O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

Mostrando postagens com marcador inflação. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador inflação. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 11 de outubro de 2023

Uma nova ópera dos três vinténs na Argentina - Paulo Roberto de Almeida

 Um libreto porteño, sem qualidades

Paulo Roberto de Almeida

“Argentinos aceleram compra de dólares; para Milei, peso não vale nem um “excremento”.”

A Argentina se prepara atabalhoadamente para um salto no escruro. Quem tem dólares é a classe média, que ainda sobrevive. A imensa maioria da população não os tem, e vai ficar muito mais pobre com um governo Milei, que seria o caos completo. 

Para o Brasil seria o fim do Mercosul e da possibilidade de qualquer liderança na América do Sul, menos ainda no diáfano Sul Global. Um fracasso partilhado com muitos outros vizinhos.

Para os argentinos, seria o labirinto do Minotauro sem qualquer fio de Ariadne. 

Já se pode chorar antecipadamente pela Argentina, mas isso não vale nem um ópera de três vinténs. 

Brasília, 11/10/2023

quinta-feira, 10 de agosto de 2023

China-USA: dois gigantes econômicos, com problemas opostos: deflação-inflação - Adam Taylor (WP)

 

domingo, 2 de abril de 2023

Em busca de mais impostos ou mais inflação* - Carlos Alberto Sardenberg (O Globo)

 *Em busca de mais impostos ou mais inflação*

Carlos Alberto Sardenberg

O Globo, 01/04/2023

Arcabouço depende de forte ganho de arrecadação, difícil de realizar. E, realizado, aumenta o custo Brasil

O novo arcabouço fiscal só funciona, mantendo as contas públicas em razoável equilíbrio, na ocorrência de três situações:

1) expressivo ganho de arrecadação do governo federal;

2) forte crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) ou;

3) alta inflação.

O ajuste proposto se baseia no ganho de arrecadação. O corte de despesa só ocorre, quer dizer, só seria necessário em circunstância difícil de acontecer. Na verdade, o programa como que protege o crescimento da despesa, chegando mesmo a estabelecer uma expansão mínima de 0,6% em termos reais. Também fixa uma meta de investimentos, corrigida anualmente pela inflação.

Sim, sabemos que o governo tem mesmo de gastar, especialmente nos programas sociais. Sim, investimentos geram crescimento, emprego e renda. E, finalmente, não há como cortar radicalmente a despesa. Os gastos obrigatórios (Previdência, salários do funcionalismo, programas sociais, educação e saúde) consomem cerca de 95% da receita. Tudo isso subirá com o aumento real do salário-mínimo e o reajuste do funcionalismo. Sem contar as diversas promessas de campanha. Isso posto, também é preciso admitir: qualquer que seja a boa intenção, chame-se a coisa de gasto ou investimento, o governo precisa colocar dinheiro. E de onde vem?

Da arrecadação, óbvio. Não por acaso, o ministro Haddad, ao apresentar o programa, acentuou esse ponto. Assegurou que não criará novos impostos nem aumentará alíquotas, mesmo assim sugeriu que pode obter logo um ganho de R$ 150 bilhões. Quem pagará isso? O ministro responde: quem deveria e não está pagando impostos. Diversos setores econômicos recebem incentivos fiscais, são autorizados por lei a não pagar ou a recolher menos impostos, taxas e contribuições. Exemplo maior: as empresas instaladas na Zona Franca de Manaus. Mas há muito mais. O obstáculo está exatamente aí: são setores protegidos por lei, logo devem ser desprotegidos por novas leis aprovadas no Congresso. E lá o governo enfrentará os mesmos lobbies que conseguiram as vantagens. Não será fácil. Também não recolhem impostos as grandes empresas da área de tecnologia. A pessoa compra uma roupa num site chinês — ou de qualquer outra origem — e recebe em casa a mercadoria produzida noutro país, por empresa sediada em algum paraíso fiscal. Há uma discussão no mundo todo sobre como taxar esses negócios via “big techs”. Está difícil. Sempre haverá um país disposto a oferecer incentivo para receber a sede fiscal e a base operacional desses gigantes corporativos. Proibir que essas empresas façam negócios por aqui? Só prejudicaria os consumidores, além, claro, de o país não recolher um centavo de impostos. Aliás, perde aquele que se recolhe nas atividades paralelas.

Eis o ponto: o arcabouço fiscal depende de forte ganho de arrecadação, difícil de realizar. E, realizado, aumenta o custo Brasil para empresas e cidadãos. Uma forte expansão do PIB resolve isso automaticamente. Mais crescimento e renda, mais receitas para o governo. Problema: as projeções mostram expansão pífia para os próximos anos, em torno de 1%. Dirão: se o governo gastar mais e estimular a economia, o PIB responde. Mas, para isso, o governo precisa recolher todo aquele dinheiro. Difícil, de novo. A reforma tributária pode melhorar o ambiente de negócios — e, pois, estimular investimentos privados —, mas no médio prazo, para além do atual governo. E precisaria ser votada no Congresso.

Resta a inflação, sim, a própria. Inflação eleva o PIB nominal, logo aumenta a arrecadação. Além disso, a moeda desvalorizada diminui o valor real das despesas do governo, de modo que a mágica se completa: mais receita, mais espaço para gastar. Já aconteceu e sabemos como termina: inflação saindo do controle e corroendo a renda das famílias. Será que deixarão acontecer novamente? Por isso a bronca com o Banco Central? Suspeitas, claro, mas não despropositadas. Os obstáculos são reais.

oglobo.globo.com/opiniao/carlos-alberto-sardenberg/coluna/2023/04/em-busca-de-mais-impostos-ou-mais-inflacao.ghtml 

quarta-feira, 15 de junho de 2022

Deterioração da situação fiscal aponta para aumento de juros e mais inflação em 2023

 O Brasil é um asilo de lunáticos onde os pacientes assumiram o controle (Paulo Francis)

Prezados Senhores

Com uma previsão orçamentária da ordem de R$ 320,1 bilhões em renúncias fiscais para 2022, Bolsonaro abre mais um buraco da ordem de R$ 110,0 bilhões em renúncias fiscais, sem fontes de recursos definidos que, como sempre, serão cortadas das pastas da Tecnologia, Saúde e Educação.

Rogo a Deus que Bolsonaro seja reeleito para que, em seis meses do seu novo governo seja expulso do poder, juntamente com o seu bando refece de demônios, da mesma forma como ocorreu com Dilma. Por isso, e somente por isso, o Centrão sabendo que não haverá mais o que sugar de Bolsonaro já prepara a vice de Bolsonaro (Tereza Cristina).  

Ricardo Bergamini


 

 

Governo abre mão de R$110 bi de arrecadação em 2022 e analistas veem risco a próximo governo 

 

Por Bernardo Caram

ISTOÉ DINHEIRO, 15/06/22 

 

BRASÍLIA (Reuters) – A implementação de uma série de medidas que envolvem cortes de tributação significará uma perda de receita de ao menos 110 bilhões de reais aos cofres federais em 2022, com a maior parte das iniciativas adotadas neste ano eleitoral sob justificativa de que ações emergenciais são necessárias para reduzir a inflação.

 

Especialistas alertam, no entanto, que o movimento do governo embute riscos fiscais que geram pressões inflacionárias a médio prazo. A reversão de medidas temporárias a partir de janeiro de 2023 também empurra parte da inflação para o próximo governo. É esperado ainda que mesmo este ano os cortes de tributos não sejam repassados integralmente ao consumidor.

 

O levantamento das perdas reúne as medidas implementadas nos últimos meses e listadas pelo Tesouro Nacional por gerarem renúncia de receita. Inclui também o pacote anunciado e articulado pelo governo para baixar preços de combustíveis, que ainda depende de aprovação do Congresso e representa o maior custo estimado, num total de 64,8 bilhões de reais apenas para a União este ano –a maior parte das ações vale apenas até dezembro. 

 

O ex-secretário do Tesouro Nacional Jeferson Bittencourt, que deixou o cargo no ano passado após o governo sinalizar que driblaria o teto de gastos para reforçar programas sociais, afirma que a maior preocupação é com o efeito que será produzido pelas medidas em 2023, quando mais da metade dessas renúncias terá perdido a validade.

 

“Vamos ter o seguinte dilema no ano que vem: ou teremos uma inflação maior do que o projetado para 2023 (com a reversão dos cortes de tributo) ou teremos um fiscal pior do que o projetado para manter desonerações”, disse Bittencourt, que é economista da ASA Investments. 

 

Ele estima que 0,9 ponto percentual de inflação será empurrado deste ano para 2023 por conta das medidas.

 

O governo federal já havia zerado alíquotas de PIS/Cofins sobre diesel e gás de cozinha até dezembro, a um custo de 14,9 bilhões de reais. Agora, por mais 17 bilhões de reais, decidiu zerar também tributos sobre a gasolina, medida que era criticada pela equipe econômica por beneficiar famílias de classes média e alta.

 

O relator da proposta do Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), ainda incluiu no texto uma isenção sobre etanol e álcool anidro (usado na mistura da gasolina) até 2027, ao custo de 3,3 bilhões de reais neste ano.

 

O pacote, que está em análise pelos parlamentares e ainda pode ser alterado, vai além ao definir, em outra medida, um repasse de até 29,6 bilhões de reais da União aos governos regionais que aceitarem zerar cobranças de ICMS sobre diesel e gás de cozinha até dezembro deste ano. O pagamento será feito por fora da regra do teto de gastos, que opera no limite.

 

Com o novo cenário, Bittencourt acredita que cresce a pressão para que o Banco Central, que está agora inteiramente focado na inflação de 2023,mantenha a taxa básica de juros elevada por mais tempo, considerando os efeitos inflacionários a médio prazo.

 

“Claro que se a gente joga uma inflação imprevista de 2022 para 2023, com todos os custos de inércia, o Banco Central vai ter que começar a se preocupar e colocar isso na mesa para tomar suas decisões”, afirmou.

 

O BC vem implementando um agressivo ciclo de aperto monetário na tentativa de domar a inflação, que está acima de dois dígitos. Nesta quarta-feira, a diretoria da autarquia se reúne para definir o patamar da Selic e sinalizar passos futuros.

 

Na lista de medidas com maior perda de arrecadação para a União está ainda o corte permanente, já em vigor, de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em 35%, com renúncia de 23,4 bilhões neste ano.

 

Outra iniciativa tratada como emergencial pelo governo para segurar a inflação foi o corte linear das tarifas de importação, reduzidas em 20% de maneira unilateral pelo Brasil, sem o aval dos membros do Mercosul. Com ela, o Tesouro estima que deixará de arrecadar 6 bilhões de reais em Imposto de Importação neste ano.

 

A economista da XP Tatiana Nogueira afirma que o governo deve conseguir um efeito de baixa da inflação neste ano, mas que o movimento pode se inverter em 2023 após a retomada da cobrança de tributos reduzidos temporariamente.

 

“Você resolve um problema em 2022, mas encomenda um problema maior em 2023“, disse. ”Além disso, em um segundo momento, aumenta o risco fiscal”, acrescentou, ressaltando que grande parte da recente alta da arrecadação foi motivada por questões conjunturais como a inflação e a disparada de preços de commodities.

 

Na última semana, avaliação feita pela agência de classificação de risco Moody’s após os anúncios do governo sobre combustíveis apontou que a aprovação do pacote dos combustíveis com pagamentos fora do teto seria negativa para o crédito do Brasil.

 

“Controlar os gastos para cumprir o teto ajudou o governo a desenvolver força fiscal: exceções diminuem sua capacidade de controlar os gastos e preservar a credibilidade fiscal, especialmente antes das eleições de outubro”, disse.

 

Segundo Nogueira, da XP, a expectativa é que mesmo neste ano, o corte de tributos chegue ao consumidor final apenas parcialmente, com uma fatia das reduções sendo internalizada pelas cadeias do mercado. No caso de combustíveis, a XP estima que o repasse ficará entre 60% e 80%.

 

Em um exemplo dessa dificuldade, a Associação Brasileira de Supermercados (Abras) mencionou na semana passada que o corte de Imposto de Importação de alimentos pelo governo com o objetivo de baixar preços não será sentido de imediato pelo consumidor.

 

Nogueira ressalta que no caso dos combustíveis há ainda o fator adicional da defasagem nos preços em relação ao mercado internacional. Dados de segunda-feira da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom) apontam defasagem de 17% na gasolina e 16% no diesel. Eventual reajuste de preços pela Petrobras poderia anular efeitos do corte de tributos.

 

DISTORÇÕES

 

Relatório publicado pelo Santander na quinta-feira afirma que as medidas de desoneração para conter preços de bens e serviços podem distorcer tendências inflacionárias. O banco espera que as iniciativas reduzam a inflação deste ano em 1,4 ponto a 3,1 pontos percentuais, mas já vê uma pressão de alta do IPCA em 0,6 ponto em 2023.

 

Procurado, o Ministério da Economia não respondeu. A equipe econômica tem argumentado que o governo está registrando recordes de arrecadação e que os excessos de receita são em parte estruturais, podendo ser convertidos em corte de tributação, justificando também que o cenário atípico com resquícios da pandemia e a guerra na Ucrânia exige medidas emergenciais.

 

Para este ano o governo também contabiliza renúncias não relacionadas a situações emergenciais e que têm cifras menores de impacto. Entre elas, estão a renovação da desoneração da folha salarial para setores da economia (9 bilhões de reais), o regime especial de tributação para clubes de futebol (2,3 bilhões de reais) e a prorrogação de benefício tributário para a compra de veículos por pessoa com deficiência (1,3 bilhão de reais).

 

O número do levantamento não considera o custo que será arcado por Estados e municípios com o projeto que estabelece um teto permanente de 17% para a cobrança de ICMS sobre combustíveis, energia, comunicação e transporte coletivo. A Consultoria de Orçamentos do Senado estimou que esse impacto deve ficar em até 26,8 bilhões de reais para os entes apenas em 2022.

 

(Por Bernardo Caram; edição de Isabel Versiani)

 

sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

Erdogan, o sultão está nu, dizem seus opositores - Anthony Faiola (The Washington Post)

Um antigo correspondente na América Latina se ataca a um típico ditador latino-americano, com a peculiaridade dele ser turco...

The Washington Post
Today's WorldView
Presented by Goldman Sachs
 
 

sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Microhistória do Brasil nos últimos 60 anos - Paulo Roberto de Almeida

 Microhistória do Brasil nos últimos 60 anos

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com; pralmeida@me.com)

 

 

Vou resumir, num único parágrafo nossa história das três últimas gerações.

Sou de uma geração que assistiu a tudo: o descontrole inflacionário do final dos anos 1950 e início dos 60, a estabilização estatista dos anos militares, o descontrole inflacionário e o endividamento do final da ditadura, as hiperinflações e os planos frustrados de estabilização da redemocratização (1986-1992), uma razoável estabilização macroeconômica com o Plano Real (1994), mas meia boca, pois que baseado em âncora cambial insustentável e ausência de ajuste fiscal rigoroso, um "conserto" em 1999, que criou um tripé macroeconômico razoável, a ser complementado por reformas estruturais de segunda geração que NUNCA foram feitas – o lulopetismo econômico surfou sobre a demanda chinesa e a valorização das commodities –, seguido de uma rápida deterioração da conjuntura econômica sob a incompetente da Dilma, que provocou a MAIOR RECESSÃO econômica de nossa história, uma nova tentativa de correção sob Temer, mas sabotada pelas turbulências políticas derivadas da corrupção e do ativismo judicial, para chegarmos, enfim, a um governo que prometia tudo – luta contra a corrupção, abertura econômica e liberalização comercial, nova política – e não entregou NADA, ao contrário, só agravou TUDO, corrupção, desmandos, desgoverno, graves violações da institucionalidade, com um psicopata genocida no comando do Executivo, militares castrados a seu serviço e um estamento político adepto do patrimonialismo gangsterista. 

Acho que resumi nossa história pelo lado menos glorioso.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4011, 5 novembro 2021, x p.

 

 

domingo, 29 de agosto de 2021

Aprendendo com a História - Affonso Celso Pastore (OESP)

 

01:51:52 | 29/08/2021 | Economia | O Estado de S. Paulo | Affonso Celso Pastore | BR

Affonso Celso Pastore

    AFFONSO CELSO PASTORE

    Aprendendo com a história

    Muitos desprezam a história, preferindo o conforto dos modelos matemáticos.

    Respeito ambos, mas dou um grande peso à história.

    No regime de Bretton Woods, os EUA fixavam o preço do ouro em US$ 35 por onça-troy, e os demais países mantinham o câmbio fixo em relação ao dólar. Há cinquenta anos, precisamente em 15 de agosto de 1971, o presidente Nixon fechou a "gold window", que permitia aos signatários daquele acordo converterem as suas reservas em ouro àquele preço. Era o "início do fim" daquele regime monetário, que só foi formalmente extinto em 1973.

    Naqueles anos, tanto quanto agora, a política monetária do Fed era voltada exclusivamente aos objetivos domésticos.

    "O dólar é a nossa moeda, mas o vosso problema", como disse o secretário John Connally. Para financiar a guerra do Vietnã e manter o pleno emprego, o Fed expandia a oferta de moeda que, devido ao câmbio fixo, elevava a oferta mundial de moeda e gerava uma inflação mundial. A atividade bancária era estimulada, florescendo o mercado de euro-dólares, que ainda continuou crescendo depois de 1973, dado que os países não abandonaram de imediato o câmbio fixo.

    Quando em 1976 ocorreu o segundo choque do petróleo, aumentando o valor das suas importações, o governo Geisel teve a ilusão de que poderia usar a crise como uma oportunidade de crescimento. Lançou o II PND através do qual financiou com empréstimos externos os investimentos na produção de bens de capital e de insumos básicos. Era suposto que a substituição de importações geraria uma economia de dólares que permitiria pagar o aumento na conta do petróleo, com o benefício do crescimento econômico.

    Os industriais aplaudiram a clarividência do presidente e se auto-enganavam, acreditando que entrávamos em um mundo novo, no qual a abundância de empréstimos baratos era uma consequência da reciclagem dos petrodólares, e não da política monetária expansionista do Fed, que teria de terminar.

    Geramos uma dívida externa de 50% do PIB, que nos levou à crise da dívida externa dos anos oitenta. Durante o II PND, o Brasil cresceu a 7,5% ao ano, porém à custa de nos jogar na armadilha do baixo crescimento, da qual não mais nos livramos.

    Não sei se este episódio ainda é estudado nos cursos de Economia, nem se são feitas comparações com o mundo atual. Mas os alunos deveriam ser advertidos de que, apesar das muitas transformações institucionais, ainda temos uma relíquia do passado, que é o "privilégio exorbitante" dos EUA â o benefício de ter a sua própria moeda usada como a moeda reserva internacional.

    É o único país que, diante de um déficit nas contas correntes, não tem de se preocupar com seu financiamento.

    Paga com sua própria moeda e influencia as políticas monetárias de todos os demais.

    Um exemplo são os efeitos da expansão monetária motivada pela crise da covid sobre as taxas de câmbio dos países livres de graves problemas fiscais e políticos. Quando irrompeu a pandemia, a taxa dos "fed funds" foi colocada no zero técnico, e foram comprados em torno de US$ 2 trilhões de treasuries.

    A consequência dessa maciça expansão monetária foi um enfraquecimento de 10% do dólar em relação a uma cesta de moedas que inclui euro, libra, iene, dólar canadense, dólar australiano, coroa sueca e franco suíço â o DXY. Não foram apenas estas 7 moedas que se valorizaram, e sim a quase totalidade das demais. O mundo agradeceu aos EUA. Afinal, aquela recessão exigia queda acentuada das taxas de juros, que foi facilitada pelo efeito desinflacionário vindo do fortalecimento de suas moedas.

    Estímulo monetário nos EUA leva a um estímulo monetário mundial, mas a recíproca também é verdadeira.

    inflação vem se elevando, mas ainda não vi preocupações. O "average inflation targeting" dá um enorme conforto; a transição demográfica derrubou as taxas neutras no mundo; e a culpa de uma inflação acima de 5% nos EUA não é atribuída ao exagero dos estímulos, mas a choques de oferta. Da mesma forma, a sensível elevação dos "price earnings ratios" no S&P500 não é atribuída à queda excessiva da taxa de desconto, e sim ao vigor da economia norte-americana.

    Por que nos preocuparmos com uma mudança quando o próprio Fed está seguro de que pode tolerar uma inflação mais alta? Gostaria de ter essa frieza. Mas o respeito à história e às lições que ela nos oferece me impedem de tê-la. Já vi muitas esperanças serem destruídas por fatos que muitos julgavam irrelevantes, e que preocuparam apenas uns poucos.

    EX-PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL E SÓCIO DA A.C. PASTORE & ASSOCIADOS.

    ESCREVE QUINZENALMENTE