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sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

Os interesses do Brasil e a ideologia - Rubens Barbosa (revista Interesse Nacional)

Rubens Barbosa: Os interesses do Brasil e a ideologia

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Editorial da revista Interesse Nacional, 8/12/2023

Decisões recentes do país colocam em contraste as posições do governo Lula e ações que beneficiariam a política externa do Brasil. Para embaixador, Lula deveria ir à posse de Milei, acordo Mercosul-EU deveria ir adiante,  Brasil deve evitar escalada entre Venezuela e Guiana, e ideia de governança para o clima é problemática.

Por Rubens Barbosa*

  • Novo governo argentino

Na posse do presidente Javier Milei no próximo domingo, o Brasil será representado pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira. Estará bem representado, mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deveria ir a posse, depois do convite de Milei por carta entregue pela nova ministra Diana Mondino, que veio ao Brasil especialmente para isso.

O vice-presidente Geraldo Alckmin representou o Brasil na posse do presidente do Equador, mas não vai à posse do presidente argentino.

O que Milei disse sobre Lula durante a campanha foi resultado da interferência interna na eleição pelo PT, que enviou um grupo de marqueteiros para ajudar Massa contra Milei. Campanha é uma coisa, governo é outra. Lula não deveria passar recibo nem deixar que Bolsonaro apareça em Buenos Aires, sozinho como ex-presidente.

O presidente do Chile, de esquerda, vai comparecer à posse. Ideologia a parte, a relação entre Estados se impõe.

  • Reunião presidencial do Mercosul

A última reunião do Mercosul neste semestre, presidida pelo Brasil, planejada para ser um grande evento, foi concluída bastante esvaziada, no Rio.

Foi assinado o acordo de livre comércio com Cingapura e oficializada a admissão da Bolívia como membro pleno do Mercosul (haverá um período de transitado de três ano para que a legislação do Mercosul seja incorporada ao ordenamento jurídico boliviano, o que poderá durar mais do que esse período).

Foram anunciadas medidas de menor impacto, visando a modernização do subgrupo regional. O grande ausente foi o acordo de livre comercio com a União Europeia, e a grande presença foi a crise Venezuela-Guiana, com Lula oferecendo o Brasil para sediar as conversações entre os dois países e coordenando um comunicado pedindo uma solução negociada.

  • Acordo Mercosul-UE

A decisão do presidente Alberto Fernandes de não querer tomar a decisão de aprovar o acordo do Mercosul com a União Europeia, praticamente pronto para ser finalizado na reunião do Mercosul, adiou mais uma vez o final dessa novela que se arrasta por mais de 20 anos.

A declaração contrária de Macron não teve nada que ver com o postergamento do anúncio. Enquanto o presidente Lula continuou apostando na aprovação final do acordo e pediu e obteve o apoio do premiê da Alemanha, Scholz, o PT no Brasil considerou positivo o fim do acordo.

O assessor presidencial, Celso Amorim, contrariando a posição de Lula, disse que o acordo com a UE tem insuficiências sérias, oferece pouco e exige muito.

O acordo, com o apoio da Comissão Europeia, deverá ser finalmente aprovado logo após a posse de Milei – como indicado pela nova ministra do exterior argentina – em reunião do Mercosul, presidido pelo Paraguai.

O acordo é positivo porque põe fim ao isolamento do Mercosul e representa um avanço geopolítico importante.

Em seguida será concluído o acordo com a Area de Livre Comércio da Europa (EFTA). A abertura comercial para os produtos mais sensíveis do Brasil e do Mercosul somente terão suas tarifas reduzidas a zero daqui a dez anos, a tempo de a reindustrialização ganhar corpo e a redução do custo Brasil permitir o aumento da competitividade dos produtos industriais no mercado europeu.

  • Venezuela – Guiana

O referendo convocado por Maduro sobre a incorporação de 74% do território da Guiana, contestado por Caracas, teve o resultado esperado. Apoio de 94% à reivindicação venezuelana, unindo governo e oposição em torno dessa contestação.

O Brasil vem atuando nos bastidores para evitar uma confrontação militar que poderia trazer os EUA na defesa da Guiana, inclusive com a possibilidade de instalação de uma base militar na região. Por outro lado, mostrando suas limitações na defesa, o Ministério da Defesa anunciou que dobrou o contingente do Exército em Roraima (passou de 60 para 130 militares e enviou cerca de 28 veículos blindados, que levaram semanas para chegar).

Lula disse que o melhor é não ter confusão em nossa região.

Sem ameaçar uma próxima invasão na Guiana, Maduro pediu à Assembleia Nacional a criação do Estado de Essequibo no território contestado, elege interventor e divulga plano de exploração de petróleo, organizado pela PDVSA. Será montado um posto militar avançado em território venezuelano perto da fronteira para supervisionar o novo estado.

A Guiana, em função disso, pediu a convocação de emergência do Conselho de Segurança da ONU para examinar o assunto e está conversando com o governo americano. Os EUA se manifestaram alertando a Venezuela contra um eventual conflito e iniciaram exercícios militares aéreos na Guiana.

  • COP-28, Dubai

O presidente Lula, em inflamado discurso na COP-28, defendeu uma governança global para as questões ambientais. “Precisamos ter uma governança global para cuidar do planeta, porque se você toma uma decisão qualquer em benefício do mundo, e ela tiver que ser votada internamente pelo seu Congresso Nacional, significa que ninguém vai cumprir”.  

Para um país que é uma potência global em questões ambientais e em transição energética onde tem interesses concretos a defender, a criação de uma organização multilateral para regulamentar e acompanhar as questões climáticas e ambientais parece ir na direção contrária à defesa do interesse nacional, pois o Brasil perderia a capacidade de decidir seu rumo no tocante ao desenvolvimento econômico, a bioeconomia e a biodiversidade da Amazônia. No limite, poderia até haver decisões sobre a Amazônia que interfiram com a soberania do país.

A proposta de Lula será difícil de ser examinada seriamente, pois nem os EUA nem a China e nem a Europa aceitariam subordinar suas decisões internas a uma nova organização multilateral para tratar do meio ambiente e mudança do clima.



*Rubens Barbosa foi embaixador do Brasil em Londres e em Washington, DC., é diplomata, presidente do Instituto Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice) e coordenador editorial da Interesse Nacional.




terça-feira, 5 de dezembro de 2023

A ameaça venezuelana - Editorial, O Estado de S. Paulo

A ameaça venezuelana

Editorial, O Estado de S. Paulo (05/12/2023)

Lula deveria usar sua proximidade com Nicolás Maduro para convencê-lo a não agredir a Guiana

Regimes ditatoriais são ávidos em explorar paixões nacionalistas como meio de sobreviver, em especial quando desafiados pelos desastres que engendraram. Não é diferente na Venezuela de Nicolás Maduro. Ao iniciar a construção de uma segunda base militar na fronteira leste e conduzir, no último domingo, a farsa de um plebiscito sobre a anexação de 70% do território da Guiana, o autocrata bolivariano deslanchou a primeira ameaça bélica na América do Sul desde 1991. Do episódio, salta à vista a inação do Brasil. Em vez de advertir claramente o vizinho sobre os riscos de uma aventura regional desestabilizadora, o presidente Lula da Silva limitou-se a dizer que a América Latina “não precisa de confusão”.

Não se trata de “confusão”, e sim de ameaça explícita de agressão à Guiana por parte da Venezuela, que inventou uma consulta popular obviamente fajuta para revestir de legitimidade sua reivindicação territorial. Como já fez no caso do ataque injustificado da Rússia contra a Ucrânia, Lula da Silva tratou a ameaçadora Venezuela e a ameaçada Guiana como se fossem igualmente responsáveis pela “confusão”. Segundo o presidente brasileiro, é preciso que “o bom senso prevaleça do lado da Venezuela e da Guiana”. Ora, só há falta de bom senso de um lado, o da Venezuela do “companheiro” Nicolás Maduro.

Não há dúvidas sobre as más intenções do ditador venezuelano, que aceitou a realização de uma eleição presidencial aberta e monitorada em 2024 em troca da suspensão temporária de sanções pelos Estados Unidos. Nada indica que cumprirá esse acordo, celebrado em Barbados em outubro passado, dadas as travas de seu regime às candidaturas da oposição.

Nessa lógica, insuflar o nacionalismo, ao resgatar uma causa apoiada também por alguns de seus detratores, parece uma jogada característica de quem precisa recuperar a popularidade em meio à crise generalizada no país.

A Venezuela reivindica há dois séculos a soberania sobre Essequibo, uma faixa de 160 quilômetros quadrados no oeste da Guiana. Desdenha de arbitragens e acordos anteriores e, agora, de recentes orientações da Corte Internacional de Justiça. Não se pode abstrair o fato de a controvérsia ter sido pinçada por Maduro quando a Guiana se vê catapultada economicamente pela exploração petrolífera na região em disputa – e desguarnecida de força de defesa. Tampouco é possível ignorar o fato de o Brasil estar, literalmente, no meio do vespeiro. Porta de fuga de venezuelanos desesperançados, Roraima faz fronteira com ambos os países.

A circunstância geográfica, por si só, exige do Brasil uma posição neutra, equilibrada e ativa na busca de uma solução diplomática. Lula da Silva deveria usar sua condição de “companheiro” de Maduro para convencê-lo a desarmar os ânimos. A cada dia de imobilismo e de miopia diante dos arroubos de Maduro, porém, a Guiana se verá empurrada a buscar proteção militar nos EUA. A escalada é preocupante e requer do Estado brasileiro o dever estratégico nacional e regional de levar a Venezuela a manter a paz, o maior capital geopolítico da América do Sul.

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Grato a Augusto de Franco pela transcrição.


quarta-feira, 15 de novembro de 2023

Lula e a má-fé da esquerda - Editorial Estadão

Lula e a má-fé da esquerda

 Estadão/Editoriais, 15/11/2023


O presidente Lula da Silva considera que a ofensiva de Israel contra o Hamas é "terrorista", ao, segundo ele, "não levar em conta que mulheres e crianças não estão em guerra". Numa só frase, o petista distorceu completamente o cenário da guerra, igualou situações inigualáveis e confirmou sua incapacidade de perceber a complexidade do mundo, prisioneiro que é do ranço ideológico de uma esquerda primitiva.


Não se sabe se o falatório de Lula atende a demandas dos militantes petistas, decerto insatisfeitos com as reinações do Centrão no governo que deveria ser esquerdista, mas isso pouco importa: manda a decência que, na condição de presidente da República, Lula se informe melhor antes de tirar conclusões tão abomináveis, que envergonham o Brasil perante a comunidade internacional.


Lula deveria saber que nenhuma criança palestina estaria morrendo em bombardeios israelenses em Gaza se Israel não tivesse sido covardemente atacado por terroristas do Hamas no dia 7 de outubro passado; Lula deveria saber que o Hamas usa crianças como escudos humanos e hospitais como esconderijos e que esse grupo terrorista nunca se importou que as crianças e os doentes morressem sob bombas israelenses, pois o objetivo é desmoralizar Israel perante a opinião pública mundial; Lula deveria saber, por fim, que a intenção declarada do Hamas é dizimar Israel e os judeus, o que deveria ter ficado suficientemente claro com o ataque de 7 de outubro.


Mas Lula não sabe nada disso ou faz força para não saber - pouco importa, pois o resultado é o mesmo. Há um imperativo imoral no discurso do demiurgo petista: a barbárie é plenamente justificada se for realizada em nome das causas que seu partido e a esquerda defendem.


No caso em questão, o Hamas tem sido tratado por esquerdistas como um grupo heroico de resistência palestina contra o colonialismo israelense. Pouco importa que o Hamas trucide civis inocentes se estes forem israelenses; não é relevante que o projeto do Hamas para a futura Palestina é um Estado islâmico que faria o Irã parecer uma democracia laica; também não interessa se os chefões do Hamas desviaram o dinheiro da bilionária ajuda internacional para Gaza para construir seu arsenal de guerra e para encher os próprios bolsos; e finalmente ninguém dessa esquerda primitiva quer saber se o Hamas pratica terrorismo não só contra Israel, mas também contra os próprios palestinos que o grupo deveria governar, reprimindo mulheres, homossexuais e qualquer forma de dissidência. Tudo o que importa, para Lula e sua seita, é que o Hamas fustiga Israel, considerado como braço do imperialismo americano no Oriente Médio.


Trata-se de um padrão. Esse mesmo Lula, não podemos esquecer, foi o presidente que, em meio à estupefação mundial com a agressão russa contra a Ucrânia, foi capaz de culpar os ucranianos pela guerra. A razão é óbvia: na interpretação lulopetista, os ucranianos estavam se aproximando do Ocidente, razão mais que suficiente para justificar o corretivo russo. Afinal, ninguém que se aproxime do Ocidente merece consideração da esquerda. Perde até o direito de se defender.


Essa indecência só surpreende os estrangeiros que tinham Lula como grande líder mundial. Quem acompanha o petista desde os tempos de sindicalista sabe que ele construiu sua mitologia reduzindo tudo à luta entre trabalhador e patrão - ou entre oprimido e opressor, em escala global. E todos os que Lula considera oprimidos são, claro, moralmente superiores. Nessa chave, o regime cubano pode colocar quantos queira no paredão, pois tudo é feito em nome da necessidade de manter a revolução em curso e enfrentar a opressão americana; do mesmo modo, a Venezuela, uma rematada ditadura, é para Lula um exemplo de democracia, simplesmente porque é o grande bastião antiamericano no continente. Os exemplos podem seguir infinitamente, da Nicarágua do companheiro ditador Ortega, ao Irã do infame Ahmadinejad, que tratou Lula como "grande amigo".


O "oprimido" da vez é o Hamas, em cuja defesa Lula se empenha com denodo, desprezando cruelmente a dor dos judeus massacrados em Israel - país que, afinal, para muitos esquerdistas, nem deveria existir.


sexta-feira, 15 de setembro de 2023

O abraço dos párias - Editorial, O Estado de S. Paulo

O abraço dos párias

Editorial, O Estado de S. Paulo (15/09/2023)

O apelo de Putin ao lunático Kim mostra que suas cartas estão acabando, mas pressagia riscos para a Ucrânia, para as democracias, a estabilidade na Ásia e para a segurança global

Depois da primeira invasão da Ucrânia, em 2014, a Rússia foi expulsa do G-8. Após a segunda invasão, Vladimir Putin faltou às duas cúpulas do G-20 e foi “desconvidado” da última cúpula do Brics pela África do Sul, que se veria obrigada a cumprir uma ordem de prisão expedida pelo Tribunal Penal Internacional. Com efeito, sua única visita internacional (sem contar os antigos satélites soviéticos que hoje integram o Tratado de Tasquente, a Otan russa) foi ao Irã. Agora, Putin estendeu o tapete vermelho para Kim Jong-un, o neto do tirano fantoche imposto por Stalin à Coreia do Norte, o Estado mais fechado e totalitário do mundo – uma versão em miniatura, mas com esteroides, do que a Rússia está se transformando sob Putin.

O conclave na base espacial de Vostochny foi celebrado com pompa e circunstância pelas mídias dos dois regimes, e Kim prometeu “apoio pleno e incondicional” à Rússia em sua “luta sagrada contra o Ocidente”. Mas não houve comunicados oficiais. É certo, no entanto, um acordo para o fornecimento de armas à Rússia.

Isso representa um risco iminente para a Ucrânia. Após o fracasso fragoroso de seu Plano A, uma blitzkrieg contra a Ucrânia, Putin aposta numa guerra de atrito, na expectativa de que o tempo exaurirá as forças ucranianas e a solidariedade ocidental. Mas Kiev tem realizado avanços, ainda que modestos, em sua contraofensiva. O Kremlin está com dificuldades de repor sua munição, e os recrutamentos compulsórios têm gerado desgosto na população. A Coreia do Norte tem amplos estoques e fábricas de bombas e foguetes, a maioria baseada em tecnologias soviéticas compatíveis com o arsenal russo. O acordo pode envolver ainda mísseis balísticos de curto alcance, blindados, drones e até mesmo tropas.

Em troca, a Rússia pode oferecer óleo cru e grãos a um país famélico e falido. O principal interesse de Kim, contudo, está na transferência de tecnologia para modernizar seu arsenal. Isso intensificaria as tensões na Ásia. Vizinhos apreensivos com um Estado errático e agressivo poderiam responder escalando sua corrida por arsenais.

A China, que exerce um poder tutelar sobre os dois países, não tem interesse nessa instabilidade e pode interferir para limitar esse escambo sinistro. Mas só em parte. Pequim não vê nenhum problema em uma guerra prolongada na Europa e certamente se compraz com a tal “luta sagrada” contra o “imperialismo” ocidental.

O pacto pode ainda intensificar a degradação do controle global de armas nucleares, já no seu ponto mais periclitante desde a guerra fria. Nem à Rússia nem à China interessa robustecer as capacidades nucleares de Kim. Mas, a depender da barganha, Moscou pode violar seus compromissos com as sanções da ONU à Coreia do Norte e cooperar com o desenvolvimento não só de satélites de espionagem, como de mísseis e submarinos nucleares.

O conselheiro de segurança nacional dos EUA, Jake Sullivan, advertiu que os países “pagarão um preço”. Mas anos de sanções unilaterais e mesmo multilaterais tiveram impacto limitado sobre a Coreia do Norte, e a Rússia tem engendrado meios de contornar essas barreiras para financiar sua guerra. No G-20, as potências ocidentais se viram obrigadas a aliviar as pressões pela condenação da Rússia para garantir uma declaração conjunta e impedir o malogro da presidência rotativa da Índia, com quem contam para reequilibrar as relações de poder na Ásia. O presidente americano, Joe Biden, legitimamente preocupado com uma escalada, tem hesitado em enviar mísseis de longo alcance para a Ucrânia, apesar do apoio bipartidário do Congresso. A hesitação pode se transformar em franca recusa se Donald Trump for eleito no ano que vem, algo com que Putin conta.

Nada de bom pode sair desse abraço sombrio dos párias. Ele pressagia ameaças para a Ucrânia, para a estabilidade na Ásia, para o eixo democrático e para a segurança global. Se há um aspecto positivo, é o fato de que ele revela que as cartas de Putin estão se esgotando. Mas mesmo esse consolo é ambivalente. Déspotas desesperados são mais, não menos, perigosos.


quinta-feira, 27 de julho de 2023

A verdadeira diplomacia ambiental que o Brasil deveria estar conduzindo (OESP)

 Grato a Walmyr Buzatto pela transcrição desta matéria.

Editorial do Estadão de hoje expõe a triste realidade do nosso País. 

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“O País tem enor­me po­ten­ci­al de geração de cré­di­tos de carbo­no, mas explora me­nos de 1% da ca­pa­ci­da­de. É ho­ra de re­co­nhe­cer o va­lor de nossas florestas e agir pa­ra mantê-las em pé”

O tesouro verde do Brasil

O Estado de S. Paulo.

24 de jul. de 2023


A união entre Estado e sociedade em prol da preservação das florestas brasileiras em pé se impõe como obrigação moral, no sentido de dar segurança às parcelas da população mais vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas e de legar para as gerações futuras um planeta sustentável. Além disso, diante da crescente demanda mundial por créditos de carbono, a conservação de áreas verdes intactas é também um investimento inteligente que pode gerar bilhões de dólares para o País. Não são poucos os investidores e empresas que olham para nossas florestas preservadas como um verdadeiro tesouro verde.

De acordo com a consultoria McKinsey, o Brasil detém, sozinho, 15% do potencial global de captura de carbono por meios naturais, ou seja, por suas florestas preservadas. Trata-se da forma mais simples e econômica de gerar créditos de carbono, que podem ser vendidos para empresas que poluem o meio ambiente como forma de compensação para atingimento de metas. Contudo, o País ainda claudica nesse mercado extremamente promissor. Segundo a McKinsey, o Brasil explora menos de 1% de sua capacidade anual de geração de créditos de carbono – e segue limitado a projetos de conservação e geração de energia a partir de resíduos, não de ações de reflorestamento.

Como se vê, há no território nacional esse gigantesco tesouro verde, literalmente, à espera de melhor aproveitamento. O bom manejo das florestas em pé pode levar o Brasil a contribuir decisivamente para o esforço global de combate às mudanças climáticas e prevenção de desastres naturais, cada vez mais intensos e frequentes, e ainda gerar recursos financeiros que poderão ser empregados para melhorar a qualidade de vida de milhões de cidadãos.

Ainda segundo a McKinsey, a demanda por créditos de carbono pode crescer 15 vezes ou mais até 2030. Para 2050, a consultoria projeta um crescimento ainda maior: 100 vezes. Está-se falando de um volume total negociado de cerca de US$ 50 bilhões em créditos de carbono só até 2030. Boa parte desses recursos pode vir para o Brasil, caso a manutenção das florestas em pé seja elevada à condição de prioridade nacional.

É consensual entre especialistas que a contenção do desmatamento, sobretudo do desmatamento ilegal, é a principal contribuição que países emergentes, que ainda mantêm grandes porções de florestas preservadas, podem dar para reduzir as emissões de carbono e, assim, frear o processo de mudança no clima do planeta. Em que pese a enorme parcela de responsabilidade dos países desenvolvidos nesse esforço global, afinal, foram os primeiros a desmatar suas áreas verdes em nome do progresso econômico, o fato é que, hoje, são países como o Brasil que desempenham papel crucial para limitar o aquecimento global a 1,5 grau Celsius até 2050.

O Estado, como detentor do monopólio da violência, tem o dever de reprimir de forma implacável o ecossistema criminoso que se instalou na Região Amazônica, mas não só lá, para explorar, privada e ilicitamente, riquezas naturais que são patrimônio público, sem falar na apropriação das florestas e rios da Região Norte como novas rotas do tráfico internacional de drogas. Reiteradamente, este jornal tem alertado para os múltiplos e crescentes danos que a leniência do Estado no combate ao crime organizado em áreas de preservação ambiental tem causado ao País.

A iniciativa privada, por sua vez, tem feito sua parte para recuperar áreas verdes degradadas. É notável, nesse sentido, o investimento do Grupo Votorantim para transformar uma área de Mata Atlântica de 31 mil hectares no Vale do Ribeira, em São Paulo, numa reserva florestal. Essa opção pela conservação de florestas intactas e por ações de reflorestamento de áreas desmatadas como investimentos promissores tem atraído cada vez mais empresas e grupos de investidores.

É mais que hora de reconhecer a conservação ambiental como um valor e de agir para que disso advenham um planeta mais sustentável, mais riquezas para o País e, principalmente, melhores condições de vida para o povo brasileiro.

domingo, 28 de maio de 2023

Lula ‘perdido’ da Silva - Editorial do Estadão, 27/05/2023

Lula ‘perdido’ da Silva

 Editorial do Estadão, 27/05/2023

Sem plano estratégico para o País, o petista parece desorientado. As crises que já engolfam um governo de apenas cinco meses formam o retrato de um presidente fora do prumo.

É difícil acompanhar a política nacional e não se espantar com o fato de que o governo do presidente Lula da Silva não completou cinco meses, mas já está imerso em confusões que o fazem parecer precocemente envelhecido, como se já estivesse padecendo da fadiga de material típica de fim de mandato.
Lula parece perdido. Sabe-se que ele queria governar o País pela terceira vez, ou não teria se submetido, a essa altura da vida, ao desgaste de uma virulenta campanha eleitoral como foi a do ano passado. Mas, até agora, ainda não se sabe exatamente para quê. Afinal, aonde Lula quer levar o Brasil? Qual seu plano estratégico para o País?
Desencontros são naturais no início de qualquer governo. No entanto, não há explicação razoável para tantas crises políticas, em tão pouco tempo, a não ser a desorientação do presidente da República. Mais especificamente, a falta de um programa de governo consistente e de uma política de comunicação que sejam capazes de unir a sociedade em torno de objetivos comuns, malgrado todas as divergências políticas que possa haver entre os cidadãos, como as há em qualquer democracia saudável.
Enquanto as reais intenções de Lula não forem conhecidas, é lícita a inferência de que o presidente só está se movendo por seus caprichos e por sua pulsão pela desforra. É nítida a intenção do petista de demolir tudo o que foi feito de bom no País enquanto o PT esteve fora do poder, em particular o Marco Legal do Saneamento, a Lei das Estatais, a autonomia do Banco Central (BC), as reformas do Ensino Médio e a trabalhista e a capitalização da Eletrobras, entre outras medidas.
Lula pode vir a público e afirmar, como o fez há poucos dias, que “não voltaria à Presidência para ser menor” do que foi em seus mandatos anteriores. Porém, até o momento, isso é exatamente o que se descortina. Lula também pode fazer afagos públicos nas ministras do Meio Ambiente, Marina Silva, e dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, mas nada compensará o fato de que, em nome de uma certa governabilidade, permitiu que o Centrão desfigurasse esses Ministérios que, bem ou mal, serviam para ser a cara do governo petista. Como bem disse o próprio Lula depois da humilhação de suas ministras, “tudo parece normal”.
Em um Congresso infenso às pretensões do presidente, Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) brotam por todos os lados, em número sem precedentes para uma legislatura que mal começou. O que é isso senão o retrato de um governo fraco, como já destacamos nesta página?
Enquanto claudica na articulação para formar uma base de apoio no Legislativo consistente o bastante para aprovar projetos realmente importantes para o Brasil, Lula se perde entre questões distantes das prioridades do País, como a guerra na Ucrânia, sua rixa pessoal contra o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, suas agressões aos empresários do agronegócio, sobretudo os paulistas, e os endossos aos arruaceiros do MST. Enquanto o mundo já discute como serão as cidades do futuro, Lula dobra a aposta no transporte individual por meio de carros baratos movidos a combustíveis fósseis.
O que haveria de ser pior para o Brasil do que ser governado por um presidente desorientado, alguém que, ao invés de servir à Nação como fonte de estabilidade, funciona como vetor de crises perfeitamente evitáveis?
O País teve a infelicidade de ser governado por um desqualificado como Jair Bolsonaro durante a mais grave emergência sanitária em mais de um século. Seu despreparo e, principalmente, seu descaso com a vida dos brasileiros fizeram de sua gestão da crise, por assim dizer, uma tragédia dentro de outra tragédia. A razia promovida pelo ex-presidente em praticamente todas as áreas da administração pública demandava do sucessor um esforço de união e reconstrução sem precedentes.
Lula se apresentou como a única pessoa à altura dessa tarefa, o líder de uma fenomenal “frente ampla” capaz de reconectar os brasileiros com a esperança de dias melhores. Tempo há para que esse Lula, enfim, apareça. Resta saber se era isso o que ele realmente se propôs a fazer pelo País.

sábado, 15 de abril de 2023

Editorial do Estadão (30/03/2023) sobre novos trabalhos da Comissão de Anistia

 O retorno da Comissão de Anistia

EDITORIAL: ‘Comissão de Anistia é política de Estado’ 

A Constituição e a Lei 10.559/2002 são inequívocas: os anistiados são pessoas físicas. A pretendida ampliação a coletivos, por meio de decreto, desrespeita o que o Congresso estabeleceu bit.ly/3nmMXgo

Editorial O Estado de S. Paulo, 30/03/2023

Está prevista para hoje a primeira sessão da Comissão de Anistia com a nova composição do colegiado, definida pelo governo Lula. O objetivo imediato é fazer a revisão dos processos avaliados nos últimos dois governos, especialmente no de Jair Bolsonaro, quando a grande maioria dos pedidos foi rejeitada. Entre 2019 e 2022, dos 4.285 processos julgados pela Comissão, 4.081 (95%) foram indeferidos, segundo levantamento do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania.

É fundamental realizar esse trabalho de revisão, uma vez que, no governo Bolsonaro, a Comissão de Anistia foi totalmente desvirtuada, com integrantes que rejeitavam a própria finalidade do colegiado. Basta ver que, para Jair Bolsonaro, as atrocidades da ditadura militar não deveriam ser indenizadas, e sim homenageadas.

De fato, o bolsonarismo distorce até mesmo as questões mais básicas. O trabalho da Comissão de Anistia não é a realização de uma política de governo, como se dependesse das idiossincrasias do governante de plantão. O colegiado vem cumprir uma política de Estado, definida na própria Constituição de 1988, que concedeu “anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares” e determinou a correspondente reparação econômica. É dever do Estado, portanto, indenizar todos aqueles que, por razões políticas, foram perseguidos pelo poder estatal.

Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, foi editada a Medida Provisória (MP) 65/2002, depois convertida pelo Congresso na Lei 10.559/2002, que regulamentou os direitos constitucionais dos anistiados políticos. A Comissão de Anistia, que entre seus membros conta com um representante do Ministério da Defesa e um das pessoas anistiadas, é fruto dessa regulamentação. Assim, quando desvirtua o funcionamento do colegiado, o governo descumpre a Constituição, ao negar efetividade a direitos previstos no texto constitucional.

A vinculação da Comissão de Anistia com a Constituição e com a Lei 10.559/2002 explicita que o trabalho do colegiado não tem natureza política, não devendo depender de orientações político-ideológicas. Trata-se de tarefa técnica, de análise das provas, para comprovar a alegada perseguição política, assessorando o Executivo federal na concessão das indenizações.

Em razão da necessária conformidade com a lei, a Comissão de Anistia não deve fazer criações interpretativas, seja para negar direitos, seja para estendê-los além do que o legislador previu. Por exemplo, o novo Regimento Interno da Comissão de Anistia, publicado em 23 de março, prevê a possibilidade de um requerimento coletivo de anistia política, criando uma “declaração de anistia política coletiva” para “associações, entidades da sociedade civil e sindicatos representantes de trabalhadores, estudantes, camponeses, povos indígenas, população LGBTQIA+, comunidades quilombolas e outros segmentos, grupos ou movimentos sociais que foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares”.

A Constituição e a Lei 10.559/2002 são inequívocas: os anistiados são pessoas físicas. A pretendida ampliação a coletivos, por meio de decreto, desrespeita o que o Congresso estabeleceu. Se o governo federal pretende indenizar associações e entidades, deve antes propor ao Poder Legislativo. A razão para tal exigência é cristalina: a Comissão de Anistia cumpre uma política de Estado, e não de governo. Alterar sua sistemática exige lei.

Outro aspecto que merece ser lembrado, especialmente depois de duas décadas de existência da Comissão de Anistia, é a necessidade de finalizar o trabalho de reparação dos anistiados políticos. O Estado tem o dever de analisar com presteza os casos pendentes, dando o devido encaminhamento. Eternizar essa tarefa, como se não tivesse fim, seria também uma forma de descumprir a Constituição.

sábado, 1 de abril de 2023

O Estadão não gostou do arcabouço: Editorial

 Licença para gastar

Do que foi revelado, a proposta de ancora fiscal do governo não tem uma única medida concreta para rever gastos e aposta em aumento irreal de receitas. Já se sabe onde isso vai dar. 

O Estado de São Paulo – Editorial – 1º de abril de 2023

         O governo de Lula da Silva demorou, mas apresentou sua proposta de arcabouço fiscal. O mecanismo, segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, vai fixar o crescimento das despesas a 70% do avanço das receitas. Em paralelo, os gastos terão um piso e um teto, que garantirão a eles um aumento real de 0,6% a 2,5% acima da inflação. Esse plano, de acordo com o governo, seria capaz de reduzir o déficit primário a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, zerá-lo em 2024 e gerar um superávit em 2025 e 2026.

                   Após a euforia inicial gerada pelo anúncio, economistas começaram a se ater aos números e detalhes da proposta. A primeira dúvida diz respeito ao rombo para este ano. Na semana passada, na divulgação do Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias do primeiro bimestre, o Ministério da Fazenda havia reduzido a estimativa de déficit primário de R$ 228,1 bilhões, o equivalente a 2,1% do PIB, para R$ 107,6 bilhões, ou 1% do PIB.

 

         O que fez com que o governo cortasse a projeção do rombo de 1% para 0,5% do PIB passados apenas oito dias permanece uma incógnita. Tudo indica, no entanto, que essa mudança teria relação com um outro pacote, ainda a ser apresentado, cujo objetivo é rever parte dos subsídios e renúncias tributárias e onerar setores que hoje não recolhem impostos, como o de apostas eletrônicas. Esse plano elevaria a arrecadação federal em R$ 100 bilhões a R$ 150 bilhões.

         Assumir essa projeção de aumento de receitas como um fato concreto é de um otimismo que beira a ingenuidade, considerando a articulação que esses grupos de interesse conquistaram no Congresso. Mas o problema é que esse aspecto resume a essência da proposta do arcabouço fiscal do governo, que aposta num crescimento irreal de receitas e não propõe uma única medida concreta para rever os gastos estruturais da União. Ao contrário: se há algo que esse mecanismo assegura é que as despesas cresçam ano a ano e sempre acima da inflação, o que é suficiente para colocar em xeque qualquer previsão de superávit primário.

         Há outros detalhes questionáveis a respeito das bases do novo arcabouço fiscal e que o enfraquecem já de saída. A regra não atinge os fundos que bancam o piso salarial dos professores e da enfermagem, bem como mantém os mínimos constitucionais estabelecidos para saúde e educação, independentemente das reais necessidades das áreas e do recorrente empoçamento de recursos orçamentários que esses setores registram ano a ano. Da mesma forma, os investimentos estão fora do escopo da âncora. O patamar atual, de R$ 70 bilhões a R$ 75 bilhões, será mantido e corrigido pela inflação mesmo que as receitas sejam frustradas, mas poderá ser ampliado, de maneira extraordinária, caso a arrecadação supere as projeções do governo.

         Na entrevista em que a proposta foi detalhada, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, ao defender a flexibilidade do arcabouço, criticou a rigidez do teto de gastos e as recorrentes emendas constitucionais aprovadas para alterá-lo. Mas, na ânsia de elaborar algo exequível, o governo perdeu a mão. Se houver superávit primário no fim do mandato de Lula, a única forma de atingi-lo sem reformas que revisem os gastos obrigatórios será pela elevação de uma carga tributária já bastante alta. Do contrário, essas despesas serão financiadas da mesma forma como têm sido arcadas nos últimos anos, via endividamento – o que retroalimenta a inflação e exige o aumento da taxa básica de juros.

         A nova regra, segundo Ceron, permitirá ao governo fazer escolhas. Se é assim, a primeira escolha parece muito clara: . Foi exatamente a prática adotada pela administração de Dilma Rousseff, que levou o País a uma recessão cujos efeitos ainda não foram completamente superados. A opção por um Estado eficiente foi mais uma vez descartada. E, se mesmo um arcabouço frouxo como este foi alvejado pela ala política do governo e por lideranças e parlamentares petistas, é o caso de o País começar a se preocupar.

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Comentário de Tomas Guggenheim:

 O Estadão não gostou do "arcabouço". O resumo do resumo estaria na frase "assegurar condições para que todo e qualquer gasto possa ser realizado". Ainda é um tanto prematuro julgar as intenções do governo, mas se o Estadão estiver certo, a gastança (se possível com pouca inflação), bem mais do que a redistribuição de renda (que sempre encontra muita resistência), seria um atalho (ou uma avenida) para a permanência indefinida no controle do aparelho estatal, com o argumento para (os apoiadores) de que, excluindo dele os inimigos dos necessitados/excluidos, entreguistas, privatizadores, o "mercado", etc, com pouco mais o país acabará por se desenvolver inevitavelmente. ”


sábado, 25 de dezembro de 2021

Chile: escolheu a esquerda para lutar contra as desigualdades - Editorial Le Monde

 O Chile realmente melhorou enormemente a qualidade de suas políticas econômicas a partir da Concertación, nos anos 1990, ou seja, pós-Pinochet. Mas tinha, sempre teve, uma enorme concentração de renda, pois desde sempre foi um país elitista, no sentido mais mesquinho da palavra, e a maior parte dessa desigualdade tinha origem num sistema educacional deficiente. 

Os chilenos votaram bem para a Constituinte e acabam de votar melhor ainda, não tanto ao eleger um “jovem esquerdista” — como a mídia conservadora considera Borič —, mas ao recusar aderir a um fascista-pinochetista declarado, como é o Kast. Esperamos que o “esquerdismo” de Borič não comprometa a qualidade das políticas econômicas.

Paulo Roberto de Almeida 

Le Chili choisit la gauche pour lutter contre les inégalités

ÉDITORIAL
Le Monde, 21 décembre 2021
L’élection à la présidence chilienne de Gabriel Boric, au terme d’un scrutin marqué par une forte participation à l’aune du pays, est avant tout la répudiation d’un modèle économique néolibéral décomplexé. 

Le Chili a tourné une page de son histoire le 19 décembre. En portant Gabriel Boric à sa présidence, à une large majorité qu’un premier tour serré remporté par le candidat d’extrême droite José Antonio Kast ne laissait pas deviner, les Chiliens ont choisi de tourner le dos à une politique jugée responsable de profondes inégalités, épousée avec seulement quelques nuances par les majorités de droite comme de gauche qui se sont succédé au pouvoir depuis la fin de la dictature d’Augusto Pinochet.

L’élection de l’ancien dirigeant étudiant venu de l’extrême gauche, qui sera à 36 ans, en mars, le plus jeune président de l’histoire du pays, ne marque donc pas seulement un saut de génération. Sa victoire alimente en Amérique du Sud, à gauche, l’espoir d’un regain qui dépasserait en 2022 les frontières du Chili. Des élections cruciales sont prévues en mai en Colombie et plus tard au Brésil. Elles pourraient entraîner le reflux de la droite dure incarnée par Ivan Duque comme celle encore plus extrême de Jair Bolsonaro, quelles que soient les contorsions politiques de ce dernier.

Les élections législatives partielles en Argentine, en novembre, ont cependant mis en évidence les difficultés du président péroniste de centre gauche Alberto Fernandez, dont le parti a été devancé par l’opposition de centre droit. L’Amérique latine compte aussi des bastions d’une autre gauche, autoritaire, dictatoriale, au Nicaragua, à Cuba et au Venezuela, qui reste assez peu compatible avec la première.

L’élection de Gabriel Boric, au terme d’un scrutin marqué par une forte participation à l’aune du Chili, constitue avant tout la répudiation d’un modèle économique néolibéral décomplexé, incarné jusqu’à la caricature par le président sortant Sebastian Piñera, dont le mandat a été entaché par des accusations d’affairisme. Ce « modèle » chilien a fait la part belle au privé dans les secteurs de l’éducation et de la santé, générant une société à deux vitesses qu’un système de retraite par capitalisation a figée un peu plus.

Fracture sociale

Il a produit des résultats incontestables en matière de croissance du produit intérieur brut, mais au prix d’une fracture sociale mise à nu en 2019 par une lame de fond protestataire. Celle-ci a fourni le socle populaire de la victoire du 19 décembre, balayant les mots d’ordre ultraconservateurs, sécuritaires et anti-immigration de José Antonio Kast.

Gabriel Boric, dont la famille a des racines croates, s’est montré capable de rassembler derrière lui les différentes composantes de la gauche chilienne en promettant que son pays serait le « tombeau » de ce néolibéralisme. Il va s’efforcer de revenir sur les inégalités qui affligent le pays par une fiscalité plus équitable, redistributive, et le retour assumé de l’Etat, en un mot par un programme qui s’inspire, volontairement ou non, de ce qui est déjà en vigueur, et de longue date, au sein de l’Union européenne.

Il lui faudra cependant compter avec une solide opposition de droite au Parlement. Elle pourrait le contraindre aux ajustements dont l’exercice du pouvoir est souvent synonyme. Le nouveau président a déjà promis le dialogue, une nécessité autant qu’un signal encourageant pour le Chili. C’est d’autant plus le cas que le début de son mandat va également coïncider avec une révision constitutionnelle majeure qui pourrait permettre à la fois d’enterrer définitivement les années de plomb subies par le pays et de mieux prendre en compte l’ensemble des minorités chiliennes.


segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

O estupro orçamentário agora é um processo "legal" e permanente - Editorial do Estadão

A constitucionalização da infâmia

A ideia de que a subversão da ordem jurídica e o abandono da âncora fiscal eram indispensáveis para ajudar os pobres é falsa, e os pobres pagarão por isso


Notas & Informações, O Estado de S.Paulo 

13 de dezembro de 2021 | 03h00 

O Congresso promulgou parte da PEC dos Precatórios. Convenientemente, foi deixada de fora a emenda aprovada pelo Senado que vincula os espaços fiscais adicionais exclusivamente a gastos sociais. O heterodoxo “fatiamento” coroa a manobra que nasceu antirrepublicana não só nos meios, como nos fins. 

Consolidou-se, não apenas no Planalto e no Congresso, mas em parte da opinião pública, a ideia de que o teto de gastos era um fetiche liberal insustentável. Ironicamente, posicionar-se contra a PEC do presidente que outrora vilanizava sistematicamente os programas de assistência social equivaleria a ser antipobre. Era preciso escolher o mal menor: ou o calote e a pedalada ou o abandono de milhões à miséria. Essa narrativa foi desmentida reiteradas vezes pelos especialistas em contas públicas. 

Não é apenas que o governo tenha negligenciado desde o princípio promessas obtusas da campanha que poderiam ter aliviado os pobres ou gerado espaço fiscal, como a implementação de uma tributação mais progressiva ou uma reforma administrativa que tornasse a máquina pública mais eficiente e menos onerosa. Nem que tenha ignorado propostas parlamentares projetadas para compatibilizar novos gastos sociais com a sustentação do arcabouço fiscal, como a PEC 182/19 ou o Projeto de Lei de Responsabilidade Social. 

O fato é que mesmo depois da pandemia, o governo ignorou pelo menos quatro alternativas sugeridas por sua própria equipe econômica para viabilizar o Auxílio Brasil sem furar o teto: revisar as despesas com abono salarial, com o seguro-defeso, com o seguro-desemprego ou com subsídios fiscais. 

A Instituição Fiscal Independente do Senado apontou que seria possível dobrar o valor dos auxílios fixados na proposta do Orçamento de 2022 com cortes nas despesas de custeio, a correção da contabilização dos precatórios do Fundef/Fundeb e o direcionamento de metade das emendas parlamentares para o social. 

Os senadores José Aníbal (PSDB-SP), Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE) apresentaram emendas que garantiriam R$ 99 bilhões ao social, podendo beneficiar 21 milhões de brasileiros com R$ 400 por mês. 

Há gente séria pensando no País. Todas essas propostas permitiram robustecer expressivamente os gastos sociais ao abrigo do teto. Mas justamente esse era o inconveniente. O teto foi projetado para forçar a arena política a debater e a avaliar sistematicamente os gastos públicos. Mas isso atenta contra os propósitos do governo e seus aliados fisiológicos: ampliar despesas sem economizar um centavo. 

Ao contrário, a pretexto de ajudar os pobres, o dinheiro dos cofres públicos e aquele “poupado” com o calote aos credores dos precatórios servirão para bancar, em ano eleitoral, mais emendas parlamentares (algumas tão escusas que chegaram a ser suspensas pelo STF), fundos partidários e eleitorais, benefícios corporativos (como bolsa-caminhoneiro) ou aumentos ao funcionalismo. Com o teto despedaçado, o céu é o limite. 

A PEC constitucionalizou não só o descumprimento de sentenças judiciais, mas, como disse o senador José Serra, o princípio do “orçamento-ficção”. Com a nova regra de cálculo da inflação (de janeiro a dezembro), o limite de gastos anual será determinado com base em estimativas. Os Orçamentos passarão a ser aprovados ao sabor de especulações. A cada ano, uma nova bomba fiscal. 

Ao constitucionalizar a subversão da ordem jurídica e consagrar a irresponsabilidade fiscal, a PEC impacta a credibilidade e a segurança jurídica do País, hipotecando seu futuro. A fatura não tardará a chegar e parte já está sendo paga. A bola de neve dos precatórios pode criar um passivo de R$ 850 bilhões até 2026. O custo para o Tesouro tomar empréstimos do mercado crescerá cada vez mais. Os juros previstos para os próximos 10 anos já estão em 12% ao ano. As chances de crescimento derretem a olhos vistos e uma crise social prolongada se desenha no horizonte. 

A amarga ironia é que justamente os pobres, que serviram de pretexto para toda essa patranha, serão os mais penalizados.


terça-feira, 26 de outubro de 2021

O diabo não desiste - Editorial, O Estado de S. Paulo (24/10/2021)

 O diabo não desiste

Editorial, O Estado de S. Paulo (24/10/2021)


O PT não se desculpa por seus erros, e aqueles que o partido não pretende repetir, julga ter poder de apagar

Desde que o PT precipitou a maior crise econômica, política e moral da Nova República, a população esperou em vão por um mísero mea culpa. Após o impeachment de Dilma Rousseff, a única bandeira a unificar seus correligionários foi a denúncia ao “golpe”, logo substituída pelo slogan “Lula Livre”. O PT se opôs a reformas modernizantes como a da Previdência, opõe-se a outras, como a administrativa, e não oferece alternativas construtivas aos desmandos que acusa. Em campanha eleitoral, o partido se mostra incapaz de propor uma agenda positiva para o futuro, muito menos de reconhecer os erros do passado. Ao contrário, afirma que vai repeti-los, por exemplo, implodindo o teto de gastos que estancou a hemorragia fiscal deflagrada no governo Dilma Rousseff. 

Ainda pior, o PT não só pretende repetir seus erros de gestão, como julga ter poder de apagar os crimes dos quais foi cúmplice. Em entrevista coletiva, a sua presidente, Gleisi Hoffmann, afirmou que nunca houve “corrupção sistêmica”, superfaturamento ou desvio de dinheiro na Petrobras.

Boa parte desses delitos foi confessada pelos próprios delinquentes, que devolveram bilhões desviados à Petrobras. Com base em uma auditoria da PriceWaterhouseCoopers, a própria Petrobras admitiu no balanço de 2014 que US$ 2,5 bilhões foram pagos a mais a “um conjunto de empresas que, entre 2004 e abril de 2012, se organizaram em cartel para obter contratos com a Petrobras, impondo gastos adicionais nestes contratos e utilizando estes valores adicionais para financiar pagamentos indevidos a partidos políticos, políticos eleitos ou outros agentes políticos, empregados de empreiteiras e fornecedores, ex-empregados da Petrobras e outros envolvidos no esquema de pagamentos indevidos”.

Segundo Gleisi Hoffmann, a PriceWaterhouse foi obrigada pela Lava Jato a atestar as perdas. Não há evidências disso. Por outro lado, é notório que à época o PT pressionou a diretoria da Petrobras comandada por Maria das Graças Foster, executiva de confiança de Dilma Rousseff, a não publicar os dados auditados, levando a um impasse e finalmente à renúncia de Foster e outros diretores. Depois, a Petrobras participou dos processos judiciais como assistente de acusação do Ministério Público, recuperando mais de R$ 6 bilhões superfaturados pelos cartéis.

O Tribunal de Contas da União (TCU), atuando independentemente da Lava Jato, expôs uma série de ilicitudes nos contratos da Petrobras. Na construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, por exemplo, o TCU identificou que o orçamento inicial de US$ 13,4 bilhões foi majorado para US$ 26,3 bilhões. Ao mesmo tempo que o custo final foi dobrado, a refinaria produz apenas metade dos 230 mil barris de petróleo inicialmente previstos. O TCU estimou que as perdas da Petrobras apenas em Abreu e Lima acumularam US$ 19 bilhões.

Similarmente, o TCU verificou que a torre Pirituba, em Salvador, inicialmente orçada em R$ 320 milhões, foi construída pela OAS e a Odebrecht por R$ 1,3 bilhão, e que a construção do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro – jamais concluída – gerou perdas de US$ 12,5 bilhões.

É conhecida a candura com que a ex-presidente Dilma Rousseff expôs os métodos petistas: “Nós podemos fazer o diabo quando é a hora da eleição”. Ironicamente, o PT, ciente de que ninguém fez mais do que Dilma para arruinar o suposto legado de Lula, a incluiu no rol dos erros a serem esquecidos. O ex-poste de Lula é hoje uma ausência garantida nos discursos e comícios do demiurgo de Garanhuns. 

Lula, por sinal, afetou melindres em suas redes sociais: “Eu sou de um tempo onde a disputa era apenas eleitoral. Você não estava numa guerra. Seu adversário não era um inimigo”. Que o diga a ex-petista Marina Silva, sordidamente vilanizada pelos marqueteiros do PT nas campanhas de 2014, ou todos os brasileiros vilipendiados como “fascistas” simplesmente por recusarem o culto a Lula da Silva.

O despudor com que o PT tenta reescrever a história do País para edulcorar sua trágica passagem pelo poder rivaliza com o sistemático embuste bolsonarista, o que permite prever que a campanha de 2022, mantido o favoritismo de Lula e Bolsonaro, fará corar o próprio Pinóquio.


quarta-feira, 11 de agosto de 2021

Impasses no relacionamento do “Ocidente” contra a China devem continuar - editorial do Japan Times

 A próxima década continuará a ser marcada pela atitude confrontacionista de grande parte dos países “ocidentais” — aqui incluídos Japão e Austrália — contra a China. Ou seja, o mundo vai continuar gastando mais do que o desejável em defesa e dissuasão, o que manterá as desigualdades internacionais no mesmo nível atual, em lugar de um grande esforço de cooperação em favor da redução da miséria e pobreza em vastos setores da periferia.

Paulo Roberto de Almeida

 

The Japan Times, Tóquio – 11.8.2021 - Editorial

The U.S.-China downward spiral will only get worse

 

In his meeting last week with visiting U.S. Deputy Secretary of State Wendy Sherman, Xie Feng, China’s vice foreign minister, accused the United States of treating China as an “imaginary enemy.”

He and his government are dismayed that the Biden administration has not softened Donald Trump’s hard-line policy toward China and instead continues to hold it accountable for its misdeeds. The expectation that the U.S. would reverse course was folly.

U.S. policy reflects a new consensus about China and this consensus extends to other governments as well. China needs to recognize this new normal and adjust policy accordingly. It appears to be doubling down on belligerence instead.

Xie’s characterization of U.S. policy is wrong on both counts. The U.S government does not consider China the enemy. The Biden administration has made it clear that it sees China as a competitor and a rival, but also a partner. It is eager to work with Beijing on issues of mutual concern, and there are many — climate change, the COVID-19 pandemic, the bloody situation in Myanmar and the North Korean nuclear problem top a long list.

But the U.S. also has a list of complaints about Chinese behavior that it — like other nations — rightly considers inappropriate and dangerous. Those offenses include, but are not limited to, the disregard for international law in the South China Sea, a similar indifference to its international obligations in regard to the Hong Kong Special Administrative Region, the increasing pressure on Taiwan and ongoing attacks on U.S. computer networks.

Japan too is ready to work with China on pressing issues, but it also wants Beijing to respect international law, cease the pressure on Taiwan, quit turning a blind eye to and enabling North Korea’s disregard for its nuclear obligations, end the daily incursions into waters around the Senkaku islands and provide greater transparency about its military.

Meeting Sherman, Chinese diplomats countered with their own demands, among them: end visa restrictions on members of the Communist Party of China, as well as their families and Chinese students; stop suppressing Chinese companies and Confucius Institutes; stop registering Chinese media as foreign missions; and halt the extradition of Meng Wanzhou, a senior Huawei executive held in Canada on U.S. charges of money laundering.

Foreign Minister Wang Yi, with whom Sherman met on her second day of meetings, provided a revealing set of principles for the bilateral relationship. He insisted that the U.S. must not challenge or attempt to subvert the system of socialism with Chinese characteristics, it must not block China’s development process and it must not infringe upon China’s sovereignty or territorial integrity.

Charges of unfair economic practices apparently violate the first and second principles, while the demand that Beijing respect the international arbitral decision that ruled illegal China’s island-building projects in the South China Sea transgresses the third.

Beijing responds to all accusations with either a flat denial or a claim that China’s behavior is of no concern to other nations. It thunders that any criticism constitutes interference in its internal affairs. It accepts no authority — not even the treaties and charters that it signed — as superior to that of its own government. Beijing is quick to attribute any charges to a desire to keep China from assuming its rightful place in the regional and global order or the belief that the U.S. is using China to “reignite a sense of national purpose.”

China’s refusal to accept that it plays a role in the downward spiral in relations with the U.S. guarantees that the deterioration will continue. No nation is above criticism. Unnamed U.S. officials reportedly said that they would “take a look at … some of the concerns that were raised with us.” China is likely to see that as validation of its complaints rather than an opening to engage in self-reflection.

The way that Xie’s remarks were released — first through Chinese language social media — reveals that China’s stiff-necked and caustic engagement is aimed as much at domestic audiences as those in Washington and other capitals. It is part of a belligerent triumphalism that has assumed still more strident tones since the ruling Chinese Communist Party marked the centennial of its founding earlier this month.

This nationalist crescendo seems to be girding the public for hardship as much as celebrating China’s strengths. The country’s leadership should worry that tidal waves of emotion are difficult to control or direct.

One of Beijing’s greatest concerns is the creation of a multinational front that takes a united stand against China on issues such as its human rights practices, its predatory economic policies or its cyber attacks. The Biden administration is committed to forging that consensus among like-minded nations and has had success with statements condemning China’s behavior in bilateral summits like that with Prime Minister Yoshihide Suga or the multilateral G7 and NATO meetings last month. That, for Beijing, is an alarming development.

China and the U.S. need to have a working relationship. The world needs China and the U.S. to have a working relationship. That will include both cooperation and competition, and both sides need to find common ground to ensure that the latter does not dominate, nor does it slide into conflict.

 

Para acessar a íntegra:

https://www.japantimes.co.jp/opinion/2021/07/30/editorials/china-downward-spiral/

quinta-feira, 15 de julho de 2021

Bolsovirus: um presidente vulgar no extremo limite da expressão: Editorial da IstoÉ - Carlos José Marques

 Confesso que existem certas coisas que não merecem destaque e das quais eu preferiria passar longe. 

Mas cabe, neste meu quilombo de resistência intelectual, registrar o horror que estamos vivendo, com um presidente chulo, tosco, vulgar, pestilento, uma escória de pessoa, e não sou eu quem invento nada: é o próprio que se desqualifica e diminui o Brasil com os mais sórdidos palavrões e expressões. O homem não tem limites, e ainda pretende provocar confusão.

Já vou tomar uma atitude RADICAL: imputo plena RESPONSABILIDADE pela continuidade desse DESPREZÍVEL dirigente aos MILITARES que o circundam, e que o sustentaram na sua ascensão ao poder, junto com políticos oportunistas e com empresários calhordas. São eles os responsáveis pela manutenção desse verme no poder.

Transcrevo o editorial.

Paulo Roberto de Almeida


domingo, 17 de janeiro de 2021

Intervenção no BB é mais um ataque ao liberalismo - Editorial de O Globo

Bozo não é, nunca foi, nunca será liberal. Usou dessa carapuça hipocritamente, de má-fé, para enganar os "liberais de mercado" e os grandes empresários, que são tão estúpidos quanto ele, achando que poderiam realizar alguns de seus objetivos secretos. Ele conseguiu ser eleito, e os donos do capital ainda aguardam a maravilha do crescimento. Que não virá sem reformas, e reformas é tudo o que Bolsovirus não quer. Seu único objetivo é proteger seus negócios escusos, e sua família miliciana, aliás muito parecido com Trump, nisso também.

Paulo Roberto de Almeida 

Intervenção no BB é mais um ataque ao liberalismo
Editorial de O Globo, 17/01/2021
Barrar reforma no banco confirma que Bolsonaro só se preocupa com seus projetos político-eleitorais
A ameaça de demissão de André Beltrão da presidência do Banco do Brasil revela a essência antiliberal de Jair Bolsonaro, que trata empresas estatais, mesmo as com ações em bolsa dentro e fora do país, como se estivessem subordinadas ao Planalto, à sua disposição para interferências políticas. Ex-presidente do HSBC, Beltrão foi levado para o banco pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para fazer uma gestão profissional. Esbarrou no projeto político e na visão ideológica de Bolsonaro sobre as estatais.
Assumiu o cargo em julho para substituir Rubem Novaes, que saiu se dizendo frustrado por não conseguir fazer privatizações no BB. Não é difícil deduzir de onde partiam as resistências. Desta vez, Brandão anunciou um necessário plano de enxugamento do banco, cada vez menos competitivo num setor em rápida evolução. O plano envolvia um programa de demissão voluntária para afastar 5 mil funcionários, fechar agências, escritórios e postos de atendimento, 361 unidades ao todo, gerando economia de R$ 353 milhões ainda este ano. Não faz sentido mesmo manter guichês e balcões quando, também no BB, cresce o número de operações feitas pelos clientes de forma digital.
Mas o programa de reestruturação não é considerado conveniente em meio ao toma lá dá cá que transcorre em Brasília para Bolsonaro eleger Arthur Lira (PP-AL) presidente da Câmara dos Deputados. “Quem manda sou eu” é um dos bordões mais usados por Bolsonaro quando não gosta de alguma decisão tomada em seu governo. Ele reclama que não foi informado sobre detalhes do plano, aprovado pelo ministro Paulo Guedes.
Na quarta-feira, Bolsonaro recebeu a visita de nove deputados e um senador, preocupados com os efeitos do plano de enxugamento em suas bases. Consta que Paulo Guedes, além de procurar demover Bolsonaro, tenta substituir Brandão por alguém do mesmo perfil. O plano de Brandão, diga-se, é até modesto perto da real necessidade para o país: privatizar a área comercial do BB — não faz sentido o Estado operar um banco de varejo — e, se necessário, criar uma nova instituição financeira para as operações de fomento e crédito agrícola operadas pelo banco, área com que o BB tem ligação tradicional.
Fundado na chegada da família real portuguesa ao país, em 1808, o BB tem uma longa história de uso pelos donos do poder. A começar pela primeira falência, em 1821, quando Dom João VI voltou a Lisboa levando nas arcas o dinheiro do banco. Bolsonaro repete uma tradição secular da manipulação de estatais, sem qualquer preocupação com os acionistas privados da instituição financeira.
Todos os bancos têm planos de enxugamento para se adaptar à digitalização do setor, acelerada pela chegada das fintechs. Mas Bolsonaro se preocupa apenas com seu projeto político-eleitoral e, no momento, em eleger Lira para controlar a pauta da Câmara. A queda de braço em torno do BB resulta em mais uma derrota a seu ministro da Economia, a cada vez menos visível face liberal do governo.