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terça-feira, 9 de janeiro de 2024

Perspectivas negativas para a ordem mundial no futuro imediato - Paulo Roberto de Almeida

Perspectivas negativas para a ordem mundial no futuro imediato


Paulo Roberto de Almeida 


A chamada “ordem mundial” — mais bem uma desordem atualmente— encontra-se fragmentada, muito em função de desacordos e até mesmo hostilidade entre as grandes potências mundiais, que são as que possuem algum controle sobre a agenda multilateral, hoje esgarçada entre interesses divergentes entre a comunidade ocidental (EUA e o meio império europeu) e as duas grandes autocracias que lhe são opostas nos objetivos políticos globais.

A capacidade de liderança americana parece paralisada por uma grande divisão interna. O delírio do povo trumpista foi longe demais; a deformação do partido Republicano parece irreversível; se a Justiça não conseguir barrar o populista autoritário ele vai destruir instituições e arruinar a credibilidade dos EUA no mundo. Os europeus tampouco conseguem mostrar-se unidos, em grande medida pelos avanços da extrema-direita em diversos países: a guerra da Ucrânia pode ter exacerbado essas divisões.

A Rússia pode até o reter parte do território ucraniano, sacrificando milhares de seus soldados e mercenários estrangeiros, mas sairá terrivelmente diminuída economicamente e militarmente dessa guerra insana de Putin, portanto dependente de favores chineses. 

Quanto à China, o novo imperador parece ter exercido um controle nefasto sobre o seu dinamismo econômico, centralizando demais as decisões de investimento. Ou seja, a perspectiva de superar a economia americana parece ter ficado mais afastada em vários anos. 

A tal de “nova ordem” virou uma paródia, com o ajuntamento de países autoritários nesse Brics+ sem qualquer papel positivo para um sistema interdependente no plano econômico global ou liberal no plano das liberdades democráticas. 

Pena que Lula embarcou nessa aventura lá atrás, como eu sempre critiquei: não existe NENHUMA convergência entre os objetivos das duas grandes autocracias e as aspirações nacionais do Brasil. Dificuldades visíveis para o Brasil na liderança do G20 em 2024.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4545, 9 janeiro 2024, 1 p.


sábado, 26 de novembro de 2022

Uma Nova Ordem Europeia? - colóquio da Universidade Portucalense (30/11/2022)

 

Oradores: Martin Pohl, embaixador da República Checa em Portugal, e António Martins da Cruz, antigo embaixador e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros.
Recentemente, Emmanuel Macron, Presidente de França, defendeu a criação de uma nova “comunidade política europeia”, mais alargada que a União Europeia (UE), que reforce a cooperação no espaço europeu.
Emmanuel Macron e Ursula von der Leyen, Presidente da Comissão Europeia, defendem o fim da unanimidade nas decisões da UE em Segurança e Defesa, Política Externa ou Saúde, o que implicará uma revisão dos tratados.
O que poderá significar esta proposta para o futuro da Europa e para o papel da UE no mundo?
A Conferência será aberta pelo Reitor da Universidade Portucalense, Fernando Ramos, pela Diretora do Departamento de Direito, Maria Manuela Magalhães e pelo coordenador da licenciatura e do mestrado em Relações Internacionais, André Pereira Matos, e terá a moderação do professor Pedro Ponte e Sousa. 
A Conferência “Uma Nova Ordem Europeia?” é uma atividade integrada na unidade curricular de Estudos Europeus, da Licenciatura em Relações Internacionais.


segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Por que o mundo é como é (e como ele poderia ser melhor...) - Paulo Roberto de Almeida (Ordem Livre)

Originalmente, este foi o primeiro texto da série "Volta ao Mundo em 25 Ensaios", elaborado ainda no final de 2009 e publicado em janeiro de 2010, dando início a estas reflexões sobre o mundo atual.
A republicação pelo site Ordem Livre está sendo feito de maneira aleatória, sem atender ao ordenamento e encadeamento dos textos que eu havia organizado originalmente. Ao final, colocarei os textos em sua sequência lógica, na ordem original, por meio de uma listagem cronológica e temática. Isso é importante, pois o raciocício histórico, teórico e substantivo foi sendo construído gradativamente, até chegar nas conclusões.
Paulo Roberto de Almeida

Por que o mundo é como é (e como ele poderia ser melhor...)

Asd
Imaginemos um viajante estratosférico, vindo para a Terra em sua espaçonave, procurando compreender o que vê, em aproximações sucessivas. Primeiro visualizaria aquele planeta azul de que falam os astronautas, depois veria enormes manchas cinzas ou verdes, segundo os oceanos focalizados, manchas interrompidas aqui e ali por grandes ou pequenas massas de cores distintas, correspondendo às regiões dos cinco ou seis continentes entrevistos do espaço: verde para as densas florestas tropicais, o amarelo ou ocre dos espaços desérticos, as tonalidades mais claras das regiões temperadas e o branco dos pólos. Depois, teria a grande variedade de cores exibida pelas implantações agrícolas e construções urbanas das distintas sociedades humanas.
Chegando mais perto, ele veria que algumas dessas explorações rurais exibem um quadriculado perfeito, correspondendo ao que chamamos de agronegócio, enquanto outras estão dispersas em vastas zonas de ocupações irregulares, com muita destruição dos recursos naturais em volta e alguma degradação ambiental: são as unidades de exploração familiar, de subsistência e de baixa produtividade, geralmente nas regiões tropicais. Quanto às zonas urbanas, nosso viajante extraterrestre teria todos os tipos de paisagens: enormes cidades modernas, repletas de grandes edifícios modernos, cortadas por vias expressas; pequenas cidades do interior, de arquitetura mais tradicional; e uma variedade de grandes ou pequenas cidades com todos os tipos de habitações: condomínios de luxo, mansões espetaculares, mas também favelas urbanas e ajuntamentos periféricos, revelando a imensa desigualdade da condição humana nas sociedades que se distribuem por todas essas regiões e continentes.
Planando, agora, a baixa altura sobre essas cidades, nosso visitante exterior teria todas as combinações possíveis à sua disposição: pessoas de alta renda se deslocando em carros de luxo ou em helicópteros pessoais, cidadãos de classe média fazendo compras em shoppings multicoloridos pelos neons atrativos, trabalhadores especializados concentrados em fábricas ou escritórios, empregados informais em situação de exploração abjeta em negócios não registrados, capitalistas do campo aqui, agricultores miseráveis e trabalhadores volantes ali, em regiões de agricultura primitiva e de baixa produtividade. Nas ruas e semáforos, ele se depararia com carros fechados, passantes apressados, vendedores de ocasião e uma quantidade variável de pedintes andrajosos, dependendo do país ou região que estivesse sobrevoando. Nas zonas tropicais os contrastes seriam certamente mais fortes do que nas temperadas, embora as migrações humanas, legais e clandestinas, venham colorindo todo o planeta de todas as gradações possíveis no imenso leque de riquezas e misérias humanas.
Este é o nosso mundo, rico e miserável ao mesmo tempo, contraditório nas situações econômicas e nos regimes políticos, variado pelas línguas e religiões, mas unificado pelos mesmos desejos humanos de algumas coisas muito simples: comida, segurança, bem-estar material, boa saúde, disponibilidade de bens úteis à existência e alguma perspectiva de melhora no curso da própria geração. Todos aspiram a essas mesmas coisas, em graus variáveis de necessidade ou ambição, assim como todos desejam um bem intangível, um pouco mais difícil de ser "entregue": a felicidade humana; isto é, a realização de outros sentimentos ainda mais subjetivos: o amor, o afeto, a satisfação pessoal no convívio com entes queridos.
Se ao nosso viajante do exterior fosse facultado pesquisar livremente entre os terráqueos as fontes e as razões daquela sensação que os anglo-saxões chamam de fulfilling (e que os franceses designam por accomplissement), ele constataria que a condição básica para sua realização é simplesmente esta: a liberdade de escolha. Poder escolher onde morar, definir uma profissão, realizar-se como ser social, dispor de uma renda suficiente para fazer suas próprias opções em termos daqueles bens materiais e ofertas culturais que melhor atendam sua personalidade, deslocar-se livremente pelo planeta para visitar templos, museus, florestas e praias, comer em bons restaurantes, comprar roupas vistosas e confortáveis, ser atendido nos melhores hospitais e poder conversar livremente e relacionar-se com quem encontrar pela frente, ou simplesmente ficar sentado em frente da televisão, sem outras preocupações do que a certeza de que se dispõe de seres amados em volta de si, que lhe dão a segurança de uma vida tranquila, sem os sobressaltos de guerras, violência, delinquência ou catástrofes de qualquer tipo.
Esse talvez seja o conjunto de requisitos materiais e imateriais que poderiam definir aquilo que chamamos de felicidade humana, algo ainda raro em nossos tempos. Ela não está diretamente correlacionada ao PIB per capita ou ao IDH dos países, embora não se possa descartar a imensa interface que existe entre, de um lado, um nível satisfatório de renda e de serviços públicos (como a assistência à saúde, por exemplo), bem como um provimento adequado de educação de base para o enfrentamento dos problemas mais comezinhos da vida humana; e, de outro, essa sensação d’accomplissement, que se aproxima, em parte, da felicidade. A felicidade é a liberdade de você poder escolher o que lhe faz ser feliz, e para isso é preciso dispor de um mínimo (ou provavelmente mais do que isso) de meios materiais.
O fato é que a imensa maioria dos seres humanos, talvez dois terços de um planeta com mais de seis bilhões de habitantes, não dispõe da simples liberdade de escolher onde trabalhar, onde morar, como garantir sua segurança alimentar, física ou até a satisfação de necessidades as mais simples: água potável, saneamento básico, transporte acessível, escolas e hospitais de qualidade, sem mencionar a liberdade de escolher quem definirá as regras que impactarão a sua vida no trabalho, na disponibilidade da renda pessoal, na habitação e na segurança, justamente. Uma das explicações aventadas para essas imensas desigualdades distributivas e de acesso aos bens materiais e intangíveis é a de que os ricos são ricos porque extraíram sua riqueza dos pobres, povos ou países pobres dominados e explorados pelos cidadãos ricos dos países ricos, cabendo, portanto, liquidar com a dominação e com essa exploração para corrigir imediatamente as iniquidades existentes.
Esse simplismo e esse maniqueísmo já não são mais aceitáveis hoje em dia (se algum dia o foram), bastando, aliás, que o nosso extraterrestre examine a situação do Haiti, tanto a partir da estratosfera – de onde ele veria a mesma ilha, Hispaniola, perfeitamente dividida numa porção verde, à direita, e numa mancha ocre e desolada do lado esquerdo, que corresponde exatamente ao Haiti –, quanto no plano histórico-político, posto que o Haiti foi a primeira colônia da América Latina a se libertar da dominação européia, ainda no final do século 18. Pois bem, o Haiti nunca foi explorado diretamente por potências estrangeiras desde então, constituindo uma nação independente que escolheu o seu próprio caminho para o subdesenvolvimento e para a degradação ambiental. Uma mistura de elites insensíveis e população miserável, jamais educada para explorar os recursos naturais de forma sustentável, representou a “receita” terrível que levou o Haiti à situação que ele exibe hoje: não só um Estado falido, mas uma sociedade arrasada pela degradação ambiental e pela desestruturação social. Em uma palavra: uma população sem qualquer liberdade de escolha, a não ser (embora precariamente) a de emigrar e de tentar refazer a vida em outros países.
O Haiti não é o que é hoje por excesso de “exploração capitalista”, como querem alguns, mas provavelmente pela insuficiência de “exploração” capitalista, pela incapacidade de suas elites de inserir o país nos amplos circuitos da economia mundial, de onde poderiam vir a tecnologia, os capitais, a inovação e, sobretudo, as idéias que permitiriam ao país um pouco de progresso, de prosperidade, enfim, um pouquinho de felicidade humana. O erro fatal do Haiti foi ter se isolado da comunidade internacional, da economia mundial, e preservado estruturas defasadas, feitas de má educação, de escassos valores cívicos, baixa integração social. Tudo isso deixou o Haiti num patamar de baixa produtividade do trabalho humano, com reduzidas possibilidades de crescimento econômico e, atualmente, com poucas saídas para sua inserção internacional. Povos atrasados são feitos, antes de mais nada, de países isolados. A geografia e a história confirmam essa verdade elementar.
Olhando o mundo de maneira desprevenida, nosso extraterrestre veria que os países mais abertos à inovação, ao comércio, aos intercâmbios ilimitados com todos os demais povos são também as sociedades e nações mais avançadas e progressistas, de maior nível de renda e com um grau de ‘felicidade humana’ um pouco maior. Isso só se alcança com liberdade de escolha, e esta depende fundamentalmente de quão aberto é o país ao exterior. Nosso viajante exterior, mesmo sem ser especialmente educado em economia ou sem dispor de estatísticas completas, não teria muita dificuldade em concluir que a liberdade individual, a liberdade de dispor de seus bens sem que alguém (ou o próprio Estado) ameace tomá-los de maneira arbitrária, a liberdade de poder transacionar esses bens (ou a sua própria força de trabalho) sem muitas restrições impostas por governos intrusivos, essas qualidades são as que criam povos ricos, sociedades prósperas e amantes da paz.
Falaremos em maior detalhe sobre tudo isso mais adiante...

* Publicado originalmente em 18/01/2010.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Encruzilhadas mundiais - Fernando Henrique Cardoso


Encruzilhadas mundiais

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, sociólogo, foi presidente da República 

O Estado de S.Paulo, 04 de dezembro de 2011 | 3h 03

Diante dos horrores da 2.ª Guerra Mundial, os vencedores dispuseram-se a criar a Organização das Nações Unidas (ONU) e outras instituições internacionais para impedir as grandes conflagrações e regular, dentro do possível, certas matérias de interesse geral, como o comércio, com a Organização Mundial do Comércio (OMC), os desequilíbrios financeiros globais e o socorro a países endividados, com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Outras, ainda, para promover o desenvolvimento (Banco Mundial) ou para remediar as questões básicas dos povos em matéria de saúde (Organização Mundial da Saúde) e da educação (Unesco). Embora longe do ideal, é inegável que essas organizações alcançaram algum progresso. Em pelo menos um ponto crucial a ONU foi vitoriosa: apesar da guerra fria, não se deu um choque direto entre os Estados Unidos e a União Soviética. No período pós-guerra fria tampouco se veem riscos de confronto militar entre a China e as potências ocidentais.

Acontece, entretanto, que já se passaram mais de 50 anos da formação da ONU e os fundamentos econômicos e políticos da ordem mundial se transformaram enormemente. Pelo menos quatro fatos significativos impõem uma revisão dessas instituições internacionais: o fim da União Soviética, a incrível expansão econômica da China, a reaparição do mundo islâmico na cena internacional e a emergência de novos polos de poder econômico e político no mundo (não apenas o Bric, mas a Turquia, o Irã, a África do Sul, a Coreia do Sul e outros países asiáticos). Sem esquecer que o Japão e a Alemanha, que não têm assento no Conselho de Segurança, se colocaram no topo da economia mundial.

No mundo ocidental, a transformação de maior significado foi a construção da União Europeia, por seu alcance político-civilizatório. Esse movimento unificador foi consequência do mesmo impulso que levou à formação da ONU: cansadas de guerrear, a Alemanha e a França tornaram-se o sustentáculo da Comunidade Europeia, conjunto de nações cujas relações se devem basear na solidariedade entre a Europa mais rica e a mais pobre, num arranjo supranacional que busque a paz fundamentada na prosperidade comum.

Considerados em conjunto, os acontecimentos político-econômicos pós-Guerra Mundial foram capazes de substituir a guerra pela luta por melhores posições na produção, no comércio e nas finanças mundiais. Os conflitos refluíram para o âmbito regional e muito frequentemente tiveram, depois do desabamento da União Soviética e dos ideais comunistas, mais fundamentos culturais e religiosos do que propriamente econômicos. As transformações no sistema produtivo nos últimos 40 anos, com uma série de avanços tecnológicos, permitiram uma expansão econômica à escala global sem guerras nem anexações territoriais. A atual globalização difere, portanto, da anterior expansão capitalista, denominada geralmente de imperialismo, que supunha o poder dos Estados, com exércitos, guerras e ocupações coloniais.

Que modificações advirão do quadro de poder que se vai desenhando no mundo, somado à crise financeira iniciada em 2007, e que perdura? Uma coisa parece certa: o predomínio do Ocidente vê-se contestado pela emergência de fatores econômicos, demográficos, e mesmo culturais, sinocêntricos, ou, melhor, "asiáticocêntricos". Está reaberta a rota para o Extremo Oriente. Dominique Moïsi, analista francês da cena internacional, vem insistindo nessa tese, exposta no livro A Geopolítica da Emoção. Em artigo mais recente, mostrou que a América está tentando se adaptar ao que chama de "século da Ásia", formando uma comunidade econômica com países dessa região. Alguns países emergentes, como o próprio Brasil, desde a década de 1990 se vêm aproximando da China e da Ásia em geral - em nosso caso, as relações com o Japão são mais antigas e já foram mais próximas. Países africanos, mesmo não sendo "economias emergentes", do mesmo modo se vinculam crescentemente à China como exportadores de matérias-primas, tendência seguida por vários países da América Latina.

Com as consequências econômicas da crise financeira atual, é natural que a tendência a depender da Ásia se reforce. Dela escapa a Europa, embora não tenha sido capaz de tomar decisões que interrompam a débâcle econômico-financeira. Velhas tensões voltam a incandescer os corações europeus. Berlim quer se manter na ortodoxia financeira, não aceita que o Banco Central Europeu empreste aos Tesouros nacionais, teme que os eleitores reajam negativamente a ajudar países que, ao ver deles, não souberam ser previdentes. Por isso se recusa a emitir bônus salvadores em troca de títulos das dívidas dos bancos e países europeus. É como se, de alguma maneira, voltássemos, figurativamente, à linguagem das guerras. Em alguns países europeus se deu a falência da política: enquanto os povos protestam, indignados, os "mercados" indicam e conseguem impor primeiros-ministros, tal a desmoralização dos partidos e da classe dirigente.

Neste panorama, é premente que apareçam lideranças globais do calibre das que conseguiram criar a ONU e suas diferentes organizações e daquelas que construíram a velha-nova Europa. Os governos norte-americanos já erraram muito ao não perceberem o significado do mundo árabe e islâmico e tentarem impor-lhe o seu estilo de democracia, quando eles próprios já se retorciam em dificuldades econômicas e políticas. O mundo todo paga o preço da expansão do terrorismo e da quase impossibilidade de manter unidas comunidades religiosas, culturais e nacionais diversas sob o domínio de um mesmo Estado. Caiu o Iraque, mas a paz não veio. O Afeganistão padece entre a corrupção e os senhores da guerra e do ópio. Na Líbia, uma intervenção que tinha propósitos humanitários percorreu o caminho das atrocidades. E por aí vamos, sem mencionar as áreas mais quentes, como Palestina/Israel, Irã ou Paquistão.

Com realismo, mas sem perder de vista os ideais universais desenhados em 1948, é urgente que as potências dominantes reconheçam as novas realidades e convidem à mesa os que têm vez e voz no mundo. Tomara que Dominique Moïsi tenha razão e a liderança americana esteja mesmo construindo as bases para um relacionamento estável, de paz, prosperidade e respeito aos direitos humanos, com a Ásia, sem ambicionar difundir sua ideologia política, muito menos aceitar a generalização do modelo chinês.