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terça-feira, 24 de setembro de 2013

OMC: Protecionismo comercial brasileiro em servicos, abertura da China

Desde os anos 1980, o Brasil recusa, persistentemente, qualquer abertura em serviços. Com isso, perde mercados no mundo e mantém nefastos cartéis domésticos num mercado interno protegido e prejudicial aos brasileiros.
Paulo Roberto de Almeida

China adere e Brasil se isola na negociação de serviços

Por Assis Moreira | De Genebra

Valor Econômico, 24/09/2013


A China quer entrar nas negociações de um acordo liderado pelos Estados Unidos para liberalização mais acelerada no setor de serviços. A decisão de Pequim, que surpreendeu os americanos e outros parceiros na cena comercial, poderá deixar o Brasil isolado nas discussões do comércio internacional de serviços, que movimenta US$ 4 trilhões por ano e é um dos mais dinâmicos da economia mundial.
Washington lançou o "Trade In Services Agreement" (Tisa) em 2012, em resposta ao impasse nas negociações da Rodada Doha. Aderiram às discussões a União Europeia (28 países), Austrália, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Hong Kong, Islândia, Israel, Japão, Liechtenstein, México, Nova Zelândia, Noruega, Paquistão, Panamá, Paraguai, Peru, Coreia do Sul, Suíça, Taiwan e Turquia. Até recentemente, os grandes emergentes, como China, Brasil e Índia, se recusavam a fazer parte do Tisa, argumentando que isso diminuiria as chances de acordo na Rodada Doha.
As discussões no Tisa foram centradas, inicialmente, na atualização das regras existentes do Acordo de Serviços. EUA e Japão submeteram as primeiras ofertas de acesso aos mercados, impulsionando assim compromissos efetivos de mais liberalização dos participantes.
A China deu agora uma reviravolta, aparentemente reconhecendo a importância do setor. Projeta tornar-se grande investidor estrangeiro direto também nesse segmento. Além disso, mesmo se houver acordo limitado em Bali, a negociação de Doha ainda pode demorar muito. Por isso, os chineses buscaram americanos e europeus para aderir a essa negociação plurilateral (com numero limitado de participantes).
Os americanos mostram-se cautelosos. É que a China aderiu também ao Acordo de Tecnologia da Informação (ITA, na sigla em inglês) e desde então impediu qualquer avanço.
Assim, apesar do interesse no gigantesco mercado chinês, os EUA vão segurar por um momento a entrada da China até ter garantias de que Pequim assumirá compromissos de liberalização. De outro lado, a China não quer entrar colocando já de saída suas cartas na mesa.
Enquanto o Brasil recusa a negociação em serviços, mais países estão se movendo em busca de acordos em setores com enorme potencial de negócios.
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Brasil e OMC

Rubens Barbosa


Rubens Barbosa é presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp

Pelo trigésima segunda vez, realizou-se no Rio de Janeiro o encontro nacional dos exportadores (Enaex). O maior e mais importante evento de comércio exterior j no Brasil, como em muitas outras vezes, não contou com os principais responsáveis pelo setor no Governo federal, frustrando cerca de 500 participantes, empresários e interessados.
Participei, representando a Fiesp, de painel sobre o multilateralismo, com ênfase nas negociações comerciais e no encontro ministerial da OMC em Bali, em dezembro.
Com o fracasso das negociações multilaterais da Rodada de Doha, a Organização Mundial de Comércio (OMC) está paralisada. Com 159 membros, a OMC mantém uma estrutura superada e um processo decisório difícil de formar consensos, que tem de ser aperfeiçoado.
No encontro ministerial de Bali em dezembro, os países membros tentarão retomar o processo negociador da Rodada de Doha, mas encontrarão dificuldades pela baixa prioridade que os EUA e a Europa atribuem, no momento, à retomada dos entendimentos. Estão sobre a mesa acordos de facilitação de comércio, de segurança alimentar, acordo plurilateral de serviços e isenções tarifárias para os países de menor desenvolvimento relativo. Caso não seja possível retomar os entendimentos sobre a Rodada de Doha, o novo diretor da OMC, o brasileiro Roberto Azevedo, terá de concentrar-se em uma agenda reformulada para ser discutida pós-Bali.
Um dos grandes desafios da OMC para o próximo ano será a forma como serão tratadas as inúmeras regras que estão sendo incorporadas aos acordos de livre comércio de última geração: mega acordos como o acordo dos EUA com países asiáticos, o acordo entre os EUA e Europa e dezenas de bilaterais. Esses acordos incorporam as formas modernas de comércio representadas peia integração das cadeias produtivas e tratam de competição, serviços, propriedade intelectual, compras governamentais, investimentos, barreiras sanitárias, meio ambiente e regras trabalhistas. Desse modo, a OMC, que busca a liberalização comercial pela redução das barreiras tarifárias e não tarifárias na fronteira, está fora das negociações para a implementação de regras de última geração que interferem com políticas dentro do território dos países.
O Brasil está em desvantagem nessa discussão pelo seu isolamento nas negociações dos acordos comerciais, pela distância das cadeias produtivas globais e pela vulnerabilidade do seu setor externo.
Fiz duas sugestões sobre o que fazer diante dos grandes desafios interno e externo do comércio exterior brasileiro:
* definir uma nova estratégia de negociação comercial externa que inclua o aprofundamento dos acordos regionais no âmbito da Aladi e acordos com os países desenvolvidos, que possam aportar inovações tecnológicas e integrar as empresas brasileiras nas cadeias produtivas, como o acordo com a União Europeia (se necessário, desvinculado dos parceiros do Mercosul);
* modificação na estrutura decisória do comércio exterior para elevar o nível burocrático de seu tratamento com a criação da função de presidente da Camex, subordinado diretamente ao presidente da Republica.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Transparencia demais e' burrice - Lei de Acesso 'a Informacao...

O companheiro que disse a frase se referia, de fato, ao caixa do partido, o tal de caixa 2 que serviu de pretexto para todas as patifarias, falcatruas, e mesmo crimes, cometidos pelos mesmos companheiros.
Mas deve-se reconhecer que nas negociações entre países, nos embates diplomáticos,  nas tratativas comerciais, não se pode ser transparente demais, pois a regra é o mercantilismo, o oportunismo, o protecionismo disfaçado, a barganha interessada, as vantagens unilaterais. Assim são os homens (e as mulheres), assim são os países...
Paulo Roberto de Almeida

Lei de Acesso faz governo rever acordos
O Estado de S. Paulo, 19/02/2013

Planalto avalia restringir divulgação de dados de negociações comerciais com outros países

Alana Rizzo/ Brasília - Após pressão internacional, o governo brasileiro estuda co­mo restringir o acesso a docu­mentos de acordos comer­ciais com outros países. A pedido do Palácio do Planalto, o Itamaraty começou a mapear todos os acordos internacio­nais e avaliar áreas sensíveis, que podem ser afetadas pela Lei de Acesso à Informação.
O Estado teve acesso a docu­mentos do gabinete do ministro das Relações Exteriores, Antô­nio Patriota, que revelam o te­mor de países como França e Ucrânia com a implantação da lei de transparência, em vigor desde maio de 2012. Os dois paí­ses mantém relações comerciais com o Brasil em áreas considera­das estratégicas pelos militares. O primeiro negocia desde 2009 a compra dos caças Rafale e a pro­dução de submarino. O segun­do, um programa espacial.
Em ofício datado de 08 de no­vembro de 2012 o assessor espe­cial para assuntos internacionais do Itamaraty, Rodrigo Baena Soa­res, relatou ao contra-almirante Renato de Aguiar Freire uma reu­nião entre membros do governo brasileiro e a secretaria de defesa França. Na pauta do encontro, a assinatura de um acordo sobre informações classificadas (sigilo­sas) entre Brasil e França.
Outro ofício de 2012 revela a co­brança do governo da Ucrânia pa­ra a assinatura de um Acordo de Proteção Mútua de Informação Classificada, que alcance princi­palmente documentos relativos à cooperação espacial entre os dois países. Nos documentos, o Itamaraty afirma que está estudando "medidas legais para avançar nas negociações de instrumentos re­lacionados aos acordos interna­cionais classificados".
Antes da viagem da presidente Dilma Rousseff à Rússia - em de­zembro de 2012 -, o Itamaraty também discutiu a possibilidade de renegociação de quatro acor­dos em matéria de defesa com aquele país que descumpriam trechos da Lei de Acesso. O pen­te fino nos acordos internacio­nais foi um pedido da Casa Civil que identificou, além do caso rus­so, outros três acordos comer­ciais contrários à nova legisla­ção: com a Bolívia, os Estados Unidos e a França.
Em ofício encaminhado ao Itamaraty, a Casa Civil afirma que esses instrumentos internacio­nais conflitam com a lei. "Trata- se, particularmente, da categoria "informação confidencial", não mais existente na nova regula­mentação. Por esse motivo, os textos de Acordo nem poderiam ser enviados ao Congresso Nacional (...) nem promulgados pela Presidenta da República, sob pe­na de representar uma violação do ordenamento jurídico vigente", diz o texto da Secretaria de Assuntos Jurídicos da Casa Civil.
O Itamaraty confirmou que es­tá estudando mecanismos para adequar acordos internacionais à Lei de Acesso à Informação. A Casa Civil informou que pediu ao Ministério das Relações Exte­riores uma posição sobre os acor­dos que tratavam de informa­ções "confidenciais".
A Embaixada da França no Bra­sil disse "as trocas de informações classificadas são objeto de acordos entre governos e regularmente atualizadas" e as informações classificadas tratam da segurança do Estado. As representações da Ucrânia e da Rússia não responderam aos questionamentos do Estado.

domingo, 1 de julho de 2012

Negociacoes internacionais: diplomacia do governo Lula (PRA-2005)

Uma antiga apresentação, que talvez ainda tenha alguma validade: 
1483. “A agenda negociadora internacional do Brasil: temas diplomáticos nos contextos regional e multilateral”, Brasília, 18 out. 2005, 11 p. Transcrição em documento de apresentação em PowerPoint para apoiar palestra proferida na Task Force sobre Negociações Internacionais da American Chamber-SP, em 20/10/2005.

A agenda negociadora internacional do Brasil:
temas diplomáticos nos contextos regional e multilateral

Paulo Roberto de Almeida

Sumário:
Posições do Governo Lula e contrapontos possíveis:
1. Política mundial: multilateralismo e equilíbrio de poderes
2. Organização das Nações Unidas: Conselho de Segurança
3. Globalização e volatilidade financeira internacional
4. OMC e negociações comerciais multilaterais
5. Relações Sul-Sul - países em desenvolvimento
6. Crises financeiras e acordos com o FMI
7. Brasil como “líder” regional e mundial
8. O Mercosul e a inserção internacional do Brasil
9. Relações com a República Argentina
10. Comunidade Sul-Americana de Nações
11. Relações com a União Européia
12. Relações com os Estados Unidos
13. A questão do terrorismo
14. Negociações em torno de uma Alca
15. O papel do instrumento diplomático

1. Política mundial:
Multilateralismo e equilíbrio de poderes
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> Forte ênfase no sistema político multilateral;
> Reafirmação tradicional da soberania nacional;
> Ênfase na igualdade soberana dos países (Rui Barbosa);
> Busca uma “mudança no eixo do poder mundial” (Viagem à Rússia: “O debate nas Nações Unidas, o debate na Organização Mundial do Comércio e o debate em outros foros multilaterais demonstram que somente o trabalho conjunto dos países emergentes pode criar uma nova geografia política, econômica e comercial.”);
> Persegue uma estratégia de alianças estratégicas com algumas potências médias e outras nações emergentes de postura independente.
< O multilateralismo é inoperante para muitos problemas;
< Mundo atual é caracterizado pela interdependência efetiva;
< Certo, mas alguns sempre serão “mais iguais” do que outros;
< Será conseqüência da relevância do país, não efeito da vontade;
< O sistema mundial é hoje mais diversificado e os interesses nacionais nem sempre são coincidentes, sobretudo na esfera econômica.


2. Organização das Nações Unidas:
Conselho de Segurança
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> Grande prioridade à conquista de uma cadeira permanente;
> Multiplicação de apoios a essa pretensão, inclusive de membros do próprio CSNU;
> Contrapartida: necessidade de o País assumir novas e maiores responsabilidades, em termos de segurança, de assistência humanitária e de cooperação ao desenvolvimento de países pobres;
> Maiores encargos financeiros e diplomáticos;
> Grandes investimentos e frustração pela não reforma em 2005.
< Pedidos de apoio já revelam problema de representatividade e de legitimidade da demanda;
< Os apoios manifestados podem ter sido meramente retóricos;
< Dificuldades: o Brasil não tem “excedentes de poder”, em termos de forças militares, e solidez econômica e financeira para cooperação técnica internacional, além de ainda manter o status de “país em desenvolvimento”;
< Dificuldades fiscais previsíveis, agora e no futuro;
< Situação de impasse deve persistir pelo futuro previsível.


3. Relações econômicas internacionais
Globalização e volatilidade financeira internacional
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> Adesão inicial às teses do Foro Social Mundial: “um outro mundo é possível”;
> Condenação explícita da globalização capitalista;
> Sim a Porto Alegre; não a Davos;
> De fato: diálogo realista com os dois mundos, os alternativos de Porto Alegre e  os capitalistas de Davos;
> Combate à fome e a pobreza mundial: taxas sobre os fluxos de capitais ou o comércio de armas;
> Recusa explícita do chamado “consenso de Washington”;
> Proposta de um “consenso de Buenos Aires”;
> Preferência pela sustentabilidade social do governo.
< Balanço de 30 meses: “Por um mundo mais justo”, o que implica que o atual é aceitável, com alguns ajustes;
< Fim da retórica anti-capitalista: política econômica responsável;
< “Ponte” entre  Porto Alegre e Davos;
< Na prática, os antiglobalizadores não têm nada de muito prático a propor, como revelado nas manifestações;
< Pouco sucesso no “fome zero mundial”: apenas uma taxa, de adesão voluntária, sobre as passagens aéreas;
< A China é o maior e melhor exemplo do “consenso de Washington”;
< Aceitação quase nula do “consenso de Buenos Aires”: teses vagas;
< Ações sociais não têm dependência direta da situação econômica.


4. Sistema multilateral de comércio
OMC e negociações comerciais multilaterais
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> Ativismo diplomático: formação do G-20, em Cancun (setembro de 2003): fim dos subsídios internos e das subvenções às exportações de produtos agrícolas;
> Enfática defesa da soberania econômica nacional e de políticas nacionais, macroeconômicas e setoriais, para o desenvolvimento nacional;
> Ofensivo na demanda de acesso a mercados agrícolas, mas defensivo na abertura e liberalização dos setores industriais e de serviços nacionais.
< Vitória mais de procedimento do que de substância: interesses internos dos países membros são contraditórios e defensivos; amarram o Brasil a posições menos ofensivas;
< Fraco entendimento nacional sobre o que são políticas nacionais e setoriais de desenvolvimento: inconsistências temporais e substantivas na definição de políticas adequadas ao momento;
< Necessidade de maior equilíbrio negociador e construção de consenso interno em favor de abertura e liberalização progressiva do setor comercial.


5. Relações políticas bilaterais
Relações Sul-Sul - países em desenvolvimento
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> Grande arco de alianças estratégicas: China, Índia, Rússia;
> Formação do G3 (África do Sul e Índia);
> Concertação política, econômica e até estratégica com a China e a Rússia (Viagem à Rússia: “A política externa brasileira tem a Rússia como parceiro estratégico.”);
> Tentativa de coordenação política, além do desejo de aprofundar os laços econômicos, tecnológicos e de cooperação técnica;
> Política de ativa solidariedade com a África (reconhecimento pelos séculos de tráfico, de escravidão e de exclusão interna dos “afro-brasileiros”).
< “Alianças estratégicas” devem ser condicionadas a interesses nacionais;
< Um formato em busca de algum conteúdo;
< Diferenciais de poder e de presença internacional dificultam o intento;
< Os países sempre adotam uma postura pragmática (e não principista) na definição de suas propostas e ações diplomáticas e de cooperação;
< Dúvidas quanto à consistência histórica e moral da “dívida para com a África” (gerações atuais nada tiveram a ver com o tráfico e a escravidão).


6. Sistema financeiro internacional
Crises financeiras e acordos com o FMI
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
>  FMI: um dos principais objetos da demonologia econômica da esquerda;
> O PT opõe-se a qualquer acordo que “limite a soberania brasileira”;
> Mudança de postura durante a campanha eleitoral: aceitação relutante (mas desconfiança silenciosa);
>  Postura pragmática do ministro Palocci;
>  O PT teve de aprovar, em 2003, a renovação do acordo de 2002;
>  Mas, convivência (de má vontade) com esse acordo, tolerado apenas e tão somente enquanto era absolutamente indispensável para o equilíbrio das contas externas;
>  Alívio com a não recondução do acordo com o FMI: em compensação, foram mantidos os níveis do superávit primário.
<  Não ao FMI: uma das grandes bobagens do “pensamento” econômico da esquerda;
<  A “limitação de soberania” se dá por inadimplência, não por acordo com o FMI;
<  Oportunismo eleitoral: depois assunção de todos os princípios e práticas de uma gestão econômica responsável;
<  Não há outra atitude a tomar;
<  Com muita oposição interna e bastante desconforto público;
<  O governo do PT promoveu a mais dramática melhoria da situação das contas externas conhecida na história econômica brasileira, não só por mérito próprio, mas ajudado pela economia internacional;
<  O governo continua praticando a mais exemplar ortodoxia econômica já operada no Brasil nas últimas décadas.


7. Ativismo diplomático
Brasil como “líder” regional e mundial
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> Um dos grandes objetivos políticos, não necessariamente limitado à região, mas podendo estender-se ao mundo todo;
> Esse papel pode ser conquistado com o ativismo diplomático e as alianças estratégicas, com países selecionados, que estão sendo desenvolvidas;
> Não parecem existir, a priori, limitações estruturais (orçamentárias e militares) a essa pretensão à liderança;
> Na prática, o exercício da liderança é mais difícil do que o antecipado nos discursos para consumo público.
> O elemento da liderança aparece nas relações com os vizinhos, mas também  com os países africanos e, de modo geral, para o mundo em desenvolvimento.
< Raramente, em diplomacia, se afirma liderança diretamente, mas se espera que ela seja reconhecida, em bases concretas;
< A liderança deve resultar de uma gradual preeminência econômica do País, em primeiro lugar na própria região, estendendo-se eventualmente, a outras regiões;
< Deve haver uma avaliação clara da limitação dos recursos efetivamente disponíveis para a ação externa do Estado;
< Na prática, não há disponibilidade de recursos financeiros, ou sequer militares e diplomáticos, para isso.
< Existem limites, derivados da capacidade econômica do Brasil, a essa liderança, bem como restrições dadas pelas percepções dos parceiros (a começar pela Argentina);


8. Integração regional
O Mercosul e a inserção internacional do Brasil
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> A prioridade mais importante da diplomacia brasileira: importância estratégica do Mercosul como base material para a união política da América do Sul;
> Região deveria estar livre de influências “externas” (grande irmão do Norte) e das limitações hegemônicas por ele impostas (notadamente no âmbito da Alca);
> Mercosul como fortaleza defensiva contra as investidas do império;
> O social e o político assumem precedência no processo de integração;
> Mercosul passou a ser buscado não como um meio para realizar objetivos de política externa, mas como um fim em si mesmo: Brasil assume custos e responsabilidades da ênfase no Mercosul. Falta de recursos financeiros para a integração física;
>  Assimetrias internas tem de ser superadas mediante programas compensatórios, num esquema similar ao dos fundos europeus de convergência.
<  Determinismos geográficos geralmente não são bons conselheiros em matéria de inserção internacional: o ideal a ser buscado é o universalismo sem restrições;
<  A idéia de uma exclusividade regional e de supostas ameaças externas não combinam muito com a realidade de um mundo globalizado, ao qual a região deve aderir;
<  Mercosul como plataforma para o exercício de uma interdependência assumida;
< Na ausência de progressos econômicos e comerciais fica difícil sustentar a integração;
<  A integração e o Mercosul não podem ser convertidos em fins, em si mesmos, mas servir de base para o atingimento de outros objetivos de desenvolvimento nacional. O Brasil não dispõe de recursos suficientes, mas oferta de capitais não é o problema;
<  Assimetrias internas são mais importantes do que as existentes entre os países do Mercosul, e elas de fato constituem a base da integração regional (David Ricardo).

A integração sul-americana não pode ser construída unicamente com base em instituições criadas politicamente, mas sim deve responder a necessidades concretas da economia.

9. Relações políticas bilaterais
Relações com a República Argentina
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> “O” parceiro estratégico: tolerância excessiva em relação a salvaguardas contra produtos brasileiros;
> Consultas freqüentes e busca de posições comuns (na Alca, por exemplo);
> Aceitação prévia da meta da moeda comum e da união política (parlamento do Mercosul diretamente eleito);
> “Consenso de Buenos Aires”: mais no plano simbólico do que em ações reais;
> A identidade de posições e a política de compreensão deveriam conduzir ao reforço do Mercosul, à consolidação da união sul-americana e a uma maior projeção internacional.

< A “diplomacia da generosidade” não pode ser feita em detrimento dos interesses dos industriais brasileiros;
< A coordenação de posições não consegue alcançar todos os pontos;
< Renúncia de soberania (implícita e explícita no projeto da moeda comum) precisa ter justificativa muito forte;
< Não há muitas alternativas em termos de políticas econômicas;
< Na prática, o Mercosul  foi fragilizado pela inobservância de regras básicas, a Argentina nunca aderiu à tese da América do Sul e vem obstaculizando, quanto possível, o projeto da cadeira no CSNU.


10. Diplomacia regional
Comunidade Sul-Americana de Nações
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
>  Não apenas relações são estratégicas, mas abundam as iniciativas políticas: visitas a todos e recebimento em Brasília de todos os chefes de Estado da região;
>  Ampliação das negociações regionais de comércio entre a CAN e o Mercosul, mas acordos de efeitos limitados e dificuldades para a formação de uma área de livre comércio (poder de atração dos EUA);
>  Liderança proclamada na região recebeu menor carga retórica no segundo ano
>  Estratégia arriscada nas negociações hemisféricas da Alca; reintegração de Cuba ao concerto americano (dificuldades);
>  Esquema da IIRSA parcialmente aceito pelo governo Lula, que prefere financiamento bilateral pelo BNDES (limitações de recursos enfrentadas pela diplomacia na materialização dos projetos concebidos).
<  Abandono de uma postura tradicionalmente mais discreta na região pode redundar em resistências que estavam sendo superadas;
<  Região é vista como cenário de atuação exclusiva da diplomacia brasileira, em competição com os Estados Unidos, mas os demais países preferem manter suas opções abertas, em vista das diferenças de poder;
<  Reconhecimento das limitações à liderança regional, inclusive por razões históricas;
<  Sucesso na paralisação da Alca pode representar uma frustração para os demais países, que esperam acesso ao mercado EUA;
<  A Comunidade não tem ainda estrutura definitiva e os esquemas de financiamento não são a maior dificuldade, e sim a existência, ou não de bons projetos, com capacidade gerencial para levá-los a bom termo, o que depende dos Estados nacionais.
As relações cooperativas com todos os países da região devem partir de dados concretos: pacificação política e militar dos países vizinhos, estabilidade social e perspectivas de crescimento econômico na região.

11. Relações políticas fora da região
Relações com a União Européia
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> Atribui à União Europa um papel político compensatório em uma espécie de “aliança estratégica” contra o unilateralismo dos EUA, para uma mudança no “eixo do poder mundial”;
> Visão de um acordo comercial entre o Mercosul e a UE como dotado de maiores benefícios potenciais do que aquele negociado com os EUA e demais parceiros no âmbito do projeto da Alca.
< A Europa permanece basicamente atlantista (OTAN), a despeito de alguns desentendimentos ocasionais com os EUA (Iraque), e não pretende mudar as “relações de força” no plano mundial;

< As relações de comércio entre o Mercosul e a UE são basicamente do tipo Sul-Norte (produtos primários contra manufaturados) e os europeus são bem mais protecionistas na área agrícola.


12. Relações políticas bilaterais
Relações com os Estados Unidos
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> Relação importante, mas considerada não essencial para os objetivos brasileiros;
> Desacordos são nítidos, tanto políticos quanto econômicos;
> No plano da política mundial, se busca concretamente a emergência da multipolaridade;
> Reciprocidade estrita (revelado no fichamento de turistas americanos);
> Governo Lula não é anti-americano, mas há uma nítida postura anti-americana em diversos setores da base política do PT.
< De fato, subsiste uma grande desconfiança, ainda que se reconheça a importância dos EUA;
< Parco trabalho conduzido para eliminar ou diminuir os desacordos.
< Correto, mas unipolaridade resulta não da vontade própria dos EUA, mas da incapacidade dos demais;
< Concepção equivocada da reciprocidade (discriminação ilegal);
< A sociedade brasileira manifesta sentimentos ambivalentes e contraditórios em relação aos EUA, feitos de admiração e receio.


13. Segurança internacional
A questão do terrorismo
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> Discurso de Lula em 10 de julho de 2003:

“Não será militarmente que vamos acabar com o terrorismo, nem tampouco com o narcotráfico. Vamos enfrentar isso com muito mais densidade na hora em que a gente atacar o problema crucial que é a pobreza no mundo.”

> Assembléia Geral da ONU setembro 2003:

“Existe, hoje, louvável disposição de adotar formas mais efetivas de combate ao terrorismo, às armas de destruição em massa, ao crime organizado. (…) Não podemos confiar mais na ação militar do que nas instituições que criamos com a visão da História e a luz da Razão. (…) O verdadeiro caminho da paz é o combate sem tréguas à fome e à miséria, numa formidável campanha de solidariedade capaz de unir o planeta ao invés de aprofundar as divisões e o ódio que conflagram os povos e semeiam o terror.”
<  O problema do terrorismo está em que ele não deriva apenas ou essencialmente de condições de pobreza ou sequer de injustiça, mas de percepções peculiares sobre o problema da dominação política e a impotência da ação democrática, sendo respaldado por grupos de ativistas que em geral possuem uma visão fundamentalista do mundo.

< Os movimentos terroristas não são, em geral, dissuadidos por ações sociais ou humanitárias, ainda que no longo prazo eles possam ser vencidos pela gradual conscientização das comunidades nas quais se inserem. No curto prazo, porém, a segurança tem de ser assegurada pela dissuasão preventiva ou pela ação repressiva.



14. Negociações comerciais hemisféricas
 Negociações em torno de uma Alca
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
> PT sempre se opôs ao esquema velado de “dominação imperial”: Alca seria um “projeto de anexação”;
> Plebiscito contra a Alca com amplo apoio de setores do PT e de sindicatos identificados com o partido), mas o PT retirou seu patrocínio explícito;
> Aceitação muito relutante do princípio do “livre-comércio”;
> Barganha ainda mais dura na mesa de negociações: vários impasses negociais ao longo de 2003 e início de 2004. Alca parada desde então;
> “Interesse nacional” e desvantagens da liberalização comercial assimétrica;
> Minilateralismo e liberalização à la carte: de fato, a Alca “aladizou-se”.

< As razões não derivavam de uma análise de cunho econômico, mas de uma ação essencialmente política;
< A oposição continuou plena no âmbito da base social e dos grupos de apoio, mas no governo ela se manteve bastante discreta;
< De fato se buscou diversificar o comércio, para não ser “dependente”;
< Ação cautelosa contra a Alca feita no interior do próprio processo negocial, com base em novos requerimentos para alcançar resultados;
< Não há acordo sobre o interesse nacional e sobre eventuais resultados;
< Qualquer novo progresso depende de resultados na Rodada Doha (OMC).


15. Questões institucionais
O papel do instrumento diplomático
Posições do Governo Lula:
Contrapontos possíveis:
>  Itamaraty partilha a formulação e execução da política externa com assessores presidenciais (partidários) e outros atores escolhidos de forma ad hoc;
>  Diplomacia presidencial implícita (conceito recusado por sua identificação com a administração anterior);
>  Coordenação política com países em desenvolvimento e “alianças estratégicas” com alguns deles;
>  Liderança regional e internacional para mudar substantivamente o mundo, e implantar uma “nova geografia comercial”;
>  Participação no mundo globalizado, com preservação da soberania nacional.
<  Problema da unidade conceitual e da uniformidade de concepção e formulação da política externa, com preservação de um discurso unificado em temas sensíveis;
<  Grande ativismo do chefe de Estado gera o problema da instância política de recuo ou de retificação das ações empreendidas;
<  Em diplomacia, posturas adotadas a priori podem não ser as mais adequadas, uma vez que se deve preservar flexibilidade na ação;
<  A implementação das mudanças não depende apenas do discurso diplomático, mas de condições efetivas de influência e de ação;
<  A soberania se defende, justamente, com maior participação na interdependência global.


terça-feira, 6 de abril de 2010

2031) Negociacoes comerciais multilaterais: o papel dos emergentes - Patrick Messerlin

Pessoalmente, considero este artigo bem mais político do que acadêmico, bem mais concessivo aos emergentes do que a realidade recomendaria, um exercício de contorsionismo verbal a serviço de alguma causa politicamente correta. Parece que o autor abandonou sua independência acadêmica em troca de algum posto na OMC...

Caminhando com gigantes
Patrick A. Messerlin
Valor Econômico, 5.04.2010

Na esteira da Cúpula do G-20, em Pittsburgh, no ano passado, autoridades americanas e europeias insistiram em que os membros do G-20 estavam impondo novas responsabilidades. Elas convidaram as autoridades econômicas dos gigantes emergentes a se envolverem mais na concepção de um novo balizamento econômico mundial - sugerindo, implicitamente, que isso não aconteceu até agora.

No entanto, as evidências não sustentam essa visão. Brasil, China, Índia, Coreia e México já vinham desempenhando um papel decisivo em duas grandes áreas: o regime de comércio mundial e a gestão da crise econômica mundial; ainda não há definição no que diz respeito a uma terceira: as mudanças climáticas.

Poucas pessoas parecem perceber a contribuição fundamental das economias emergentes para o sucesso do regime de comércio mundial atual. Durante as últimas três décadas, o surpreendente sucesso da liberalização comercial da China fez muito mais para convencer outros países em desenvolvimento sobre os ganhos com o comércio do que todas as exortações dos países na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

De forma similar, entre os membros da Organização Mundial do Comércio (OMC), a China declarou seu mais profundo engajamento na liberalização de serviços, a Índia tem levantado a questão de maior liberalização dos serviços e o Brasil tem sido decisivo em romper com o protecionismo agrícola americano e europeu. Durante as negociações ministeriais cruciais na OMC em julho de 2008, o Brasil foi o negociador mais proativo. O fracasso nessas negociações falhas são geralmente atribuídos à Índia e aos EUA, mas a maioria dos observadores parece concordar que a responsabilidade dos EUA é maior.

Na administração de crises na esteira do colapso financeiro em 2008, as economias emergentes têm sido tão diligentes e ativas quanto os Estados Unidos e a União Europeia (UE). A deterioração do saldo orçamentário geral da Coreia do Sul, China e Índia foi tão grave quanto nos maiores países membros da UE. Medidas macroeconômicas discriminatórias relacionadas com a crise e adotadas em 2009 por todas as principais economias emergentes, exclusive a Índia e o Brasil, são comparáveis às implementadas nos EUA e em toda a UE.

Por último, porém não menos importante, o núcleo de economias emergentes absteve-se de elevar tarifas, e seus pacotes de estímulo concederam subsídios muito mais limitados aos setores bancário e automobilístico do que pacotes semelhantes nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Exceção foram as dramáticas medidas de estímulo na China, que, expressas em políticas industriais, serão uma fonte de problemas no futuro.

Quanto às mudanças climáticas, as posições das economias emergentes eram, até meados de 2009, negativas ou defensivas. Mas a Índia fez muito para mudar o ânimo quando tornou-se proativa no debate sobre mudanças climáticas na reta de chegada à mais recente cúpula de dezembro em Copenhague. Pouco antes da reunião, a China anunciou um corte substancial no crescimento, embora não no nível, de suas emissões.

As credenciais de liderança dos países do G-20, tais como Argentina, Indonésia, África do Sul, Rússia, Arábia Saudita, África do Sul e Turquia, têm sido menos convincentes. Esses países têm sido mais hesitantes em questões de comércio, mais ambíguos quanto aos instrumentos que escolheram para administrar a crise e continuam relutantes em lidar com as questões ambientais. Essas atitudes também são paralelas, em larga medida, a seu desempenho econômico menos convincente.

O fato de que o núcleo das economias emergentes têm contribuído substancialmente para a formação do novo quadro econômico mundial não significa que elas não continuem a enfrentar sérios problemas. Em particular, as discrepâncias de renda entre elas e os países ricos põem em perigo seu crescimento e estabilidade política de longo prazo, e ainda poderão prejudicar seu futuro envolvimento no processo do G-20.

Está na moda, hoje, buscar a implementação de normas internacionais mais rigorosas como solução para a maioria dos problemas mundiais, mas essa estratégia não é bem adequada a uma mudança, ora em curso, nas relações econômicas internacionais. A emergência de novas potências mundiais, combinada à diminuição da influência das atuais potências, não é propícia a disciplina mais rigorosa. As potências emergentes do mundo tendem a mostrar-se cada vez mais não inclinadas a aceitar limitações que veem como tutela norte-americana ou europeia. Ao mesmo tempo, ainda estão longe de exercer liderança, poder ou de introduzir, eles mesmos, maior disciplina.

Isso significa que os países da OCDE terão que liderar mediante exemplo. O que, em termos concretos, significa essa abordagem? Primeiro, ao reformar suas próprias estruturas regulamentadoras nacionais deveriam evitar guinadas muito fortes que os distanciem substancialmente de mercados supostamente racionais e os aproximem de governos supostamente racionais. Ao contrário, devem melhorar a qualidade da regulamentação, juntamente com execução e fiscalização. Como a regulamentação é uma forma de concorrência entre governos, um foco em melhor regulamentação parece, cada vez mais, o melhor canal de influência à disposição dos países da OCDE.

Segundo, os países da OCDE devem manter seus mercados abertos, e abrir os que estão fechados - na agricultura (crucial para o crescimento sustentado de economias emergentes, como Argentina, Brasil e Indonésia) ou de serviços (crucial para países como a Índia ou Coreia). Acima de tudo, essas regiões detêm a chave da geração de mais crescimento baseado em mercados internos em todas as economias emergentes. Tudo isso implica apoio muito mais vigoroso dos países da OCDE, especialmente dos EUA, a uma conclusão bem sucedida da rodada Doha da OMC.

Neste ano, a Coreia do Sul - um dos países de melhor desempenho durante a crise mundial - ocupará a presidência do G-20. Apoiar as iniciativas da Coreia do Sul cria excelente oportunidade para os países da OCDE mostrarem que, embora continuem orgulhosos do mundo pós-Segunda Guerra Mundial, agora em desaparecimento, não temem o novo mundo que está emergindo.

Patrick A. Messerlin é professor de Economia da Sciences-Po (Institut d Etudes Politiques), em Paris, e foi conselheiro especial do diretor geral da Organização Mundial do Comércio 1999-2002.