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quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

A Política da Política Externa: os partidos políticos nas relações internacionais do Brasil, 1930-1990 (1993) - Paulo Roberto de Almeida

 Reformatação, revisão, correção e nova inserção na plataforma Academia.edu deste trabalho minucioso de pesquisa na literatura sobre o envolvimento dos partidos políticos brasileiros na política externa, feito em várias versões. Esta é a primeira versão completa, de 1930 a 1990. Ulteriormente atualizei o trabalho, em versões mais limitadas e compactas, para servir como capítulos em livros publicados.

A ficha original é esta: 

327. “A Política da Política Externa: os partidos políticos nas relações internacionais do Brasil, 1930-1990”, Brasília: 14 março 1993, 85 p. Ensaio sobre a relação política externa-partidos políticos, incorporando parte de trabalho anterior sobre o mesmo tema. Preparado para o IV Seminário Nacional do Projeto “60 Anos de Política Externa Brasileira (1930-1990)”, desenvolvido pelo IPRI/USP e apresentado em Brasília em 01.04.93. Revisão em 25 de setembro de 1993, com modificação de alguns trechos e preparação de índices remissivo e onomástico. Publicado, nesta primeira versão de 14/03/1993, n. 327, in: José Augusto Guilhon de Albuquerque (org.), Sessenta Anos de Política Externa Brasileira (1930-1990), IV volume: Prioridades, Atores e Políticas. São Paulo: Annablume/Nupri/USP, 2000, pp. 381-447. Disponível na plataforma Academia.edu (link: http://www.academia.edu/26037730/Os_Partidos_Politicos_nas_Relacoes_Internacionais_do_Brasil_1930-1990_1993_). Reformatação completa, correção e nova inclusão na plataforma Academia.edu (23/12/2020; link: https://www.academia.edu/44759089/327_A_politica_da_politica_externa_os_partidos_politicos_nas_relacoes_internacionais_do_Brasil_1930_1990_1993_). Relação de Publicados n. 262.


A política da política externa

Os partidos políticos nas relações internacionais do Brasil, 1930-1990

 

Paulo Roberto de Almeida

Doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas

 

Sumário geral:

Introdução

I. A retirada dos partidos políticos da política externa: 1930-1945

II. Os partidos políticos sem política externa: 1945-1964

III. A política externa sem partidos políticos: 1964-1985

IV. O retorno dos partidos políticos à política externa: 1985-1990

Conclusões

Bibliografia

 

[Trabalho preparado para o IV Seminário Nacional do Projeto “Sessenta Anos de Política Externa Brasileira (1930-1990)”, desenvolvido conjuntamente pelo Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais da Fundação Alexandre de Gusmão (IPRI/FUNAG) e pelo Programa de Política Internacional e Comparada do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (DCP/USP), realizado em Brasília, em 31/03 e 01-02/04/93]

[versão preliminar; Brasília, 14 de março de 1993]

 

Sumário dos capítulos

Introdução

1. Partidos políticos e política externa no Brasil: desencontros

     I. A retirada dos partidos políticos da política externa: 1930-1945

2. Pouca política externa e muitos partidos políticos: o primeiro período Vargas, 1930-1937

3. Nenhum partido político e muita política externa: os anos de guerra e a redemocratização, 1937-1945

     II. Os Partidos Políticos sem Política Externa: 1945-1964

4. Os programas dos partidos no pós-guerra, 1945-1961

5. A “política externa” dos partidos políticos: o regime constitucional de 1946

6. Os partidos políticos na política externa: a experiência parlamentarista, 1961-1963

     III. A política externa sem partidos políticos: 1964-1985

7. Poucos partidos políticos e várias políticas externas: o longo período autoritário, 1965-1979

8. Vários partidos políticos e uma política externa: a abertura política do multipartismo limitado, 1979-1985

     IV. O retorno dos partidos políticos à política externa: 1985-1990

9. Muitos partidos políticos e a busca de uma política externa: a redemocratização de 1985

10. A Constituição de 1988 e as relações internacionais do Brasil

11. Excesso de partidos e nenhuma política externa: a campanha presidencial de 1989

Conclusões

Bibliografia citada

 


Introdução 

O presente trabalho, que pode ser caracterizado como mais propriamente histórico do que sociológico, persegue um duplo objetivo: por um lado, verificar o papel político e institucional ocupados pelos partidos políticos brasileiros no debate e encaminhamento das grandes questões relativas às relações internacionais do Brasil entre 1930 e 1990; por outro, examinar o espaço e a importância doutrinal dos temas de política externa nos programas e nas atividades dos partidos políticos brasileiros ao longo desse período.

O início e o final do período estudado estão balizados por dois eventos históricos de relativo impacto para o sistema político e a própria vida partidária no Brasil: a Revolução de outubro de 1930, provocando uma ruptura fundamental com o “velho” estilo de se fazer política (eleições “a bico de pena”, máquinas políticas que raras vezes podiam ser verdadeiramente identificadas a formações partidárias, cooptação institucional pelas oligarquias estaduais, etc.), e as eleições presidenciais de 1989, rompendo um jejum de quase 30 anos na escolha direta do Presidente da República. Entre essas duas datas o Brasil passou por quatro processos constituintes, três golpes de Estado militares e outras tantas rupturas da ordem constitucional, dois longos períodos ditatoriais e apenas uma fase plenamente democrática em regime multipartista.

Dos vários processos de elaboração constitucional, apenas dois — a Assembleia Constituinte de 1946 e a Constituinte Congressual de 1987-88 — podem realmente ser identificados com a formação de um sistema político pluralista e moderadamente reformista do ponto de vista social. Em ambos os casos, quando também atuaram de forma intensa partidos políticos comprometidos com linhas doutrinais relativamente claras, as questões do relacionamento internacional do País tiveram importância relativamente secundária nos debates parlamentares ou na vida partidária. Na segunda metade desse período, ocorreu uma ruptura da ordem constitucional (o golpe militar de 1964), com a imposição forçada de um regime bipartidista (1966), um arremedo de reordenamento institucional (1967), seguido de uma Carta imposta (a Emenda Constitucional nº 1, de 1969) e de três dezenas de emendas constitucionais (com outros tantos casuísmos eleitorais) até a convocação do último processo de elaboração constitucional.

Ocorreu também, ao longo desse período de 60 anos, uma reformulação significativa dos fundamentos e da atuação efetiva do Estado nas relações internacionais do Brasil, sem que os partidos políticos tenham tido uma influência preponderante nas grandes linhas de inflexão da política externa brasileira. Essa apreciação pode ser corroborada em fontes independentes. O brazilianist Ronald Schneider, por exemplo, em seu conhecido trabalho sobre os aspectos estruturais e institucionais da política externa brasileira, faz um julgamento severo sobre o papel dos partidos na formulação da política externa: “Os partidos políticos não são fatores significativos na elaboração da política externa (foreign policy-making). Em termos de influência, os partidos variam entre a influência inexistente e a marginal. Mesmo antes de 1964, a política externa era mais uma responsabilidade do Executivo que uma preocupação partidária; dessa forma, as posições de política externa de diversos partidos pecavam por falta de coerência”.[1]

Esse alheamento dos partidos da política externa não é uma peculiaridade brasileira, mas uma característica presente nos mais diversos regimes políticos. Como já tivemos oportunidade de discutir, de um modo geral, os programas dos partidos políticos nos sistemas pluralistas, e no Brasil em particular, atribuem importância apenas secundária, quando não marginal, aos temas de política externa.[2] Quando realçados na prática corrente dos partidos em regime democrático, esses temas comparecem, aliás, mais com objetivos táticos do que por razões propriamente doutrinárias. Esse julgamento deve ser evidentemente nuançado em função da posição internacional assumida pelo país em causa ou da conjuntura histórica refletida nos documentos organizacionais.[3]

O presente estudo, que amplia e aprofunda pesquisas anteriores do Autor sobre essa matéria ou sobre temas correlatos,[4] não tem a pretensão de cobrir em todos os seus detalhes o itinerário histórico da interação partidos políticos — política externa nos últimos 60 anos da vida republicana brasileira. Ele representa, ainda assim, uma contribuição conceitual e metodológica de caráter multidisciplinar — isto é, no âmbito da história e da sociologia política — sobre esse tema geralmente negligenciado da reflexão acadêmica na área das relações internacionais do Brasil. Mais precisamente, ele constitui um primeiro mapeamento sistemático da atuação dos partidos políticos brasileiros no contexto do sistema político e da própria reflexão doutrinal sobre a política externa institucional. 

 

1. Partidos Políticos e Política Externa no Brasil: desencontros

Em primeiro lugar, caberia lembrar que os partidos políticos não têm, enquanto tais, “política externa”, mas tão simplesmente posicionamentos ideológicos e práticos sobre as relações internacionais e os desafios externos de seus respectivos países. Com efeito, por sua própria natureza, a política externa tende a elevar-se acima dos partidos para adquirir um caráter nacional abrangente.



[1] Ronald M. SCHNEIDER: Brazil: Foreign Policy of a Future World Power (Boulder, Co.: Westview Press, 1976), p. 137.

[2] Ver Paulo Roberto de ALMEIDA, “Partidos Políticos e Política Externa”, Política e Estratégia (São Paulo, vol. IV, nº 3, julho-setembro 1986, pp. 415-450) e Revista de Informação Legislativa (Brasília, Ano 23, nº 81, julho-setembro 1986, pp. 173-216).

[3] A referência básica para a discussão dessa questão, do ponto de vista da sociologia política, é o artigo de Marcel MERLE, “Partis Politiques et Politique Etrangère en Regime Pluraliste”, Revue Internationale des Sciences Sociales (vol. 30, nº 1, 1978), consultado na tradução brasileira: “Partidos Politicos e Politica Exterior no Regime Pluralista”, Relações Internacionais (Brasília, ano I, nº 3, setembro-dezembro 1978, pp. 78-85); esse artigo foi transcrito em sua obra Forces et Enjeux dans les Relations Internationales (Paris, Economica, 1981); ver tambem, de Merle, “Politique Intérieure et Politique Extérieure”, Politique Etrangère (Paris, vol. 41, nº 5, 1976, pp. 409-22) e a seção “Le rôle des partis politiques” em seu livro La Politique Etrangère (Paris, Presses Universitaires de France, 1984), “Deuxième Partie”, pp. 72-79.

[4] Ver Paulo Roberto de ALMEIDA, “Uma Interpretação Econômica da Constituição Brasileira: A Representação dos Interesses Sociais em 1946 e 1986”, Ciência e Cultura (São Paulo, vol. 39, nº 1, janeiro 1987, 34-46); “Partidos Políticos e Política Externa”, op. cit. supra, nota 2; “Relações Exteriores e Constituição”, Revista de Informação Legislativa (Ano 24, nº 94, abril-junho 1987, pp. 109-120); “As Relações Internacionais na Ordem Constitucional”, Revista de Informação Legislativa (Ano 26, nº 101, janeiro-março 1989, pp. 47-70); “Relações Internacionais e Interesse Nacional: As Relações Econômicas do Brasil e a Ordem Constitucional”, Boletim da Sociedade Brasileira de Direito Internacional (Anos XXXIX a XLI, 1987/1989, nºs 69/71, pp. 164-183); “A Estrutura Constitucional das Relações Internacionais e o Sistema Político Brasileiro”, Contexto Internacional (Rio de Janeiro, Ano 6, nº 12, julho-dezembro 1990, pp. 53-69).



Ler a íntegra neste link: 

327. “A Política da Política Externa: os partidos políticos nas relações internacionais do Brasil, 1930-1990”, Brasília: 14 março 1993, 85 p. Ensaio sobre a relação política externa-partidos políticos, incorporando parte de trabalho anterior sobre o mesmo tema. Preparado para o IV Seminário Nacional do Projeto “60 Anos de Política Externa Brasileira (1930-1990)”, desenvolvido pelo IPRI/USP e apresentado em Brasília em 01.04.93. Revisão em 25 de setembro de 1993, com modificação de alguns trechos e preparação de índices remissivo e onomástico. Publicado, nesta primeira versão de 14/03/1993, n. 327, in: José Augusto Guilhon de Albuquerque (org.), Sessenta Anos de Política Externa Brasileira (1930-1990), IV volume: Prioridades, Atores e Políticas. São Paulo: Annablume/Nupri/USP, 2000, pp. 381-447. Disponível na plataforma Academia.edu (link: http://www.academia.edu/26037730/Os_Partidos_Politicos_nas_Relacoes_Internacionais_do_Brasil_1930-1990_1993_). Reformatação completa, correção e nova inclusão na plataforma Academia.edu (23/12/2020; link: https://www.academia.edu/44759089/327_A_politica_da_politica_externa_os_partidos_politicos_nas_relacoes_internacionais_do_Brasil_1930_1990_1993_). Relação de Publicados n. 262.


terça-feira, 7 de maio de 2019

Novas configuracoes partidarias no Brasil - Estadao

Maiores partidos políticos já se rendem a nome novo

O desgaste dos partidos e da própria classe política - marcado nas eleições do ano passado pela rejeição do eleitorado - já estimula mudanças nas mais tradicionais e mais estruturadas siglas do País. De imediato, das 10 maiores bancadas do Congresso, ao menos cinco siglas já alteraram ou estudam alterar o nome, decisão que costuma ser anunciada como um processo de busca de conexões com as redes sociais e de renovação de estatutos e programas. 
Algo que o DEM, que hoje preside tanto a Câmara quanto o Senado, fez em 2007, quando deixou de ser PFL e adotou a marca Democratas. O PSDB e MDB, as duas maiores bancadas no Senado, devem ir na mesma linha. O fenômeno, segundo especialistas, é uma tendência mundial e revela uma mudança na relação do eleitor com a política que dispensa mediadores e tem campo aberto no meio digital. 
Depois de abolir “P” da sigla, o MDB estuda passar a se chamar apenas “Movimento”. O PSDB encomendou pesquisa para se reposicionar a partir de junho, quando ocorrerá a convenção nacional. Principal liderança da legenda, o governador de São Paulo, João Doria, fala em transformar o partido em “digital”. 
Ligado à Igreja Universal, o PRB vai se transformar em Republicanos, como antecipou o Estado. A intenção da legenda é focar sua atuação no campo ideológico da centro-direita. 
Originário do antigo PCB, o Partido Popular Socialista (PPS) foi rebatizado recentemente como Cidadania, e tirou o “Socialista” do nome para receber os grupos de renovação política, como Agora, Livres e Acredite. Entre os 74 partidos em formação inscritos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 20 optaram por nomes com cara de movimento: Iguais, Raiz, Tribuna Popular, Animais, Força Brasil, Liga, Arena, UDN, Unidade Popular, entre outros.
O ex-deputado Roberto Freire, fundador e líder do Cidadania, observa que a ideia de partido como configurada hoje surgiu na revolução industrial, com o Partido Social Democrata Alemão. Para ele, este conceito está com os dias contados. “O mundo exige outra forma de organização. Os partidos vão deixar de existir”, disse. “A comunicação direta com o eleitor é uma nova realidade. Hoje é só pelas redes. Ninguém espera mais uma articulação partidária por células em sindicatos de base.” 
Outra sigla que mudou de nome foi o Partido Trabalhista Nacional (PTN), que se transformou em Podemos em maio de 2017. “Somos cidadãos do século 21, mas lidamos com instituições concebidas no século 18. O que mobiliza hoje a sociedade não é mais a ideologia de esquerda ou direita, mas as causas, que são muito dinâmicas”, disse a deputada federal Renata Abreu (SP), presidente da legenda.
Sistema
Para o professor de ciência política Leonardo Avritzer, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), esta tendência indica que o sistema partidário brasileiro é pouco consolidado. “Não consigo imaginar o Partido Republicano dos Estados Unidos mudando de nome”, disse. 
Avritzer avalia que existe grande desconfiança em relação aos partidos. Pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), em parceria com outras instituições, mostrou que, em 2018, oito em cada dez brasileiros (78%) afirmaram não ter “nenhuma confiança” nessas instituições. Uma das causas, segundo Avritzer, é a ausência de conexão com os anseios de parte da sociedade. 
“A mudança (de nome dos partidos) é para se viabilizarem como estruturas que possam ser mais atrativas. Mas, provavelmente o motivo da pouca confiança não é que as pessoas não gostam do nome, e sim de determinadas de práticas”, diz o cientista político. 
O pesquisador vê o Brasil inserido em um movimento mundial de forte insatisfação com o sistema político tradicional. “O eleitorado esteve disposto a votar no PSL e no Novo, partidos que praticamente inexistiam em eleições anteriores”, destacou. Nos casos dos partidos tradicionais, como MDB e PSDB, ele alerta que a mudança do nome significa, também, “abandonar muita coisa”. “O MDB seria a própria tradição da luta pela redemocratização, e o PSDB seria abrir mão de uma série de bandeiras históricas.”
Para o sociólogo Rodrigo Prando, professor do Mackenzie, a ideia de tirar o termo “partido” é uma tentativa de se mostrar mais conectado com a sociedade, numa tentativa de dar ares de modernidade a uma estrutura antiquada e pouco democrática. “Os partidos estão assentados em uma burocracia do século 20 e a sociedade hoje é outra, a democracia representativa está em crise no mundo todo. As eleições de Trump nos EUA e de Bolsonaro no Brasil deram uma chacoalhada no sistema.” Para ele, é fundamental que a militância participe da discussão da mudança do nome. “Não pode vir só da cúpula.”
Desde a derrota de Fernando Haddad para Jair Bolsonaro no segundo turno da eleição presidencial do ano passado, o PT intensificou as discussões sobre como superar o antipetismo e o desgaste da imagem do partido. 
Houve até a proposta de mudança do nome - hipótese prontamente descartada. Hoje o PT debate internamente a criação de uma frente formada por partidos, movimentos sociais e “setores democráticos”, como forma de fazer oposição ao governo Bolsonaro. A justificativa para a estratégia da frente é a “ausência de um deslocamento da situação política à esquerda”. 
MDB quer ser 'movimento"
Depois de deixar o Palácio do Planalto, sofrer forte derrota nas eleições do ano passado e perder a presidência da Câmara e do Senado, o MDB tenta se reposicionar na cena política para sair do isolamento. Dirigentes do partido querem agora construir uma agenda econômica com novas bandeiras, limpar a imagem da legenda abalada por escândalos de corrupção e influenciar no debate do Congresso, para ser uma espécie de fiel da balança em votações importantes para o governo de Jair Bolsonaro.
A estratégia para sair da “segunda divisão” e ganhar protagonismo após a crise passa por um alinhamento entre as bancadas do Senado e da Câmara e mudanças no cartório.
Uma ala do MDB quer trocar o nome do partido, desta vez para “Movimento”. Por trás desse novo batismo está a ideia de que o MDB admite erros, mas não é estático e dá a volta por cima. No fim de 2017, o PMDB já havia removido o “P” da sigla, voltando a ser chamado de Movimento Democrático Brasileiro (MDB), como foi criado, em 1966, quando fazia oposição à ditadura militar.
Antes antagônicas e em disputa, as bancadas do partido na Câmara e no Senado procuram agora alinhavar táticas conjuntas para avançar algumas casas no jogo legislativo e acumular força. Um dos temas em discussão, por exemplo, é a reforma da Previdência e o outro, as mudanças tributárias.
“Temos um Everest para escalar”, disse o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM). “Os governos, estrategicamente, sempre tentaram nos dividir, mas agora começamos a ter uma relação mais próxima. Estamos construindo várias pautas de políticas públicas e queremos debatê-las com o povo e com o governo.” 
A meta é explorar temas que têm impacto na vida da população e jogar os holofotes sobre a marca MDB. As bancadas do partido querem, por exemplo, mexer na proposta do governo Bolsonaro sobre abono salarial e propor uma nova política de salário mínimo para vigorar a partir de 2020. Uma das ideias do partido é preparar uma proposta de transição para a implantação da mudança no abono, incluídas pelo governo na reforma da Previdência, e que prevê a redução de dois para um salário mínimo a renda de acesso ao benefício. 
Na avaliação do deputado Baleia Rossi (SP), líder do MDB na Câmara, o novo momento do País exige uma aliança entre todas as correntes do partido. “Não vejo sentido em ter dois MDBs diferentes”, afirmou. “Precisamos superar as dificuldades e essa união ajuda a projetar nosso crescimento porque o próximo desafio é a eleição municipal de 2019.” O plano do MDB é lançar candidatos próprios nas capitais e em cidades com mais de 200 mil eleitores.
Presidente do MDB paulista, Baleia Rossi disse que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma tributária, apresentada por ele, é um dos temas que podem juntar as duas bancadas no Legislativo, além das mudanças sugeridas para a aposentadoria rural e para o Benefício de Prestação Continuada (BPC), por exemplo. 
TSE
Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indicam que o MDB ainda é o maior partido do País, com 2,3 milhões de filiados, embora tenha enfrentado um terremoto nas eleições do ano passado. Hoje, a sigla tem três governadores (Alagoas, Distrito Federal e Pará), 1.030 prefeitos, comanda um ministério no governo Bolsonaro - o da Cidadania, com Osmar Terra, e 34 deputados federais - um pouco mais da metade do que tinha antes -, mas ainda é dona da maior bancada do Senado, com 13 parlamentares. 
Presidente do MDB, o ex-senador Romero Jucá (RR) não se reelegeu, assim como outros quadros históricos do partido no Senado, como Eunício Oliveira (CE), Edison Lobão (MA) e Garibaldi Alves (RN). Denunciado pela Lava Jato, Jucá atribuiu a derrota, na ocasião, ao que classificou como “linchamento” contra a classe política e à crise humanitária que atingiu Roraima, seu Estado, com intenso fluxo migratório de venezuelanos na região. Recentemente, Jucá conversou com Bolsonaro. “Mas não vamos entrar na base aliada”, avisou. “O MDB quer ser independente.” 

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Partidos politicos e financiamento eleitoral no Brasil - Paulo Roberto de Almeida

Partidos políticos e financiamento eleitoral no Brasil

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: respostas a questionário; finalidade: participação em pesquisa]
  
Recebi, de [um pesquisador], pequeno questionário destinado a subsidiar pesquisa que ele conduz sobre sistemas de financiamento político e eleitoral. Eis minhas respostas.

1 . No contexto democrático, qual é o papel dos partidos políticos? 
Representar “partes” da opinião pública, ou frações de setores sociais e grupos determinados da sociedade, até talvez o conjunto da sociedade (embora seja difícil atender a interesses contraditórios), junto às instituições políticas de natureza governamental. Partidos são intermediários entre desejos, demandas, requerimentos da sociedade – mais frequentemente partes dela, daí o nome de “partidos”, ou seja, partes de um todo – e as instituições de governança, no legislativo, em primeiro lugar, no comando do executivo naturalmente, e eventualmente também junto a órgãos do judiciário, no caso de mecanismos de solução de controvérsias.
Partidos são elementos essenciais nas democracias modernas, que são todas, ou quase todas, representativas. O jogo democrático legítimo prevê a organização de consultas eleitorais regulares, visando à alternância dos partidos no exercício do poder, segundo procedimentos acordados consensualmente pela sociedade, através de uma assembleia constituinte e seus ordenamentos constitucionais.

2. Você seria favorável a um sistema de financiamento (partidos e campanhas) totalmente privado (doações empresariais e de pessoas físicas)?
Não se trata de ser favorável: sou, em primeiro lugar, inteiramente contrário a qualquer outro sistema, e, portanto, a favor de uma proibição formal de financiamento público de campanhas e dos partidos. Partidos são entes de direito privado – pois que representando apenas partes da opinião pública –e devem, dessa forma, ser financiados exclusivamente por seus membros, militantes, simpatizantes, apoiadores. Sou, portanto, pela liberdade absoluta de financiamento privado das campanhas. Mas, como os partidos são entidades de direito privado exercendo missões públicas, de caráter cívico, sou a favor de total transparência nos mecanismos e dados reais sobre esse tipo de financiamento: tudo o que o partido receber deve estar à disposição de todas as autoridades de organização dos escrutínios eleitorais, assim como da sociedade em geral. Repito: total liberdade. Existe o risco de partidos serem capturados por grandes interesses econômicos? Claro que existe, mas isso vai se saber imediatamente, e a sociedade terá perfeita informação e consciência desse apoio. Fraudes, omissões e sub-declarações quanto ao financiamento obtido deveriam ser sancionados severamente, implicando, por exemplo, na vedação da participação dos candidatos do partido fraudador em um ou dois escrutínios eleitorais seguidos.

3. Como a prestação de contas do dinheiro público transferido para os partidos políticos pode ser aperfeiçoada?
Sou absolutamente contrário a qualquer forma de financiamento público. O financiamento privado deve ser registrado na página de cada partido, sem sequer a obrigação de remeter à autoridade eleitoral, que procederá eventualmente a conferência por amostragem das contas dos partidos, podendo inquirir por dados mais completos.

4. Você seria favorável a um sistema de financiamento 100% público de campanhas e partidos políticos?
De nenhuma forma, e não aceito o argumento de que esse financiamento público é o preço da democracia. Partidos investem os recursos de seus apoiadores em campanhas políticas, para eleger representantes que, eles sim, receberão um salário condigno para tal tarefa de representação, mas se qualquer tipo de mordomia.

5. Você é favorável ao teto de gastos de campanha? 
Não; como liberal, acredito que cada partido deve investir o que seus apoiadores desejarem na eleição de seus candidatos. Alguns serão eleitos com muito dinheiro, outros com um mínimo. E serão ambos exatamente iguais na representação congressual ou nos cargos executivos, devendo desempenhar seus mandatos de acordo a dispositivos constitucionais.

6. Qual é sua perspectiva acerca do atual paradigma de financiamento dos partidos políticos brasileiros?  
Sistema totalmente irresponsável, perdulário, inaceitável, escandaloso e vergonhoso, do ponto de vista dos eleitores (que não deveriam ser compulsórios, e sim voluntários) e dos contribuintes (também compulsórios) que já pagam os salários de seus representantes e dirigentes. Os fundos eleitoral – uma excrescência inaceitável – e partidário devem ser extintos completamente, imediatamente, por antidemocráticos. A questão é muito simples: como um eleitor liberal, ou conservador pode apoiar, sem o seu consentimento, um partido que prega o fim da propriedade privada? E como um eleitor esquerdista, igualitarista radical, pode sustentar candidatos conservadores e partidários de uma economia de mercado totalmente livre? Injusto para ambos.

7. Qual é o modelo mais adequado de financiamento dos partidos políticos brasileiros?
 Já explicitado acima: totalmente a cargo, exclusivamente sob responsabilidade de seus membros e simpatizantes. Qualquer outra forma é antidemocrática e autoritária.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 25 de fevereiro de 2019


quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

Bolivar Lamounier: a (nao)reforma do sistema politico brasileiro - Bolivar Lamounier, Paulo Roberto de Almeida

Em 2005, eu fazia uma resenha deste livro de Bolívar Lamounier, abaixo transcrita:
1482. “Tudo o que você sempre quis saber sobre a política brasileira...”, Brasília, 14 out. 2005, 2 p. Resenha de Bolivar Lamounier: Da Independência a Lula: dois séculos de política brasileira (São Paulo: Augurium Editora, 2005, 320 p.).  
 

Não creio que a situação tenha melhorado desde então, ao contrário, só piorou nestes 12 anos desde que o livro foi publicado e eu fiz essa resenha. O sistema se tornou mais fragmentado, mais corrupto, mais bandidos de colarinho branco ainda escapam de uma justa punição, aliás com a colaboração ativa de membros dos cortes inferiores (ops) que teimam em não julgar os maiores bandidos da política brasileira.
Temos alguma réstia de esperança?
Não creio, pelo menos não imediatamente. Mas teimamos em resistir e continuamos na nossa ação para limpar o sistema político. Eu pelo menos faço o meu dever de denunciar, de acusar, de informar, de refletir, e não hesito em assinar embaixo do que escrevo.
Bom 2018 a todos.
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 21 de dezembro de 2017



Tudo o que você sempre quis saber sobre a política brasileira...

Bolivar Lamounier:
Da Independência a Lula: dois séculos de política brasileira
São Paulo: Augurium Editora, 2005, 320 p.; R$ 49,00

Paulo Roberto de Almeida
14/10/2005

            ...e nunca teve a quem perguntar. Agora já tem: é o novo “Lamounier”, cobrindo desta vez (quase) dois séculos de história política. Mas atenção: o livro não é para principiantes, nem do lado teórico, nem do lado prático, isto é, dos que são chamados a nos representar no parlamento e no executivo. Estes, como evidenciado nos casos de “fundos não contabilizados”, acabam construindo um universo à parte dos que pagam impostos, que vêem os recursos auferidos serem dilapidados pelos poucos que, segundo a descrição apta de Milton Friedman, “são pagos para gastar o dinheiro dos outros”.
            Não se trata de uma simples “introdução” à história política brasileira, uma vez que o livro exige dos leitores um conhecimento mínimo dessa história, ao mesmo tempo em que certa familiaridade com conceitos centrais da ciência política. Tampouco se trata de um “manual” para a reforma política e eleitoral à intenção dos que nos governam, pois eles dificilmente se deixariam guiar por critérios de racionalidade estrita do sistema partidário e representativo, preferindo cuidar dos seus interesses, acima de quaisquer considerações éticas. Como diz o autor na introdução: “O crafting institucional da democracia brasileira ostenta resultados contraditórios: organizamos bem a esfera eleitoral e criamos uma ética para o voto, mas não organizamos nem criamos uma ética para a esfera dos partidos e do parlamento”. Difícil, assim, que os governantes sigam as recomendações da terceira parte, relativa, justamente, à reforma política, para introduzir um sistema de governo, uma organização partidária e um sistema eleitoral que correspondam às necessidades da nação, contra seus próprios interesses, enquanto classe organizada para o assalto (é o caso de se dizer) e a manutenção do poder.
            As duas primeiras partes, em todo caso, constituem a mais completa análise de que se tem notícia na literatura sobre a evolução da política brasileira, não apenas pelo lado dos “episódios” políticos, mas também pelo lado da teorização sobre os regimes políticos, os sistemas partidários, as relações civil-militares e as “lições” de cada período. Um quadro analítico resume a evolução do sistema político de 1822 a 2005: cada um dos regimes – Império, Primeira República, Revolução de 1930, Estado Novo, República de 1946 e o regime militar – terminou em grave conflito político, geralmente sob a forma de golpes militares, com o apoio das classes médias. O regime militar, na verdade, se esvaiu numa “prolongada peleja política e eleitoral”, ao cabo da qual as oposições coligadas viabilizaram o retorno ao governo civil. O novo regime democrático, obviamente, ainda não acabou, mas se supõe que seu destino seja menos dramático do que a meia dúzia de sistemas político-partidários que o precederam.
            Lamounier examina a historiografia convencional – propondo sua revisão – e a literatura de cada época. Duas formas de reducionismo político são identificadas no protofascismo (“mescla de positivismo, nacionalismo e endeusamento do Estado”) e no marxismo (“sobretudo na versão stalinista da Terceira Internacional”), intrinsecamente antiliberais e antiparlamentares, ambos avessos à consideração do sistema político enquanto esfera autônoma. A análise se estende ainda à construção e funcionamento dos sistemas partidários e representativos, sendo evidentes o crescimento paulatino do corpo eleitoral, a ampliação do sufrágio e a fragmentação gradual do sistema partidário.
Um texto de Hegel sobre a Inglaterra de 1830 é ironicamente recrutado para explicar o que é um “curral eleitoral”, prática aliás bem viva no Brasil moderno, a julgar pela formação de um exército contemporâneo de assistidos por “mensalinhos” oficiais. A despeito disso, a competição aumentou, mas nem sempre foi assim: Rodrigues Alves (1918) e Washington Luís (1926), por exemplo, conquistaram a suprema magistratura com maiorias “albanesas” superiores a 98% dos votos válidos, ainda que com cerca de 2% de votantes sobre a população total (hoje a proporção de eleitores é superior a 60%). “Lula lá”, em 2002, foi “a batalha que não houve”: a manutenção do sistema político de maiorias frágeis mostra a amplitude das reformas políticas que precisam ser feitas para tornar o Brasil mais conforme à estabilidade já conquistada no terreno econômico. A julgar pelo “presidencialismo de mensalão”, ainda estamos longe do ideal...

Paulo Roberto de Almeida
[Brasília, 14 outubro 2005]

20. “Tudo o que você sempre quis saber sobre a política brasileira...”, Brasília, 14 outubro 2005, 2 p. Resenha de Bolivar Lamounier: Da Independência a Lula: dois séculos de política brasileira (São Paulo: Augurium Editora, 2005, 320 p.). Publicada em Desafios do Desenvolvimento (Brasília: IPEA-PNUD, ano 2, nº 16, novembro 2005, p. 60; link: http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=1791:catid=28&Itemid=23). Divulgado no blog Diplomatizzando (01/02/2012; link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2012/01/politica-brasileira-por-um-especialista.html). Relação de Trabalhos nº 1482. Relação de Publicados nº 604.


sábado, 8 de outubro de 2016

Gabeira sobre a organização criminosa, as eleições e o sistema político (OESP)

Sempre lúcido, ainda que um pouco caótico na argumentação.
Mas eu quero destacar apenas, em direção e em intenção daqueles gramscianos de academia que insistem em defender criminosos de alto coturno a pretexto de estarem defendendo um governo de "esquerda" ou "progressista", a importância de se ler não apenas os relatórios da Polícia Federal mas também as peças acusatórias do MPF e da chamada "República de Curitiba" como provas cabais daquilo que eu sempre afirmei desde o início do governo celerado (e destaco em caixa alta):
A PARTIR DE 2003, O BRASIL PASSOU A SER DIRIGIDO POR UMA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA, não apenas mafiosa, mas também inepta, pois mergulhou o país na GRANDE DESTRUIÇÃO! 
Todo mundo tem o direito de ser de esquerda, de direita, de centro, de defender quaisquer teorias ou ações que julguem adequadas para seus objetivos políticos, econômicos ou sociais.
Mas acho que NINGUÉM tem o direito de DEFENDER CRIMINOSOS políticos, que são, na verdade, bandidos comuns: assaltantes do dinheiro público (isto é, nosso), quadrilheiros vulgares.
Quem ainda insiste em fazê-lo, ante tantas evidências dos crimes cometidos pelos companheiro, seja por razões ideológicas, seja por quaisquer outras, só revela sua falta de caráter, pois já não pode alegar ignorância ou o argumento canhestro de que "todo mundo sempre fez assim".
Paulo Roberto de Almeida


VOTANDO E APRENDENDO A VOTAR
FERNANDO GABEIRA 
O Estado de S.Paulo, 07/10/2016

Não tenho o hábito de comemorar derrota de adversários, porque me lembro de que também já tive as minhas, aritmeticamente, humilhantes. No entanto, o resultado das eleições é uma espécie de confirmação eleitoral do fim de uma época.
Na verdade, o marco inaugural foi o impeachment, que muitos insistem em dizer que foi produto de uma articulação conservadora e dos meios de comunicação. Os defensores dessa tese têm uma nova dificuldade. Se tudo foi mesmo manobra de uma elite reacionária, se estavam sendo punidos pelo bem que fizeram, por que o povo não saiu em sua defesa nas urnas?
Sei que a resposta imediata é esta: a Operação Lava Jato, o bombardeio da imprensa, tudo isso produz uma falsa consciência. Esse argumento é uma armadilha. Nas cartilhas, exaltamos a sabedoria popular. Vitoriosos nas urnas, é para ela que apontamos, a sabedoria popular. De repente, foram todos hipnotizados pela propaganda?
Considero que estas eleições mostraram também uma grande distância entre campanhas e eleitores. No entanto, o declínio geral do sistema político não pode servir de refúgio para esconder a própria derrota.
Em certos momentos da História é difícil delimitar a fronteira entre um movimento político e uma seita religiosa. Mesmo antes do período eleitoral, tive uma intuição do que isso representa. Estava pedalando pela Lagoa, no Rio de Janeiro, e uma jovem com fone no ouvido gritou: “Golpista!”. Saía da natação, era uma bela manhã de setembro, sorri para ela.
Na verdade, estava a caminho de casa para ler o relatório da Polícia Federal sobre as atividades de Antônio Palocci que envolvem os governos do PT. Imaginava o que iria encontrar. Ao chegar em casa pensei nela, na moça com dois fios saindo do ouvido. Se pudesse ler isso que li e tudo o que tenho lido, talvez compreendesse o que é ser dirigido por uma quadrilha de políticos e empreiteiros.
Num raciocínio de rua, pensei ao cruzar com operários da Odebrecht que trabalham nas obras do metrô na Lagoa: esses são gentis, dizem bom-dia.
Bobagem de manhã de setembro, mas uma intuição: enquanto se encarar a queda de um governo que assaltou e arruinou o Brasil como um golpe de Estado, será muito difícil deixar os limites da seita religiosa e voltar à dimensão da vida política.
Há derrotas e derrotas. A mais desagradável é quando não existe uma única voz sensata, dizendo a frase consoladora: o pior já passou.
Quem lê o que se escreve em Curitiba, não só os contos de Dalton Trevisan, mas os relatórios da Lava Jato, percebe que muita água vai rolar.
As eleições não mostraram apenas uma derrota do PT, mas revelaram a agonia do sistema político. Certamente, as de 2018 serão ainda mais decisivas para precipitar a mudança.
Esse é um dos debates que já correm por fora. Às vezes, tocando em aspectos do problema, como o foro privilegiado, o número de partidos; às vezes, discutindo uma opção mais ampla, como a mudança do próprio regime.
Certamente, um novo eixo mais importante de debate se vai travar entre as forças que apoiaram o impeachment. Não são homogêneas, têm diferentes concepções.
A derrocada do populismo de esquerda não significa que não possa surgir algo desse tipo no outro lado do espectro político. Os eleitos de agora têm uma grande responsabilidade não somente com a aspereza do momento econômico, mas também com sua própria trajetória.
Se o sistema político está em agonia, isso não significa que será renovado a partir do zero. A História não começa nunca do zero. Um novo sistema político carregará ainda muitos feridos das batalhas anteriores. E talvez alguns mortos, por curto espaço de tempo.
Creio que o alto nível de abstenção e votos nulos possa fortalecer esse debate. Embora a abstenção elevada seja um fenômeno internacional.
No mesmo dias das eleições municipais no Brasil, a Colômbia votou o referendo sobre o acordo de paz. Abstenção: 62%. Na Hungria, votou-se o projeto europeu de cotas para receber imigrantes. O número de eleitores foi inferior a 50%, invalidando a votação.
Cada lugar tem também suas causas específicas para que tanta gente não se importe com algo que nos parece.
As eleições confirmaram que a qualidade dos políticos representa muito no aumento do descrédito. Mesmo em países com voto facultativo e, relativamente, altos níveis de abstenção, isso parece confirmar-se. Uma campanha como a de Obama atraiu mais gente para as urnas nos EUA.
Depois das eleições começa a etapa em que a superação da crise econômica entra para valer na agenda. Sempre haverá quem se coloque contra todas as reformas e projete nelas todas as maldades do mundo.
Mas entre os que consideram as mudanças necessárias é preciso haver a preocupação de que os mais vulneráveis não sejam atingidos. O instrumento para atenuar o caminho é um nível de informação mais alto sobre cada movimento.
Tenho a impressão de que o Ministério da Educação compreendeu isso na reforma do ensino médio. Outros fatores contribuem para que a discussão seja adequada ao momento. Várias vozes na sociedade já se manifestam a respeito da reforma.
E, além disso, é um tema bastante debatido. Lembro-me de que em 2008 Simon Schwartzman me alertou para o absurdo do ensino médio brasileiro. Defendi a reforma e não me recordo de ninguém que defendesse o ensino médio tal como existe hoje. Por que conter o avanço?
É o tipo do momento em que é preciso esquecer diferenças partidárias. Os índices negativos estão aí para comprovar.
O Congresso pode discutir amplamente o tema, apesar da forma, por medida provisória. Mesmo as críticas sobre a retirada da obrigatoriedade da educação física devem ser consideradas – embora eu ache a educação física facultativa mais eficaz que a obrigatória. E mais agradável para o corpo.