi rifado apesar dos fracassos, como é preciso constatar que a cabeça da Hidra está um andar acima. Guido Mantega e Luciano Coutinho, por exemplo, exercem sua influência na medíocre gestão da economia, sem dúvida. Só que não basta demiti-los – o que sequer foi feito, pois a crença no nacional-desenvolvimentismo está enraizada em quem dá as cartas.
É o que sustenta Rogério Werneck em sua coluna de hoje no GLOBO, “Um governo em apuros”. Ele diz:
A esta altura, qualquer esforço sério de restauração da credibilidade da política fiscal exigiria mudança da equipe econômica. Algo que o governo obviamente não está disposto a fazer. Não obstante o lamentável desempenho da economia e a extensão do descrédito da política fiscal, a presidente não parece ter intenção de fazer qualquer alteração maior na equipe econômica, seja na Fazenda, seja no Tesouro, seja no BNDES.
Isso sugere que o problema de falta de credibilidade da política econômica é de solução bem mais difícil do que em geral se pensa. É preciso levar mais a sério o que diz a presidente Dilma, quando se dá ao trabalho de esclarecer, com todas as letras, que, na verdade, a central de formulação e condução da política econômica está instalada no terceiro andar do Palácio do Planalto. Só não entende quem não quer.
Exato. Quem determina os rumos das políticas econômicas é a própria presidente. Ela que tem endossado os malabarismos todos, o grau assustador de intervencionismo estatal, o congelamento de preços, os subsídios do BNDES. A visão distorcida acerca do funcionamento da economia não é apenas do segundo escalão, que por lábia aguçada teria persuadido a chefona. É da própria chefe!
E agora, com apenas um dado de crescimento acima do esperado, sendo que todas as previsões já apontam para recuo no próximo trimestre, o governo voltou a vender euforia e ridicularizar os “pessimistas”. Já vimos o fundo do poço, diz Mantega, mais torcedor que qualquer coisa.
Com isso, o equívoco ganha sobrevida. A equipe que vem adotando tantas medidas erradas respira aliviada, aumentando o grau de tensão do mercado. Menos pressão para mudar o rumo. Mais problemas à frente. Tudo devidamente apoiado pela própria presidente Dilma.

domingo, 9 de junho de 2013

O Brasil que nao da' certo - Rogerio Furquim Werneck

O Brasil que não está dando certo
Rogério Furquim Werneck
 O Globo, 7/06/2013

Na última campanha presidencial, o País foi conclamado pela candidata vitoriosa a escolher entre “o Brasil que dava errado e o Brasil que está dando certo”.
Passados pouco mais de 30 meses, o problema central do governo eleito em 2010 passou a ser evitar que se dissemine no eleitorado o sentimento de que o Brasil não está dando certo.
No início deste ano, já não havia dúvida de que o desempenho econômico do primeiro triênio do governo Dilma Rousseff estava fadado a ser muito medíocre. E, como essa perspectiva havia deixado o PT bastante apreensivo, o lançamento da campanha presidencial foi antecipado, para conter o ceticismo do partido sobre o projeto da reeleição.
Em entrevista ao GLOBO, em 28/4, o senador Jorge Viana, prócer inequívoco do partido, confirmou que a antecipação da campanha, patrocinada por Lula, em fevereiro, havia sido “um movimento interno para o PT. Como alguns levantavam dúvidas, ele disse que ela era candidata. Com isso liberou a presidente para ficar livre, leve e solta para governar”. Se, de fato, era essa a intenção, o efeito tranquilizador sobre o PT durou pouco.
O País chega ao fim do primeiro semestre com um quadro inflacionário preocupante e perspectivas de expansão da economia cada vez mais desalentadoras. O desempenho do nível de atividade no primeiro trimestre reforçou as previsões de mais um ano de crescimento pífio.
A mediana das últimas expectativas de mercado coletadas pelo Banco Central já aponta para uma taxa de expansão do PIB de menos de 2,8% em 2013. O que deixaria a taxa média anual de crescimento do primeiro triênio do governo Dilma Rousseff em pouco mais que 2,1%.
É natural que o PT esteja de novo alvoroçado e apreensivo com os riscos da reeleição. Há meses, o partido ainda alimentava a fantasia de que, em 2014, poderia tentar vender ao eleitorado um pacote fechado de 12 anos de governo petista, no qual o desempenho sofrível dos quatro anos de Dilma estivesse compensado pelo desempenho dos oito anos de Lula. Mas já percebeu que isso não será tão fácil. Há poucos dias, o próprio presidente do PT reconheceu que o legado dos anos Lula será “insuficiente para garantir a reeleição”.
Na verdade, não é só o PT que vem acalentando a ideia de um Plano B. A antecipação da campanha presidencial vem obrigando toda a base aliada — governadores, senadores e deputados — a antecipar seu reposicionamento para as eleições 2014. E é a incerteza sobre o projeto da reeleição que explica boa parte das notórias dificuldades que a presidente vem enfrentando para manter a base aliada sob controle.
Em longa entrevista publicada em livro sobre os 10 anos de presidência petista, Lula relata de forma muito franca as dificuldades que teve de enfrentar para levar à frente a ideia de lançar Dilma Rousseff como candidata a presidente.
“Eu sei o que eu aguentei de amigos meus, amigos mesmo, não eram adversários, dizendo: Lula, mas não dá. Ela não tem experiência, ela não é do ramo. Lula, pelo amor de Deus.” É fácil imaginar, tendo em vista o que se viu nos últimos 30 meses, a pressão que esses mesmos interlocutores estarão fazendo, agora, para que o projeto da reeleição ceda lugar a um Plano B.
Em meio ao clima de desconfiança que vem marcando as relações do Planalto com o PT e a base aliada, a presidente, em atitude defensiva, vem tentando recuar para um círculo mais restrito de auxiliares, com quem teve oportunidade de construir relações mais sólidas.
Bem ilustra esse recuo a crescente ascendência que vem tendo o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, sobre a presidente, graças à confiança mútua desenvolvida entre eles desde a época em que foram ambos secretários do governo Olívio Dutra, no Rio Grande do Sul. Nesse caso específico, é fácil perceber que o recuo da presidente para um círculo mais restrito de auxiliares não é sem custo. Implica grave perda adicional de racionalidade na condução da política econômica.

Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio.

sábado, 11 de maio de 2013

O Brasil a caminho da derrocada fiscal, deliberadamente - Rogério Furquim Werneck

O Brasil está a caminho de uma crise fiscal, ou de uma crise de transações correntes, ou ambos, o que vier antes...
E o pior é que é deliberado, ou seja, já nem se vê mais os antigos disfarces de antigamente (de poucos anos atrás), quando se aumentava o gasto público mas de maneira discreta, quase envergonhada, dizendo que se pretendia preservar as metas fiscais de pelo menos 3,1% do PIB ou algo próximo disso (e vejam que essa proporção de superávit primário não permite sequer pagar todos os juros da dívida pública, que sempre fica acima disso).
Agora, já sabemos, o governo não pretende mesmo manter disciplina fiscal, e sim gastar por conta. Por conta não se sabe bem do que, já que não consegue, justamente, pagar todos os juros da dívida, que vem aumentando gradativamente, sendo que um terço disso está em poder do Banco Central, algo que em outros países é proibido.
Tem também a deterioração rápida das transações correntes, pela redução (ou talvez até eliminação) do saldo comercial. Se os investimentos diretos não forem suficientes, vamos recorrer às reservas internacionais, mas esse dinheiro pode acabar rápido, pois quando os investidores estrangeiros perceberem que o governo está justamente gastando por conta e avançando sobre as reservas, vão sair rapidamente para evitar de perder dinheiro com a desvalorização (em princípio assegurada pelo regime de flutuação, mas nem isso sabemos se vai ser cumprido).
Ou seja, de todos os elementos estabelecidos no final dos anos 1990, o famoso tripé de 1999 -- metas de inflação, superávit primário, e responsabilidade fiscal, que vai junto, e o câmbio flutuante -- já não sobra mais nada, nadicas de peteberebas.
Os keynesianos de botequim que nos governam ainda vão conseguir afundar este país...
Paulo Roberto de Almeida 


Rogério Furquim Werneck, O Globo
Está em curso uma alarmante escalada no processo de demolição institucional que, já há algum tempo, vem botando abaixo o arcabouço que sustentou a condução da política fiscal ao longo dos últimos 15 anos.
Em entrevista publicada no “Valor” em 29/4, véspera da divulgação do desastroso desempenho das contas públicas em março, o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, anunciou com todas as letras que o governo deixou de trabalhar com uma meta rígida para o superávit primário, para poder ter “liberdade” para conduzir uma política fiscal mais contracionista ou expansionista, “dependendo do momento”.
Anunciou também que o novo arranjo de condução da política fiscal, já em vigor em 2013, será mantido, não só em 2014, como no próximo mandato, caso a presidente seja reeleita.
O anúncio merece toda a atenção. Afinal, o que se noticia (“Folha de S.Paulo”, 4/5) é que o secretário do Tesouro vem tendo crescente ascendência sobre a presidente e papel ativo nas articulações para a reeleição, devendo integrar a futura coordenação da campanha eleitoral.
Encarregado de conceber a “plataforma econômica para o segundo mandato”, o secretário vem sendo visto como o provável sucessor do ministro Guido Mantega.
Na verdade, o novo arranjo é ainda pior do que pode parecer à primeira vista. A ideia, esclareceu o secretário, não é eliminar a meta de 3,1% do PIB para o superávit primário do setor público e, sim, dar às autoridades fazendárias liberdade para descumpri-la na extensão que julgarem razoável, ao sabor dos acontecimentos.
A meta permaneceria como uma miragem a que o Banco Central, por exemplo, poderia continuar a fazer menção, ao explicitar as premissas sobre política fiscal que estariam pautando a condução da política monetária.
As declarações do secretário deixaram patente a desarticulação que hoje se observa entre a política monetária e a política fiscal. Num momento em que o Banco Central está supostamente empenhado em elevar a taxa de juros para conter a demanda agregada, o secretário se diz convencido de que a economia precisa ser estimulada pelo lado fiscal.
Tendo relaxado de várias formas as restrições fiscais dos governos subnacionais, o Tesouro anunciou há algumas semanas que não pretendia compensar o não cumprimento de metas de superávit fiscal pelos Estados e municípios. Mas, agora, o secretário informou que, quando uma política expansionista se fizer necessária, o Tesouro estará pronto a facilitar a expansão fiscal dos estados e municípios, já que não faria sentido que o gasto público aumentasse num nível da federação e caísse em outro.
Um arranjo de política fiscal contracíclica, seriamente concebido, que desse a devida importância à sustentabilidade fiscal, representaria grande avanço na condução da política macroecômica no país. Mas não é bem isso que o governo tem em mente.
O que o secretário quer vender como política fiscal contracíclica é só a falta explícita de compromisso com metas e regras de qualquer espécie. E a possibilidade de racionalizar qualquer desempenho fiscal, a posteriori, com uma boa história de última hora sobre política de demanda agregada.
Em países onde a política fiscal contracíclica tem sido conduzida com seriedade, as autoridades fazendárias são pautadas por metas de médio prazo, regras fiscais claras e exigências de transparência que asseguram previsibilidade e possibilidade de aferição objetiva de desempenho.
A condução da política contracíclica pode ser monitorada pelos agentes econômicos e devidamente levada em conta pelo Banco Central. Algo bem diferente da simples declaração de descompromisso com restrições à política fiscal que acaba de ser feita pelo Tesouro.
No arranjo totalmente discricionário agora instaurado, o secretário do Tesouro conduzirá a política fiscal como bem entender. Uma perspectiva que se afigura ainda mais preocupante, quando se tem em conta a visão primitiva e insensata das questões fiscais que têm pautado a atuação de Arno Augustin na Secretaria do Tesouro Nacional.

Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Cavalgando um dragao (e achando que vai doma-lo) - Rogério Furquim Werneck


Rogério Furquim Werneck
O Globo, 26/04/2013

Em meio ao caótico discurso econômico do governo, passou quase despercebida uma declaração do vice-presidente Michel Temer, feita no fim de março, que explicita com clareza, ainda que de forma um tanto rudimentar, a premissa básica da aposta que deve pautar a atuação da presidente Dilma Rousseff nos próximos 18 meses. “Uma coisa é a macroeconomia. Outra é a economia do cotidiano. PIB e pibinho não interessam ao povo. Ele quer saber de emprego e se vai poder comprar um frango e um ventilador.” (O GLOBO, 27/3.)
A aposta do Planalto é que, mesmo que a economia continue mostrando crescimento medíocre, o governo conseguirá prolongar, até outubro do ano que vem, a sensação de prosperidade que vem sustentando o bom desempenho da presidente nas pesquisas de opinião pública.
Até há pouco tempo, o governo ainda alimentava a fantasia de que poderia ostentar taxas relativamente altas de crescimento do PIB na segunda metade do mandato. Agora, parece ter baixado o canhão. Já se contenta com pouco. O que se diz no Planalto é que, se 2013 fechar com crescimento do PIB de 3% e inflação de 6%, “pode mandar preparar a faixa”. (“Valor”, 9/4.) Mas, por enquanto, nem mesmo esse desempenho tão modesto parece assegurado.
Salta aos olhos que a ideia da prosperidade sem crescimento não pode ir muito longe. Está fadada ao fracasso. É só uma questão de tempo. E quem ainda mantém um mínimo de lucidez dentro do governo sabe perfeitamente que 18 meses é muito tempo. Com tanta água para passar debaixo da ponte, muita coisa ainda pode dar errado.
No começo do ano, o plano de jogo do governo era acelerar a recuperação da economia a qualquer custo e, em paralelo, conter o agravamento do quadro inflacionário com medidas pontuais de desoneração, improvisadas a cada mês, no calor da refrega. Mas, com a inflação rompendo o teto da meta, a perda de credibilidade do Banco Central chegou a tal ponto que o Planalto se viu obrigado a dar sinal verde para novo ciclo de alta da taxa de juros.
Não obstante a timidez da coreografia de contração monetária que o Banco Central parece ter em mente, a elevação da taxa de juros tornou a recuperação ainda mais incerta do que já era. E, como a política fiscal continua em desvario expansionista, a incerteza advinda da incoerência da política macroeconômica vem dando lugar a ambiente cada vez menos propício ao florescimento do investimento. O alegado mau humor dos investidores com a economia é perfeitamente explicável.
O sinal verde para que o Banco Central comece a elevar a taxa de juros não significa em absoluto que o governo tenha abandonado a tentativa de mascarar a inflação no curto prazo, com medidas pontuais de desoneração que trarão agravamento do quadro inflacionário num prazo um pouco mais longo.
O governo ainda não conseguiu entender que cortar tributos é uma medida expansionista. Por mais defensável que possa ser, acaba trazendo pressões sobre a inflação, em decorrência do estímulo à demanda que advém do aumento da renda disponível.
O curioso é que a própria presidente Dilma Rousseff, no pronunciamento à nação feito em 8 de março, descreveu com riqueza de detalhes o estímulo à demanda que a desoneração da cesta básica deflagraria. “A partir de hoje todos os produtos da cesta básica estarão livres de pagamento de impostos federais. Espero que isso baixe os preços desses produtos e estimule a agricultura, a indústria e o comércio, trazendo mais empregos. Com essa decisão você, com a mesma renda que tem hoje, vai poder aumentar o consumo de alimentos e de produtos de limpeza e ainda ter uma sobra de dinheiro para poupar ou aumentar o consumo de outros bens.”
É espantoso que, tendo lido exatamente isso na TV, a presidente não perceba que o alívio efêmero que as medidas de desoneração trouxerem à inflação logo dará lugar a um agravamento do quadro inflacionário. É bem possível que perceba. Mas tenha a esperança de que esses efeitos deletérios não se façam sentir com muita intensidade antes de outubro do ano que vem.

Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Pausa para humor ao contrario, ou seja: terrorismo economico - Rogerio Furkim Werneck

POLÍTICA
Reeleição a qualquer custo
Rogério Furquim Werneck
O Globo, 12/04/2013

Pensando no imediatismo e na inconsequência que vêm marcando a condução da política econômica no país, por conta da precoce fixação do Planalto na reeleição, lembrei-me de uma passagem marcante de um livro que li há mais de 50 anos.

Sou da época em que crianças ainda liam Júlio Verne. Assim mesmo, com prenome aportuguesado, como o autor era conhecido por aqui. “A volta ao mundo em oitenta dias”, publicado em 1873, é um dos seus livros mais famosos. Conta as aventuras de Phileas Fogg, um solteirão inglês rico e excêntrico, que aposta com outros sócios de seu clube que poderia fazer uma viagem ao redor do mundo e retornar a Londres em apenas 80 dias. Bastam dois parágrafos curtos para situar, no enredo, o episódio de que me lembrei.

Fogg cruza a Europa e a Ásia, atravessa o Pacífico e segue, por trem, de San Francisco a Nova York. Mas não chega a tempo de embarcar no navio em que pretendia retornar à Inglaterra. E aí se vê em dificuldades. Os navios que estavam prontos para zarpar não eram suficientemente rápidos. Os que eram, não sairiam a tempo de Nova York.

Mas Fogg afinal descobre o Henrietta, um cargueiro que parecia adequado, prestes a partir vazio para Bordeaux. Era um navio típico do período de transição da navegação a vela para a vapor. Já tinha propulsão a vapor, mas ainda era dotado de velas. E, afora o casco de aço, a caldeira e a máquina a vapor, era todo de madeira.

Fogg embarca no Henrietta e consegue desviá-lo para a Inglaterra, graças a um motim por ele fomentado. Mas a travessia acaba tendo de ser feita em meio a uma tempestade. E logo fica claro que o estoque de carvão do navio, dimensionado para uma travessia calma de Nova York a Bordeaux, era insuficiente para a viagem a todo vapor, em mar revolto, que estava sendo empreendida.

É nesse ponto que vem o episódio que me veio à mente (capítulo 33, para quem se interessar). Com o carvão prestes a acabar, Fogg convence o capitão, a quem o navio pertencia, a lhe vender o Henrietta. E, para manter a pressão da caldeira, ordena que todas as partes em madeira do navio sejam desmanteladas e lançadas à fornalha. Quando, afinal, o Henrietta chega às Ilhas Britânicas, só lhe restam o casco, a caldeira e a máquina a vapor.

A ideia de um navio que vai sendo desmantelado para que seus pedaços sejam usados como combustível que o mantém em movimento propicia excelente metáfora para perceber com mais clareza o que hoje vem ocorrendo no país. Ajuda a realçar o que há de mais errado na forma inconsequente com que a presidente Dilma Rousseff vem tentando assegurar sua reeleição a todo custo, em frenético vale-tudo.

Não há espaço aqui para um balanço de tudo o que já foi desmantelado para avivar a fornalha da reeleição. Mas uma lista curta teria de incluir o controle da inflação, a credibilidade do Banco Central e previsibilidade da política fiscal.

Num quadro em que o dispêndio público continua a mostrar rápida expansão, já não se tem mais ideia do que será o resultado fiscal de 2013, deixado agora ao sabor de pacotes de desoneração anunciados de improviso, a cada mês, em desesperada tentativa de mascarar a inflação com medidas que implicam inflação mais alta no futuro.

Merecem ainda destaque o abandono cada vez mais escancarado da ideia de realismo tarifário — como bem ilustra a insistência na política de preços de derivados de petróleo — e a decisão populista de não repassar, aos consumidores, o custo mais alto da energia elétrica proveniente das térmicas. E há, também, outras conquistas valiosas, como a solidez dos bancos federais, sendo consumidas na fornalha da reeleição.

A inconsequência na gestão da Petrobras e do pré-sal não pode deixar de ser mencionada. Mas tem mais a ver com o vale-tudo anterior, que marcou a travessia do biênio eleitoral de 2009-2010.

Faltam hoje 560 dias para o segundo turno das eleições presidenciais. Uma travessia de 80 semanas. E ainda há muito o que queimar a bordo. Mas em que estado estará o nosso Henrietta no fim de outubro do ano que vem?

Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio.