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sábado, 9 de julho de 2022

O insustentável aumento do endividamento público no Brasil - Marcelo Guterman (OESP)

 O Brasil está se suicidando lentamente, com a ativa colaboração da sua classe política e uma conivência inacreditável das elites econômicas.

Paulo Roberto de Almeida 

Marcelo Guterman

O Estado de S. Paulo, 9/07/2022

Quando taxa de título público alcança o status de manchete principal de jornal não especializado em finanças, é que a coisa já passou do ponto faz tempo.

Para quem labuta no mercado financeiro, isso não é novidade. Venho falando do problema do financiamento da dívida pública há já algum tempo. É que essas coisas funcionam como a história do sapo na panela. Pra quem não conhece: para matar um sapo, não adianta colocá-lo em uma frigideira. O sapo sente a mudança de temperatura imediatamente e pula fora da panela. Mas se você colocar o sapo em uma panela em banho maria em fogo baixo, a temperatura vai aumentando aos poucos. O sapo vai se acostumando com as novas temperaturas até que chega em um determinado momento em que morre cozido sem reação. É o que podemos constatar no gráfico abaixo, que mostra a evolução da taxa real de juros dos títulos brasileiros mais longos: a taxa vai subindo, subindo, e vamos nos acostumando aos novos níveis, até que chegará um momento em que o sapo vai morrer, ou seja, faltará quem queira continuar a financiar a dívida a prazos longos, qualquer que seja a taxa. A manchete do Estadão é só um sinal de que o sapo está incomodado com a situação.

Apenas para ter uma ideia da situação: estamos hoje pagando 6% ao ano além da inflação para financiar nossa dívida em prazos mais longos. Considerando que nossa relação dívida/PIB é de 80%, a dívida nos custa quase 5% do PIB todo ano para ser rolada, além da inflação. Considerando um crescimento do PIB de 2% ao ano em termos reais, precisaríamos de um superávit primário de 3% ao ano somente para manter a relação dívida/PIB estável.

Como comparação, os títulos americanos pagam 1% acima da inflação. Com uma relação dívida/PIB de 130%, o custo de carregamento da dívida é de 1,3% do PIB. No Chile, os títulos pagam 3% acima da inflação. Com uma relação dívida/PIB de 35%, o carregamento da dívida custa aos chilenos cerca de 1% do PIB. Ou seja, se Estados Unidos e Chile crescerem 2% ao ano, sua relação dívida/PIB fica estável mesmo que façam déficits de 1% do PIB.

E por que chegamos neste ponto? Porque a regra do teto de gastos, que foi feita justamente para garantir que a dívida pública não entre em trajetória explosiva ao longo do tempo, foi, na prática, destruída por este governo, abrindo caminho para que o próximo também ignore qualquer regra de disciplina fiscal. Bastou a produção de um superávit primário no ano passado, em grande parte por conta da surpresa inflacionária, para que políticos de todas as cores achassem que já poderiam soltar o cinto, gastando o “dinheiro que sobrou”. O problema é que não sobrou nada, na verdade está faltando muito para controlar o crescimento da dívida pública. O resultado é taxa de juros mais alta, mais despesa financeira, menor crescimento econômico e maior dificuldade para trazer a inflação a níveis civilizados.

Muitos acusam essa visão de ser “financista”, de não olhar para as necessidades dos mais pobres. Não é verdade. Essa visão se preocupa não somente com os pobres de hoje, mas com todos os pobres do futuro. Se existe o nível de pobreza que vemos hoje, é porque, no passado, os que têm visão humanitária, não “financista”, não se preocuparam com os pobres do futuro. Na verdade, os grandes responsáveis pela pobreza de amanhã são justamente os que se dizem muito preocupados com os pobres de hoje. Com suas políticas imediatistas, estão fabricando a pobreza do amanhã. “Pobres, sempre os tereis”, diz Jesus em uma passagem. Aqui no Brasil, isso soa como uma profecia.


quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Juros elevados: Ricardo Bergamini sempre indignado

Todas as mudanças no Brasil são promovidas para que tudo permaneça no mesmo lugar (Ricardo Bergamini).

Prezados Senhores

Fico pasmo como pode uma nação viver com uma aberração econômica dessa magnitude, sem manifestar um mínimo de indignação. Como se fosse uma situação normal.

Em outubro de 2019 a taxa SELIC divulgada pelo Banco Central era de 5,0% ao ano, e ninguém consegue explicar o motivo pelo qual a taxa média de mercado do crédito livre no mês de outubro de 2019 estava em 35,9% ao ano, ou seja: 7,18 vezes maiores. Ficando a impressão de que os bancos são os ladrões dessa fortuna, quando na verdade é o próprio governo. Vejam explicação didática abaixo:


A aberração do depósito compulsório no Brasil

Ricardo Bergamini

Premissas básicas com base na média do ano de 2018:

1 – Custo médio de carregamento da dívida interna da União: 9,37% ao ano (Fonte: STN)

2 – Percentual do depósito compulsório total (remunerado e sem remuneração): 74,63% (Fonte BCB).

A - Se um banco tivesse a quantia de 100 dinheiros disponíveis para aplicação ele teria duas opções:

A.1 - Comprar títulos do governo federal, nesse caso seria isento do depósito compulsório e receberia no final de um ano 9,37% de 100 dinheiros, ou seja: 9,37 dinheiros.

A.2 - Emprestar ao público (empresas e famílias), nesse caso o banco teria que recolher ao Banco Central 74,63% dos 100 dinheiros disponíveis, ou seja: 74,63 dinheiros, ficando com apenas 25,37 dinheiros para emprestar.

Para obter o mesmo ganho que teria na aplicação de títulos públicos de 9,37 dinheiros no ano, o banco teria que empresta os 25,37 dinheiros restantes a uma taxa correspondente a 3,9417 maiores do que a taxa de aplicação nos títulos públicos de 9,37% ao ano, nesse caso seria a uma taxa de 36,93% ao ano.

Resumo do exemplo hipotético: 

I - Aplicação em títulos federais - 100 dinheiros a 9,37% ao ano daria um rendimento de 9,37 dinheiros em um ano.

II – Aplicação de 25,37 dinheiros a uma taxa de 36,93% ao ano daria um rendimento de 9,37 dinheiros em um ano.

Spread Bancário

É composto das seguintes despesas: administrativa, inadimplência, custo com depósito compulsório sem remuneração, tributos, impostos, taxas e lucro.

O percentual varia em função de cada tipo de operação, bem como de banco para banco.

Nota: Cabe lembrar que, como na nossa análise não consideramos que alguns depósitos compulsórios são remunerados, é óbvio que há uma pequena divergência entre a taxa apurada no estudo (36,93% ao ano) e a taxa média oficial apurada pelo Banco Central para os créditos livres que foi de 35,60% ao ano em 2018.

Ricardo Bergamini

segunda-feira, 31 de julho de 2017

Quer reduzir os juros? Baixe os gastos publicos - Rodrigo Constantino


Um blog de um liberal sem medo de polêmica ou da patrulha da esquerda “politicamente correta”.

31 de julho de 2017
http://constantino-static.gazetadopovo.com.br/assets/2017/07/gasto-publico.jpg

Em sua coluna de hoje no GLOBO, o economista Paulo Guedes explica de forma resumida qual foi o maior dos erros desde a redemocratização no final da década de 1980, e que não deixa partido algum de fora (apesar de ser injusto colocar os tucanos no mesmo saco dos petistas, como veremos). O grande vilão, sem dúvida, foi a expansão dos gastos públicos:
Um erro fundamental da social-democracia em suas mais de três décadas governando o país foi a ininterrupta expansão dos gastos públicos sob todas as formas, dos meritórios programas sociais de transferência de renda inerentes a uma democracia emergente aos reprováveis subsídios a grandes empresas agora configurados como práticas de um capitalismo de quadrilhas.
[…] Essa incapacidade de controlar gastos e de promover reformas trouxe como subproduto uma tragédia de dimensões épicas: os esforços de estabilização sem apoio da política fiscal elevaram as taxas de juros por décadas, causando um endividamento interno em bola de neve. As enormes despesas anuais com os juros da dívida são impressões digitais de políticas de estabilização pouco competentes, sempre conduzidas por apertos monetários em ações isoladas do Banco Central.
[…] Teríamos hoje centenas de bilhões de reais para aplicar anualmente em programas de saúde, educação e segurança pública, em vez dessa roubalheira a céu aberto, um verdadeiro ninho de ratos em que se transformou o aparelho de Estado sob a condução de uma despreparada “vanguarda do atraso” pela “esquerda”, e seus oportunistas aliados “conservadores” comprados à “direita”. Os arquitetos de nossa governabilidade revelam-se agora incompetentes uns, malfeitores outros, e as duas coisas alguns. Chegam a ser comoventes a compreensão de FHC pelos infortúnios de Lula, a impensável aproximação política de Lula a Maluf e Collor e o voluntarioso afeto de Sarney por todos eles.
Quando ainda estudava Economia na PUC, lembro de uma palestra com Paulo Guedes em que ele condenava exatamente isso com uma boa analogia: Gustavo Franco, então presidente do Banco Central, era como o Napoleão que sozinho invadiu a Rússia, e aguardava a chegada da tropa em seu auxílio. Mas ela não veio.
Ou seja, jogou a taxa de juros para cima para conter a inflação, mas era crucial que a redução dos gastos públicos ocorresse em seguida. Não veio a ajuda do lado fiscal. O inverno chegou, a o bravo soldado se viu isolado, incapaz de derrotar os inimigos.
Enfrentar a inflação somente com os juros é como tentar matar uma formiga com uma bazuca: o efeito colateral será inevitável e catastrófico. A melhor ferramenta para conter a inflação é a redução das despesas do governo, as reformas estruturais que apontem nessa direção lá na frente, e o controle imediato, com teto de gastos e tudo mais.
É verdade que o PSDB aprovou a Lei de Responsabilidade Fiscal, mas na prática se mostrou perdulário também, gastador, imbuído de sua mentalidade social-democrata esquerdista. Pode não ter sido irresponsável como o PT, mas passou longe do modelo liberal que demandava um corte sério na gastança estatal. Ao menos deu autonomia ao BC para usar a bazuca…
Quando o governo insiste nessa política fiscal expansionista, só resta a política monetária (alta de juros) para segurar a inflação. O PT resolveu abandoná-la, e Dilma reduziu na marra as taxas de juros, sob os aplausos de Ciro Gomes e muitos empresários, como Benjamin Steinbruch. “Deu ruim”, como os liberais anteciparam (inclusive este que vos escreve). A inflação saiu de controle, como esperado.
Mas no Brasil aprendemos que poucos aprendem com a história. E vemos os potenciais candidatos insistindo na mesma receita furada, condenando o termômetro pela febre, culpando os altos juros pelos problemas, como se o rabo balançasse o cachorro, e não o contrário. Até mesmo a opção mais à direita, aquela com viés nacionalista, repete as mesmas ladainhas, como fica claro nessa entrevista com Jair Bolsonaro no Valor hoje:
http://constantino-static.gazetadopovo.com.br/assets/2017/07/bolsonaro-economista.jpg
Essa besteira parece dita por Dilma ou Ciro Gomes, mas foi dita por Bolsonaro, que nada entende de economia (e não foi por falta de esforço da minha parte, que cheguei a enviar de presente a ele meu curso online “Bases da Economia“, que explica direitinho as causas da inflação e evitaria esse tipo de vergonha alheia caso ele tivesse visto).
Também acho que a segurança é a prioridade num país com 60 mil assassinatos por ano, apesar de entender que a economia vem logo atrás, num país com 15 milhões de desempregados. Mas fica claro por que a turma do “mito” repete que economia não tem tanta relevância assim: é o maior calcanhar de Aquiles do homem. Sair da social-democracia para o nacionalismo dirigista não é o que precisamos.
Falta no Brasil alguma liderança que seja capaz de mesclar a determinação de combater a criminalidade e o socialismo na cultura com o conhecimento básico da economia e do liberalismo. Essa figura ainda não surgiu no horizonte político. Ainda dependemos de nomes que se mostram incapazes de compreender a importância do resgate de valores morais para a sociedade e a urgência em abandonar a política de inchaço e voluntarismo estatal, responsável pela calamidade em que vivemos hoje.
Querem saber o que permitiria a redução sustentável das taxas de juros, mais recursos para investimentos em áreas cruciais como segurança e justiça, menores impostos e ao mesmo tempo a redução da corrupção? Uma queda drástica dos gastos públicos, com fim de subsídios e assistencialismo, privatizações, abertura comercial etc. Ou seja, o liberalismo econômico, que, ao lado de um conservadorismo nos costumes, seria a melhor solução para os males que assolam nosso país hoje.
Liberais clássicos e conservadores de boa estirpe seguem na busca por uma liderança que compreenda isso.
Rodrigo Constantino, para o Instituto Liberal

terça-feira, 10 de junho de 2014

Consumidor paga juro de 100pc ao ano: presidenciaveis alheios a usura


Consumidor já paga juro médio de 100.76% ao ano, mas presidenciáveis não ligam para a usura
Por Jorge Serrão - serrao@alertatotal.net

Dá para sobreviver bem e produzir tranquilamente em um Brasil com juros médios de 100,76% ao ano para os consumidores? A complicada resposta é o grande tema que tende a ficar de fora do debate eleitoral deste ano sem graça de 2014. Nem a perdida Dilma Rousseff e muito menos seus adversários Aécio Neves (o social-democrata) e Eduardo Campos (o socialista) vão tocar na delicada submissão do capimunismo brasileiro ao lucrativo poder da usura bancária.

Azar do cidadão-eleitor-contribuinte. Além de juros altos, que complicam a vida quem se vê obrigado a fazer dívidas, o brasileiro continuará pagando impostos escorchantes para sustentar o desperdício e a corrupção da máquina pública, os gastos crescentes com as bolsas-votos (fabricantes de vagabundos morais) e o permanente aumento da impagável dívida pública da União, Estados e municípios. A agiotagem compulsória e a improdutividade sistêmica tendem a passar longe do debate eleitoral no País sob governança do crime organizado.

No Brasil, realmente, tudo parece que está além de 100%... A começar pelos juros estratosféricos… levantamento da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac) confirma que o brasileiro convive com o inferno da usura oficial. No cartão de crédito, o juro anual chega a 232,12%. O cheque especial tem usura anual de 158,04%. O empréstimo pessoal oferecido por financeiras atinge absurdos 132,65%. O mesmo esquema dos bancos esfola o correntista em 49,54%.

É fácil entender por que muitos estão devolvendo os carros que compram em infindáveis prestações. Os juros anuais do crédito direto ao consumidor (CDC) para compra de veículos subiu de 23,58% em abril para 23,87% em maio. A situação também é complicada para quem não tem grana para pagar á vista nas compras comuns. As taxas de juros cobradas no comércio para aquisições a prazo atingem 71,94% ao ano. Fora os juros altíssimos, o consumidor ainda tem de arcar com taxas maquiadas na hora de liberar o financiamento.

Os indicadores tornam ainda mais irresponsável o discurso do mito Luiz Inácio Lula da Silva – que deu uma comida de rabo pública no Secretário do Tesouro Nacional, cobrando que a equipe econômica da sua companheiro Dilma Rousseff libere mais dinheiro para o crédito, incentivando o consumo e, por extensão, permitindo mais felicidade ao eleitor que anda PT da vida com o governo.

Lula, que já está com o boi na sombra, como um dos políticos mais ricos do mundo, não tem problemas de crédito, pois tem dinheiro suficiente para comprar o que quiser à vista. Mas o brasileiro comum – inclusive aqueles que o endeusam – são obrigados a pagar os juros mais altos do planeta, para que os bancos continuem batendo recordes de lucros, enquanto refinanciam a falência estrutural do Estado tupiniquim.

Além da usura

O estudo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças verificou que bancos e financeiras têm elevado suas taxas em ritmo mais acelerado que o do crescimento da taxa Selic.

Enquanto o Comitê de Política Monetária (CPOM) do Banco Central do Brasil subiu os juros básicos em 3,75 pontos percentuais entre março de 2013 e maio deste ano, para 11%, a taxa média de juros para pessoa física cresceu 12,79 pontos percentuais no mesmo período.


O salto da usura foi de 87,97% para 100,76% ao ano – o que serve de explicação automática para o desgaste da imagem do governo junto à classe média.

terça-feira, 30 de julho de 2013

O absurdo da divida publica - Pedro Feu Rosa

Nao sei se o ex-deputado e agora desembargador pretende dar calote na dívida pública, mas o fato é que ela é grande justamente devido a personagens como ele, e tudo o que representam. São esses homens que fizeram a dívida ficar grande.
Paulo Roberto de Almeida

Uma conta muito fácil de entender

“A cada dia morrem 20 crianças no Brasil, vítimas de doenças causadas pela falta de um simples esgoto ou de água tratada – isto dá uns três Airbus lotados de crianças caindo por mês”
Opinião e Notícia, 29/07/2013
O Brasil é um dos países mais ricos do mundo – eis aí um fato. No entanto, convivemos com níveis de miséria, criminalidade e deficiência de infraestrutura absolutamente degradantes. Haveria alguma lógica nisso? Que tal tentarmos responder esta pergunta com uma simples calculadora?
Vamos começar pela fome. Segundo o IBGE divulgou em 2006, 14 milhões de brasileiros convivem com a fome, e outros 72 milhões estão perto dela. Daí a ideia do Bolsa Família. Nos últimos seis anos, esse programa distribuiu R$ 52,7 bilhões para quase 12 milhões de famílias. Enquanto isso, só em 2008, gastamos R$ 282 bilhões com juros e amortizações da dívida pública. Faça as contas: em um único ano o Brasil pagou só de juros 5,35 vezes o que distribuiu aos seus famintos durante quase seis anos!
Vamos a outros cálculos: em 2006, destinamos R$ 41 bilhões para a saúde, R$ 19,5 bilhões para a educação e R$ 3,9 bilhões para a segurança pública. Some tudo. Vai dar uns R$ 64,4 bilhões. Pois é: naquele mesmo ano pagamos só de juros da dívida pública R$ 325,8 bilhões – umas cinco vezes mais!
Se alguém ainda não entendeu, sejamos mais claros: os recursos que destinamos no orçamento de 2006 para custear a Previdência Social, a assistência social, a saúde, a educação, o trabalho, a reforma agrária, a segurança pública, o urbanismo, a habitação, os direitos da cidadania, o desporto e lazer, a cultura e até o saneamento, somados, dão uns R$ 317,9 bilhões – R$ 7,9 bilhões a menos do que pagamos só de juros naquele ano!
Vamos a um outro exemplo, talvez ainda mais chocante: a cada dia morrem 20 crianças no Brasil, vítimas de doenças causadas pela falta de um simples esgoto ou de água tratada – isto dá uns três Airbus lotados de crianças caindo por mês. Com base em custos internacionais, R$ 100 bilhões seriam suficientes para levar saneamento básico a 86 milhões de brasileiros, acabando com essa chacina mensal. Nós ainda não tivemos condições de destinar R$ 100 bilhões para isso. No entanto, entre 1995 e 2008, conseguimos R$ 1,8 trilhão só para pagar juros e amortizações da dívida pública – umas 18 vezes mais!
Essa dívida, em 1995, estava em R$ 61 bilhões. Em 2008, alcançou a assustadora soma de R$ 1,68 trilhão. Por conta disso, mais de 30% dos impostos que pagamos são gastos só no pagamento dos juros dela – desconsiderada a emissão de novos títulos para a denominada “rolagem”. Incluindo estes, não será difícil concluirmos que quase metade do esforço nacional está sendo canalizado para a manutenção desta dívida, sobre a qual pouco se fala ou se discute.
Dona Sueli
Sim, preferimos tratar de temas mais amenos, como os funerais de algum artista norte-americano ou o escandaloso divórcio de dada atriz europeia. Eis aí um quadro sério, superior a presidentes e partidos políticos, fruto da omissão de toda uma geração de homens esclarecidos e preparados.
Enquanto isso, alheia a todos estes dados, lá está Dona Sueli sofrendo dia após dia em um corredor imundo de hospital público, ao lado do marido baleado durante um assalto, desesperada diante da perspectiva de ter que sustentar seus dois filhos sozinha na brutal favela onde vivem. Dona Sueli, como de resto a maioria do povo brasileiro, nunca foi muito chegada a discussões sobre política e economia. Deveria ser. Afinal, como dizia Pitágoras, “os números governam o mundo”.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Brasil chega aos juros "normais" do capitalismo: demorou...

Ufa! Finalmente o Brasil chega aos juros que, historicamente, sempre foram os do capitalismo industrial, na média: 3,5% ao ano. Demorou um bocado e resta saber se é sustentável (a palavra da moda, mas com outro sentido).
Agora são os países capitalistas "normais" que não exibem juros normais, ou seja, de mercado. Estão anormalmente baixos, o que é uma punição ao poupador e um prêmio (indevido) ao devedor, ainda que sirva ao investidor.
Parabéns ao Banco Central, e a Alexandre Tombini em particular, por este desempenho, mas muitos acreditam, a começar por certos comentaristas internacionais que isso foi alcançado mais por razões políticas do que por real condição econômica.
Em todo caso, cabe esperar que se mantenham nesse nível.
O trabalho a ser feito, agora, está com o resto do governo, especialmente na área fiscal e de ambiente macro e microeconômico para o crescimento.
Paulo Roberto de Almeida 


SELIC

Brasil não tem mais os maiores juros do mundo

Com a nova redução da Selic o Brasil deixa de ter a maior taxa de juros reais do mundo

Opinião e Notícia, 19/04/2012
Em decisão unânime, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central reduziu nesta quarta-feira, 18, a taxa básica de juros da economia brasileira, a Selic, em 0,75 ponto percentual, confirmando a tendência de baixa que vem sendo adotada no governo Dilma Rousseff.
Com a Selic agora a 9% ao ano, os juros no Brasil estão no seu menor patamar desde março de 2010, quando eram de 8,75%. É também a menor taxa do governo Dilma.

Rússia agora tem os maiores juros

Segundo o analista internacional Jason Vieira, da Apregoa.com – Cruzeiro do Sul, e o analista de mercado Thiago Davino, da Weisul Agrícola, com a nova redução da Selic o Brasil deixa de ter a maior taxa de juros reais do mundo.
Os cálculos dos analistas apontam que, com a Selic a 9% ao ano, os juros reais do Brasil — descontando a inflação projetada para os próximos 12 meses — são hoje de 3,4%. O primeiro posto, segundo eles, agora é da Rússia, que tem juros reais de 4,2%.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Como baixar os juros no Brasil: uma solucao inovadora...(na Espanha)

Não sei se daria certo no Brasil, mas quem sabe o governo dos companheiros não organiza as companheiras -- que eles chamam de "trabalhadoras do sexo", dispondo inclusive de um código e de cadastro no MTb -- para fazer a mesma coisa no Brasil?
Será que os nossos banqueiros -- privados e estatais -- vão ser obrigados a baixar os juros por essa via?
Nunca se perde nada por tentar...
Paulo Roberto de Almeida 

COM CRISE, PROSTITUTAS DE LUXO SE RECUSAM A FAZER SEXO COM BANQUEIROS

GAROTAS DE PROGRAMA DE MADRI DIZEM QUE “GREVE” SÓ ACABARÁ QUANDO INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS OFERECEREM LINHAS DE CRÉDITO MAIORES PARA FAMÍLIAS CARENTES E EMPRESAS

Madri Madrid Espanha (Foto: Shutterstock)
Prostitutas de luxo de Madri estão decretando greve de sexo aos seus clientes banqueiros, reportou nesta terça-feira (27/03) o tablóide britânico Daily Mail. Elas pedem para que os funcionários das instituições financeiras abram linhas de crédito para oferecer a famílias carentes e empresas à beira da falência.
A Espanha enfrenta atualmente uma de suas piores crises econômicas, com as taxas de desemprego atingindo 23%. Com as incertezas sobre o mercado de trabalho e pouco dinheiro circulando no país, os bancos diminuem a oferta de crédito a seus clientes.
Nós somos as únicas com capacidade real de pressionar o setor
PROSTITUTA
As garotas de programa dizem que a paralisação continuará até que os banqueiros “cumpram suas responsabilidades sociais” e comecem a oferecer empréstimos maiores à população. “Nós somos as únicas com capacidade real de pressionar o setor”, disse a principal associação de prostituição do país.
Segundo o tablóide, os banqueiros têm tentado contornar o protesto, dizendo que são arquitetos ou engenheiros às prostitutas, mas a tentativa não tem funcionado. Os executivos dos bancos até já acionaram o governo para tentar mediar o assunto.
Para a prostituta conhecida como AnaMG, a paralisação não deve durar muito. “Estamos em greve há três dias e eu não acho que eles agüentem mais tempo”, disse. Ela conta que a ideia veio de Lucia, uma das mulheres da associação, que disse que só faria sexo com o funcionário de um banco se ele concedesse um empréstimo a um conhecido.
A greve de sexo das prostitutas de Madri vem em um momento em que toda a Espanha se prepara para iniciar uma greve geral, marcada para esta quinta-feira. Os trabalhadores protestam contra o elevado grau de desemprego no país e pedem mudanças nas leis trabalhistas – que tornam mais barato para as empresas despedirem seus empregados.

sexta-feira, 2 de março de 2012

"Brasil declara guerra cambial" - Contra si mesmo???

Curiosas essas matérias de imprensa, e curiosos esses jornalistas, que acham que o Brasil vai começar, e ganhar, uma "guerra cambial", ou seja lá o que isso queira significar...
Quem fala em "guerra cambial" -- um termo absolutamente inapropriado e totalmente equivocado -- é o próprio governo, que distraído, parte em guerra contra ele mesmo...
Pois é, o governo provoca a valorização do real, ao manter juros estratosféricos (que mesmo a 10% são o triplo, ou o quádruplo da média mundial), e depois diz que vai lutar contra a "guerra cambial", como se esta nos fosse imposta por americanos -- que despejam, isso é certo, dólares no mundo -- e por chineses -- que espertamente colam sua moeda à divisa americana para não perder partes de mercado.
Mas vocês já se deram conta da imensa bobagem proclamada por Mantega e outros neófitos da "guerra cambial"?
Os EUA estão ficando mais pobres, ao desvalorizar sua moeda, e eles o fazem por absoluta necessidade, já que de outro modo o ajuste seria ainda mais brutal. Os chineses apenas defendem seu modelo exportador, fazendo ajustes cambiais dirigidos, algo que o Brasil praticou durante 40 anos seguidos (e o mundo não nos acusou de fazer "guerra cambial", ainda que manipulássemos o câmbio).
O governo é absolutamente risível, ou patético, ao falar de guerra cambial.
Deveria cuidar das suas contas, o que ele não faz...
Paulo Roberto de Almeida

Jornais estrangeiros veem nova ‘guerra cambial’

Blog Estadão, 2 de março de 2012 | 7h00
Sílvio Guedes Crespo
Os dois principais jornais de economia e finanças do mundo, o americano “Wall Street Journal” e o britânico “Financial Times”, publicaram reportagens nesta sexta-feira, 2, a respeito das medidas tomadas pelo governo brasileiro para tentar conter e valorização do real.
O primeiro diz no título da reportagem que o “Brasil intensifica a batalha para frear a alta do real”, enquanto o segundo afirma que
o País “declara uma nova guerra cambial”.
Ambos reforçaram a informação, já comentada em sites na quinta-feira, de que a mudança no IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) tem pouco efeito no mercado, mas vale como um sinal de que o governo está disposto a usar suas munições para conter a apreciação do real.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou ontem que a taxa de 6% de IOF sobre empréstimos no exterior, que incidia apenas as operações com vencimento de até dois anos, passaria a valer também para aquelas com prazo de até três anos.
Paralelamente, o Banco Central vem atuando no mercado de câmbio, por meio da compra de dólares à vista e no mercado futuro.
O governo argumenta que a política de afrouxamento monetário dos países ricos (o que inclui emissão de moeda) faz aumentar a quantidade de recursos nas mãos dos investidores, que, por sua vez, levam parte desse capital para países emergentes, como o Brasil, de forma especulativa.
“O ministro da Fazenda do Brasil e a presidente estão defendendo a moeda deles”, afirma o “Journal”.
No “FT”, o texto da versão impressa limita-se a descrever e explicar as medidas do governo brasileiro. Mas um artigo no blogBeyondBrics, do mesmo jornal, traz uma opinião sobre o caso. Recomenda que os investidores não ignorem “retórica belicista” de Mantega porque “desta vez a presidente se envolveu com a questão”.
Além disso, “Mantega sabe que tem grande parte do mundo emergente do seu lado”. O Peru e a Coreia do Sul também adotaram medidas de controle de capital.
China
Em outra reportagem, o “Journal” diz que a China está diversificando seus ativos, de modo a reduzir a participação do dólar em suas reservas, “uma tendência que pode significar menor fluxo de capital oriundo de Pequim e um possível aumento dos custos de empréstimos na economia americana”.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Juros no Brasil (sem querer estragar o seu dia...)

Desculpe, mas a única coisa que faço é postar estas informações do Jornal Nacional (10/10/2011)

 BRASIL: AS INACREDITÁVEIS TAXAS DE JUROS PARA OS CIDADÃOS!
            
Empréstimo Pessoa Física: 6,69% ao mês ou 117,51% ao ano \ Cheque Especial: 8,23% ao mês ou 158,33% ao ano \ Cartão de Crédito: 10,69% ao mês ou 238,30% ao ano.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

E por falar em juros... uma opiniao sensata - Alexandre Schwartsman

O debate, obviamente, é relevante, quer se goste dele ou não. Como escrevi em algum post abaixo, o Brasil não é um país normal. Longe disso.
Só de pensar que somos chamados de idiotas cada vez que vamos comprar algum durável ou semi-durável (por vezes até no supermercado, ou seja, para produtos absolutamente perecíveis), e que ouvimos como se fosse a coisas mais normal do mundo: "seis vezes sem juros"; ou então: "em quantas vezes você prefere?".
Inacreditável como as pessoas não se dão conta de que estão pagando, provavelmente, o dobro do que custa o bem em questão, e não se dão conta disso. Pagam dois e levam um para casa, e ainda acham que fizeram um grande negócio só porque entrou naquela mentira do "seis vezes sem juros".
O Brasil, decididamente, não é um país normal.
Como eu não gosto de ser chamado de idiota, recuso-me a entrar nessa conversa dos "seis vezes sem juros", mas o crime é que, quando você diz que quer pagar à vista, a vendedora diz que "é o mesmo preço!".
Aí você se recolhe à sua insignificância de mercado e à esquizofrenia econômica brasileira e aceita pagar 100% a mais, diluído nos "seis vezes sem juros". Juro que eu fico possesso, mas infelizmente não posso fazer nada, a não ser xingar as autoridades econômicas que não colocam um final nesse absurdo, ou pelo menos avisam a todos que estão sendo chamados de idiotas...
Enfim, isso para iniciar o debate abaixo transcrito, por motivos puramente intelectuais.
Paulo Roberto de Almeida

Os juros, a democracia e um e-mail de Alexandre Schwartsman
Reinaldo Azevedo, 28/07/2011

Escrevi ontem um post sobre a taxa de juros no Brasil, a valorização do real e as medidas sugeridas por especialistas, em reportagem da VEJA desta semana, para corrigir algumas distorções que estão em curso. Leiam lá. Fiz uma ironia: dadas as saídas apontadas, então precisamos de uma tirania virtuosa para aplicá-las porque os políticos não as adotarão — não, ao menos, se estiverem de olho nas urnas. É preciso um grande senso de dever para fazer a coisa certa, numa perspectiva de médio e longo prazos, mesmo correndo o risco da impopularidade no curto. Quem tem hoje esse senso de grandeza? Um dos economistas ouvidos é Alexandre Schwartsman, que tem um blog, como sabem, que recomendo: A Mão Visível. Ele me mandou o seguinte e-mail, que publico com a sua autorização. Trata-se, vocês lerão, de um pequeno artigo. Alexandre, concordem com ele ou não, tem uma virtude inegável entre muitas: é claro. Leiam.

Caro Reinaldo,

Como sempre gostei do seu artigo e aproveito para deixar claro que não acredito na incompatibilidade entre democracia e juros baixos. Só não acho que iremos convergir rapidamente para a taxa mundial de juros, como parecia ser a aposta de muitos dos meus colegas.

Para ser sincero, sou também simpático à tese da poupança; apenas não me parece razoável que esta explique toda a diferença entre o juro real brasileiro e o juro de países similares a nós.

Isso dito, no que tange à poupança, o principal entrave não aparenta vir do consumo das famílias (não muito distinto do consumo observado em outros países latino-americanos - embora esta ainda seja evidência insuficiente), mas sim do consumo público. No Brasil, o governo consome cerca de 20% do PIB. Este número, é bom dizer, não inclui as transferências feitas pelo governo às famílias (Previdência, Bolsa-Família, LOAS, RMV etc), mas apenas a parcela do produto apropriada pelo governo para seus próprios fins.

Em comparação, na média de Argentina, Chile, Colômbia e México, o consumo público roda em torno de 15% do PIB. A Colômbia, que apresentava consumo público próximo aos níveis brasileiros (até por conta de lutar uma guerra civil), conseguiu trazê-lo para valores mais em linha com os demais países da América Latina, o que sugere compatibilidade entre democracia e ajuste fiscal. Obviamente, compatibilidade não assegura o ajuste, mas, pelo menos, indica que não precisamos de um Pinochet para fazer nossa lição de casa.

De qualquer forma, minha opinião (que, diga-se, apenas tomei emprestado de economistas mais discretos) é que também a existência do crédito direcionado no volume que se observa no Brasil (praticamente um terço do total) pode explicar parcela grande da diferença entre nossa taxa de juros e a do resto do mundo. Aqui, eu diria que a democracia é obstáculo menor do que seria no caso do ajuste fiscal, até porque o crédito direcionado favorece apenas fração da população.

Mas não é por ser economista que sou ingênuo: minorias podem operar (e o fazem costumeiramente) para impor sua agenda como se fosse do interesse da população como um todo. Sempre digo que a estridência da Fiesp a cada reunião do Copom seria um choro bem-comportado perto do barulho que ouviremos quando (e se!) o CMN um dia ousar aumentar a TJLP. Ainda assim, creio que o balizamento do custo dos empréstimos do BNDES em torno da taxa de juros de (digamos) um título de 5 anos do Tesouro Nacional poderia fazer com que a Selic (e, portanto, a taxa de 5 anos) caísse. Não há como evitar um aumento nos custos do crédito direcionado, mas isso poderia ter efeitos benéficos sobre todo o resto.

Vai acontecer? Eu esperaria sentado, com um bom livro e uma pilha de DVDs, além de todas as amenidades possíveis, mas não acho que seja impossível (mesmo sendo difícil). Aliás, se acontecer, será antes do ajuste fiscal.

Abs,
Alex

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Entre os vagalhoes e os penhascos (juros e cambio): dilemas reais

Ardil-22: a versão nacional
Alexandre Schwartsman*
Blog A Mão Visível, 22/06/2011 17:32

...se não subir as juros a demanda se expande e a inflação segue pressionada; caso suba os juros, aumentam os ingressos de capital, a demanda cresce e novamente aparecem as pressões inflacionárias. Esta seria a justificativa para a adoção de políticas de restrição ao crédito...
Publicado originalmente na Folha de S.Paulo, edição de 22 de junho de 2011


Um dos temas mais "quentes" de política monetária refere-se às dificuldades de lidar com o ingresso de capital estrangeiro no país. O problema aparece, no entender de autoridades, porque o remédio típico para arrefecer as pressões inflacionárias - na ausência de um ajuste fiscal digno deste nome - é o aperto da política monetária, expresso na elevação da taxa básica de juros, a Selic. Entretanto, segue o argumento, taxas de juros domésticas mais altas relativamente às externas criam um fator adicional de atração de capitais, que então realimentaria a pressão sobre a inflação por meio da expansão da liquidez e do crédito que se seguiriam ao ingresso.

Esta visão foi resumida pelo presidente do BC quando afirmou: "Esse impacto inflacionário do ingresso de capitais não pode ser lidado com juros, porque, na realidade, quando apertamos as condições financeiras e monetárias, os indivíduos e as empresas buscam recursos lá fora" (Valor Econômico, 27/04/2011).

Tal tese, se válida, colocaria o BC face a um "Ardil-22": se não subir as juros a demanda se expande e a inflação segue pressionada; caso suba os juros, aumentam os ingressos de capital, a demanda cresce e novamente aparecem as pressões inflacionárias. Esta seria a justificativa para a adoção de políticas de restrição ao crédito (há algum tempo me recuso a chamá-las de "macroprudenciais", por não serem "macro", muito menos "prudenciais"), que permitiriam desacelerar a demanda, sem estimular novos ingressos.

Resta, todavia, saber se a tese é, de fato, válida. Acredito que sim, mas apenas porque o BC parece ter agora mais objetivos que simplesmente manter a inflação na meta.

Com efeito, sabe-se que a política monetária enfrenta desafios distintos sob regimes cambiais diferentes. Quando a taxa de câmbio é administrada, o BC se compromete a comprar e vender moeda estrangeira a um determinado preço. Neste contexto, se os capitais são razoavelmente livres para entrar e sair do país, a gestão de política monetária fica muito complicada.

Caso o juro doméstico suba além do externo, há incremento no ingresso de capitais, que deve obrigatoriamente ser comprado pelo BC, elevando a oferta de moeda e trazendo as taxas de juros para baixo, desfazendo à noite o que o BC tece de dia. Isto força a novas rodadas de elevação de juros, reiniciando o ciclo, de forma não muito distinta daquela descrita pelo presidente do BC. Sob um regime de câmbio administrado e mobilidade elevada de capitais, são escassas as chances do BC impor sua política monetária.

No entanto, o Brasil não adota este regime. Formalmente, pelo menos, nosso câmbio é flutuante, isto é, o BC não tem qualquer obrigação de comprar ou vender moeda estrangeira. Caso a taxa de juros aumente, há um incentivo adicional para o ingresso de capitais, que se manifesta, todavia, pela apreciação da taxa de câmbio. Em tese, o câmbio se aprecia até o ponto em que a expectativa de desvalorização iguale a diferença entre o juro interno e externo, eliminando os ganhos esperados com a arbitragem.

O interessante neste caso é que não há o Ardil-22. O encarecimento do real é quem "freia" os ingressos, pois encarece também todos os ativos (ações, bônus, empréstimos, etc.) denominados em moeda nacional. Posto de outra forma, à medida que o real se fortalece face ao dólar, menores são os incentivos para indivíduos e empresas buscarem recursos no exterior, pois aumenta o risco de uma desvalorização que encareceria estes passivos.

O ardil reaparece, contudo, porque o BC tem se engajado também na tentativa de conter o fortalecimento da moeda nacional, adicionando um objetivo à obrigação de manter a inflação na meta. Como o real não se aprecia, permanece o incentivo para o ingresso de capitais, já que - além da diferença entre taxas de juros - o risco de uma desvalorização é consideravelmente menor.

Visto de outra forma, a compra de moeda estrangeira pelo BC faz com que o regime de câmbio se assemelhe à descrição que fizemos do regime de câmbio fixo nos parágrafos acima: os ingressos de capital agora se traduzem em elevação da liquidez doméstica, em particular se direcionados a ativos privados e não à dívida pública, como argumentado por Márcio Garcia (Valor Econômico, 29/04/2011).

O Ardil-22 reflete o duplo objetivo do BC (inflação e câmbio). Sob tais circunstâncias, um instrumento adicional é requerido, a saber, as restrições ao crédito, cujo funcionamento, todavia, ainda se reveste de dúvidas, seja quanto à intensidade do seu impacto sobre a inflação, seja acerca do horizonte temporal em que tais efeitos se manifestarão.

A persistência da inflação, contudo, assim como os sinais de atividade econômica ainda forte no primeiro trimestre do ano, parecem estar reduzindo a ênfase do BC no seu objetivo cambial e reavivando seu interesse pela política monetária convencional. Resta saber se esta nova postura irá sobreviver à queda sazonal da inflação no segundo trimestre, ou se voltaremos à hesitação que marcou o final do ano passado e o começo deste ano.

Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley). [alexandre.schwartsman@hotmail.com]

sábado, 11 de junho de 2011

Governo (des)controla ingresso de capital estrangeiro...

E vai continuar tentando...
Incrível esse governo: ele precisa de dinheiro, já que gasta mais do que arrecada.
Para isso paga juros mais elevados do que os existentes no mercado, em qualquer mercado, em qualquer lugar do mundo.
Depois ele reclama que está entrando dinheiro demais.
Para reduzir um pouco o ingresso desse dinheiro "estrangeiro" -- mas muito pode ser dinheiro brasileiro depositado no exterior, também -- ele introduziu (esse é o termo) um imposto de 6% de IOF sobre os capitais de curto prazo, mas isentou o IED (investimento estrangeiro direto), pois se trata de um capital a rigor bem vindo, já que dirigido aos setores produtivos.
Agora o governo descobre que parte desse IED pode não ser IED e sim "capital especulativo".
Não seria mais fácil o governo reduzir os juros?
Os empresários parariam de reclamar, e os investidores externos viriam em menor número, só IED mesmo, pois os capitais "especulativos" procurariam paragens mais benéficas.
Por que o governo não reduz os juros?
Ah, vão dizer que com juros mais baixos, ele não conseguiria se financiar no mercado e aí ficaria sem dinheiro para pagar suas obrigações.
Ué, uai, por que o governo não reduz os seus gastos?
Não seria tudo mais simples se o governo fizesse como cada um de nós? Quando estamos sem dinheiro, deixamos de ir a restaurantes, trocar de carro, comprar roupas, sapatos, bolsas, etc...
Por que o governo não faz o mesmo?
Essa é a pergunta de UM MILHÃO DE DÓLARES...
A resposta não vale um centavo de dólar...
Paulo Roberto de Almeida

Governo faz pente-fino sobre aplicação externa
O Estado de S. Paulo, 11 de junho de 2011

SÃO PAULO - O governo resolveu olhar com lupa o ingresso de investimentos estrangeiros diretos (IED) diante das suspeitas de que investidores poderiam estar usando essa porta de entrada para fazer outras aplicações e fugir do pagamento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

A preocupação já existia desde o início do ano, quando a alíquota do tributo foi elevada. Mas a equipe econômica resolveu desenvolver mecanismos mais fortes de rastreamento, para saber para onde, efetivamente, o dinheiro está indo.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, está empenhado em acompanhar esses movimentos de perto para fechar as brechas para ingresso de capitais de curto prazo, segundo apurou o jornal O Estado de S. Paulo. Para isso, ele escalou alguns técnicos para olharem com muita atenção os dados do IED.

A Receita Federal e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) devem participar do esforço. A avaliação interna é que as portas de entrada de capital especulativo estão diminuindo, mas o mercado acaba criando mecanismos para burlar a tributação. "O jogo é esse. Vamos continuar fechando as brechas. Ninguém está dormindo", disse uma fonte do governo.

Embora o Banco Central (BC) negue publicamente que tenha identificado que a conta de IED esteja sendo usada para fazer investimento em renda fixa e variável, a área técnica do banco também está reforçando os controles e o monitoramento.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

O enigma dos juros altos no Brasil - Rubem de Freitas Novaes

Um texto antigo, mas ainda plenamente válido em suas considerações sobre política monetária, política fiscal, mercados de capitais.

O ENIGMA DOS ALTOS JUROS
Rubem de Freitas Novaes*
Valor Econômico, 17/09/2003

Faz pouco tempo, bacharéis em Direito e economistas realizaram, em datas próximas, importantes encontros na cidade de São Paulo. Como era previsível, a festa dos bacharéis, comemorando o centenário do Centro Acadêmico XI de Agosto, recebeu maiores atenções da opinião pública do que a homenagem prestada por entidades de classe a Pérsio Arida, eleito “Economista do Ano–2003”. A razão, muito simples: o desgaste sofrido pela profissão econômica, após quase três décadas de crescimento medíocre do país. Registre-se que ainda chegou a haver certa recuperação de imagem quando o Plano Real conseguiu debelar uma robusta inflação, sem impor grandes custos à sociedade. Mas, logo, a persistência de baixos índices de desenvolvimento recolocou a profissão na fase de inferno astral. Afinal de contas, se os do ramo não conseguem contribuir com políticas públicas para a melhoria do bem-estar do povo, para que servem?

O fato é que os economistas mais bem equipados têm se dedicado cada vez mais ao estudo dos aspectos monetários e financeiros (inflação, juros e câmbio), abandonando a ênfase que era dada no passado às questões ligadas à promoção do crescimento e do emprego, reconhecidas como o “lado real” da Economia. (Quem sabe a criação, na BMF, de um contrato futuro para a taxa de crescimento do PIB não ajudaria a recuperar o interesse da profissão para os temas do desenvolvimento?).

Em boa parte, a mudança de ênfase dos nossos colegas pode ser atribuída à atração exercida pelos melhores salários do mercado financeiro. Mas não se pode desconsiderar o fato de que os economistas descobriram, de moto próprio, que têm um papel bem mais limitado a cumprir na sociedade do que aquele implícito, por exemplo, nos ideais do “New Deal”, de Roosevelt, ou no pensamento dominante da CEPAL. Com efeito, nossos mais destacados estudiosos concluíram, em boa hora, que o melhor planejamento estatal é aquele voltado apenas para as funções precípuas de governo; que o melhor programa social resume-se na mera distribuição de renda para os mais desfavorecidos; que a melhor política industrial é a ausência de política industrial; que a melhor política cambial é a de moedas flutuantes; etc. e que, em síntese, o ideal é que as regras do jogo sejam sempre claras e estáveis, sem deixar lugar para grande ativismo das autoridades públicas. Com isso, a classe recolheu-se a uma menor significância, a despeito dos reclamos daqueles que, dotados de espírito corporativo mais aguçado, lutavam contra a perda de funções e postos no mercado de trabalho.

Voltando à festa dos economistas, nela Pérsio Arida - com a autoridade de quem muito contribuiu, juntamente com Simonsen, Chico Lopes, Lara Resende e Gustavo Franco, para decifrar o enigma da inflação inercial – propôs que seus companheiros de profissão se debruçassem sobre as razões pelas quais a taxa de juros natural no Brasil (taxa real neutra em termos de influência sobre a inflação) situa-se em patamar tão elevado - entre 8,5% e 10% ao ano, na ponta da captação - impondo-nos uma grave restrição à retomada do crescimento sustentável.

Aceitando seu desafio, naquilo que é permitido expor em tão curto espaço, ressalto que a questão da determinação da taxa de juros real pode ser vista sob duas óticas: a do mercado monetário e a do mercado de fundos para investimento. No primeiro caso, cabe destacar o expressivo tamanho de nossa dívida pública e o fato de que sua ordem de grandeza é dez vezes superior a da base monetária. A dificuldade está em que o país, ao longo de sua história relativamente recente, já tabelou a correção monetária, criou tributações extraordinárias sobre os rendimentos de seus títulos e seqüestrou as aplicações financeiras da população. Além disso, volta e meia ouvem-se sugestões tentadoras no sentido do “default” da dívida pública. Não é de admirar que os credores de tão volumosa quantia exijam uma bela remuneração para oferta-la.

Muitos analistas, erroneamente, acreditam que o “mercado” não tem alternativas para a aplicação de sua “caixa” e que o Tesouro, com igual sucesso, poderia financiar-se a taxas bem mais baixas. Ledo engano. Uma remuneração inadequada levaria à monetização de certa parcela da dívida pública (já vimos isto com clareza no segundo semestre de 2002), com impactos amplificados sobre a base monetária (considerando-se que, para cada 1% de monetização, aumentamos em 10% a oferta monetária) e efeitos desastrosos para o controle da inflação.

Em relação ao mercado de poupança e investimento, algumas considerações se impõem: vivemos num país com excelentes oportunidades de investimento, propiciadas pela ampla disponibilidade de recursos naturais, energia e mão-de-obra barata. A isto se contrapõe uma forte escassez de fundos de poupança, para determinar uma taxa de juros de equilíbrio muito elevada. Podemos agir sobre a poupança privada se, a exemplo de outros países, como o Chile, voltarmos a nossa Previdência para um regime de capitalização bem administrado. Do setor público, teria de ser demandado um esforço enorme de enxugamento, em todos os níveis de governo, para reverter uma despoupança líquida que hoje atinge a 3% do PIB. Finalmente, para estimular a poupança externa, teríamos de atuar basicamente sobre a percepção de risco Brasil, oferecendo regras estáveis e amistosas, respeito aos contratos e obediência aos direitos de propriedade.

Como vemos, nenhuma das ações é de fácil materialização e teria poder de influenciar de forma importante a nossa taxa “natural” no curto-prazo. O país tem enfraquecido a sua capacidade de poupar há muitos anos e a situação do endividamento público, se não é calamitosa, ao menos é preocupante . Um quadro como este só é mutável aos poucos e exige um somatório de medidas na direção correta. Infelizmente, não será possível um lance de genialidade (como foi a construção da URV no desmonte da inflação inercial) para a solução do enigma que Arida nos coloca. Permanece o consolo de que, nas condições de hoje, ainda há um belo espaço para a queda expressiva nos juros.

*O autor é Economista (UFRJ) com Doutorado pela Universidade de Chicago.