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segunda-feira, 10 de junho de 2019

The Intercept e o terremoto na politica (e na Justica) - Mario Rosa

10 perguntas inconvenientes sobre os conteúdos do ‘Vaza Jato’, questiona Mario Rosa

Poder 360, 10/06/2019

Vazamentos são terremoto na política
Caberá a cada 1 de nós achar respostas
O site Intercept publicou conversas vazadas entre Sérgio Moro e Deltan Dallagnol. E agora?Pixabay
10.jun.2019 (segunda-feira) - 7h13
Senhores Leitores, Senhoras Leitoras,
As placas tectônicas da política sofreram um solavanco de altíssima escala com o vazamento de conteúdos – obtidos ilegalmente – com trocas de mensagens de texto e áudio, ao longo de anos, entre o então juiz Sérgio Moro, o procurador Deltan Dallagnol e delegados e outros integrantes da força tarefa da operação Lava Jato, de Curitiba. Em bom português: terremoto.
Não faltarão opinadores de todos os lados com todas as opiniões possíveis. Creio que minha maior contribuição agora não é oferecer respostas (haverá de todos os tipos, para todos os gostos). Prefiro abastecer o mercado das perguntas. São 10 que coloco para que cada um reflita e chegue às suas próprias conclusões.
01) O ministro Sérgio Moro construiu uma biografia sólida baseada no rigor mais estrito no cumprimento de suas atribuições e, por isso, granjeou louvadamente a admiração da sociedade. Deve ele permanecer no governo, como ministro, sobretudo se a Polícia Federal – sob seu comando hierárquico – for convocada a investigar os conteúdos vazados e o seu teor?
02) O que é mais ético fazer numa situação como esta para todos os que se destacaram perante a admiração do país justamente por um implacável discurso de defesa da ética na vida pública?
03) O procurador Deltan Dallagnol é um dos símbolos perante a sociedade da intransigência com os mal feitos. Em nome da transparência total e para dirimir antecipadamente qualquer dúvida que possa se colocar em relação ao inestimável trabalho em prol do interesse público associado à Lava Jato por grande parte da população, seria o caso de haver uma abertura completa e espontânea de todas as conversas do grupo no aplicativo Telegram (como fez Neymar, mas agora dentro da lei), para que todo o material pudesse ser escrutinado amplamente?
04) O presidente Jair Bolsonaro foi eleito surfando na corrente majoritária de um Brasil que quer uma nova política e a ética no exercício das funções públicas. Deverá o presidente manter seu ministro da Justiça incondicionalmente? Deverá mantê-lo mesmo que isso tenha impacto e afete a tramitação das reformas no Congresso Nacional?
05) O ministro da Justiça, que também sempre defendeu a transparência como valor da cidadania, deveria tomar a iniciativa de comparecer ao Congresso ou convocar uma entrevista para tornar públicos os conteúdos de suas conversas e, desde já, afastar eventuais distorções e exaustivas crises que podem apenas prejudicar o governo, a economia nacional e o país?
06) O Conselho Nacional de Justiça, a Procuradoria Geral da República ou o próprio Supremo Tribunal Federal (com inquérito de questões cibernéticas em curso) poderiam solicitar as bases de dados da Força Tarefa de Curitiba e – no prazo mais curto possível para evitar traumas institucionais e a paralisia política do país – emitir um parecer tempestivo e esclarecedor sobre os graves fatos noticiados?
07) O Congresso Nacional, o Senado ou a Câmara deveriam instituir uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar a denúncia e, nessa perspectiva, exigir oficialmente o compartilhamento do aplicativo da Força Tarefa e esclarecer, com imparcialidade e presteza, como se deu a conduta dos investigadores na Lava Jato, até mesmo para inocentar politicamente esta que é a mais admirada iniciativa de combate à corrupção da história do país de uma eventual acusação deletéria?
08) Se, por algum motivo neste momento absolutamente teratológico e inimaginável, se e apenas se o cotejo dos conteúdos eletrônicos da Lava Jato atestassem a acusação por ora ainda meramente hipotética e sem lastro probatório, poderia a condenação do ex-presidente Lula permanecer sem qualquer revisão, sobretudo baseando-se no princípio largamente aceito da “árvore dos frutos podres”, segundo o qual uma investigação se torna integralmente ilegal se alguma ilegalidade for cabalmente comprovada em seu curso?
09) Avançando nessa hipótese – faço questão de frisar novamente – a essa altura despropositada e descabida (visto que teria de ser fortemente convalidada por fatos incontestáveis), aqueles que porventura tivessem se comportado ao arrepio da lei deveriam ser punidos de alguma forma? Quem? Como?
10) A democracia brasileira e as instituições republicanas foram beneficiárias do efeito profilático de todas as revelações feitas pela operação Lava Jato ao longo dos anos. O Brasil, apesar dos traumas, experimentou um avanço notável ao expor as vísceras de um sistema arcaico e definiu um marco civilizatório com a investigação dos meandros nebulosos da política. A democracia brasileira deveria expor as vísceras de seu sistema de investigação (inclusive e antes de tudo para inocenta-lo de qualquer mácula), para firmar mais um marco civilizatório como nação?
Essas são algumas perguntas. Caberá a cada um de nós, como cidadãos, encontrar as respostas para elas e formular outros questionamentos. A resposta final a tudo isso tem um nome: História.

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Terremoto em Angola? Novo presidente limpa o terreno dos corruptos

Expresso

Terramoto político em Angola: o acontecimento internacional de 2017

As eleições em Angola foram a escolha da redacção do Expresso para Acontecimento Internacional do Ano. João Lourenço, o novo Presidente angolano, está a mostrar todos os dias que não é um homem de palha

Agostinho Neto, o primeiro Presidente de Angola, tem um poema onde afirma: “Eu não espero/ Eu sou aquele por quem se espera”. Jorge Amado escreveu “O cavaleiro da esperança”. Os angolanos esperavam há muito por um homem que lhes devolvesse a esperança, depois de quase 40 anos em que José Eduardo dos Santos dominou a cena política angolana e em que os seus familiares e o círculo mais próximo construíram enormes fortunas, com destaque para a sua filha Isabel dos Santos, que se tornou a primeira bilionária africana, enquanto o povo continuou a viver com dois dólares por dia. Surpreendentemente, o homem que está a devolver a alegria e a esperança aos angolanos manteve, ao longo da sua extensa carreira no MPLA, nas Forças Armadas, no Governo e noutras funções um perfil muito discreto e contido. Talvez por isso, quando foi escolhido pelo todo-poderoso Presidente cessante para lhe suceder, as interrogações seguiram-se. Como seria a presidência de João Lourenço? A manutenção do statu quo? Teria feito um acordo para não mudar durante um ou dois anos as nomeações do anterior Presidente nos últimos dias do seu reinado ou tocar nos interesses dos filhos? Ou iria afirmar-se e correr em pista própria? Pois bem, a resposta tem sido brutal. O que neste momento tem vindo a acontecer em Angola no plano político é um enorme tremor de terra, que surpreende pela intensidade, rapidez e capacidade de destruição do velho poder. Os sinais foram-se acumulando. No seu discurso de posse, Lourenço assinalou que na comunicação social estatal tinha de haver maior abertura à diferença e à divergência de opiniões. E concretizou, exonerando todas as administrações das empresas públicas de comunicação social no dia 9 de novembro: Televisão Pública de Angola (TPA), Rádio Nacional de Angola (RNA), Edições Novembro e Agência Angola Press (Angop). Da empresa Edições Novembro, que publica o “Jornal de Angola”, foi exonerado José Ribeiro do cargo de presidente do Conselho de Administração e de diretor daquele diário estatal. Ribeiro, nomeado para o cargo em 2007, destacou-se desde aí pelos violentos editoriais contra as pretensas ingerências de Portugal na vida política angolana, contra empresários e a imprensa portuguesa, bem como pela sua ortodoxia na defesa das mais altas figuras do regime angolano. A 17 de outubro já tinha sido extinto o Gabinete de Revitalização e Execução da Comunicação Institucional e Marketing da Administração (GRECIMA), órgão liderado pelo influente ex-ministro Manuel Rabelais, desde 2012 responsável pela imagem da Presidência de José Eduardo dos Santos.
MANUEL DE ALMEIDA / Lusa
No mesmo discurso, o novo Presidente disse que o seu grande combate seria contra a corrupção — reafirmando esse desiderato no discurso sobre o estado da nação, ao sublinhar que essa luta é para encarar “com a devida seriedade e responsabilidade”. A 27 de outubro tinha dado o sinal de partida ao exonerar o governador do Banco Nacional de Angola. Novembro foi o mês de todas as demissões. No dia 1 demitiu o conselho de administração da Ferrangol, a empresa mineira do país. No dia 2 foi a vez de ser exonerada a administração da Endiama, a segunda maior empresa nacional de diamantes. No dia 3 aconteceu o mesmo na Sodiam, a empresa de comercialização de diamantes. Seguiu-se, a 9 de novembro, a rescisão do contrato de exploração de laboratórios de análises com a empresa Bromangol, acusada pelos empresários de encarecer a importação de alimentos por ser a única reconhecida pelo Estado para realizar as obrigatórias análises laboratoriais. Foi também exonerado o responsável pelo Secretariado Executivo do Conselho Nacional do Sistema de Controlo e Qualidade, Jorge Sebastião, apontado como sócio de José Filomeno dos Santos na Bromangol.
Finalmente, no quinquagésimo dia da sua presidência, João Lourenço deu um golpe violento no poder da família Dos Santos, ao afastar Isabel da presidência da petrolífera estatal, nomeando para o seu lugar Carlos Saturnino, que a mesma Isabel tinha demitido em 2016 da presidência da Sonangol Pesquisa & Produção sob a acusação de má gestão.
No mesmo dia, o Presidente mandou cessar os contratos da Semba Comunicações, empresa responsável pela gestão do Canal 2 e da TPA Internacional. A Semba é propriedade dos irmãos Tchizé e Coreon Du dos Santos, que detinham o controlo de dois canais da televisão pública.
Para a eliminação da herança santista ser total só falta mesmo o afastamento de Filomeno dos Santos, que dirige o Fundo Soberano de Angola, recentemente envolvido no escândalo dos “Paradise Papers”. Salva-o uma investigação às contas da instituição que está a decorrer.
Finalmente, a 20 de dezembro, o Presidente exonerou as administrações de nove empresas públicas, dos aeroportos e portos, de distribuição de eletricidade e água, e dos caminhos de ferro.
getty
No total, e até agora, João Lourenço precisou de menos de três meses para demolir parte substancial da estrutura de poder de Dos Santos, fazendo 300 nomeações e exonerando mais de 30 oficiais generais e cerca de 20 administrações de empresas públicas, na área petrolífera, dos diamantes, e de comunicação social, além do próprio BNA e de bancos detidos pelo Estado. Depois das exonerações, Lourenço terá acima de tudo de mostrar resultados e com rapidez. É essa a expectativa de quem votou no candidato que, afinal, fez campanha para uma presidência de corte com o passado, reformadora, inclusiva e anticorrupção. Tem a seu favor ser um homem do mundo, viajado e com relações regionais e internacionais com que o seu antecessor nunca contou.
Digamos, pois, que João Lourenço está a atuar como um bulldozer, limpando todos os resquícios do poder de José Eduardo dos Santos, da sua família e dos que enriqueceram à custa dele e com a permissão dele. Sabe que tem de ser rápido e determinado. Já não pode voltar para trás. O caminho, contudo, não é isento de riscos. José Eduardo dos Santos continua a ser presidente do MPLA e, apesar de doente, não está seguramente disposto a ceder sem luta tudo aquilo que ele, os familiares e os que enriqueceram à sua sombra conseguiram. Para se precaver, Lourenço já nomeou lideranças da sua confiança para as forças armadas, para a polícia e para os serviços de segurança. Mas à medida que exonera mais e mais dirigentes a todos os níveis, ganha também mais e mais inimigos, vários deles com capacidade para retaliar. É esse braço de ferro que se joga neste momento no grande país africano. Para já, Lourenço está a levar a melhor, contando com o apoio da generalidade da população. Mas sobre o país ainda paira uma liderança bicéfala e convém não dar por adquirido o trajeto seguido nos últimos três meses. Angola nunca teve terramotos. Está agora a viver um. E as réplicas, como se sabe, podem provocar mais danos do que o primeiro abalo.