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sábado, 17 de março de 2018

Dez livros fundamentais em Direito e Filosofia Política - Irene Nohara

Não são os "dez mais" que eu próprio escolheria, mas vários dos que aí figuram também poderia estar entre os meus preferidos.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 17 de março de 2018

10 livros fundamentais sobre Direito Público

É necessário pensar o nosso tempo a partir de abordagens sociológicas, daí a preferência por obras mais reflexivas


Crédito: Pixabay
  • Irene Patrícia Nohara

Existem 10 sugestões de obras que contribuem para a estruturação de uma visão de mundo mais problematizante e que auxiliam na reflexão dos publicistas. Como autora de um livro de Fundamentos de Direito Público, procurei selecionar 10 obras que são imprescindíveis à formação de um publicista, tendo em vista que nelas se encontram:
  • os valores republicanos ou a falta deles;
  • o conjunto de ideias que contribuíram para a formação do Estado Moderno e, consequentemente, do Direito Público;
  • o imorredouro contraste entre visões de mundo em esquerda e direita;
  • a compreensão do Direito enquanto fenômeno associado à organização estatal, visão que teve seu ápice no positivismo jurídico;
  • a estruturação, posterior, de um Estado Democrático de Direito, no combate ao totalitarismo;
  • semiologia do poder, isto é, o estímulo reflexão sobre a intenção manipuladora do discurso técnico-científico que se volta ao domínio social; e
  • as novas problemáticas surgidas com a sociedade pós-moderna.
Como estamos em tempos de tecnologias disruptivas, de mudanças valorativas, de ausência de consenso sobre os valores estruturantes do espaço público e, portanto, de crise, surge com força no direito público a necessidade de se pensar o nosso tempo a partir de abordagens sociológicas, daí porque a preferência por obras mais reflexivas.
Na obra Coronelismo, Enxada e Voto se consegue identificar como se estruturou o espaço público no Brasil, por uma cooptação privada, à medida que o voto foi relativamente universalizado a partir da República Velha. Os coronéis acabaram fazendo um acordo com os candidatos a governadores, sendo esta “troca de favores” permeada por três dimensões: (1) mandonismo; (2) filhotismo; e (3) desorganização de serviços públicos, dada inexistência de autonomia aos municípios.
Com a obra se consegue entender algumas distorções políticas que têm origem nessa dinâmica de relacionamentos escusos entre público e privado no Brasil. Ressalte-se que Victor Nunes Leal quis enfatizar que o crescimento do espaço público com a República demandou uma nova estruturação do privado com o público, mas que a situação do Brasil agrário contribuiu para o acirramento do coronelismo. O publicista precisa conhecer para saber quais problemas existem na origem da conformação do espaço público no Brasil, algo que emerge da discussão da integridade no relacionamento entre público e privado.
É uma obra sintética, mas completa. O professor Dalmo de Abreu Dallari é um dos maiores estudiosos do federalismo no Brasil. Nessa obra ele analisa as principais características do federalismo a partir da exposição da sua estruturação por agregação nos Estados Unidos da América. Imprescindível ao publicista brasileiro saber dessas características e posteriormente comparar a conformação do federalismo nos Estados Unidos em relação à formação federativa por segregação no Brasil.
Para quem não teve na graduação, é imprescindível conhecer essa coletânea sobre autores de escol, estudiosos dos clássicos da política, organizada por Francisco C. Weffort. Os textos são muito agradáveis de ler e são estruturados numa crescente de informações do pensamento que conformou o Estado Moderno. Ainda tem a vantagem de serem seguidos, na maioria, de trechos originais expressivos das obras clássicas abordadas. Uma joia a ser trabalhada para reflexão dos temas imorredouros sobre: a natureza humana, a estruturação e os papéis do Estado e as relações de poder.
Paulo Bonavides é um dos maiores juristas que o Brasil produziu. Suas teorias são estudadas tanto no Brasil, como em universidades da Alemanha e da América Latina, sendo conhecido como constitucionalista plural, inovador, crítico e defensor inarredável de uma proposta de Estado Social. Nesta obra o autor retrata, com texto complexo e cheio de construções poéticas, mas de acentuado rigor amparado na ciência política, os movimentos revolucionários que estruturaram novos papeis ao Estado.
Trata-se de obra de agradável densidade teórica e com pitadas de genialidade próprias de Paulo Bonavides, que burila frases tão impactantes como aquela de que: no período Liberal o Estado foi visto como “o fantasma que atemorizou o indivíduo”, sendo que posteriormente se verificou ter sido injusto concentrar no espectro estatal toda potencialidade de opressão humana.
 

Apesar de estar em voga o pós-positivismo, ainda assim é imprescindível conhecer o positivismo para que não haja distorções sobre os pontos de possível superação teórica. Mesmo Friedrich Müller, ao propor uma teoria estruturante, ainda assim nos revela que: os objetivos do positivismo de cientificizar na medida do possível a ciência jurídica e de elaborar uma dogmática racional não merecem ser esquecidos em benefício de exigências menores no tocante à racionalidade e à honestidade em questões de método. Não se trata de fim em si a superação do positivismo!
Assim, ainda é encantador ao publicista se debruçar sobre o esforço metódico de Kelsen, que outrora foi injustamente taxado de antidemocrático, por afastar a função dos valores da abordagem da Teoria Pura, mas que, nesses tempos de moralismos irracionais, valoração seletiva diante das relações de poder, e, portanto, de retomada das perseguições ideológicas em diversas instâncias, nos revela o quão a despolitização propugnada, ao menos da seara da ciência jurídica, seria algo não distante de uma proposta democrática, dada vocação igualitária ao menos quanto à aplicação de critérios objetivos amparados nas possibilidades derivadas dos textos normativos dentro de uma estrutura escalonada do ordenamento jurídico.
Por conseguinte, conhecer a Teoria Pura jamais implica em rezar a cartilha do positivismo normativista, mas é honesto reconhecer o quanto Kelsen conseguiu fazer algo genial, porque atemporal, que contribuiu historicamente para legitimar a atuação jurídica dos Tribunais Constitucionais europeus. Um clássico para a reflexão do Direito, que, para ele, era um só: tanto público como privado, sendo ambos emanados do Estado.
Nessa obra, Celso Lafer, a partir de categorias básicas do Direito, dialoga com o pensamento de Hannah Arendt, enfatizando a necessidade de reconstrução dos direitos humanos. Trata-se de obra de grande atualidade, sobretudo num contexto de retração dos Estados de Bem-Estar Social, da situação de permanente conflito geopolítico no Oriente Médio, que faz aflorar os movimentos migratórios e a emergência das intolerâncias na Europa Ocidental, diante não apenas do terrorismo, mas também da competição por oportunidades que vão se escasseando em um cenário de crise e de desemprego estrutural.
Ressalta-se a diferença dos valores que permeiam o universo privado, com a questão da intimidade e da vida privada, focando a necessidade de proteção das idiossincrasias humanas, em relação ao domínio público, sendo que ainda nos dias atuais a realização dos direitos se dá numa possibilidade de inclusão sob a tutela de um Estado Nacional. É obra de grande valia para os publicistas.
Ainda que se diga que a dicotomia deva ser superada, Norberto Bobbio nos explica, de sua forma tradicionalmente clara e didática, que há uma distinção estrutural na visão de mundo entre a direita e a esquerda. Ele separa as orientações gradualistas das revolucionárias, sendo que estas últimas possuem em comum o desprezo à democracia, tida como medíocre. Logo, existem tendências ao totalitarismo nas perspectivas mais extremistas seja de direita ou de esquerda.
Em contraposição, no âmbito gradualista, que se baseia no crescimento a partir de um embrião, ou seja, de uma ordem preestabelecida, há as seguintes tendências: enquanto a esquerda enxerga a desigualdade como ordenação hierárquica injusta, pois entende que todos devam ser tratados igualmente, sendo que muitos não tiveram as mesmas oportunidades, dado que sua proposta é libertar os semelhantes dos privilégios sociais; a direta, por sua vez, enxerga a proposta igualitária do prisma de um nivelamento, tendendo a ter uma postura de darwinismo social — que vençam os melhores, sendo, ainda, ancorada, como regra geral, na defesa do passado, da tradição e da herança.
A obra é útil para desmistificar alguns pensamentos correntes como, por exemplo, aquele que associa religiosidade à direta e ateísmo à esquerda. Segundo Bobbio, tanto pode haver uma direita laica, isto é, não religiosa, como frequentemente existem alas progressistas das igrejas, que estimulam o governo a promover reformas em benefício da inclusão social.
Luis Alberto Warat reúne como poucos conhecimentos de Filosofia, psicanálise, teoria do Direito e teoria da linguagem. É importante que o publicista tome contato com a dimensão política do signo, isto é, dos falsos significados de representações e mascaramentos das relações de poder.
O livro contribui para a tomada de consciência sobre a semiologia do poder, sendo importante para interpretar intenções manipuladoras subjacentes aos discursos. A significação é tida como instrumento de controle social, estratégia normalizadora e disciplinar, fórmula produtora de consenso sobre o monopólio de coerção.
É uma obra rica, densa e que gera muitos insights para aqueles que gostam da abordagem do Direito do prisma da linguagem, mas que, curiosamente, apesar do título, não se restringe a abordar o Direito exclusivamente sob um viés linguístico, mas procura trazer as dimensões materiais de poder para dentro da produção do discurso na área jurídica. Leitura que exige certa maturidade e preparo do publicista em teoria da linguagem para que seja melhor degustada!
Sociólogo polonês, Zygmunt Bauman, foi extremamente fértil na produção científica. Com uma linguagem acessível explica como a contemporaneidade ou a modernidade líquida se apresenta descolada de referenciais (sólidos) anteriores.
É a época da insegurança, sendo a família, a classe, a nacionalidade e a ideologia submetidas a um processo de desengajamento coletivo, em prol do consumismo, do hedonismo, das artificialidades daqueles que desertaram de defender um projeto coletivo no espaço público.
Apesar de pessimista, Bauman ainda nos alerta da necessidade de defender o evanescente espaço público da colonização comandada pelas angústias próprias da iniciativa privada. É um clássico que, uma vez que se toma contato, jamais abandona o pensamento…


Ulrich Beck, sociólogo alemão, trabalha a modernidade reflexiva a partir da lógica do risco, que permeia as relações sociais no momento atual. Trata-se de um contexto de incerteza, pois tendo em vista a dissolução da crença no progresso por meio da ciência e tecnologia, e do potencial também destrutivo das atividades da indústria química, da microeletrônica, da tecnologia nuclear e das manipulações genéticas, há situações que ameaçam as categorias até hoje usadas para o pensamento e a ação.
Num contexto de transnacionalização dos riscos civilizacionais, em que os riscos se apresentam como invisíveis, dependendo de uma interlocução pautada em pesquisa científica, Beck entende que as empresas acabam se engajando no debate dos riscos.
Inclusive, o mundo do risco faz com que haja sub-políticas, pois um sinistro pode ser fatal à sobrevivência das empresas, que doravante se submetem às exigências de legitimação próprias do espaço público, produzindo “contra-discursos” no intuito de forjar o conhecimento e disseminar versões interessadas com o objetivo de evitar consequências financeiras de riscos potencialmente produzidos por suas atividades.
É uma obra de leitura mais complexa, mas que é imprescindível para discussão de temas atuais do Direito Público, como: regulação, consenso, saúde pública, estado da arte na ciência e tecnologia e captura pelo setor regulado.
Veja outras indicações de leitura

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Obras uteis para os candidatos 'a diplomacia: dez livros

Dez obras fundamentais para um diplomata

Paulo Roberto de Almeida

Reproduzo uma listagem anterior, indicativa de alguns dos livros que considero importantes para uma boa cultura clássica, ou para uma formação adequada no quadro da cultura brasileira, com uma inclinação especial para os temas de relações internacionais do Brasil:

1) Heródoto: História (440 a.C.)
     Disponível neste link (em inglês): http://classics.mit.edu/Herodotus/history.html

2) Maquiavel: O Príncipe (1513; divulgado pela primeira vez em 1532)

3) Tocqueville: A Democracia na América (1835)

4) Pierre Renouvin: Histoire des relations internationales (1953-58; nova edição em três volumes em 1993; Paris, Hachette)

5) Henry Kissinger: Diplomacy (1994; várias edições posteriores)

6) Manuel de Oliveira Lima: Formação histórica da nacionalidade brasileira (1912; nova edição: Rio de Janeiro: Topbooks, 1997)

7) Pandiá Calógeras: A política exterior do Império (3 volumes, 1927-1933; reedição fac-similar, 1989; Brasília: Câmara dos Deputados)

8) Carlos Delgado de Carvalho: História Diplomática do Brasil (1959; reedição fac-similar, 1998; Brasília: Senado Federal)

9) Marcelo de Paiva Abreu (org.). A Ordem do Progresso: cem anos de política econômica republicana, 1889-1989 (1989; outra edição: Rio de Janeiro: Campus, 1994)

10) Paulo Roberto de Almeida: Formação da Diplomacia Econômica no Brasil: as relações econômicas internacionais no Império (publicado em primeira edição em 2001; reedição em 2005 pela Senac-SP).

Uma última palavra sobre a auto-permissão para o narcisismo, como evidenciado no último livro, justamente: eu poderia indicar algum dos livros de história diplomática do Brasil disponíveis no mercado, mas disponho, aparentemente, de crédito suficiente – em matéria de estudo e pesquisa – para destacar minha própria investigação histórica sobre os fundamentos da nossa moderna diplomacia econômica (com a promessa de que vou continuar esse trabalho de pesquisa em dois volumes subsequentes cobrindo o longo século republicano).

Brasília, 29 de setembro de 2006