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quinta-feira, 31 de julho de 2014

PIB da América Latina: crescimento baixo do Brasil, da Venezuela e do Mexico

Da coluna virtual da jornalista Miriam Leitão, no site do jornal O Globo:
30/07/2014

Na AL, Brasil foi dos que menos cresceu no pós-crise

O gráfico abaixo é um complemento da coluna "Os fatos da crise". Mostra o crescimento acumulado entre 2008 e 2013 das 10 principais economias da América Latina. O Brasil teve o terceiro pior desempenho, com alta de 19,3%, na frente apenas de Venezuela e México.

Foram apenas dois anos de PIB forte, 2008 e 2010; um de leve recessão, 2009; e três de crescimento muito baixo, entre 2011 e 201.

quinta-feira, 24 de julho de 2014

Robert E. Lucas: The Wealth of Nations in the 21st Century - YouTube

Robert Lucas é um dos grandes economistas americanos, ou do mundo, simplesmente.
Mas ele parece ser melhor no papel do que no microfone. Sua exposição num encontro de Barcelona é muito importante, sobre a riqueza das nações desde o século 18 até o futuro previsível.
Mas ele parece ser um péssimo expositor.
Seria melhor tentar conseguir o seu paper, ou sua apresentação, e postar aqui.
Quem fizer isso ganha um pirulito.
Por enquanto esta apresentação meio difícil em YouTube, feita em Barcelona no dia 21/03/2014.
Paulo Roberto de Almeida

https://www.youtube.com/watch?v=5oOgx_JF9ww

quarta-feira, 23 de abril de 2014

O Brasil como inimigo do Brasil: produtividade e crescimento

Brasil improdutivo

Editorial Folha de S. Paulo, 22/04/2014


Aumento de riqueza gerado por trabalhadores nacionais avança de modo lento; país perde mercado para chineses até na vizinha Argentina

Não faltará quem se agaste, por aqui, com o tom um tanto derrisório da reportagem desta semana na revista britânica "The Economist" sobre a economia do Brasil. Será um erro, daqueles que se explicam quando a paixão turva o raciocínio e a objetividade.
"Você começa a perder tempo no momento em que pisa no Brasil", queixou-se à publicação o empresário texano Blake Watkins, que saiu de Nova York para abrir um restaurante fast food em São Paulo.
Não é preciso deixar de ser patriota para reconhecer que o empresário tem razão. Basta atentar para o trânsito infernal, a morosidade da burocracia, o custo e a qualidade incompatíveis dos serviços --públicos ou privados.
A "Economist" não se limita a juízos de valor, e talvez por isso cause tanto incômodo. O Brasil investe só 2,2% do PIB em infraestrutura, muito abaixo da média de 5,1% no mundo em desenvolvimento. De 278 mil patentes concedidas em 2013 pelos Estados Unidos, meras 254 foram para invenções brasileiras.
No domingo, reportagem desta Folha corroborou o descaso nacional com a inovação, mãe verdadeira do aumento sustentável de produtividade. O Inpi (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) consome em média 10 anos e 10 meses para conceder uma patente. No campo das telecomunicações, o prazo médio está em 14 anos e 2 meses.
Entre países desenvolvidos, esse intervalo não ultrapassa três anos: nos EUA são 2 anos e 7 meses; no Japão, 2 anos e 6 meses; na China, 1 ano e 11 meses. Não é difícil compreender por que um empreendedor descartaria o Brasil como opção para sediar um laboratório de desenvolvimento de semicondutores, por exemplo.
A chave do atraso, como aponta com exatidão a revista britânica, está na produtividade.
O produto anual do trabalho de um empregado brasileiro está na casa de US$ 20 mil (calculado pela metodologia de paridade de poder de compra). Nos anos 1960, era da ordem de US$ 15 mil, maior que o obtido por sul-coreanos --os quais, hoje, produzem quase US$ 70 mil. A China, que partiu de patamar muito inferior, já nos alcançou.
Não estranha, assim, que o Brasil esteja perdendo mercado para exportações chinesas até na Argentina, sua grande parceira de Mercosul. Em 2005, a participação brasileira nas importações argentinas estava em 36,5%; no primeiro trimestre de 2014, ficou em 24,8%. No mesmo período, a China saltou de 5,3% para 18,4%.
Indignação, apenas, nada pode contra essas cifras acabrunhadoras. É imperativo convertê-la em brio, algo muito mais produtivo.

Em busca do tempo perdido

Coluna / Vinicius Torres Freire


Patente leva 14 anos para sair; opressão da burocracia merece ser grande tema da eleição

Uma patente demora em média dez anos para sair no Brasil. Deu nesta Folha, no domingo.
O cidadão inventa um troço, processo, planta modificada, videogame, app, ou sabe-se lá, e recebe seu título de proprietário intelectual uma década depois. Se é criador da área de telecomunicações, pode esperar 14 anos.
O que são meros 14 anos? Jacó teve de trabalhar de graça por 14 anos a fim de casar com Raquel. Mas o caso era de um amor daqueles bíblicos, Jacó tinha paciência de Jó e, enfim, isso se passou em um tempo em que, como se sabe, não existiam telecomunicações.
Em 1993, o Cern, o centro de pesquisas europeu onde se inventou a web, tornou a tecnologia disponível, grátis, sem requerer pagamento de royalties, o que desencadeou a massificação da internet. Era uma internet movida a lenha, ligada por meio de chamada telefônica, de conexões e computadores velozes como o governo brasileiro.
Em 2007, 14 anos depois, aparecia o iPhone, por exemplo, internet fácil e outros mil badulaques na palma da mão.
Enquanto isso, em 14 anos, um papel entrava pela porta de uma repartição brasileira e saía pelos fundos, comido pelas traças e comendo a poeira da história tecnológica em revolução.
Proust levou 14 anos para escrever as milhares de páginas de "Em Busca do Tempo Perdido". Enfim, chega de piada.
O Instituto Nacional de Propriedade Industrial, o INPI, que concede patentes, não tem funcionários bastantes. O salário não atrai os trabalhadores qualificados necessários, pois é menor que o de muito inútil da praça dos Três Poderes e cercanias.
Uma patente sai quatro vezes mais rápido nos EUA. Seis vezes mais rápido na China e na Coreia do Sul.
Estamos acostumados a esse tipo de estatística comparada deprimente. O Brasil é líder em perda de tempo para pagar tributos, tirar mercadoria do porto, preencher papel para exportar ou abrir um negócio etc.
No começo deste mês, Dilma Rousseff disse a empresários do comércio que seu governo está "totalmente comprometido com o processo de desburocratização". É uma frase burocrática: 1) a presidente fala de um "PROCESSO de desburocratização"; 2) o "processo" já leva mais de três anos e nada.
O que há? Em certos serviços, faltam mesmo funcionários (analistas no INPI, auditores fiscais etc.). Mas, em quase 20 anos de governos mais "modernos", não foi possível colocar servidores em lugares certos e encarregar um desses 171 ministérios de limpar a área burocrática?
A lista de perversões, ignorâncias e opressões que explicam a burocracia estúpida não cabe nestas colunas, para nem mencionar a grande burocracia privada que nos inferniza com as teias do 0800. Mas um motivo da paralisia merece menção honrosa: governos sem dinheiro favorecem a opressão burocrática.
Em deficit perigoso, o governante não vai bulir com leis fiscais e com funcionários que coletam o dinheiro escasso, isso quando não incentivam setores mais militantes do fisco a aumentar a barafunda.
Está aí um tema popular de campanha eleitoral e um projeto civilizatório de governo que custa muito pouco além de trabalho e inteligência: dar um jeito na opressão das burocracias públicas e privadas.

sábado, 1 de março de 2014

Governo brasileiro vs Financial Times: jequice involuntaria? - Reinaldo Azevedo

Num ato de jequice calculada, governo do Brasil responde a uma crítica do “Financial Times”
Que preguiça!
Desde quando, mundo afora, um chefe de governo bate boca com um órgão de comunicação porque este emitiu uma opinião desfavorável? Aconteceu mais uma vez com Dilma. O jornal “Financial Times” publicou nesta quarta um editorial em que afirmou que Guido Mantega deveria ser substituído por um ministro da Fazenda pró-mercado. Segundo o texto, diante do Brasil, os investidores antes diziam: “Vamos lá”. Agora, “deixem pra lá”. Pois é… Imaginem o presidente Obama mobilizando seus assessores para responder a editoriais críticos aos EUA…
Dilma subiu nas tamancas mais uma vez. Thomas Traumann, secretário de Comunicação, enviou uma resposta ao jornal cheia de ironia, um atributo das almas superiores. “Talvez [o critério utilizado seja] um crescimento econômico de 2,3% em 2013, ou uma taxa de desemprego de 5,4% no ano passado, ou talvez reservas internacionais de US$ 376 bilhões e taxas de inflação abaixo de 6%”. Com isso, convidava os britânicos a comparar a sua própria taxa de crescimento (1,8%) e de desemprego (7,1%) com as do Brasil. Com a devida vênia, é pra enganar trouxa. Se for para falar a sério, então é preciso começar a comparação pelo PIB per capita. Mais: um empregado considerado “classe média” no Brasil certamente preferiria ser um desempregado na Grã-Bretanha…
Mas a questão relevante é outra. Não foi o governo britânico que se referiu ao Brasil, mas um jornal. Será que a Casa Branca enviará uma carta à VEJA ou à Folha ironizando o Brasil se esses dois veículos criticarem em editorial decisões daquele governo? Trata-se de uma jequice calculada. Esse tipo de coisa açula um certo nacionalismo bocó.
Não é a primeira vez que o Planalto faz isso. Em dezembro de 2012, a revista The Economist, também britânica, alertava que o Brasil estava se tornando menos atraente e que Mantega já não era mais capaz de enfrentar os desafios da economia. Criticou ainda o excesso de ingerência do estado: “Um bom exemplo é o aparente desejo de Dilma de reduzir o retorno sobre o investimento na ‘base do porrete’, não só para bancos, mas também para as empresas de energia elétrica e fornecedores de infraestrutura”, escreveu a Economist, numa referência à insistência do Palácio do Planalto em querer convencer empresários a investir ao mesmo tempo em que lhes negava um retorno adequado para participar dos investimentos.
Bem, tanto a revista estava certa que o governo mudou as regras das concessões — embora tarde. Dilma ficou brava e chegou até a evocar a soberania nacional. Não é a primeira vez, diga-se, que o Financial Times aponta o acabrunhamento do Brasil. Em fevereiro do ano passado, diante do baixo crescimento de 2012, o jornal já chama o ministro da Fazenda de “Guido Vidente”.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Com Dilma, economia do país cresce no menor ritmo desde Collor - Blog Achados Economicos

Blog Achados Econômicos, 27/02/2013

A economia brasileira medida pelo PIB (produto interno bruto) cresceu 2,3% em 2013, depois de uma expansão de 1% em 2012 e de 2,7% em 2011, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Nos três primeiros anos da presidente Dilma Rousseff, portanto, o crescimento médio foi de 2%. O número é metade do verificado na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (4%), e ligeiramente inferior ao registrado no período de Fernando Henrique Cardoso (2,3%).
Também está bem abaixo do desempenho do período Itamar Franco (5%), mas muito acima da variação de -1,3% ao ano verificada nos três anos do ex-presidente Fernando Collor de Mello.
O gráfico abaixo mostra qual foi o ritmo de crescimento médio anual do PIB durante o mandato de cada presidente.
Apenas por curiosidade, calculei a média desde Getulio Vargas, que chegou ao pode em 1930. Mas naquela época as condições eram tão diferentes que não dá nem para comparar. Além de uma conjuntura nacional e internacional completamente diversa, o ritmo de crescimento da população era muito maior. Portanto, os dados que vão dos anos 1930 a mais ou menos 1980 estão aí só a título de curiosidade, mesmo.
Só para não perder a viagem, acrescento que, de 1930 até hoje, a economia brasileira registrou um crescimento acumulado de 5.134%.

Mundo
Em comparação com outros países, o período em que o PIB do Brasil teve o melhor desempenho desde 1990 foi o de Itamar, com um crescimento de 5%, acima da média do mundo, da América Latina e dos países emergentes e pobres.

No gráfico ao lado, os dados de 2013 são estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI), pois muitos países ainda não divulgaram o PIB do ano passado.
A economia brasileira cresceu menos do que a do mundo nos governos Collor e FHC, assim como nos três primeiros anos de Dilma. O país só superou ritmo do restante do planeta durante as gestões de Itamar e Lula.
No grupo dos emergentes e pobres há 154 nações que o FMI classifica dessa forma. Na América Latina, foram considerados 32 países, incluindo a região do Caribe. No mundo, incluí os 189 países sobre os quais o FMI tem dados.

Comparações
Com este texto, o blog Achados Econômicos encerra uma série de comparações do desempenho da economia brasileira no período de cada um dos últimos presidentes da República.
Considerando as séries históricas disponíveis, o período Dilma foi o melhor em termos de emprego e renda.
Quanto à balança comercial (diferença entre exportações e importações), à inflação e ao equilíbrio das contas públicas, a média anual desses indicadores nos anos Dilma foi menos favorável do que na era Lula e mais do que no período FHC.
Em relação à indústria, o ritmo de crescimento no governo Dilma é o menor desde Collor, como ocorreu com o PIB.
Como venho afirmando desde a primeira postagem desta série, a comparação do desempenho de indicadores econômicos não deve ser a única nem a principal maneira de avaliar um presidente, pois a economia é influenciada por diversos fatores que não estão ao alcance do chefe do Poder Executivo.
Mesmo assim, esse tipo de comparação é importante porque mostra quais foram os principais desafios macroeconômicos do país durante o mandato de cada um e ajuda a entender por que alguns presidentes se tornaram mais populares do que outros.
Se olharmos, por exemplo, para o período Lula, que encerrou seu segundo mandato sendo aprovado por mais de 80% da população adulta, os indicadores de emprego, renda, PIB, balança comercial, contas públicas e inflação estavam melhores do que o do seu antecessor, FHC. Este, por sua vez, foi nitidamente superior aos que o antecederam em termos de combate à inflação, como todos sabemos, o que explica sua eleição em 1994 e, provavelmente, sua reeleição, em 1998.

sábado, 25 de janeiro de 2014

Brasil e China no túnel do tempo - Marcos Troyjo

Brasil e China no túnel do tempo
FOLHA DE S. PAULO, Sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Suponha que os 3 mil participantes do Fórum Econômico Mundial entrassem num túnel do tempo. Regressariam até 1971, ano do primeiro encontro de Davos.

Lá chegando, os muitos CEOs, futurólogos e vencedores do Nobel fariam uma aposta. Que países do que à época se chamava “Terceiro Mundo” – hoje “emergentes” – seriam as estrelas da economia global em 2014?

Imagine que déssemos pistas aos ilustres senhores. Em algum momento entre 2020 e 2023, um dentre os emergentes superaria o PIB nominal dos EUA. Contabilizaria volume somado de exportações e importações acima dos US$ 4 trilhões anuais, tornando-se em 2014 a potência comercial líder.
Seu investimento em pesquisa e inovação rapidamente convergiria à média dos países ricos. Essa nação lideraria em 2013 o ranking da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) em número de marcas registradas, patentes e desenho industrial. Rivalizaria com os EUA na condição de principal destino de investimentos estrangeiros diretos (IEDs). 
Esse Davos imaginário poderia prever que tal país seria a China?
No início dos 70, a China não se distinguia pela planta manufatureira.  Já o Brasil, no auge do “Milagre”, era o maior parque industrial do Hemisfério Sul. O “Brasil Potência” crescia mais de 10% ao ano.  
Em 1978, China e Brasil tinham PIB equivalente: US$ 200 bilhões. O Brasil contava 100 milhões de habitantes. A China, 1 bilhão. De lá para cá, a população brasileira dobrou. A da China cresceu 30%, já levando em conta a reintegração de Hong Kong (1997) e Macau (1999). Nesse período, nossa economia aumentou 12 vezes. A da China multiplicou-se por 45. 
Por que a China decolou e o Brasil voou rente ao chão?
Muitos creditam a diferença do desempenho à mão forte de regimes autoritários e às virtudes do dirigismo. Isso é um equívoco. A China, da Revolução de 1949 até a morte de Mao Tsé-Tung em 1976, também era tenebrosamente ditatorial e planificadora – e sua economia não ia a lugar algum.
O Brasil redemocratizou-se nos 80 e cresceu comparativamente pouco desde então. Mas o problema não é a democracia. A questão é que,  com 40 % da renda circulando pelo Estado, o País continua estatizante e dirigista.
A diferença está no tipo de estratégia adotada. A economia chinesa, desde 1978, foi orientada a competir globalmente. Caracterizou-se por parcerias público-privadas, baixo custo trabalhista e tributário, acúmulo de poupança e investimento, atuante diplomacia empresarial.
Já a vertente brasileira foi voltada para dentro. Ambiente cartorial de negócios, busca de fortalecimento de "campeãs nacionais", política comercial e industrial defensiva, investimento mirrado, seguridade social que não cabe no PIB.
O túnel que Brasil e China atravessarão para chegar ao futuro é distinto daquele que os trouxe ao presente. Os chineses parecem saber disso. Hoje redirecionam seu modelo industrial-exportador rumo a uma economia em rede mais sofisticada. Será que o Brasil conseguirá fazer o mesmo com seu Capitalismo de Estado?   

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Ainda sobre o (nao) crescimento brasileiro: um texto PRAlmeida de 2007

Parece que o Brasil não anda, ele se arrasta.
Desde tempos imemoriais -- bem, desde os anos cinquenta, pelo menos -- temos um debate no país em torno de nossa obsessão nacional, o desenvolvimento.
O que quer que se diga sobre "estratégias" para satisfazer os que possuem obsessão com esse tipo de objetivo grandioso, deve-se dizer que sem crescimento seria impossível ter desenvolvimento, no máximo outra coisa, talvez redistribuição, como querem alguns, com acumulação de miséria, como conseguem os mais aloprados.
O debate atual gira em torno das mesmas questões: o crescimento, como chave para o desenvolvimento.
O problema é que o Brasil anda para trás, ou melhor, os companheiros o estão arrastando para trás, aplicando políticas da era militar, ou mesmo de muito tempo antes, algumas teorias mal costuradas de suposta herança cepaliana (coitados, eles não tem culpa dos nossos erros).
Bem, eu já escrevi muito sobre isto, e como estamos nesse tipo de debate, permito-me recomendar, e reproduzir aqui, um outro artigo meu sobre a questão:


1794. “Duro de crescer: obstáculos políticos ao crescimento econômico do Brasil”, Brasília, 2 setembro 2007, 10 p. Trabalho sobre as barreiras políticas a um maior crescimento econômico no Brasil. Espaço Acadêmico (ano 7, n. 76, setembro 2007; link: http://www.espacoacademico.com.br/076/76pra.htm). Feita versão completa para a Revista de Gestão Pública-DF (Brasília: Escola de Governo do GDF; vol. I, n. 1, jul.-dez. 2007, p. 29-36).

Duro de crescer: obstáculos políticos ao crescimento econômico do Brasil

Paulo Roberto de Almeida
Artigo destinado à
Revista da Escola de Governo do GDF

Resumo: Exposição e análise crítica dos principais impedimentos político-institucionais ao crescimento econômico no Brasil, cujo desempenho nos últimos dez anos tem ficado abaixo da média mundial e é três vezes inferior ao crescimento de outros países emergentes. São alinhados, no plano da experiência histórica de outras economias, os elementos tradicionais do crescimento econômico (estabilidade macroeconômica; microeconomia competitiva; boa governança; qualidade dos recursos humanos e abertura ao comércio e investimentos). Feita a lista dos problemas sistêmicos e políticos a um processo de crescimento sustentado, se procede a uma proposição de seis conjuntos de reformas consideradas indispensáveis para superar o atual quadro de letargia: política, tributária, educacional, securitária, trabalhista e administrativa.

Abstract: Description and critical assessment of the main political-institutional obstacles to economic growth in Brazil: its economic performance in the last decade has been half of the world average and a third only of comparable growth in other emerging economies. After considering, in comparative perspective with other countries, traditional components of economic growth (macroeconomic stability; competitiveness in the microeconomic domain; good governance; high quality of human resources and trade opening and to foreign investments), there is a discussion on the structural and policy problems and obstacles to a sustainable process of economic growth.  Finally, there is a set of proposals to overcome this situation, consisting of reforms in: political representation and electoral system, taxation, educational system, social security regime, labor and administrative reform.

Palavras-chaves: Brasil; crescimento econômico; obstáculos políticos; reformas: política, tributária, educacional, previdenciária, trabalhista, administrativa.

Key-words: Brazil; economic growth; political obstacles; reforms: political, taxation, educational, social security, labor, governance.


Em outubro 1988, ao saudar a promulgação da nova carta constitucional – a sétima ou oitava desde a independência, dependendo de como se considera a Emenda Constitucional de 1969 à Carta de 1967 – , o deputado Ulysses Guimarães, então seu pai putativo, apelidou-a de  “Constituição cidadã”. Será mesmo?
A julgar pelos efeitos provocados por ela na economia real do país, nos últimos vinte anos, ela mereceria talvez a alcunha de “Constituição madrasta”, uma vez que ela coloca obstáculos ponderáveis a um processo sustentado de crescimento econômico. Ou quem sabe, então, “Constituição corporativa”, tendo em vista os inúmeros arranjos feitos em favor de grupos especiais de cidadãos? O que distingue o Brasil, hoje, no contexto das economias emergentes, é precisamente o fato de que estamos crescendo menos da metade da média mundial e três vezes menos do que as mais dinâmicas economias emergentes.
Vejamos alguns dados recentes. Nos últimos anos, o Brasil conheceu uma formidável vitória na luta contra a inflação e na preservação de um dos pilares fundamentais do processo de estabilização macroeconômica iniciado com o Plano Real (1994). A elevação dos preços ao consumidor, que ameaçou esse processo ainda em 2002 e 2003, como conseqüência dos temores despertados com a disputa eleitoral naquele primeiro ano, despencou de mais de 16% para menos de 4% atualmente. Já o índice de risco-Brasil – medido pelo spread sobre a taxa básica dos títulos do Tesouro americano – caiu de 24 pontos para menos de 2 atualmente, o que é uma formidável inversão. Esta redução se deve, essencialmente, à política monetária do Banco Central, algo que foi difícil de aceitar em certos setores do pensamento econômico universitário, que passaram os últimos cinco anos condenando a autonomia de fato concedida ao Copom.
Esses dados são eminentemente positivos, sobretudo porque eles confirmam que o Brasil caminha para converter-se em um país “normal”, isto é, uma economia que apresenta taxas de inflação razoavelmente alinhadas com as médias mundiais, pelos menos para países emergentes, algo que não exibimos no último meio século, pelo menos. Em compensação, na frente do crescimento econômico, nosso desempenho é menos que brilhante, praticamente pífio, com uma taxa média de crescimento do PIB de menos de 3% ao ano desde o início dos anos 1990, em face de robustos 9% para a economia chinesa, de cerca de 6,5% para a economia indiana e de mais de 5% para a Coréia do Sul, não considerando os 7% da Irlanda.
A tendência declinante do crescimento econômico no Brasil não é de hoje, infelizmente, como sabem todos aqueles que convivem com as estatísticas do IBGE. Se convertermos o comportamento errático das taxas de aumento anual do PIB em uma linha tendência, veremos que sua inclinação é constantemente para baixo, desde o final dos anos 1970, quando ela deixa a casa dos 5% anuais, ostentados durante a maior parte do pós-guerra, para cifras inferiores à metade desse valor nos anos recentes.
De modo geral, dos anos 1940 aos anos 1980, o Brasil crescia a taxas superiores à média mundial, passando a exibir, a partir daí, um comportamento inferior ao do crescimento do PIB mundial. Em termos per capita, que é o que vale, finalmente, na vida das pessoas, as médias do período recente são extremamente preocupantes, uma vez que a taxa efetiva é próxima de 1,5% ao ano, o que significa que a renda per capita só dobraria em 75 anos, ou seja, o espaço de três gerações. Apenas para fins de comparação, a taxa do crescimento per capita atual da China, de cerca de 7,6% real ao ano, entre 1995 e 2004, significa que a renda dos chineses dobra em 17 anos, ou menos de uma geração. A continuar nesse ritmo, a China fará o Brasil passar a vergonha de ter a sua renda per capita ultrapassada por um país manifestamente pobre, ou dispondo, pelo menos de muitos pobres (algo como 300 ou 400 milhões de chineses, ainda).
A tabela abaixo reproduz o comportamento recente de algumas dessas economias:

Crescimento do PIB per capita, 1995 a 2004, taxas médias anuais
PIB per capita de países selecionados
US$ 1.000 PPP
Crescimento anual %
1995
2004
Estados Unidos
31,6
38,6
2,3
Alemanha
25,7
28,4
1,1
Coréia do Sul
15,5
20,8
3,7
Chile
8,5
10,7
2,6
Rússia
6,9
9,9
4,1
Brasil
7,2
8,2
1,5
China
2,9
5,5
7,6
Índia
2,1
3,0
4,1
Fonte: Banco Mundial.

Como se pode constatar, o Brasil foi a economia que menos cresceu em termos reais per capita, de todos os países em desenvolvimento, ficando até mesmo atrás de alguns desenvolvidos, como os Estados Unidos, só ganhando da Alemanha, que numa certa época já foi chamada de “a economia enferma da Europa”. Alguma razão deve existir para esse desempenho medíocre.

Os economistas do desenvolvimento costumam identificar um conjunto de fatores qualitativos, como constituindo requisitos necessários, mas não suficientes, para um processo sustentado de crescimento econômico (não confundir com “desenvolvimento”, que requer um processo sustentado de crescimento, com transformações estruturais no sistema produtivo, isto é, ganhos de produtividade, e distribuição social dos benefícios do crescimento). Estes requisitos podem ser resumidos nos elementos seguintes:
Requisitos para o crescimento:
1) Estabilidade macroeconômica
2) Microeconomia competitiva
3) Capacidade institucional
4) Qualidade dos recursos humanos
5) Abertura ao comércio internacional e aos investimentos diretos estrangeiros

Vejamos, rapidamente, cada um deles e como o Brasil tem se comportado em face desses elementos macro e microeconômicos.

1) Estabilidade macroeconômica
Desde o Plano real, o Brasil tem apresentado políticas macroeconômicas relativamente sólidas, com uma inflação baixa, contas nacionais razoáveis, isto é, tendentes ao equilíbrio, mas ainda caracterizadas por desequilíbrios setoriais (previdenciários, sobretudo) ameaçadores, e, desde 1999, uma taxa de câmbio competitiva, a despeito da valorização observada no período recente (e entre 1995 e 1999), o que, de toda forma, induz a ganhos de produtividade e ajuda a combater a inflação. Mas, a despeito de ter superado o histórico problema da vulnerabilidade financeira externa, o Brasil ainda sofre de grande fragilidade no comportamento futuro de suas finanças públicas, marcadas, como se sabe, por gastos exagerados em relação ao crescimento do PIB. Com efeito, os gastos públicos têm crescido duas vezes mais do que o PIB e do que a inflação, acarretando enorme pressão sobre o orçamento e, consequentemente, sobre a dívida. Uma projeção das tendências atuais indica, infelizmente, o crescimento contínuo das despesas públicas, sendo que a Constituição é em grande medida responsável por “gastos encomendados”.

2) Microeconomia competitiva
Uma microeconomia competitiva significa uma estrutura de mercados aberta e desprovida de barreiras a novos negócios, que devem ser o mais possíveis concorrenciais, ou seja, com a defesa efetiva da competição pelas autoridades governamentais encarregadas institucionalmente do setor, a ausência quase completa de cartéis e oligopólios setoriais e um mercado de capitais amplo e de fácil acesso. Infelizmente, o Brasil conhece diversos oligopólios setoriais e o ambiente de negócios é próximo do horroroso, se considerarmos a estrutura tributária, não apenas extremamente pesada, mas sobretudo ineficiente e altamente burocratizada. Conhecendo-se as tendências predominantes no Estado brasileiro, parece pouco provável que esse ambiente venha a mudar substancialmente no futuro previsível.

3) Capacidade institucional
Uma governança eficiente significa, em princípio, a remoção de incertezas políticas e a mudança no quadro de instabilidade legal que desestimulam os investimentos e prejudicam o crescimento. O Brasil conhece, indubitavelmente, uma situação de democracia estável, ainda que caracterizada por sua baixa qualidade institucional, com comportamentos rentistas inaceitáveis por parte de políticos e altos burocratas do Estado. A capacitação institucional de muitos quadros da burocracia pública apresenta deficiências preocupantes. Determinados serviços públicos apresentam uma situação deplorável de ineficiências e desvio de funções. A situação é tanto mais preocupante que o Brasil, no contexto dos países em desenvolvimento – e aqui cabe reconhecer o legado da era militar –, havia conseguido construir um Estado relativamente eficiente, dotado de uma burocracia bem organizada e “produtiva” (para os padrões desses países).

4) Qualidade dos recursos humanos
A qualidade da mão-de-obra, como sabem todos os economistas, é essencial para ganhos de produtividade. No Brasil, existe uma boa capacitação científica e gerencial, mas o ambiente legal deixa muito a desejar. A despeito do maior acesso educacional nos últimos dez anos, continuam a existir muitas diferenças regionais e sociais nos resultados de desempenhos exibidos nos diferentes ciclos da educação pública. Não é preciso lembrar que estamos muito atrasados na educação de massa e que a universalização foi seguida da baixa qualidade nos padrões. O Brasil tem desafios imensos nessa frente, uma vez que nossa mão-de-obra ostenta poucos anos de estudo – cerca de 5,5 anos, em média, comparados aos 11 anos, ou mais, dos trabalhadores da Coréia do Sul – e os resultados dos exames internacionais de desempenho escolar nos colocam nos últimos lugares da lista. Nossa educação pública é calamitosa!

5) Abertura ao comércio internacional e aos investimentos diretos estrangeiros
Como sabem também os economistas, o desempenho econômico de um país – isto é, os seus ganhos de produtividade – responde rapidamente ao maior incremento tecnológico de sua base produtiva e a uma maior inserção no intercâmbio global de mercadorias. Nesse particular, os progressos nessas áreas têm sido muito lentos, com a persistência de baixa inserção internacional no comércio de produtos mais demandados no mercado mundial. Atraimos poucos investimentos relativamente ao tamanho de nossa economia, realizamos, basicamente, exportação competitiva de commodities – e, futuramente, energia renovável – mas somos fracos nas manufaturas mais dinâmicas.

Numa palavra, como o Brasil se apresenta, hoje, no cenário mundial? O Brasil aparece, hoje, no âmbito da nova economia globalizada, como o país emergente menos preparado para crescer e exercer um papel mundial de relevo, com exceção, talvez, no campo das energias renováveis (biomassa, isto é, etanol e biodiesel, com ênfase no primeiro). O curioso de ser constatado é que nenhum dos problemas brasileiros comumente identificados – problemas nas contas públicas, má qualidade da educação, corrupção, ineficiência do Estado, ausência de competição no seu sistema econômico, baixo desempenho tecnológico – deriva da globalização; todos ele são “made in Brazil”…
Nos últimos vinte e cinco anos de história econômica mundial, tivemos países que podem ser chamados de “convergentes” –  isto é, economias que melhoraram o seu desempenho e que se aproximaram dos padrões econômicos conhecidos na OCDE; são elas as da Ásia Pacífico, da Ásia do Sul e países europeus que demandaram ingresso na UE – e países que claramente podem ser identificados como “divergentes”: eles estão na África, na América Latina e no Oriente Médio e são economias que permaneceram estagnadas ou retrocederam, relativamente (alguns em decorrência de choques externos (peso da dívida, por exemplo) ou até mesmo absolutamente (é o caso do fenômeno conhecido como falência política –  failed States –, com diversos exemplos africanos e, no caso da América Latina, do Haiti).
No caso do Brasil, não chegamos a esses extremos, mas pode-se, deve-se, reconhecer que nosso desempenho caminhou abaixo das possibilidades. Basta lembrar, por exemplo, que no ínicio dos anos 1960, o Brasil exibia o dobro da renda per capita da Coréia do Sul – grosso modo, cerca de 600 dólares, contra menos de 300 –, ao passo que, quarenta anos depois ela nos supera por um fator de 3 (quase 20 mil dólares em paridade de poder de compra, contra menos de sete para o nosso caso). Deve haver razões para esse desempenho pífio em termos de crescimento. De fato, no período recente, a taxa de crescimento anual do PIB brasileiro tem sido a metade da taxa mundial, enquanto o valor correspondente para os demais países emergentes representa 1,5 vezes aquela taxa. O Brasil é o “lanterna” dos emergentes e não há indicações que este comportamento possa ser alterado no futuro previsível.

As razões do não-crescimento e da inércia, no caso brasileiro, podem ser: (a) episódicas, ou seja, conjunturais, isto é, derivadas da inflação, da desorganização, ou até da instabilidade econômica, o que, sinceramente, não parece ser o caso, pelo menos desde o Plano Real, ou, então, desde a mudança de regime cambial em 1999 (com a introdução da flutuação); ou, então, essas causas podem ser: (b) sistêmicas, ou estruturais, o que provavelmente é o caso. O que o sistema político tem a ver com isto?
Comecemos pela Constituição “cidadã”. Ela tem estas particularidades: em seu texto, a palavra “direito” aparece 76 vezes; já a palavra “dever” aparece apenas 4 vezes; o conceito de “produtividade” comparece duas vezes, tão somente e “eficiência” uma única e solitária vez (apud: José Pastore, “O trem da alegria”, OESP, 21.08.07, p. B-2). Devem existir fortes razões para esta disparidade conceitual. Ao ver de alguns observadores, esta situação apresenta alguma coincidência com o fato de a elaboração constitucional ter ocorrido antes da queda doo muro de Berlim e da derrocada final do sistema socialista.
Pode ser: em todo caso, não deveria ser para nós motivo de orgulho especial verificar que o governo anuncia, até com certa euforia, que o programa “Bolsa-Família” atende a 11,1 milhões de famílias, um entre quatro brasileiros, ou seja, 25% da população total. Teria isto algo a ver, em outra vertente, com o fato de que a nossa “Carga de impostos é a maior da história” (Folha de S. Paulo, 22.08.07)? De fato, apesar da promessa do governo Lula de não elevar a carga tributária, os brasileiros pagaram, em 2006, o equivalente a 34,23% do PIB em impostos, contribuições e taxas. Todos os economistas conhecem a correlação empírica existente entre gastos públicos elevados e baixo crescimento do produto. Não se trata aqui de opinião, mas de fatos observáveis com uma simples consulta às estatísticas nacionais dos principais países.
Os problemas brasileiros podem ser resumidos como segue: (a) uma institucionalidade precária, ou seja, um Estado predador, caracterizado por gastos públicos excessivos, na média dos países mais ricos (38% do PIB), para uma renda per capita seis vezes menor; (b) uma burocracia intrusiva, inimiga dos negócios e facilmente capturada por grupos e pessoas representando “interesses especiais” (geralmente apresentados como “estratégicos”); (c) elites políticas autocentradas, dotada de atitudes rentistas, o que inevitavelmente resulta em altos custos de transação, diminuindo o PIB potencial.
Todos esses fatores, combinados, provocam informalidade (que no Brasil supera 50% da população economicamente ativa e algo como 40% do PIB, para uma média mundial de 32%) e baixa produtividade do trabalho humano. Para inverter essa tendência, o governo precisaria eliminar as barreiras à produtividade, o que exige medidas de política econômica e social.
Resumindo: o Brasil aparece, no atual contexto mundial, como um país totalmente preparado para “não crescer”,  em virtude de seus impedimentos estruturais ou sistêmicos (ou seja, a sua baixa produtividade do trabalho) e de fatores não estruturais (em outros termos, derivados de políticas do governo). Esses dois conjuntos de elementos se combinam para manter o Brasil em baixos níveis de crescimento, agora e no futuro previsível.

Traçando uma lista dos obstáculos políticos ao crescimento econômico no Brasil, eles poderiam ser resumidos nos seguintes elementos:
1. Constituição detalhista, intrusiva, concedendo muitos “direitos” e demandando poucas obrigações;
2. Estado extenso, também intrusivo, perdulário, gastador, “burrocrático” e gigantesco;
3. Regulação microeconômica hostil aos negócios e ao trabalho, dando pouco espaço às relações autoreguladas e diretamente contratuais;
4. Monopólios em excesso: cartéis e restrições de mercado, pouca competição e muitas barreiras a novos ofertantes de bens e serviços;
5. Reduzida abertura externa, seja para comércio, investimentos ou fluxos de capitais, criando ineficiências, altos custos e preços, ausência de competição e de inovação;
6. Sistemas legal e judicial atrasados, permitindo manobras processuais que atrasam a solução das disputas e que aumentam os custos de transação.

Se ouso apresentar uma lista de reformas políticas, elas poderiam ser expressas nos elementos seguintes:
1. Política (partidos e regime eleitoral);
2. Tributária (difícil, por causa da organização federativa);
3. Educacional (que será obstaculizada pelas corporações existentes);
4. Seguridade social (que se choca com privilégios remanescentes no setor público);
5. Trabalhista (uma das mais duras, pois o Brasil converteu-se numa República sindical);
6. Governança (ainda mais difícil, em vista do perfil da representação política).

Em todo caso, apresentando sintéticamente os principais elementos de uma agenda de reformas, e sem nenhuma ilusão quanto à sua factibilidade, o esforço poderia ser dirigido a:

1. Reforma Política:
Começar pela Constituição (operar uma “limpeza” em regra, remetendo diversos dispositivos para a legislação infra-constitucional); efetuar uma redução das legislaturas nos três níveis da federação (já que a representação não apenas é excessiva, mas provoca gastos em excesso); elaborar uma reforma eleitoral, com a introdução do sistema distrital misto de seleção e de representação; por fim, tentar uma reforma partidária (ainda que ela seja manifestamente difícil, também, em vista do autismo político que caracteriza as lideranças partidárias).

2. Reforma Tributária:
Ela será obviamente dificultada pelo problema da federação e, por isso mesmo, não poderia ser um simples arranjo formal, e sim uma reforma completa (macro e micro), com simplificação tributária e disposição de se reduzir a carga tributária total, ainda que de forma gradual e talvez até mesmo lenta. Em todo caso, ela deveria ser colocada no contexto de uma continuidade da abertura econômica, com liberalização ampliada do comércio exterior e dos investimentos diretos estrangeiros e com novos incentivos à inovação (na linha de do respeito à propriedade intelectual).

3. Reforma Educacional:
Deveria estar centrada no ensino básico, tendo como eixos centrais a capacitação dos professores dos ciclos fundamental e médio e o reforço do ensino técnico-profissional. A dificuldade principal aqui parece ser a introdução de um regime meritocrático de avaliação e de remuneração. Não é preciso dizer que a tarefa principal dos governantes seria concentrar os recursos nos dois primeiros ciclos, uma vez que a pirâmide de gastos do governo no ensino público – que é, de fato, uma grande pirâmide – está completamente invertida. Quem conhece os resultados dos exames internacionais de avaliação de desempenho dos nossos alunos do primário e do ciclo médio sabe que essa missão é absolutamente crucial. Por fim, deve-se conceder, de imediato, autonomia universitária às IFES, mas obrigando-as, ao mesmo tempo, a elaborar orçamentos administrados por claros princípios de premiação por desempenho, de avaliação dos resultados individuais e de aferição de mérito em bases não isonômicas.

4. Reforma da Seguridade social:
Para acabar, em primeiro lugar, com o festival de privilégios remanescentes, seria preciso reduzir vários benefícios abusivos do setor público, ou seja, suprimir alguns regimes especiais que insistem em permanecer. De forma geral, seria importante, do ponto de vista do equilíbrio das contas públicas, ampliar os prazos de aposentadoria e as idades mínimas, modular as contribuições em função de regimes complementares de poupança compulsória (como os regimes de capitalização administrados setorialmente) e diminuir os desincentivos derivados dos direitos garantidos, que atuam como um indutor perverso da informalidade e do não-recolhimento (já que os situados nos estratos de salário-mínimo preferem não contribuir, uma vez que terão direito ao benefício, independentemente de terem, ou não, contribuído para o sistema durante sua vida ativa).

5. Reforma Trabalhista (e sindical):
Trata-se, obviamente, da flexibilização da legislação laboral (por mais que isto possa chocar as “almas cândidas”), no sentido de se ter mais contratualismo e mais negociações diretas entre as partes, em lugar da rigidez das normais atuais. No plano dos conflitos, em grande medida criados artificialmente por essa mesma legislação, o objetivo deve ser, pura e simplesmente, o da eliminação da Justiça do Trabalho, ela mesma criadora de conflitos, além de custar acima dos valores que são objeto de julgamento. No plano sindical, consoante uma velha demanda do “novo sindicalismo” – que se converteu rapidamente em “velho” e parece ter-se acomodado às benesses da República sindical –, a meta é claramente a da extinção da Contribuição Sindical, que cria sindicatos de papel (quando não deliberadamente corruptos).

6. Reforma da Governança:
Sem nenhuma ilusão de que isto venha a ocorrer, o objeteivo seria uma redução radical do governo (ou colocá-lo sob dieta estrita). Infelizmente, a sociedade brasileira ainda não se convenceu de que o Estado, em lugar de ser o indutor do desenvolvimento, que ele foi num passado distante, converteu-se, de fato, no mais poderoso obstrutor do processo de crescimento econômico, dilapindo recursos da sociedade e desviando investimentos para seus gastos correntes. Caberia, assim, retomar as privatizações (uma vez que as PPPs constituem, se tanto, uma maquiagem, uma privatização disfarçada), reforçar as agências reguladoras (que foram deliberadamente sabotadas, ou aparelhadas no período recente) e introduzir um conjunto de reformadas ainda mais ousadas no plano administrativo (como, por exemplo, o fim da estabilidade do funcionalismo público).

Existe alguma chance de sucesso, para um programa como esse? Talvez, embora, pessoalmente, eu considere isso praticamente impossível, em vista da chamada “consciência cidadã”, hoje comprometida com as supostas “benesses do Estado”. As pessoas, em geral, demandam “mais Estado”, grande parte dos formandos desejam fazer um concurso público e aceder a salários que são, na média, o dobro daqueles vigentes no setor privado, desfrutando, ademais, dos demais benefícios vinculados ao atual regime do funcionalismo público (entre eles o da estabilidade no emprego). As razões para o pessimismo, portanto, são reais.
Em todo caso, na ausência de reformas – não necessariamente as delineadas aqui, mas funcionalmente equivalentes –, o Brasil estará provavelmente condenado ao atraso relativo, em comparação aos demais emergentes, e ao baixo crescimento pelo futuro indefinido, com a preservação da atual estrutura social iníqua e uma baixa dinâmica nos processos de inovação e de modernização. Exemplos de lenta decadência econômica abundam na história mundial e o Brasil certamente não é o primeiro a enfrentar esse tipo de problema: a Grã-Bretanha (até os anos 1980) e a Argentina (a partir dos anos 1930), por exemplo, constituem duas evidências inegáveis de longa decadência e de empobrecimento contínuo de suas populações respectivas. Talvez o Brasil siga pelo mesmo caminho nos próximos 20 anos, ou mais.
Eu gostaria de acreditar que não. A responsabilidade está com cada um de nós…



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Revisão: 13 setembro 2007