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segunda-feira, 2 de setembro de 2013

O governo pretende enganar os brasileiros, no programa Mais Medicos?

É o que parece estar ocorrendo. Parece que tudo estava acertado desde muito tempo, para a importação exclusiva dos médicos cubanos. Prevendo uma reação da sociedade, o governo improvisou um programa de mentirinha, apenas para justificar a vinda dos médicos cubanos, que nada mais é do que um pretexto para se entregar dinheiro brasileiro a ditadura castrista. É o que diz este editorial do Estadão, esse jornal reacionário do Partido da Imprensa Golpista...
Paulo Roberto de Almeida

O outro lado do Mais Médicos

01 de setembro de 2013 | 2h 15
Editorial O Estado de S.Paulo

As últimas notícias sobre o programa Mais Médicos indicam que o que sobrou em preparo - infelizmente não no bom sentido - no que se refere à vinda dos médicos cubanos, faltou em cuidado sobre as consequências, para os profissionais brasileiros, da entrada deles no mercado de trabalho. Fica claro que houve ao mesmo tempo muita sofreguidão e pouco planejamento, o que é lamentável em programa tão ambicioso e voltado para uma das áreas mais sensíveis da administração, que é a saúde pública.
Provavelmente já prevendo reações contrárias à sua ideia - por existirem sérias dúvidas seja com relação à real necessidade desses profissionais, seja com relação à sua qualificação, já que não passariam pelo exame de revalidação do diploma -, o governo federal tratou do caso dos médicos cubanos em surdina, omitindo informações importantes a respeito, que agora começam a vir à tona. Reportagem do Estado mostra que a vinda desses médicos estava sendo providenciada há pelo menos seis meses, bem antes, portanto, de o governo anunciar o seu plano.
Professores brasileiros com material didático do que seria depois o Mais Médicos viajaram para Cuba, mesmo sem a existência formal de um acordo, para transmitir aos médicos noções básicas sobre o sistema público de saúde brasileiro e de língua portuguesa. É o que atestam depoimentos de médicos integrantes do primeiro grupo que aqui chegou. "Agora é só revisão. Boa parte do conteúdo aprendemos lá", disse um deles, acrescentando que havia conhecido em Cuba um dos professores que estão ministrando os cursos de três semanas, que devem seguir antes de começar a clinicar.
Três colegas seus, expressando-se em português razoável, confirmam que o preparo para a vinda ao Brasil começou há vários meses. Receberam também informações sobre as regiões em que devem trabalhar, como disse um que vai para a Amazônia.
Tudo isso confirma que esse preparo começou antes do primeiro anúncio da intenção do governo de trazer médicos cubanos, para atuar em regiões pobres do interior e na periferia das grandes cidades, feito em maio pelo então chanceler Antônio Patriota. Inicialmente o número previsto era de 6 mil. Diante da reação negativa das entidades representativas dos médicos brasileiros, o governo prometeu fazer mudanças no plano, lançado oficialmente no início de julho, agora com a promessa de preferência para os profissionais formados no País e com um número mais reduzido de cubanos - 4 mil.
O acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), que faz a intermediação entre Brasil e Cuba, foi formalizado em meados da semana passada. E, para surpresa geral, apenas três dias depois 400 dos 4 mil médicos cubanos desembarcaram no País. Surpresa que agora se explica.
O governo não tem o direito de tratar dessa forma, com esse jogo de esconde-esconde, a população e as entidades médicas. Ele transmite assim uma desagradável impressão de esperteza. Um comportamento inaceitável em autoridades públicas. E não convence a explicação do Ministério da Saúde, segundo o qual a presença dos professores brasileiros em Cuba faz parte de projeto de intercâmbio entre os dois países - os primeiros dariam aulas sobre o funcionamento do SUS e os cubanos, em troca, repassariam seus conhecimentos sobre atenção básica.
Como se toda essa trapalhada - para dizer o mínimo - não bastasse, o programa já começa a ter consequências negativas. Reportagem do jornal Folha de S.Paulo mostra que prefeituras das Regiões Norte e Nordeste estão trocando profissionais contratados por elas por outros do Mais Médicos, principalmente cubanos. Por uma razão muito simples: os primeiros são pagos por elas (os salários podem chegar a R$ 35 mil) e os cubanos, pelo governo federal. A vantagem da troca é muito grande.
A única explicação para o Ministério da Saúde não ter percebido que o programa tinha esse risco evidente, e não ter tomado medidas para evitá-lo, só podem ser a pressa e a improvisação.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

A Unesp-Marilia faz simulacro de concurso para escolher um "marquissista" companheiro; minha "Opiniao" (PRA)

O assunto é antigo, e já tinha sido veiculado aqui por minha própria iniciativa.
Vejam aqui.

A Unesp de Marília está fazendo concurso para um novo professor de Ciência Política I e II.

O edital está aqui: 
http://www.marilia.unesp.br/Modulos/Editais/pdfs/Edital-151-2013.pdf

Este é o programa aprovado para o concurso: 

1. O movimento operário e a democratização liberal
2. A sociedade de massas e a democracia como seleção de dirigentes
3. Intelectuais e planejamento democrático
4. A teoria do totalitarismo
5. A democracia como expressão de conflito de interesses
6. As teorias neo-contratualistas da democracia
7. O marxismo da Internacional Comunista
8. O marxismo da Escola de Frankfurt
9. Teorias do Estado capitalista
10. Teorias da democracia e do Direito no marxismo
11. Marxismo, crise e transição socialista


Como se pode constatar, eles não querem um professor de Ciência Política, mas um de "marquissismo"; de preferência algum companheiro que já esteja previamente selecionado. (Atenção, este é um chute, ou minha opinião, e tenho o direito de expressá-la.)

Como eu achei estranho, tanto o programa quanto a bibliografia -- onde constam títulos em italiano de livros que já foram publicados em Português, como comentei aqui --, escrevi, em 20 de Julho de 2013, para a Faculdade, para saber se eles estavam de acordo com um concurso assim tão, tão, como diremos?, tão direcionado...

A Ouvidoria da Universidade, muito gentilmente, me respondeu o seguinte no dia 22 de julho: 

"Encaminho seu email ao Departamento de Ciência Política, caso considerem pertinente comentar o assunto."

No dia 6 de agosto, nova nota da Ouvidoria, nos seguintes termos: 

"Senhor Paulo,

Tendo encaminhado seu email ao Departamento, recebemos a seguinte nota do vice-chefe departamental, a qual repasso para seu conhecimento:

" [...] os critérios adotados para concurso em uma dada área do conhecimento é discutida e proposta pelos membros da área, que no caso é a de Política. Como o conjunto desses professores que é composto por doutores, livre docentes e titular julga pertinente uma dada bibliografia e um certo conjunto de temas a serem abordados em um dado concurso, a posição do conjunto do departamento é a de referendar o que se é proposto. Além disso, o departamento preza pela liberdade de posicionamento frente a uma dada filosofia e/ou ideologia científica, e que fatalmente irá direcionar a bibliografia e o conjunto de temas, o que não consideramos isso uma falta acadêmica, e sim uma transparência nos modos de agir e pensar daqueles que integram o DCPE. Assim, irei incluir a nota da ouvidoria na próxima reunião departamental para que a mesma seja discutida amplamente, e se julgarmos oportuno daremos uma resposta".

Assim, considero que apesar de opiniões opostas, o senhor teve a atenção às suas colocações sobre o assunto.
Cordialmente
[Professor responsável]
Ouvidora da FFC"

Fiquei um pouco chocado com o Português da resposta do vice-chefe departamental -- "os critérios adotados para concurso em uma dada área do conhecimento é discutida e proposta pelos membros da área" -- mas entendo que o professor encarregado estava encarregado de altas questões de "liberdade de posicionamento", não de baixas questões de correção gramatical. Também achei estranho a falta de lógica do conjunto do departamento referendar o que se é proposto, sobretudo o "fatalmente" no direcionamento da bibliografia, e por aí segue o Português arrevesado do vice-chefe departamental. Ele ainda confunde a nota da Ouvidoria com a minha surpresa... Passons...

Enfim, eles fizeram a tal reunião prevista, e veio a resposta previsível, em 15 de agosto, que transcrevo a seguir:

"O Departamento de Ciências Políticas e Econômicas reunido em 13/08/2013 discutiu a manifestação do Sr. Paulo Roberto de Almeida encaminhado a este Departamento pela Ouvidoria e se manifesta com a seguinte nota:
"Consideramos a manifestação do Sr. Paulo Roberto de Almeida como uma opinião, e como opinião deve ser tratada. Ressaltamos que os concursos do Departamento de Ciências Políticas e Econômicas são pautados pela
transparência, pela lisura e pela legalidade e o concurso em tela não é exceção".
Atenciosamente,
Dr. Paulo Eduardo Teixeira
Vice-Chefe do Departamento de Ciências Políticas e Econômicas

Comento: PRA: 

Como é minha opinião, permito-me externá-la novamente.
Considero uma vergonha que um Departamento de Ciência Política promova um concurso para Professor para duas matérias dessa área e que o programa oferecido e a bibliografia exigida sejam os que constam do Edital.
Para refrescar a memória, transcrevi acima, novamente, o programa, que pode até se pautar pela transparência, mas certamente não pela lisura e muito menos pela legalidade, uma vez que circunscreve todo o universo da Ciência Política a um ajuntamento de "opiniões" deformadas pela ideologia de quem formulou o edital e sobretudo porque lista uma série de livros totalmente irrelevantes, ou marginais, para o estudo do núcleo programático que deveria integrar qualquer programa decente de Ciência Política.
Como eu fiz a sugestão desde o início, melhor chamar essa coisa de "concurso para professores de 'marquissismo' I e II".

Coonestando com esse bando de iluminados, a Unesp perde em credibilidade, em lisura e em respeitabilidade. Perdem os alunos, perde o estado de São Paulo, perde o Brasil.
De fato, é uma vergonha que um concurso desse tipo possa ser feito por uma instituição que se considere séria. 
Como disseram os professores do Departamento, se trata de uma opinião.
Minha opinião é a de que eles estão abusando dos alunos, conspurcando a Universidade e desmerecendo o salário que recebem do setor público (aliás, pago por todos nós).
Paulo Roberto de Almeida



domingo, 30 de junho de 2013

Democracia direta? Demagogia indireta - Marcos Pontes



Marcos Pontes
Do Blog S-E-228 Jun 2013

Sou absolutamente contra plebiscito e/ou referendo. Me dói, mas concordo com as lideranças políticas que afirmam que o Congresso tem a competência e obrigação legal e moral de fazer as reformas. É necessário que a população que vai às ruas na onda e meio perdida, sem dar-se ao trabalho de analisar a história e a legislação, coloque pressão para que ajam. 

Fomos às urnas no referendo do desarmamento. Mais de 60% da população votou "não" e o que fez o governo? Baixou o desarmamento por decreto. Isso diminuiu a violência? Não, apenas aumentou, e muito. 

Por plebiscitos El Loco Chávez eternizou-se no governo venezuelano, hoje naufragando na inflação de dois dígitos por mês. Pior, deixou para Maduro a mesma condição de tornar-se o deus-sol caribenho.E esta tem sido uma tática para dar legitimidade ao ilegal, expediente bastante utilizado por governos autocráticos que esperam, com os resultados de referendos e plebiscitos, darem uma vestimenta de apoio popular naquilo que foi espalhado como salvação da lavoura através de propagandas milionárias ou força bruta.

Eleições não são sinônimo de democracia, isso todo cidadão minimamente informado já sabe. União Soviética, China comunista, Irã teocrático, Iraque husseniano e republiquetas bolivarianas sempre fizeram eleições e são o que são, a antítese da democracia.

No texto do plebiscito/referendo, essa politicanalha que não quer largar o osso colocaria apenas questões que lhe interessa, sabendo que o grosso do populacho votaria sim ou não sem conhecer o que estaria votando. E para convencer os eleitores a votarem no que gostaria, apelaria para a propaganda, enchendo de atores e subcelebridades “globais” seus comerciais com apelos populistas e mentiras sem fundo. Camila Pitanga, Regina Casé, José de Abreu e mais uma meia dúzia de venais fariam fortuna às custas das desgraças populares. 

Se mesmo assim as vontades dessas lideranças políticas fossem rejeitadas, nada impediria que a manutenção do que há continuasse por decretos ou arranjos no Congresso com conivência do governo federal e vice-versa. 

A saída seria a vigilância constante e exigência popular (entenda-se por popular a cobrança dos 10 % que leem jornais e entendem o que entrava o crescimento e a democracia do país) nas votações de ponto por ponto, lei por lei. É uma atuação longa e demorada, mas que pode trazer resultados muito melhores a longo prazo do que um pacotão com todas as "salvações da pátria", algo que todo brasileiro já deveria ter aprendido. 

©Marcos Pontes

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Uma nota oficial para dizer... absolutamente nada... (ufa, pelo menos isso)

Bem, pelo menos não tem erros de Português, embora pudesse ser melhor escrita.
Mas não nos enganemos. Eles vão continuar tentando engabelar e construir o fascismo corporativo por todos os meios.
Insistir num plebiscito em torno do quê, exatamente? Dizer sim ou não para a reforma política?
Eu também quero, embora ache impossível, irrelevante, perda de tempo. Depende de qual reforma política, e isso não dá para resolver por sim ou não.
Por exemplo: estabelecer a verdadeira proporcionalidade: um eleitor, um voto. Vai ser no sim ou não?
Bem, já que o governo vai ouvir outras propostas de reforma política, este blog também vai fazer as suas...
Paulo Roberto de Almeida

Em relação às declarações de hoje do presidente da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, a Presidência da República esclarece:

1. A presidenta Dilma Rousseff recebeu hoje o presidente da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, e o diretor do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, Márlon Reis, que lhe apresentaram uma proposta de reforma política baseada em projeto de lei de iniciativa popular.
2. A presidenta da República reiterou a relevância de uma ampla consulta popular por meio de um plebiscito.
3. A presidenta ouviu a proposta da OAB, considerou-a uma importante contribuição, mas não houve qualquer decisão. O governo continuará ouvindo outras propostas de reforma política que lhe forem apresentadas.

Secretaria de Comunicação Social

Presidência da República

terça-feira, 19 de março de 2013

O dragao da inflacao e o cego voluntario (adivinhe quem?) - Marcelo de Paiva Abreu

Dissimulação não vai conter a inflação

Marcelo de Paiva Abreu
O Estado de S.Paulo, 18/03/2013
Nunca é demais lembrar sir Alec Cairncross e sua insistência no parentesco entre a medicina e a economia, ambas misturas de conhecimento imperfeito, sabedoria popular, jargões obscuros e análise científica. Ambas vulneráveis ao charlatanismo. Para levar o paralelismo ao extremo: o paciente tem febre alta e o médico é chamado às pressas. O caminho ortodoxo é receitar um antitérmico. Existirão, talvez, tratamentos alternativos amparados na medicina popular. O menos desejável é que o médico quebre o termômetro e suponha que o paciente não está febril. Parece absurdo, mas a metáfora retrata de forma precisa as escolhas que faz o atual governo quanto à política econômica. Entre opções mais ou menos espinhosas, prefere negar a realidade.

O governo tem demonstrado persistência na adoção de técnicas de dissimulação com o objetivo, pelo menos secundário, de dificultar análises objetivas da situação econômica do País. Alguns falariam até mesmo em tentativas canhestras de ludibriar a opinião pública.

As estripulias com dados fiscais envolvendo operações entre Tesouro, BNDES, Caixa Econômica Federal e Petrobrás têm sido ventiladas exaustivamente na mídia. Têm como objetivo ocultar que o governo vem gradativamente abandonando seus compromissos quanto à geração de um superávit primário adequado nas suas contas.

Agora, mágicas semelhantes têm sido adotadas em relação à inflação crescente. Afinal, se a inflação puder ser mantida abaixo dos 6,5% - limite superior da meta -, o governo poderá defender-se com menos dificuldade da acusação de que está abandonando o compromisso com políticas minimamente prudentes e de que está disposto a aceitar uma clara violação do modesto compromisso inflacionário implícito no atual regime de metas. O aumento das tarifas de transportes coletivos no Rio de Janeiro e em São Paulo foi postergado. Embora a redução das tarifas de energia elétrica faça sentido do ponto de vista da melhoria da competitividade dos produtos brasileiros, é sempre verdade que haverá impacto não desprezível sobre a inflação. O mesmo se aplica à desoneração fiscal da cesta básica: embora bem-vinda do ponto de vista social, alivia pressões inflacionárias. É com melancolia que se lê sobre reuniões do ministro da Fazenda com donos de supermercados com o objetivo de conter preços. Desde as grotescas iniciativas de laçar bois no pasto, que marcaram a agonia do Plano Cruzado, presumia-se que o País tivesse aprendido que, para controlar a inflação, é fundamental conter a demanda e que os instrumentos adequados para isso são a taxa de juros ou o aperto fiscal.

Nos velhos tempos, práticas que pretendiam escamotear evidências factuais - desde a tortura até a inflação crescente - eram típicas de regimes totalitários. Regimes de exceção permitem que sejam reprimidas com impunidade revelações consideradas inconvenientes. Em episódio conhecido, em 1973, o governo teria patrocinado o uso de preços tabelados para o cômputo da inflação, algo reconhecido alguns anos depois pelo Banco Mundial e pelo próprio governo. No final dos anos 70, o governo andou expurgando índices no célebre episódio da inflação do chuchu. A argumentação fazia sentido, pois não parecia razoável manter o peso do chuchu no cálculo do índice inflacionário, pois o aumento expressivo do preço do chuchu certamente resultaria em contração da quantidade demandada. O problema era convencer a opinião pública, mesmo com a censura da mídia, de que não se tratava de mais uma mentira oficial destinada a reduzir a inflação com a adoção de métodos pouco convencionais.

Modernamente, a manipulação de preços tornou-se habitual em regimes populistas, entre os quais a Argentina talvez seja o exemplo mais notável. Lá, a indecente divergência entre a inflação oficial e diversos cômputos extraoficiais levou o FMI a censurar explicitamente o governo - aplicar-lhe cartão amarelo, na metáfora da senhora Lagarde, com ameaça de cartão vermelho, se não houver progresso em três meses. A "resposta argentina" foi "congelar" preços nos supermercados por 60 dias...

Avaliando as raízes do populismo no Brasil, há claro contraste entre as políticas econômicas do peronismo e do varguismo. E, no entanto, o governo atual, useiro e vezeiro na invocação de suas raízes varguistas, está de fato tomando o péssimo exemplo da Argentina como algo que merecesse ser copiado. Sob Vargas, houve pouco que se aproximasse da sistemática penalização dos interesses agrícolas que seria tradicional em governos peronistas e neoperonistas. No seu primeiro período de governo, o momento mais controvertido foi quando suspendeu o pagamento da dívida externa em 1937, atitude extrema que começou a ser revertida depois de um ano. Eleito presidente em 1950, deu espaço às trapalhadas de Ricardo Jafet e João Goulart, no Banco do Brasil e no Ministério do Trabalho, mas, ambíguo, não deixou de contemplar os círculos mais conservadores. No cerne, era um populista bastante prudente do ponto de vista econômico e financeiro.

É preciso aceitar que a febre não vai ser reduzida com a quebra do termômetro.
* Marcelo de Paiva Abreu é doutor em Economia pela Universidade de Cambridge e professor titular no Departamento de Economia da PUC-Rio.